Let Me Know escrita por elisa wilde


Capítulo 2
Com a cara toda suja de AÇÚCAR de jujuba




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Cinco meses se passaram e cá estamos nós em mais um fim de semana ensolarado e da minha parte indesejado.

Eu queria desviar o olhar e apenas seguir o plano de ignora-lo o dia inteiro, mas como faria isso com os olhos e cada parte do corpo dominada por ele.

Acredito que Yoongi tenha percebido minha presença somente pelo tempo de duas batidas de coração. Quando passei pela porta em uma falha tentativa de camuflar minha identidade ao quase me esconder atrás das outras duas, o sorriso que ele mantinha na face cessou na hora. Tentei manter uma expressão normal e superior, porém depois de largar os amigos falando com o vento ele impulsionou o corpo para fora da piscina e veio. 

Os anfitriões nos receberam como sempre. Com todas as forças me impedi de revirar os olhos e ser mal criada com a Dona Min que me acusava de tê-la abandonado, fazendo das minhas ausências anteriores o maior dramalhão. Ao invés de defender a filha, a senhora que eu chamava de mãe só concordou com a dona da casa, ou seja, coitada de mim.

Com a maior cara de paisagem Duda e Yoona se seguravam para não rir do meu olhar de desgosto, pensei em xingá-las a base de mímica, mas quando percebi ele já estava na minha frente.

Tum tum. Tum tum. Tum tum.

— Ora ora, quem é vivo sempre aparece. — Yoongi implicou balançando o cabelo para todos os lados. 

O chão ficou todo salpicado das gotículas de água que escorriam pelo seu corpo molhado. O cabelo escuro grudou na testa, a bermuda de banho preta colou em seu corpo e sem querer meus olhos confirmaram o que estava bem nítido, alguém passou a frequentar a academia.

— Oi — respondi sem vontade e virei para o lado oposto. 

Sem ser uma novidade havia muita gente, muita comida, muita bebida e no meu caso muita vontade de ir embora. 

Dando mais uma olhada pelas redondezas evitando é claro, o lado onde ele ainda se mantinha com os dois pés fincados, avistei além dos seus amigos a presença da tal da Carla na mesma piscina em que ele parecia se divertir tanto anteriormente.

Nossos olhos se encontraram e pude ver as faíscas se soltando deles em minha direção. Eu adorava um deboche e por isso mesmo joguei o cabelo teatralmente na direção oposta devolvendo seu olhar enojado na mesma moeda. 

Os mais velhos se dispersaram e Yoona percebendo que da minha boca não sairia mais nem um "a" com relação ao idiota do irmão nos chamou para acompanhá-la até a cozinha. 

Essa era a única coisa que eu sentia saudade aqui da casa dos Min, a grande mesa completamente repleta de quitutes de duas nacionalidades diferentes. Eles sempre tinham comida gostosa e um monte de docinhos coreanos que eu implorava minha amiga para levar na segunda depois das reuniões. Constantemente ela me agradava com um potinho cheio deles, mas às vezes por pura chatice Yoona não guardava nada para mim, só por não ter aparecido na festa. 

Uma vez Yoongi mencionou que o sonho da mãe era abrir um restaurante de soondae. Mesmo nunca tendo provado outra soondaeguk, eu tinha certeza que a Dona Min fazia a melhor sopa existente. Sendo assim, além de ser a primeira, eu apareceria em seu restaurante todos os dias, sem falta.

— Tem soondae? — passei os olhos pelas comidinhas querendo pelo menos encher a pança já que não poderia ir embora. — Yoonaaaaa?? — chamei depois de não ser respondida. 

Bufei.

— Desculpa. — Ela riu. — É que eu nem acredito que você tá aqui, tem tanto tempo que parece até uma miragem. Será que eu já tô bêbada Duda? — zombou. 

Ao que tudo indica a chatinha esperava que eu desaparecesse diante os seus olhos a qualquer minuto, e não posso negar, era exatamente o que eu queria.

— Não me enche, por favor. — Pedi sem paciência com a boca cheia de um docinho chamado mochi.

Eu me esparramei em um dos bancos da ilha da cozinha comendo um doce atrás do outro. 

— Ihhh. — Duda suprimiu uma risadinha. — Eu nem vou falar nada, já conheço a peça e é capaz de sobrar pra mim. — A encarei com os olhos estreitos e fingi que ia beliscá-la. Minha prima tinha razão, com certeza sobraria para ela. 

Aos risos Duda partiu em direção a geladeira em busca de bebidas. 

— Ah amiga, só tô brincando. — A outra me abraçou pelas costas toda cínica. — Sinto sua falta aqui em casa, é só isso. — Suspirou. 

Repeti seus gestos e a apertei de volta depois da sua crítica em tom de amizade.

— Aí gente, o Thiago... — Yoona nos bombardeava de informações nada mais nada menos que desnecessárias sobre sua relação com Thiago. 

Conversamos sobre todos os assuntos que garotas conversam quando se encontram, eu me entupi de doce e elas de cerveja. Soltei altas gargalhadas e quase morri engasgada com o mochi, mas pelo menos ali dentro eu estava salva, até claro, não estar mais. 

As olhadas por cima do meu ombro, os olhos suspeitos e os movimentos congelados denunciaram tudo o que viria a seguir. A lata de coca trincando que foi colocada na minha frente na bancada também não deixou para a imaginação e logo ele surgiu ao meu lado como uma alma penada. 

Yoongi sempre chegava na surdina, devagarinho e imperceptível.

