V E N U S - Origin escrita por badgalkel


Capítulo 9
1.8 Dia Sangrento




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A gritaria e correria no campus se opunham do cenário de minutos anteriores, onde-se podia ver a paz e quietude. O desespero tomou conta como uma onda de 10 metros de altitude se apoderando de uma indefesa cidade à beira-mar.

Ninguém sabia, contudo também, não ficariam para tentar entender o que acabara de acontecer. Tudo o que sabiam era que foi disparado um tiro, mal desconfiavam que ele fora intencionalmente certeiro e preciso.

O sargento encontrava-se caído ao chão com uma Harriet trêmula agachada ao seu lado. As mãos da jovem, repletas de sangue, pressionavam desesperadamente o ombro esquerdo do rapaz.

— Saia daqui... - ele soprou, fraco - agora!

— Só saio daqui com você - grunhiu entre dentes.

— Vá, - ele engoliu em seco, perdendo a consciência - você têm que se salvar.

— Pare de dizer besteiras, - murmurou, sentindo a respiração do outro cada vez mais precária - só fique comigo, James. Fique acordado.

— Ten...tarei

— James! - esbravejou quando este fechou os olhos - James!

Ela conferiu sua pulsação, ainda ativa, contudo debilitada. Esticou a cabeça para conferir o campus e se surpreendeu em encontra-lo completamente vazio, exceto, por um homem vestido integralmente de preto e uma máscara em formato cilíndrico andando em sua direção.

Outro tiro foi disparado, ela se encolheu novamente. Estavam protegidos pelos muros de pedra que cercavam o corredor, porém não por muito tempo.

— James! - chamou-o novamente, engatinhando até suas costas e enlaçando seus braços por trás de seu tronco. – James. Preciso que fique acordado!

Ela arrastava-o com dificuldade, agachada para não ser atingida. Não sabia para onde iria e nem como escapariam disto. Mas não o deixaria para trás.

Outro tiro fora disparado e, este, passou a milímetros de sua cabeça. Lágrimas escorriam por seu rosto. Ela estava apavorada.

Quando o homem misterioso pulou a abertura, ficou frente-a-frente com os dois e apontou-lhes a arma, Harriet engoliu em seco.

— James! - gritou, entre fungadas e lágrimas - James!

Seu fim estava diante de seus olhos.

O homem destravou a trava de segurança e antes de ouvir o som do disparo, ela fechou seus olhos.

Estava trêmula, chorosa e mal respirava. Mas podia jurar que não fora atingida.

Ao abrir os olhos percebeu que o disparo foi feito pelo homem ferido em seus braços.

— James! - esbraveceu abraçando-o pelos ombros. - Por Deus!

Ela o arrastou e encostou-o na parede, para que ficasse sentado. Este mal aguentava-se com os olhos abertos, mas lutava com todas as suas forças por ela.

— Fique comigo! - ela ordenou - Comigo! Não ouse apagar novamente.

— Sim, senhora. - ele sorriu contido, tamanha era sua dor.

— Pressione isto! - ela indicou o ombro ferido - Vou procurar ajuda!

— Harriet... - soprou.

— Eu vou te tirar daqui! - grunhiu - Só permaneça acordado.

Ela levantou, ainda trêmula, e assim que viu o corpo do homem jogado ao chão não muito distante deles, suas pernas fraquejaram.

Ela caminhou lentamente na direção do mascarado. Passo a passo, prendendo a respiração.

A arma estava caída perto do homem, ela se adiantou em chutar para longe.

Lutava contra a vontade de tirar a mascara do desconhecido e revelar o rosto do terrível homem que tentara os matar.

Seria um espião infiltrado? Um dos deles? Um dos nossos? Um dos que tentara matar seu irmão?

Sua mão se erguia automaticamente, os dedos prontos para arrancar o disfarce, revelar o rosto daquela terrível alma.

De repente a imagem de Howard apareceu em sua mente, a expressão chorosa e em agonia, trancafiado em seus próprios aposentos com a solidão como companhia. Estava magro e maltrapilho, a barba por fazer e olheiras profundas tomando conta de sua face. Aquele seria seu irmão caso estivesse morta agora.

