Depois da ilha - Quem fomos nós? - Livro 3 escrita por Letícia Pontes


Capítulo 4
Kamila




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Narração por Kamila Reymond Lins

Ser adotada é o sonho de toda criança que mora em um orfanato. Se elas ficam mais velhas, começam a ser deixadas de lado pelos possíveis futuros pais. Os adultos geralmente entram em um orfanato procurando por bebês, quanto mais novos maior a chance de serem adotados. Quando fui levada aos 6 anos de idade junto com a Evaniele de 14 anos, fomos consideradas sortudas. Afinal, além de adotadas ainda fomos adotadas por um casal rico. Eu ainda era nova demais para entender as intenções daquele casal que agora eu chamaria de pais. A Evaniele havia sido devolvida ao orfanato outras duas vezes antes de termos sido adotadas juntas, a história se repetiu e eles devolveram a minha colega com uma semana de adoção. Hoje eu posso olhar para aquele fatídico dia e entender exatamente o que antes eu não entendia:  Eles queriam uma filha perfeita, eu ainda era nova e poderia ser moldada por eles. Além disso, eu era extremamente obediente, inteligente e calada. Tudo o que eles queriam. A ultima frase que ouvi da Evaniele ficou enraizada no meu coração: Eles só querem um filho para salvar o casamento falido deles.

 

Nunca mais eu vi a minha quase irmã. Anos depois quando eu tentei falar com meus pais sobre irmos ao orfanato, eles me proibiram de falar sobre a adoção e sobre Evaniele. Consegui o número do local e perguntei pela minha antiga amiga, mas eles contaram sobre ela ter fugido de lá fazia já muitos anos. Acabei deixando essa história de lado.


Ainda falando sobre quando fui adotada, eles me colocaram na melhor escola da cidade e também me deram o melhor quarto, as melhores roupas...Tudo era o melhor. Mas eles não foram pais. Se não fosse por todo aquele dinheiro, um quarto só meu, a comida que eu quisesse e a roupa mais limpa e cheirosa possível, eu poderia dizer que eu ainda estava em um orfanato. Eu continuei órfã. Apesar de muito nova, foi nessa fase que mais senti isso, já que meu maior sonho era ser adotada, mas quando fui, aquilo parecia bem diferente do que eu sonhava. 

 

Na escola eu não conseguia me enturmar e a professora me levou ao psicólogo da escola. Foi aos 9 anos então que comecei a frequentar aquele lugar toda semana. Aos 12 anos de idade eu já havia decidido que queria ser médica e participar do médico sem fronteiras. A minha vida seria para ajudar a salvar vidas de pessoas carentes. Sempre pensei que quem tem dinheiro deve ajudar quem não tem, seja de qual forma for e essa seria a minha forma. Me concentrei então apenas em estudar. Não sou do tipo de garota que sofreu bullying na infância e por isso se tornou retraída. Eu apenas sempre fui retraída e isso fazia as vezes uma colega chata de turma chamada Jemima (quem coloca um nome desse na filha?) me importunar, mas isso nunca me afetou de forma nenhuma.

 

Foi aos 15 anos que finalmente minha vida criou um pouco de cor. Fabrício, o cara mais popular da escola e também o mais lindo de repente esta em minha sala de estar conversando animadamente com meu pai sobre números e sei lá o que. Os pais dele e os meus sempre trabalharam juntos, mas nunca tiveram muita proximidade do tipo ir um a casa do outro, mas por algum motivo isso começou a acontecer. De início os homens ficavam na sala conversando e nos mulheres mais afastadas comendo e fofocando. No caso, minha mãe e  a dele ficavam fofocando e eu comendo enquanto lia algum livro no celular, fingindo de vez em quando que estava sim prestando atenção no que elas diziam.

 

Depois de alguns encontros, finalmente eu e Fabrício trocamos algumas palavras por livre e espontânea pressão de nossos pais. E minha mãe insistiu um certo dia para que eu ensinasse Fabrício a jogar xadrez. Ao contrário do que eu pensava, ele era legal. Fabrício me ouvia, me ajudava e conversava comigo como se sempre tivéssemos sido amigos. Aquilo me assustava então sempre que ele tentava falar comigo na escola eu dava um jeito de fingir que não ouvi e sumir da vista dele. 