Ele pôs roupas secas, uma camisa simples branca e outra bermuda escura. O cabelo ainda pingava por não ter sido seco direito e o cheiro gostoso que vinha dele quase me fez cair da bancada.

O silêncio que se seguiu foi impagável.

As duas acompanhavam a cena com a mais pura curiosidade rodeando seus corpos, só faltava a pipoca. Olhei para a porta dupla da cozinha nitidamente me perguntando sobre se eu corresse conseguiria chegar ao meu destino antes que ele me pegasse?

— A gente pode conversar? — pediu firme, mas debaixo de toda aquela convicção, pude perceber que hesitou.

Sem nem chance de abrir a boca e negar aquele bate papo, Yoona e Duda se mandaram como se conversar com ele fosse o que eu queria ou ao menos desejava. 

Estávamos sozinhos, literalmente. 

Sem querer olhá-lo  mudei meu olhar para a lata de refrigerante e depois de abri-la dei um longo gole. Respondi que sim, estava bem e tive a decência de fazer a mesma pergunta em troca.

1-2-3-4-5-6-7-8-9-10

10 segundos.

Ficamos por exatos 10 segundos em silêncio, exatos, pois eu contava os tic tacs do relógio que ficava pendurado na parede de cima. 

— É, então, não sei se a minha irmã disse, mas eu passei na prova da Ordem e fiquei em terceiro no Concurso de Delegado Federal. — Ele pareceu sem graça pelo feito, mas apesar de tudo Yoongi sempre foi meio tímido e eu amava isso nele. 

Há um tempo abriu o concurso para Delegado Federal, escutei rumores de que ele faria a prova e fiquei sim feliz por ter conseguido passar, ainda mais por ser tão difícil conseguir assim de primeira. 

Como eu disse antes, Yoongi sempre foi esforçado. 

Segundo minha amiga, depois do resultado eles tinham saído para jantar e passaram a noite comemorando o êxito do filho. Esse era só mais um passo em prol do seu futuro, ele ia direto em direção ao seu objetivo e isso era algo a se apreciar. Apesar de nós dois juntos não ter mais nada a ver, se é que algum dia teve não posso simplesmente fechar os olhos para os seus feitos.

— Contou sim. — Admiti. — Parabéns! — Ele merecia pelo menos uma congratulação, vai.

E lá vem ele, o seu maldito sorriso gengival.

Ele ficou mais envergonhado ainda e encarou por um bom tempo o chão de porcelanato abaixo de nós antes de voltar a me olhar em silêncio. O tempo foi passando com mais goles no refrigerante e mais segundos intermináveis de ilusão.

Não era a minha intenção sair correndo, porém, também não pensava em começar uma conversa, percebendo isso ele começou logo o assunto que queria desde o início. 

Seu cotovelo se apoiou na ilha e ele pediu que eu me dignasse a olhá-lo. 

— Eu tô com isso na cabeça há um tempo — disse sem jeito passando a mão pelos cabelos úmidos e lisos.  — Eu fiz alguma coisa aquele dia que você não gostou?

Suspirei por dentro, e neguei com a cabeça por fora.

— Tem certeza disso? Se eu não te ofendi de alguma forma, não consigo entender o que aconteceu então. — Yoongi respondeu ofendido. Eu imaginei se a única ofendida ali não deveria ser eu, quem lhe deu o direito de tomar meu lugar? — A gente tava se dando bem, curtindo de boa. Eu fiquei te esperando a noite toda. — Confessou. — Subi e desci essas escadas mil vezes antes da minha irmã falar que você tinha ido embora. Eu mandei mensagem, liguei e você além de não me responder no dia, ainda me ignorou nos outros. Simplesmente decidiu sumir como se nada tivesse acontecido entre nós. — Enquanto ele falava um incomodo foi tomando conta de mim. Sustentei seu olhar até o meio da segunda frase, depois não consegui mais.

Era perda de tempo discutir algo que aconteceu há longos cinco meses, quase seis. Eu realmente queria ter esquecido aquilo, mas como o inferno eu não conseguia esquecer o que aconteceu no terraço, muito menos o que ouvi depois. 

— Ué, e por que você perdeu a noite toda me esperando se podia tá fazendo coisa melhor com o seu preciosíssimo tempo? — minha voz saiu cheia de ofensa e um tiquinho de raiva. 

Quando sai de casa obrigada, o caminho todo disse para mim mesma: 

"Não vou me irritar, não vou me irritar, não vou me irritar..."

Mas, olha só que surpresa, dois minutos em sua presença e já estava irritada.

— O que? — perguntou confuso.

Um baque seco atingiu a bancada com a lata de refrigerante praticamente vazia que antes eu segurava entre as mãos. O seu teatrinho de quinta tinha me cansado. Quem ele pensava que eu era? Uma criança? Eu por um acaso nasci ontem? Também pelo caminho eu jurei que tentaria não bancar a infantil caso nós dois nos encontrássemos, mas olha eu aqui de novo.  

— Ah Yoongi francamente, me erra. — Impaciente, desci do banco ao mesmo tempo que revirava os olhos. — Cara, não entende que esse papinho não vai nos levar a nada, e enquanto você tá perdendo mais uma vez seu tempo comigo sua amiguinha deve estar louca te caçando? Quem chegou atrasada hoje fui eu, então acredito que vocês dois não tiveram problemas quanto ao horário dessa vez. — Ditei cheia do rancor que jurei não sentir mais. 

