Gladíolo escrita por gryphems


Capítulo 2
II – Mudanças abruptas




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SEGUNDO CAPÍTULO

 

Demorou um tempo para que Mito sentisse toda aquela energia que corria por todo o seu corpo e que começava em sua barriga. Não era desconfortável, mas com certeza muito diferente de tudo o qual havia sentido.

Quando perguntou a Neko-san (sua babá do dia e uma de suas preferidas) sobre o que se tratava a sensação que sentia, a mulher simplesmente sorriu enquanto continuava vestindo a garotinha.

— Isso que você está sentindo Mito-chan, se chama chakra. É algo que todos nós temos, uns mais que os outros — Com isso, formulou uma pequena esfera azul em sua mão. — Viu? Chakra é a energia física presente em cada pedacinho do nosso corpo, é com ela que nós, ninjas conseguimos realizar jutsus e outras técnicas.

Era mágico, místico e incrível. Era como se todos os sonhos nerds que Mito tinha ‘Antes’ estivesse se realizando, bem na sua frente, na vida real.

— E... como se controla esse chakra? — perguntou, enquanto tentava focar suas energias em criar a mesma esfera com as mãozinhas, sem sucesso nenhum.

Neko-san soltou um barulho que se não fosse pela máscara abafando, com certeza seria uma risada gostosa de ser ouvida.

— Ah, não é tão fácil assim, bebê. — riu da cara emburrada da mais nova. Ser chamada de criança era algo que Mito não gostava, mesmo que fosse uma — Há vários passos para controlar o seu chakra, e isso depende da quantidade de chakra que você tem. Como os seus pontos de chakra ainda estão em desenvolvimento, sua reserva ainda é muito pequena, e consequentemente mais fácil de ser controlada. Porém...

— Você ainda não tem idade para mexer com o seu chakra. É extremamente perigoso, entendeu, Mito-chan?

Não.

— Sim, Neko-san, — disse, dando o sorriso mais angelical possível. — mas tem algo que eu possa fazer para entender mais sobre chakra? — Diz que tem um livro por favor, por favor, por favor.

— Bem, tem muitos livros sobre chakra, — Quando Neko a viu sorrir como se as portas do paraíso fossem abertas, ela continuou — porém a maioria delas estão escritas em kanji, e você não sabe ler ainda. Além de precisar de muita meditação.

Mesmo chateada por saber que não poderia ler, (afinal, que tipo de língua tem que ter três alfabetos?) ainda estava animada com o fato de poder fazer alguma coisa para si. Mito estava cansada de ficar brincando e ter de agir como uma criança normal; ela não era uma criança normal e queria aprender coisas novas para o seu ganho pessoal.

E bem, meditação parecia ser bem fácil para começar, não?

 

***

 

Mito mudou de ideia rapidamente. Meditação era difícil demais.

Primeiro que ela não conseguia ficar parada por muito tempo. Era impossível, seu corpo tinha energia demais, era agonizante estar no mesmo lugar por mais de dez minutos. Segundo: distrações, ou no caso, uma distração chamada irmão mais novo. Naruto é uma criança extremamente barulhenta e muito, muito carente. Ele quer e necessita de atenção o tempo todo, sendo impossível se concentrar em algo por muito tempo. E terceiro, ela simplesmente não conseguia se encontrar no meio de tanto chakra. Neko-san havia dito que crianças tinham menos chakra, mas Mito estava começando a duvidar disso. Seu chakra estava em todo lugar com uma grande, grande intensidade, e era assim que conseguia descrever seu chakra: intenso demais para alguém tão pequeno.

Só a partir de alguns meses começou a sentir outras coisas. A primeira delas foi Naruto, e Mito nunca se sentiu tão esmagada.

O chakra de Naruto era muito parecido com o seu. Ele estava em todo lugar, era impossível de não o reconhecer, porém, diferente do seu, que passava uma sensação intensa e até mesmo intimidadora, o chakra do loirinho era quentinho e extremamente aconchegante como estar sentada no sofá, enrolada na coberta e de frente para lareira. Era como estar em casa.

E essa se tornou a sensação preferida de Mito.