Ela respirou fundo e mais uma lágrima percorreu sua face. Tinha que se manter segura pelo bem dele e do pobre sargento baleado.

Por fim, quando desistiu da ideia e antes de se afastar da figura assustadora, o mesmo seu um salto surpresa e se jogou por seu corpo, pressionando-a contra o chão.

Suas mãos estavam ao redor de seu pescoço, comprimindo todo o ar que por ali já passou. Harriet tentava lutar, suas mãos empunhadas contra as de seu assassino, porém, inigualável era a força dela contra a dele.

Sua visão foi se tornando turva e seus movimentos se tornavam suaves.

O sargento, a poucos metros de distancia, esbravejava com raiva e dor: - Solte-a, desgraçado!

Sua arma estava a centímetros de seus pés, onde fora deixada quando disparada da última vez. Ele tinha que alcança-la, tinha que ajudar Harriet. Ela não tinha muito tempo.

Seus movimentos pararam por completo.

Ele juntou o último resquício de força que seu corpo lhe ofereceu, alcançou a arma e disparou contra o verme, que caiu, por cima da jovem.

Quando o ar voltou drasticamente ao seus pulmões, Harriet tossiu e chorou.

Havia um homem morto sob si.

—x-

— James Buchanan Barnes. Não ouse desmaiar agora!

Ele respirou fundo e lutou contra o cansaço, os olhos pareciam pesar toneladas e não mais podiam ficar abertos. Apesar de não poder enxergar e estar levemente desfalecido, tinha mínima noção do que acontecia ao seu redor.

— Droga, vou ter que dar um jeito nisso agora. - o soar doce da voz o fez sorrir.

Sua cabeça pesava como nunca e ele teria agradecido quando sentiu mãos pequenas e finas o deitar e ajeitar seu corpo ao chão frio, se sua voz, como o resto de seus membros, obedecessem seus desejos.

— Droga, não tem nada que... Ei! - o grito fino e desesperado fez o coração do rapaz se sobressaltar - Você aí, de camisa laranja! Venha aqui!

James nada via, mas pôde sentir que alguém se aproximava, seja pelos passos abafados ou a respiração conturbada.

— O que aconteceu? Onde está todo mundo? - um rapaz, de voz aguda, indagou com a voz trêmula.

— Não tenho tempo de explicar agora, só preciso da sua ajuda e rápido, ou então ele morrerá.

— O que posso fazer para ajudar? - questionou com a voz mais firme.

— Preciso que encontre álcool, alguma coisa afiada, panos limpos, e, se possível, linha, agulha e uma pinça.

— Vou ver se encontro na enfermaria um kit de primeiros socorros. - conforme ele terminava a frase, sua voz se distanciava.

— Tudo bem, tudo bem. - ela repetiu, com o rosto perto do dele. - Você vai ficar bem. - engoliu em seco - Nós vamos ficar bem!

Ele não conseguiu ter noção do tempo que se passara, mas parecia que se passara uma eternidade até que o garoto voltasse.

— Aqui, - o som pontiagudo do vidro sendo depositado no chão chamara a atenção de James, que cada vez menos tinha consciência do que acontecia. - não consegui álcool puro, essa vodka resolve?

— É perfeita, obrigada. - respondeu a mulher. - Agora, preciso que faça isso que eu estou fazendo para que eu esterilize essas coisas, tudo bem?

A pressão que o sargento nem percebera que existia sob o ombro esquerdo diminuiu e logo voltou.

— Pressione forte, ele não pode perder sangue algum mais.

— Tudo bem, - o rapaz disse - Deste jeito está bom?

— Perfeito.

Ruídos de ferro se chocando com o chão e líquido sendo derramado irromperam as respirações pesadas.

— James, isso vai doer um pouquinho, meu amor. - a voz doce soprou - Só um pouquinho.

Dado o aviso, Barnes sentiu seu ombro queimar. Como se chamas vivas estivessem tomando conta daquele local e sua pele se esvaia junto às labaredas. Sua voz finalmente saiu, esbravejada e em agonia.

— Por Deus, sabe o que está fazendo? - o rapaz indagou com aflição.