Bufando de raiva e ódio fui marchando em direção a saída da cozinha, mas ele me puxou com tudo pelo cotovelo.

— Espera, espera aí — disse enrugando a testa. — Mas do que é que você tá falando?

Se eu fosse mais ingênua talvez acreditasse que ele realmente não fazia ideia do que aquilo se tratava, mas francamente.

— É sério?! — Cruzei os braços. — Você vai dar uma de desentendido pra cima de mim? — eu me soltei de seu aperto e avancei mais uma vez.

De novo seu corpo foi para frente do meu, só que agora sem me tocar. Ele somente foi andando de costas, enquanto eu avançava de frente. 

— Não, calma. — Pediu erguendo as mãos para que eu parasse de andar. — Não tô jogando ou fazendo tipo, só não faço ideia de que merda você está falando. É sério, por favor, só me explica. — Sua fala parecia sincera, mas eles sempre parecem, não é?

Homens sempre conseguem passar a perna em mulheres, principalmente as apaixonadas, mas hoje não senhor  Min, hoje não. 

Resolvida a parar com o showzinho e morta de vontade de me mandar dali, soltei tudo de uma vez. 

— Eu sei do seu lance com a Carla. — Comecei um monólogo louco em seguida afirmando saber sobre as ficadas, a intimidade e adicionando que tinha certeza de que hoje seria só mais um dia em que ele terminaria a noite na cama dela. — Satisfeito? — Ergui o queixo após as revelações. — Agora para de me amolar e volta pra ela, porque eu não quero mais perder um segundo com você. 

Talvez essa última frase fosse a maior mentira de todas, mas, ok. 

Para a minha surpresa, ao invés de ficar sem graça pela revelação ele riu, uma risada alta e exagerada que fez com que eu quase o matasse bem ali com uma das facas de cortar pão.

— Cara, você é ridículo. — Eu me senti ultrajada.

Mais desrespeitada que aquilo só se ela resolvesse aparecer ali e o agarrasse bem na minha frente.

Querendo esganá-lo, continuei com meu plano de deixar aquela droga de cozinha, mas aí braços apertados me envolveram pela cintura. Seu corpo todo se apoiou no meu, o rosto foi afundado no meu cabelo cheio e um arrepio indiscreto me atingiu quando ele arrastou a ponta do nariz por toda a pele do meu pescoço decorado com meu lindo colar de coração.

Eu fiquei estática, as mãos pendendo ao lado do corpo, os olhos vidrados. Minha respiração se desregulou somente pelo curto contato e quando minhas pernas começaram a tremer as senti deixando o chão. 

Arfei em choque quando ele me pôs sobre seu ombro como se fosse uma saca de batatas e sem mais nem menos, começar a andar em direção as escadas, ou seja, seu quarto. 

— O que você tá fazendo?? — sussurrei sem fôlego. 

Aquela posição não era em nada cômoda. Suas mãos me seguravam firme bem perto da bunda, mas eu tinha certeza que aquele idiota pervertido me deixaria cair a qualquer segundo.

— Yoongi, me solta agora! — Ordenei me debatendo em cima dele.

Mesmo que não pudesse ver seu rosto, eu sabia que ele achava graça da situação. 

— Você enlouqueceu?? — gritei, enquanto subíamos os degraus um a um.

Eu não queria cair, mas também não queria tocar nele mais do que já estava, porém, antes continuar sobre ele do que prostrada no chão.

— Sabia que sua mão é pesada? — ele disse se esquivando dos tapas. — Para de me bater, tá doendo. — Reclamou quando finalmente chegamos ao quarto.

Ele me jogou sem cuidado nenhum na cama de lençóis escuros mais bagunçada que arrumada e se virou. Ainda deitada e com metade do cabelo na cara eu vi uma brecha para escapar quando ele foi fechar a janela pelo som alto que se infiltrava no quarto. Eu senti o vento pelo rosto com a corrida desenfreada até a porta como aquela garota do livro "Give me love", mas o safado foi mais rápido.

Yoongi a trancou com um baque alto demais às pressas e pôs a pequena chave no bolso.

Arfei mais uma ultrajada.

— Min Yoongi, eu não tô brincando com você. — Avisei dobrando os braços em frente ao corpo sem um pingo de paciência. — Abre essa porta agora! — Berrei. 

— Não vou abrir nada, a gente vai conversar — disse decidido. — E nem adianta gritar, o som tá muito alto ninguém vai te ouvir. — Era verdade, mesmo com a janela fechada, meus ouvidos ainda tremiam.

O que ele poderia querer comigo? Principalmente agora com aquelazinha lá embaixo a sua espera? 

Mordi a bochecha por dentro da boca a ponto de sentir o gosto de sangue, super irritada pela situação. Não tínhamos nada para conversar, mesmo depois de tanto tempo eu incrivelmente ainda estava com raiva dele.

— Conversar? — repeti com sarcasmo. — Não tenho nada pra conversar com você Yoongi. — Afirmei de frente para a porta, de costas para ele de propósito. 

O que conversaríamos?

Ele queria me contar o que fez com a Carla antes deu chegar? Ou talvez, perguntar se eu gostaria de participar da sua sem-vergonhice? Claramente ele a convidou para a festa. Com certeza durante todos esses meses e ainda hoje ficaram juntos. Ele dormiu com ela, provavelmente dormiria mais uma vez daqui a poucas horas. 

Só de imaginar meu cérebro parecia querer explodir de indignação, raiva, ciúme.

Que inferno.