 

***

 

Com os meses e muita dificuldade, Mito conseguiu aprender a diferenciar os chakras das pessoas que convivia. Neko-san a lembrava da brisa do final da tarde em um dia de outono, suave como água (menos certos dias dos meses, os quais seu chakra e seu humor pareciam uma bomba relógio, sempre prestes a explodir. Nesses dias, Mito tratava de ficar uma distância bem segura). Já Passarinho-san (que aparecia cada vez menos e Mito não sabia dizer se isso era bom ou ruim), era agitado demais, como um fogo que se alastrava por onde fosse. Com toda certeza, combinava com o garoto.

Passou a ser um hobbie para ela encontrar e distinguir os chakras de quem a cercava. Dessa forma ela descobriu que havia vários e vários mascarados atrás da porta que a isolava do resto do mundo.  Havia virado rotina sentir ao menos quatro sombras vigiando seu quarto toda hora.

Mito tentava entender qual o motivo da necessidade de dois bebês precisarem de vigilância o tempo todo. Naruto e ela eram extremamente saudáveis para crianças. Em seus dois anos de vida, ela não lembrava de ter pego um resfriado, então com toda certeza não era sobre uma doença contagiosa.

Então era sobre seus pais? Eles eram pessoas importantes quando vivas (ela duvidava que eles estavam vivos depois de dois anos e meio sem dar as caras.) o suficiente que a vida de seus filhos poderia estar em risco?

Tantas perguntas e nenhuma resposta. Mito odiava ficar sem respostas.

 

***

 

Olhando no espelho, Mito não conseguia reconhecer o reflexo que a olhava de volta.

Os cabelos lisos avermelhados que iam abaixo do ouvido, a pele branca como leite e os olhos violetas não eram nada parecidos com os olhos escuros, pele bronzeada e o cabelo preto cacheado que se lembrava. A única característica familiar que encontrava em si eram os três riscos em cada uma de suas bochechas, as mesmas que via todos os dias em seu irmão.

Mito sabia que não enxergaria a mesma aparência de "antes", mas o que ela poderia esperar? Não tinha mais o seu corpo de dezessete anos. Na verdade, não era mais a garota de dezessete, seu passado estava morto, sabe-se lá há quantos anos.

Ao olhar seu reflexo no espelho, foi como se um balde de água fria caísse em sua cabeça.

Era real. Essa era a sua nova vida.

Ela estava vivendo em um mundo em que ninjas eram reais, que você nascia com uma energia que permitia deixar você cuspir fogo ou até mesmo soltar raios pelas mãos.

Bem, ao menos Mito era uma criança muito fofa.

 

***

 

Rapidamente seu aniversário chegou. Não só o seu, afinal seu irmão compartilhava da mesma data de nascimento.

Mito estava surpresa com o quão rápido o tempo havia passado desde que morrera.

O que mais a surpreendia era a velocidade que estava esquecendo de ‘Antes’. O nome de sua melhor amiga não vinha a sua mente tão rápido como antes, já não se lembrava com exatidão do rosto de sua madrinha ou o gosto da torta que só sua avó conseguia fazer.  Ela estava esquecendo as melhores pessoas de sua antiga vida.

Talvez fosse para o melhor, afinal, Mito nunca mais poderia conversar com eles, rir com eles e viver com eles. Era melhor assim de qualquer forma.  

Estava completando os seus três anos, mas vendo Naruto brincar do outro lado da sala, se sentia muito mais velha. Sentia falta da despreocupação da infância.

Deitada nas almofadas de pelúcias, buscava ocupar sua mente contando os pontos de chakras que tinham do lado de fora do quarto. Havia cinco chakras novos, quatro deles andavam nas espreitas e eram difíceis de identificar um sentimento, mas o último andava na frente, parecia bem ancião, uma tranquilidade espiritual, mas se sentisse melhor, conseguia perceber as amarguras e arrependimentos. Acompanhou até vê-lo parar de frente a sua porta, com as quatro pessoas bem atrás.  

E não foi uma surpresa quando novamente aquele mesmo velhinho que se dizia Hokage apareceu pela porta do quarto.

Na verdade, a surpresa veio quando ele disse que os levaria para fora.

— Vocês não acharam que ficariam para sempre aqui dentro, hã? — Ele disse enquanto bagunçava os cabelos dos dois irmãos, fazendo Mito se segurar para não fazer uma careta.

Mito realmente começava a acreditar que poderia ficar presa para sempre, então, para sua própria segurança e de seu irmão, preferiu ficar calada para evitar possíveis mudanças na decisão de Hiruzen de tirá-los de lá.