— Vai ficar tudo bem, meu amor.

A frase da voz açucarada soprada em seu ouvido fora a última coisa que ele ouviu antes de desmaiar e a escuridão tomar conta dele por completo.

—x-

— Relatório da situação. - uma voz rubra solicitou.

Ainda estava escuro, sombrio. Ele não conseguia se mover, falar, ao menos sentir seus próprios membros ou o peso de seu corpo.

— A bala estava alojada no nervo do ombro esquerdo, tive de abri-lo imediatamente e tirá-la ainda no local. Fiz uma sutura flexível, que suportasse a viagem até aqui, ele perderia muito mais sangue caso não a fechasse imediatamente e corria perigo de bactérias se alojarem.

— Prossiga.

— Chegando aqui o abri novamente e tive de reconstruir o nervo com enxertos e fechar. Ainda assim ele perdeu muito sangue, mas está estável agora. Estará como novo em poucas semanas. - uma voz feminina respondeu calma.

Uma faixa de luz surgiu no meio das trevas. Era singela e pequena, contudo perceptível. Aos poucos ela se tornava mais forte e intensa, até que dado um nível que esta retrocedia e se apagava.

Até que esta desapareceu por completo, levando sua mínima consciência com ela.

—x-

— Não pudemos localizá-lo, logo que o esquadrão chegou ao local... - uma voz vacilante tornava-se cada vez mais clara. Contudo, ele não pôde reconhecer de quem era.

— Está me dizendo que o homem morto, - outra voz oscilante interrompeu a primeira, engasgando com a palavra forte - que levara um tiro na cabeça não estava lá onde o deixamos?

— Não é possível deduzir o que pode ter...

— Ele estava morto! - a segunda voz esbravejou - Ele estava sob mim, eu senti a vida se esvaindo de seu corpo!

— Alguém deve ter recolhido...

— Não! - o grito calou o primeiro, tornando o silêncio vasto.

A faixa de luz despontou ao horizonte trevoso novamente e desta vez ele tentou se mover até a sua direção. Mas, ao contrário do efeito que imaginou que teria, a faixa caminhou lentamente até ele. Assim que a atravessou, foi tendo noção de cada parte de seu corpo lentamente de baixo para cima.

Os dedos dos pés, pernas, quadril, abdômen, peito, braços e cabeça, tudo em efeito retardatário. Sentiu também a dor.

Sua respiração estava falha e seu peito doía a cada suspiro. Abriu os olhos. Sua visão estava contorcida, a claridade o cegou momentaneamente.

Aos poucos o sargento percebeu os adereços de um quarto de hospital. Completamente claro e limpo. Notou a enfermeira ajeitando ataduras em seu ombro esquerdo, de onde vinha a maior parte de sua dor.

Notou o tenente Malcon, parado ao lado da porta, em uma postura defensiva. Notou dois homens com vestes pretas, armados e com postura ameaçadora no canto do quarto. E, por fim, sentada em uma poltrona ao lado da cama em que ele estava, encontrou Harriet, trajada de vestes brancas, que faziam jus a sua profissão.

Ela e o tenente ainda discutiam, mas ele já não compreendia nada. Sua cabeça latejava, o que deixou-o pouco confuso.

— Ele acordou. - anunciou a enfermeira.

Os dois viraram-se para o sargento atônitos.

— James, - ela sussurrou tocando-lhe o rosto - como se sente?

— Como... - a voz rouca rasgou sua garganta - como se tivesse levado um tiro. - não deixou de zombar.

Ambos riram levemente.

Harriet se levantou, puxando o estetoscópio que enlaçava seu pescoço, e pousou sob o peito dele.

— O que... - a dor interrompeu-o.

— Batimentos normalizados, - informou logo devolvendo o instrumento no lugar anterior e direcionando-se ao rosto do sargento. Puxou a parte de baixo de seus olhos. - Pupilas estáveis.

— Diagnóstico, doutora. - pronunciou, sorrindo.

— Forte como um touro. - respondeu retribuindo o sorriso. - Está sentindo dor?

— Um pouco, nada em exageros.

— Onde? - indagou atenciosa.