Não sei o que passou pela minha cabeça, deveria ter ficado em casa, o Ivar jamais me decepcionaria assim. Se tivesse ficado trancada no quarto com meu notebook, um balde de sorvete e a Netflix não teria visto com os meus próprios olhos o cara que eu ainda gosto tanto com outra, de novo.

Passaram-se tantos meses, eu fiquei com caras diferentes, segui minha vida e tentei esquece-lo, mas meus sentimentos com relação a ele continuaram os mesmos. Nunca cessaram. Nunca diminuíram. Eu sempre gostei dele, acho que desde a infância quando fui descobrindo o que era o amor no desenho dos seus olhos puxados, no biquinho que se formava em seus lábios quando contrariado, no sorriso com dentes pequenos demais. 

Eu me perguntava como, como pude manter esse sentimento patético dentro de mim?

Eu era patética.

Patética. 

— Escuta, eu não sei quem foi que te disse isso ou onde você escutou, mas não é verdade. — Ele disse se aproximando à passos lentos e calculados. 

Depois da afirmação Yoongi tentou segurar minha mão, porém, mesmo que eu estivesse morrendo pelo seu puxei de volta determinada a não ser só mais uma na vida e na cama dele. 

Não mesmo.

— Cara, qual parte do esse assunto não me interessa mais você não entendeu? — perguntei irritada, pedindo pela milésima vez que abrisse a droga da porta.

Meus ombros foram segurados quase totalmente pelas suas mãos enormes. Ele me fez olhá-lo, notei suas feições tão sérias, tão sôfregas.

— E qual parte do isso não é verdade você não tá conseguindo entender? — mandou de volta.

Achei o cúmulo sua falta de senso, ele achava mesmo que eu era uma idiota.

— Ah claro, não é verdade, né?! Tanto não é verdade que ela tá aqui dentro da SUA casa, na SUA piscina, bebendo da SUA cerveja e comendo da SUA comida esperando ser a próxima da lista, se é que você me entende. — O desafiei com os olhos. — Olha, Yoongi você não me deve absolutamente nada, muito menos explicações, mas seja homem e não minta pra mim, tá legal? — quis evitar o tom magoado, mas foi impossível.

Eu me perguntei como olhos tão pequenos podiam me atravessar daquela forma ofendida, mas esse lugar não era meu? Não era eu quem tinha sido humilhada e enganada? Não era eu quem se deixou iludir por meia dúzia de palavras em uma noite estrelada demais? 

— Por que tá falando essas coisas? Sabe que eu não sou esse tipo de cara. Quando foi que eu menti pra você? — virei o rosto para não respondê-lo, isso não vinha ao caso.  — A Carla veio com o Thiago, eles são primos e você sabe que minha irmã tá namorando com ele, mas nós dois não tem nada a ver, eu juro.

Espalmei as mãos em seu peito, antes que ele se aproximasse mais. 

— Não faça juras falsas. — Mandei de volta.  — Vai negar que ficou com ela? Que proporcionou bem mais do que beijos e apertos em um terraço pequeno demais? Que passou noites dormindo e manhãs acordando na cama dela, ou até aqui? — apontei com o queixo para sua cama sentindo uma ânsia enorme ao imaginar aquela vadia deitada ali a sua espera. — O que foi? Isso também é mentira? É fruto da minha imaginação?

Com um impulso ele segurou meu rosto com as mãos, o apoiou, o firmou e mesmo não querendo sentir nada o toque da sua pele na minha foi tão suave e íntimo que por um segundo quase me esqueci de tudo.

— Eu nunca negaria nada do que fiz. Fiquei com ela sim, mas nunca trouxe a Carla para o meu quarto. Eu nunca trouxe ninguém aqui em casa e você bem sabe. Naquele dia e há um bom tempo eu só tinha olhos pra uma pessoa, você só esqueceu de notar. — Admitiu mansinho. — Tanto eu só tinha e tenho olhos pra você que passei esses cinco meses seguintes tentando entender o que diabos tinha feito de errado. Se meus beijos te desgostaram, se meu carinho foi demais pra você assimilar, se eu disse alguma bobagem ou se alguma atitude dos meus amigos tinha causado o seu sumiço. — Desabafou. — Sempre que dou um tempo no Fórum vou buscar a Yoona na UFRJ só pra te ver, mas você sempre foge de mim, todas as vezes você some.

Mais uma vez aquele coração estúpido que eu carregava dentro do peito começou a palpitar quase em taquicardia. Estar com ele me dava falta de ar mesmo estando cercada de oxigênio por todos os lados.

Pouco a pouco deslizei as mãos pela sua camisa branca e as deixei em sua cintura. Eu sabia como ele era, Yoongi nunca foi do tipo galinha ou babaca com as mulheres, porém, eu estava com tanto ciúme. Não sabia que ainda sentiria tanto ciúme até que a vi em sua casa dele mais uma vez.

— Então o que ela tá fazendo aqui? — estava claro pelo modo como me olhou que lembrava de mim da mesma forma que eu lembrava dela, ou seja, com ódio real.

— Eu já disse. Ela chegou com o Thiago, pra mim é só mais uma na festa e não posso mandar a garota embora, fica chato. — Explicou o óbvio. Como ele mandaria a prima do namorado da irmã se mandar sem que afetasse o relacionamento de ambos? — A gente não fica mais do jeito que você tá pensando há muito tempo, eu juro. Não gosto de dar esperanças vazias pra ninguém.

Busquei algum indício de mentira ou farsa, mas ele parecia totalmente sincero.