— Hoje vou levá-los em um novo restaurante que abriu há alguns meses. —  disse enquanto pegava na mão de cada um. — Não é muito conhecido, mas tudo lá é muito gostoso, eu prometo.

Quando saíram do labirinto de paredes que viviam, a primeira coisa que Mito percebeu foi a luz. Uma luz que ela se recordava por conta de sua vida passada, mas que seu corpo atual não era nenhum pouco habituado a ver e sentir. Ela realmente tinha se acostumado a viver sem ter o sol por perto. O que era estranho, já que tinha certeza que crianças precisavam ficar de molho no sol de vez em quando para conseguirem as vitaminas necessárias.

Claramente suas babás precisavam ler um ou dois livros sobre cuidados com crianças.

Enquanto seus olhos tentavam se ajustar a claridade, Mito percebeu que muito mais chakras os seguiam. Contou pelo menos vinte. Olhando para os lados, não enxergou nenhuma alma.

Ninjas, duh.

Enquanto isso, Naruto ao seu lado olhava tudo com fascínio e apontava para qualquer coisa nova.

Jiji, o que é isso?  — perguntava ao Hokage.

— Uma árvore, Naru-chan. — Hiruzen respondia pacientemente.

— E isso? Isso?

— Outras árvores, Naru-chan.

 

 

***

 

Konoha era gigante. Havia pessoas andando, conversando e correndo por todo canto.

Era aterrorizador.

Em seus três anos de vida, Mito não havia interagido com tantas pessoas ao mesmo tempo. Vale ressaltar que, no passado, ela não era a pessoa mais social do mundo. Então estar no meio de tantas pessoas foi um grande choque.

Ela nem mesmo havia percebido que estava apertando a mão do Hokage mais forte.

— Mito-chan, Naru-chan, está tudo bem! Ninguém irá machucá-los aqui, Konoha nunca machucará outro civil sem causas justas. —  Hiruzen disse dando seu sorriso de avô gentil.

Ela tentava acreditar nas palavras que ele havia falado, principalmente por ver como os cidadãos tratavam o Hokage, com sorrisos e reverências, porém percebia também como eles olhavam ela e Naruto. Sentia os olhares raivosos e chocados sobre si. Primeiro pensou que se tratava do seu cabelo vermelho, tão diferente da onda de castanhos que encontrava, mas mudou de ideia rapidamente ao perceber que olhavam para Naruto da mesma forma.

Não estava entendendo nada. Os dois nunca haviam saído de um quarto, mas pareciam ser bem conhecidos pelos os adultos da vila.

Jiji, Jji, por que tem rostos naquela montanha? — Naruto, abençoe sua alma, perguntou apontando.

Realmente havia rostos estampados em uma grande montanha, quatro para ser mais exato. O último homem era o que mais havia chamado atenção da menina, com seus cabelos espetados que a lembravam levemente de Naruto.

— E quem é o último moço? — perguntou enquanto encarava a montanha. Mito não sabia por que, mas ele era parecia tão familiar.

— Esse é o Monumento Hokage, todos os Hokages tem seu rosto estampado aqui. Meu rosto é o Terceiro. Acredite se quiser, eu já fui tão jovem quanto pareço estar na montanha — O Sarutobi disse enquanto sorria lembrando-se das épocas de juventude. – O quarto Hokage era Minato Manizake, mas infelizmente ele não teve tempo o suficiente para mostrar o excelente Hokage que era. — Pelo o tom melancólico que ele usava, Mito teve algumas ideias do porquê ele não pode continuar o seu reinado, e não era nada bom. — Mas isto é conversa para outro dia, não é mesmo?

Para a menina, era uma conversa de agora. Olhando mais uma vez para a estátua do Manizake, não conseguiu largar a inquietação que sentia. Decidiu apertar o passo e sair dali o mais rápido possível.  

Quando entraram no restaurante, foi confirmado para a menina que ao invés de reencarnar, ela havia ido direto para o paraíso. O que era aquele cheiro?

— Bem-vindos ao Ichiraku Ramem! Hokage-sama, que prazer ter o senhor por aqui! — Um senhor, provavelmente o dono do estabelecimento, apresentou-se com um sorriso no rosto. — E os senhores quem são? — perguntou aos pequenos ao lado de Hizuren.