 

Ia ter uma viagem de fim de ano para uma ilha e eu nem sequer falei dela para os meus pais porque ao contrario de toda a turma, eu não queria ir, mas eles acabaram por descobrir e me forçar a ir, com a desculpa de que eu tinha que me divertir, mas aposto que só queriam se livrar de mim por um mês.

 

Antes e durante aquela viagem Fabrício e Pietra começaram a demonstrar um grande interesse em minha amizade. No início aquilo me encantou, eu adorei saber disso e me senti feliz por finalmente talvez fazer amizades, mas uma ligação dos meus pais certo dia me fez repensar sobre as intenções deles. 

 

"Você é estranha, por isso não faz amigos. Eu não sei o que deu na nossa cabeça em achar que poderíamos mudar você. Agora já é tarde para me arrepender."

 

A frase da minha mãe ficou solta no ar antes que eu desligasse na cara deles para não me ouvirem chorar. Obviamente estavam arrependidos de terem me adotado. Eu nunca entendi se eles não podiam ter filhos ou se era alguma outra coisa, mas com certeza amariam se fosse o próprio sangue deles.

 

Depois de tentar me afastar de Pietra e principalmente de Fabricio com quem eu havia dado o meu primeiro beijo, fui surpreendida com eles dois tentando reaproximação. Quanto mais eu tentava me afastar, mais Fabricio me procurava.

 

No fim eu cedi. Que mal teria eu deixar alguém que gosto se aproximar de mim?

 

No inicio eu sentia que a amizade de Fabrício e Pietra já havia sido algo mais do que isso, por causa da forma como ele se preocupava com ela e sentia ciúmes por causa do Ivo, mas depois notei que eles apenas eram amigos demais, afinal Pietra parecia ter zero interesse nele e quando ele estava comigo eu percebia que eu era o único interesse dele. Ainda assim quando ela aprecia ele parecia tentar dividir ao meio a atenção que me dava. Talvez eu fosse um pouco paranoica. 

 

Foi ai que coisas surreais começaram a acontecer com todos nós. Você já conhece a história então apenas direi: Eu chorei todas as noites porque tinha medo do que estava acontecendo. Me parecia muito filme da Disney. Logo eu que sempre  fui tão cética, me vi no meio desse mundo de fantasia.

 

Eu nunca fui próxima da Helena, mas descobrir que ela tinha anorexia e além disso o câncer foi algo que pegou a todos nós de surpresa. E que surpresa horrível quando ela morreu. Não sei porque, mas novamente repensei sobre eu e Fabrício.  Com tanta coisa acontecendo ao nosso redor, aquilo me parecia tão banal. Junto disso a morte de Pamela que praticamente presenciamos e os dois funerais que assistimos seguidos. A vida parecia mais frágil do que nunca.

 

Segundo ano do ensino médio começou totalmente diferente do ano anterior. Agora eu era namorada do cara mais popular da escola.  Conversei com ele sobre meu ciúmes da Pietra e ele imediatamente se afastou dela. Me senti um pouco culpada no início, mas percebi em seguida que aquilo seria o melhor.

 

Mesmo assim acabamos voltando a estar próximos quando a serei loira apareceu na porta da Pietra e ela, claro, veio atrás do Fabrício novamente. Como excelentes amigos nós ajudamos ela realocar a sereia. 

 

Eu não nego que eu era extremamente ciumenta principalmente quando se tratava de Pietra, e chegou um momento que eu terminei com Fabricio. Puro drama. Mas não durou três meses e estávamos juntos novamente. Prometemos um ao outro que as coisas mudariam. 

 

O ensino médio terminou finalmente. E finalmente eu começaria medicina como eu havia sonhado por tantos anos. Com o apoio de meus pais  que pareciam querer se livrar de mim rapidamente) e de Fabrício eu sabia que conseguiria. 


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