Mais relaxada deixei todo o meu corpo se encostar na porta deixando que o morno da sua respiração me atingisse diretamente causando uma sensação gostosa na minha pele. O puxei como da última vez me atracando as pontas da sua camisa com os dedos nervosos e  perguntei se ele tinha certeza.

— Sim.

Yoongi ajeitou meu cabelo ainda bagunçado pelo tempo que fiquei de cabeça para baixo em suas costas. Manteve os olhos escuros e tão puxadinhos comigo em foco, enquanto completava com a voz baixinha.

— Se ainda tem dúvidas pode descer e perguntar pra qualquer um dos meus amigos, pro Thiago e até pra própria Carla. Eu nunca menti pra você, não quero nunca mentir pra você. Juro que não encostei mais nela desde que encostei nos seus lábios. — Eu respirei fundo e ele pousou o polegar levemente sobre meu lábio superior, desenhando as curvas da boca que queria, pedia e implorava sem palavras por ele.

Que tipo de cara diria isso se não fosse verdade? Eu poderia confirmar, entrar nesse assunto delicado na frente de todos lá embaixo, mas ele realmente nunca mentiu para mim. Desde que éramos pequenos por mais besta que fosse a situação, Yoongi nunca mentiu para mim. 

Música alta, gritos, risadas.

Nada mais daquilo importava, estávamos de volta na nossa bolha, sozinhos e protegidos. 

— Tudo isso só foi um mal entendido que poderia ter sido evitado se ao invés de você ter sumido, tivesse me deixado a par das suas dúvidas.

Difícil foi não me sentir a pessoa mais idiota e precipitada do mundo naquele instante.

Foi na infância. Não lembro a idade certa e muito menos o momento da ação ou reação que fez eu olha-lo com outros olhos e perceber que aquilo que sentia não era coisa de amigo.

Eu percebia o mesmo olhar às vezes nele, a forma que me encarava quando algum outro garoto chegava perto, o jeito possessivo quando apoiava os braços nos meus ombros no recreio. Mas quando se é jovem, tudo é muito mais complicado. Então esperamos um ao outro enquanto começávamos nossa vida amorosa com outras pessoas.

Dizem que implicância é um dos primeiros indícios de amor, talvez seja verdade, pois as briguinhas entre nós se tornaram constantes, porém nada sério de verdade ou que ultrapasse um beliscão aqui e um puxão de cabelo ali.

Diversas histórias de infância, intermináveis intrigas na adolescência e muitas risadas marcavam nossa vida. Yoongi, Yoona e eu. Um coração de três pontas. Ele era mais velho e apesar de me proteger como fazia com Yoona, nunca agiu como se fosse meu irmão, eu nunca quis que ele se comportasse como um. 

Envolvi sua face quase rosada por causa do sol, o cabelo escuro contrastava com a pele, os olhos negros combinavam com a profundidade que ele me invadia só com o olhar.

Eu queria que ele me invadisse por inteiro.

Cada partezinha.

Ficar encostada na porta não tinha o mesmo efeito e prazer de estar com o corpo junto ao dele. Quis falar tantas coisas, declarar muitas verdades e até pedir desculpas pelo surto de meses, mas não consegui dizer nada.

— A gente tá resolvido então? — ele distribuiu uma porção de beijos molhados pelo meu rosto, bem próximo, mas ainda não na boca. Um sorriso tonto se formava no canto dos meus lábios a cada vez que o sentia. — Ou agora é você quem vai ficar me dando esperanças vãs só pra brincar comigo?

Sua pergunta saiu tão vulnerável, como se não tivesse certeza que eu sentia o mesmo. O único pensamento que me rondava era a vontade de voltar a provar o gosto da boca dele. O beijo suave no início, afoito no meio, fervente no final.

Quando nos beijamos no terraço, a maioria das vezes entre e depois do beijo Yoongi sorria e eu me desmanchava por aquele sorriso raro, ainda mais por saber que ele surgia por minha causa. 

— Sim — respondi baixinho quase aos sussurros. 

Eu queria dar tudo o que tinha a ele, e nunca o encheria com esperanças de algo que não iria acontecer.

De mansinho levei as mãos aos seus fios de cabelo já secos e os deslizei até a nuca arranhando aquela área, sentindo ele se desfazer com meu toque e me aconchegar em seu corpo proporcional ao meu. Cada parte dele parecia ter sido pensada, criada e feita para mim, para que meu corpo, alma e sentidos se fundissem perfeitamente aos seus. 

Eu era dele, ele era meu.

Olhos vidrados e quentes me queimavam, na verdade toda parte dele encostada em mim estava em chamas. 

Eu me ergui um pouco menos que na ponta dos pés para alcançá-lo, as mãos que prendiam minha cintura a apertavam e apertavam. Ainda me afogando com toda a sua escuridão ele selou nossos lábios e pediu passagem com a língua ao explorar o corpo que eu queria que fosse unicamente dele e mais uma vez lá estava eu, inundada.

***

Batidas desesperadas fizeram minhas costas vibrar.

— Yoongi? — ela chamou. — Eu sei que vocês dois tão aí dentro e é melhor a senhorita sair que a sua mãe tá te procurando.

Minha perna envolveu seu quadril com sua mão firme pressionando minha coxa quase totalmente descoberta com tanta força que chegava a doer. Minha cabeça tombou para o lado para dar-lhe total acesso à pele sensível do meu pescoço, ele me causava arrepios gostosos que iam de ponta a ponta do meu corpo.