— Teuchi-san esses são Naruto e Mito Uzumaki. — Sem demora, Sarutobi respondeu antes que Mito pensasse em abrir a boca. — Crianças esse é Teuchi-san, dono do Ichiraku Ramem, que na minha humilde opinião faz o melhor ramem do País do Fogo.

Uzumaki. Esse era seu sobrenome. Ela realmente não sabia por que não havia se perguntado antes se tinha ou não um sobrenome, era algo realmente importante afinal. Precisava ficar mais atenta, pois, naquele local, muitas pessoas eram chamadas pelo sobrenome, então ele era de extrema importância.

— Ah, sejam bem-vindos, então Naruto-chan e Mito-chan! — O homem sorriu gentilmente. — E o que seria para vocês?

Enquanto ela se ajeitava no banco (e não, ela não havia precisado de ajuda para sentar no banco, ok?) Teuchi anotava os pedidos. Com isso, finalmente conseguiu direcionar sua atenção para Naruto, que parecia estar pronto para explodir de curiosidade, pronto para falar para todos os ventos, mas olhava nervoso para todos os lados.  Mito chegou mais perto e abriu o sorriso que só Naruto merecia ganhar. 

Com isso, Naruto reuniu toda sua coragem para falar por todos presentes pelo resto do almoço.

 

***

 

E claro, depois que todos haviam comido, (sinceramente, a melhor comida que Mito havia provado nessa vida) havia a bomba pronta para estragar tudo.

— Orfanato? - perguntou cética.

Não, não, não, não, não.

Havia conhecido orfanatos na sua antiga vida e mesmo em uma sociedade evoluída que vivia, as condições dos órfãos chegavam ao mínimo. Não conseguia imaginar o quão pior seria um orfanato em uma época tão arcaica quanto aquela.  

Também não saberia como se adaptariam a viver com tantas crianças por perto, quando sua realidade era ter um ou dois adultos cuidando dos dois.

— Será o melhor para vocês. Terão outras crianças para brincar e adultos que poderão estar cuidando de vocês o tempo todo. — Hiruzen dizia da forma mais suave que podia, afinal, tratava-se de uma mudança muito brusca na vida dos dois.

A ruiva não acreditava muito, mas decidiu não contrariar, já que a opinião de uma criança de três anos não valeria muito mesmo.

Bem, ao menos eles haviam ganhado presentes. Como o inverno prometia ser severo, cada um ganhou um cachecol para si. Naruto já havia se enrolado até as orelhas com seu cachecol vermelho, e ela jurava que era a coisa mais fofa que havia visto em todas as suas vidas.

A ida até o orfanato foi lenta e dolorosa, a cada passo Mito pensava seriamente em correr até suas perninhas doerem, mas reuniu toda a coragem que seu corpinho pequeno poderia carregar e ergueu a cabeça.

Oras, não poderia ser tão ruim, não é?

 

***

  

Não era ruim, era terrível.

Assim que o Hokage virou as costas, a primeira coisa que a matriarca fez (que Mito realmente não se importou em ouvir o nome) foi jogá-los dentro de um quartinho escuro.

— Prestem atenção, seus demônios, eu não quero nenhum de vocês perto das crianças, entenderam? — Não dando tempo para responder, continuou. — O café é as sete horas; o almoço, meio-dia; e o jantar as dezenove. Não se atrasem, se não vão ficar sem comer. Eu não tolero nenhum tipo de mal educação. A primeira vez que me irritarem, vocês vão para a rua, entenderam? — E saiu batendo a porta, sem nem esperar uma resposta.

O quarto que estavam era pequeno e escuro, com uma cama e armário. Não havia luz nenhuma sem ser a que vinha da janela quebrada. A menina conseguia ver várias teias de aranha pelo quarto todo. Em suma, não era um quarto que criança alguma deveria ficar.

— Mito-chan? Eu tô com medo. — A voz amedrontada de Naruto quebrou seu coração.

Dando o melhor sorriso que podia, Mito pegou na mão do mais novo, tentando mostrar a força que não sabia se tinha.

— Vai ficar tudo bem, Naru-chan, vai ficar tudo bem.

Era o que ela esperava. 

 


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Notas finais do capítulo

Desculpa a demora...
Tentarei postar uma vez por semana, ok?
Edit: capítulo betado por Eena



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