— Saí daqui Yoona!!! — Falamos em uníssono.

Após tantos infortúnios na hora em que estamos quase nos dando bem ela vem atrapalhar de novo?

Pelo amor de Deus.

Ignorando a falação sem limites da irmã ele me impulsionou de uma só vez para cima fazendo minhas pernas se prenderem a sua volta e permitindo que eu sentisse bem mais que seus beijos e suspiros. Quando minhas costas bateram com tudo na porta pela pressão que fazíamos ele sorriu como eu pensei que faria.

Meu sorriso gengival de volta para mim.

— Fala sério, por que essa sua blusa tem tantos botões? — perguntou indignado.

Pensei que rasgaria o tecido fino com  tamanha brutalidade com que tentava ganhar a luta contra os pequenos botões, porém, quando conseguiu pelo menos que a metade dela estivesse ao seu alcance, mal pude conter o ofego com a quentura dos seus lábios perdida entre meus seios. 

Sua língua foi traçando um caminho delirante até de volta a minha boca, que novamente esperava por ele aberta, sedenta. Aproveitei para deslizar os dedos por entre seus fios bagunçados, os ombros tensos, a barriga lisa e fui descendo com seu olhar manhoso travado ao meu. Ele deu um sorrisinho safado quando pus as mãos por cima do cós da sua bermuda escura, mas então, minhas costas tremeram novamente.

— Amiga saí daí que ela tá subindo a escada. — Yoona falou frenética.

Engolindo o arfar desesperado nos separamos em busca de ar e uma saída. Voltei a fechar os mesmos botões que ele anteriormente tinha demorado tanto para abrir e passei as mãos loucamente pelo cabelo ao ponto que ele vestia a camisa branca jogada de qualquer jeito no chão, destino esse de cada peça que vestíamos, claro, se tivéssemos tempo para isso. 

Suas mãos se enfiaram pelos bolsos atrás das chaves, ele destrancou a porta com a cara toda vermelha e eu me perguntei se deveria achá-lo a coisa mais preciosa do mundo mesmo nesse momento de ação. 

Antes que eu desse no pé, ele segurou a ponta dos meus dedos e perguntou aos sussurros:

— Espera, como é que vai ser agora? Quer dizer, a gente tá junto em um relacionamento, tipo namorado e namorada, né?! — A dúvida estava presente em cada palavra. 

Tinha sido realmente esse tonto que passou na prova da Ordem? Como ele ainda não tinha certeza que estávamos juntos? 

Se tivesse tempo eu teria rido, rido tanto, rido de rolar pelo chão e o feito ter certeza bem devagarinho naquela cama bagunçada que agora nós dois éramos namorado e namorada, mas a sombra da minha mãe na escada não podia ser ignorada.

— O que você tá querendo com isso? — perguntei só para implicar.

Os olhos escuros e bonitos brilharam. 

— Eu só quero que você me queira. — Ele soltou baixinho me derretendo de vez. 

Acredito que era uma coisa meio ridícula de se sentir, mas sua pequena declaração teve a capacidade de criar um furor tão grande dentro do meu peito que minhas pernas quase não funcionaram mais. 

Era exatamente isso o que eu queria faz tempo, que ele me quisesse como eu sempre quis ele. 

— Vou pensar no seu caso. — Declarei com falsa confiança. 

Eu nunca iria ceder e deixar que ele soubesse em palavras a quão fraca e suscetível eu era com relação a tudo isso. Que só o seu olhar tinha o poder de me hipnotizar, que apenas o menor de seus toques me fazia delirar, que o som da voz dele me atingia como a mais bela sinfonia de Beethoven e que os beijos dele para mim eram tão doces quanto o açúcar cristalino das jujubas.

Seu resmungo manhoso e contrariado foi o melhor assim que o biquinho tão formoso surgiu.

— Quando você vai parar de brincar comigo?

Aproveitei aquele bico para beijá-lo rapidinho, um simples selar só para não perder a oportunidade e respondi antes que fosse tarde demais. 

— Nunca. — Nunca. Nunca. Nunca. 

No sapatinho corri para o quarto da irmã que esperava por mim aberto. Eu me joguei na cama ao lado de Duda e segurei um dos ursinhos esquisitos de Yoona casualmente para o teatro ser mais convincente.

— Prima você assistiu ontem o final de "Amor Proibido”? — comecei assim que ela pisou no quarto.

O churrasco estava pronto, minha mãe veio nos buscar antes que segundo ela, os amigos de Yoongi devorassem tudo. A pobrezinha caiu como um patinho na minha deixa fez uma expressão desolada e comentou inocente: 

— Coitada da Bihter. — Concordei diligentemente me segurando como as outras duas para não cair na gargalhada. 

***

Desci as pressas para evitar que o pessoal acabasse com todo o soondae, corri para fazer meu prato mais conhecido como montanha de comida, mas era tarde demais. Desiludida sem ter mais nem a sombra do soondae da Dona Min, resolvi me entupir mesmo de churrasco com salada de macarrão. 

O cheiro de um perfume gostoso, o mesmo que eu carregava minimamente em mim se aproximou na surdina e sem trocar uma só palavra comigo, Yoongi surgiu com seu próprio prato de comida e mais um cheio de soondae.

Apesar da ausência de palavras naquele silêncio esse era o jeito dele de confirmar que estávamos juntos agora, que o que aconteceu em seu quarto não foi apenas uma alucinação provocada pelo forte sol do Rio.

Min Yoongi não era o melhor para demonstrar sentimentos na frente das pessoas, mas eu nunca liguei para demonstrações públicas de afeto contanto que o sentimento me fosse apresentado de outras formas e ele era mestre nisso. Por isso o prato com soondae. Ele sabia que eu gostava, e também tinha certeza que não sobraria nada, então, pegou o soondae que a mãe tinha separado para ele e me deu. 

Aceitei o quitute sem conseguir conter o sorriso besta na face, porém, com todas as forças me segurei para não agarrá-lo ali mesmo na frente da plateia. 

Zanzamos  para lá e para cá de mãos dadas o tempo todo. Acredito que depois de tantos meses fugindo e me escondendo pelas moitas ele estivesse receoso de que eu sumisse na primeira oportunidade. Não que eu estivesse reclamando por estar grudadinha nele, nossas mãos se entrelaçavam de um jeito único, tão certo e perfeitas juntas que quase fazia meu coração doer.

Duda e Yoona ao lado do namorado mal seguravam a vontade de rir quando nossos olhos se encontravam, mas para falar a verdade, nem eu.

Fui bombardeada com as piadinhas dos seus amigos bocós, porém, nada comparado ao tanto que tiravam sarro dele. 

— Até que enfim. — Pedro levantou as mãos para o céu dando glórias. 

— Pensei que isso nunca fosse acontecer. — Henrique disse depois aos risos. 

— Você não sabe o quanto a gente torceu pra vocês se acertarem. — Pedro continuou fingindo não notar a forma como era encarado pelo outro. — Eu não aguentava mais esse bebê chorão reclamando pelos cantos por sua causa. — Ele estava todo molhado e pelo álcool falava gesticulando e se balançando muito, claro, me molhando no processo.

Todos riram quando Yoongi o empurrou de volta na água todo envergonhadinho.

— Vamo encenar o monólogo de semana passada. — Caio deu a ideia fugindo da ira de Min Yoongi. 

Pelos olhos arregalados com que o outro o olhava acreditei que seria bem interessante. 

— Será que eu ligo pra ela? — Ricardo começou do outro lado.

— Não, é melhor não ligar. — Matheus respondeu com duas latinhas na mão.

— Eu vou ligar pra ela e depois desligar! — Diego completou os desejos revelados de um Yoongi bêbado e tão perdido quanto eu durante esse tempo.

Quis me controlar para não demonstrar o quanto adorei saber que mesmo bêbado ele continuava querendo entrar em contato comigo, porque se sabe que um cara gosta de você de verdade quando ele te liga ou manda mensagens cheio de álcool nas ideias. 

A vermelhidão em sua face e os sorrisinhos sem graça foi impagável. 

— Vão se ferrar. — Anunciou em alto e bom som, logo me arrastando para o lado da irmã que negava seu espetinho de carne ao namorado comilão.

Que tipo de pessoa dividia comida? Ah, eu tinha a resposta, meu namorado, Min Yoongi. Pensei como uma idiota nele e no prato de soondae, escondendo a risadinha fora de hora de todos a minha volta. 

Devo admitir que o melhor daquela reaproximação foi ver a face da Carla toda e completamente tomada pela ira/inveja. Não demorou muito para que ela resolvesse juntar suas trouxas e se mandasse do lugar que claramente desejava, mas obviamente era MEU.

Tchau querida.

Minha amiga trocou um olhar contido comigo, ela segurou o deboche porque a garota ainda era prima do namorado e tudo mais, porém, como eu não devia nada a ninguém, ri mesmo.

— E então, vocês estão juntos? — Yoona fez a pergunta de um milhão de Dólares. 

Erguendo as sobrancelhas em minha direção ele esperou pela resposta que não veio. 

— Da minha parte sim, mas tá vendo como ela não responde nada? — Yoongi acusou insultadíssimo. 

Eu me fiz de desentendida.

— Tá vendo só? — Pressionou me chamando em seguida de teimosa. 

Continuei calada como se tivesse passado super bonder nos lábios, assobiaria se soubesse, mas como não sei, apenas o ignorei. 

Mais cedo ou mais tarde eu diria com todas as letras o que ficou implícito lá no seu quarto há pouco, só precisava de um tempinho para aceitar a ideia de que nós dois agora éramos de fato um casal. 

— Não é como se você não soubesse onde estava se enfiando esse tempo todo amigo. — Mandei cheia de abuso com a nossa costumeira implicância dando as caras. 

Ele inflou as bochechas aborrecido e isso deixou seus olhos pequenos menores, foi fofo e engraçadinho, mas Yoongi odiava parecer fofo quando de fato era só o que ele era.

Fofo. Fofo. Fofo. 

Avistei lá perto da churrasqueira com seu chapéu grande demais e os óculos de grau embaçados o Seu Min nos vigiando. Na verdade todos os três, ou seja, seu pai e nossas mães prestavam atenção e fofocavam sobre nós, só que o Seu Min não sabia disfarçar.

Homens, sinceramente. 

***

Estar com ele era tão bom que o dia se transformou em noite e eu mal notei.

Conforme as horas avançavam no relógio a casa esvaziava. Fazendo do jeito certo dessa vez, eu escondi uma boa quantidade de mochi e tteok em cima da geladeira para comer vendo minhas séries depois.

No final restaram apenas seus amigos grudentos e aparentemente sem teto, o namorado de Yoona, minha mãe, Duda e eu, todos largados no chão da grande sala, procurando algo legal para assistir.

— Por que a gente não compra umas pizzas e assiste a um filme na Netflix? — Gabriel deu a ideia levantando.

Como ninguém fazia esforço para ir embora e todos já estavam morrendo de fome de novo, concordamos.

— Prima tá tarde pra mim, eu até queria, mas o Marcelo vai me buscar pra gente sair daqui a pouco. — Duda disse conferindo o celular.

Marcelo, no caso, seu noivo, era militar. Eles moravam juntos há tempos, mas como ele chegou a pouco de uma missão no exterior passou uns dias na casa dos pais, e hoje retornaria.

Eu tentei escapar, mas Yoongi decidiu que mais uma pessoa era necessária para a comitiva a caminho da Sintonia's, não me dando brecha para discussões. Duda começou a se despedir do pessoal aproveitando a saída em massa para pegar uma carona, já que a pizzaria ficava no caminho do seu apartamento. 

— Não demorem seus lesos eu estou com fome. — Yoona anunciou como se não tivesse enchido a pança a bem pouco tempo. — E tragam pão de alho. — Gritou fechando a porta da garagem. 

Yoona adorava pão de alho, pobre Thiago.

Ela e o namorado ficariam para arrumar a mesa junto com nossas mães que ainda tinham assunto para fofocar no quintal, e o restante de nós iria à Sintonia's encher linguiça.

— Por que vocês simplesmente não pedem pelo delivery? — Essa foi a fala de sua mãe ainda quando nos organizávamos para sair de casa. — Mas, gostam de bater perna, hein. — Ela concluiu, porém, eu não gostava não. 

Agradecendo a carona depois de uns 5 minutos Duda desceu do carro e antes de entrar no prédio lembrou-se de algo. 

— Prima, esqueci de falar que semana passada comprei uma bota linda, só que tá apertando os meus dedinhos, quer ver? — ofereceu ao pegar as chaves de casa.

Minha prima era um pouco mais alta que eu, talvez uns cinco cm, mas calçávamos praticamente o mesmo número, além de que ela sabia que eu amava botas. 

Pisquei meus olhos fofamente para Yoongi com sua risada limpa e espontânea me atingindo logo depois. Sua irmã e eu tínhamos a mesma idade, como crescemos todos juntos ele conhecia bem os desejos fúteis de uma garota.

— Não precisa fazer essa carinha, pode ir, eu te busco aqui daqui a pouco. — Ele concordou sem que eu ao menos tivesse posto em palavras minha vontade. 

Duda foi abrir a porta e eu fiquei para me despedir.

Um dia.

Na verdade metade de um dia tinha resolvido toda a nossa situação que durava meses, quiçá anos, mas, agora nada mais importava só o que interessava era que estávamos juntos, realmente juntos.

Todas as vezes em que meus lábios encostavam nos dele, desde a primeira vez até as muitas vezes que aconteceram só hoje, um sentimento esquisito parecia mexer com meu peito, como se ele fosse pular, tão agitado que facilmente me rasgaria de dentro para fora.

Sabe aquela pavorosa palavrinha com A?

Não era a minha intenção dize-la tão cedo, apesar de sentir isso há muito tempo, desde que nossas brincadeiras mudaram, os olhares, as conversas, os corpos.

Tudo era o mesmo, mas de alguma forma tão diferente. Cada pedacinho do meu ser sabia que eu o amava, esperando eu que como aparentava fosse recíproco de verdade. 

Os carinhos que ele fazia eram tão bons, parecia que Yoongi sabia o jeito certo que eu preferia cada beijo, cada toque, toda a forma de aproximação. Meus lábios se moldavam aos dele como se eles não pudessem ser completos longe da sua boca tão desejada. As mãos grandes sempre encontravam um jeito de estar em mim. Seu corpo me aquecia, sua presença me enchia de calor, calor, calor. 

Mais da metade do meu corpo estava para o lado de fora, mas por algum motivo eu ainda não conseguia largá-lo. Eu carregava o seu gosto, o seu cheiro e queria mais, porém, antes que ficasse surda com todas as buzinas e reclamações do outro carro, tomei coragem para deixá-lo ir.

— Uma palavra Yoongi, pepperoni. — Anunciei. 

Manias.

Eu tinha várias e várias manias, acrescentando a mais nova que era a de contar os sorrisos que ele dava desde a hora em que cheguei a sua casa.

25.

— Volto rapidinho. — Prometeu. — E depois que despachar essa galera a gente vai poder terminar o que começou mais cedo. — Sua voz saiu baixinha, rouca e totalmente cheia de segundas intenções. 

26.

— Não faço ideia do que você tá falando. — Sussurrei com um sorriso cínico grande demais. 

Antes de ele de fato ir eu desprendi meu colar de coração do pescoço e o pus em seguida no seu bolso esquerdo da camisa branca. A palavra relacionamento, ou pior, AMOR não conseguia ser dita por mim tão facilmente, mas pequenos gestos podiam mostrar o que eu sentia, por isso tirei o colar. Não precisei de palavras, de frases prontas e rimas cafonas, eu ali quis mostrar que mesmo implicitamente entregava meu coração a ele. Que tudo o que eu tinha era dele. 

Ele apalpou o cordão dourado em seu bolso com a mão me brindando com seu 27° sorriso gengival. 

— Não demora. — Pedi já sentindo sua falta. 

— Não vou. — Garantiu de volta.

Eu juntei meus lábios aos dele, enquanto meus olhos também se juntavam aos dele, enquanto minha alma também se juntava a dele, e antes de entrar na portaria contei mais um.

28.

 

 


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