— Todo lugar, - murmurou - mas está mais concentrada no ombro esquerdo e minha cabeça está me matando.

— Aplique um analgésico. - ordenou para a enfermeira, que de imediato puxou uma seringa de um lugar que o sargento não pôde ver e inseriu em um dos muitos canos que estavam ligados a ele.

— Onde estamos? - ele questionou olhando ao seu redor.

— St. George's Hospital, Londres.

— Caramba, - murmurou com a voz falha - como chegamos aqui?

— Digamos que foi um caminho longo. – ela sorriu.

Barnes gemeu de dor, o ombro doía que nem um inferno.

— Sinto muito, tive que fazer o procedimento no local... - tentou se explicar, com a voz vacilante.

— Ei, - ele a interrompeu, movendo sua mão direita lentamente até que tocasse a dela sob os lençóis da cama - sei que fez o melhor para me ajudar. Tá tudo bem agora, graças a você.

— Não, não - negou balançando a cabeça enquanto agarrava sua mão sem hesitação - Você me salvou! Levou um tiro por mim. - deu uma pausa para castigar seu lábio inferior impiedosamente ao mesmo tempo em que seus olhos se enchiam d'água - Você... Salvou a minha vida, James! E eu não sei como agradecer. – tocou a mão do sargento por cima dos lençóis do leito.

— É este o trabalho dele, afinal. - a voz rabugenta do tenente, o qual ambos haviam esquecido ainda estar presente, interrompeu-a e a fez se encolher, recolhendo a mão.

O silêncio tomou conta do local.

— Barnes, ficará de licença até estar completamente recuperado e pronto para retornar. - anunciou o homem - Seus pertences serão enviados de imediato para que tenha uma estadia satisfatória. Por hora, dispensado.

— Obrigado, senhor. - disse antes do homem corpulento se virar e sair pela porta.

Harriet permaneceu quieta.

— Ele é um idiota, sabe disso. - murmurou para a mulher.

— Mas não deixa de ter razão - sorriu acanhada.

— Quem são esses? - indagou indicando os rapazes que os observavam.

— Seguranças, - murmurou com a boca torta - estão aqui para nos proteger.

— Mas por que...

— Esqueça, isso não importa agora. Não se preocupe com isso.

— Está bem. - sorriu, aproximando suas mãos novamente. Antes que estas se tocassem, Harriet recolheu a sua.

— James...

— Ah não, - bufou, interrompendo-a - não vamos retroceder, certo? Foi muito difícil dizer aquelas coisas, mas se for preciso eu repito...

— Não, é que...

— Pode nos dar um pouco de privacidade, por favor? - Questionou diretamente aos seguranças.

— Estaremos ao lado de fora, se precisarem... - disse o mais alto, antes de se retirarem e fecharem a porta.

Harriet engoliu em seco.

— Não, - soprou, referindo-se à expressão aflita da mulher - não fiz aquilo só porque era a minha obrigação com você, Harriet. Sabe disso, não é?

Ela abaixou a cabeça, desviando de seus olhos acusatórios.

— Fiz aquilo porque eu não suportaria viver em um mundo o qual você não viva.

Harriet sorriu ainda de cabeça baixa, e logo que mirou diretamente nos olhos do rapaz, disse:

— Sei disso. Mas... A minha vida é completamente conturbada. Te inserir nisso...

— Como se a minha fosse uma completa organização, certo? - Indagou, tenso.

Harriet riu e mirou a face do homem que não deixara de estar constantemente presente em seus pensamentos. Passou a mão delicadamente pelo queixo com a barba por fazer e sorriu ainda mais.

— Eu jamais imaginei que algum dia poderia sentir tal sensação. - Admitiu enquanto se aproximava vagarosamente, inclinando-se na direção dele. - É abrangente, intenso e doloroso. - ela percorreu a lateral do rosto do rapaz com a ponta dos dedos - Você desperta o melhor em mim e te perder... seria como... Perder a mim mesma novamente.

— Você é a pessoa mais maravilhosa que eu já conheci.

A pressão do corpo dela sobre o dele causara um leve desconforto, por conta dos ferimentos, mas ele não se importou. Assim que os lábios dela tocaram os dele, toda a dor desapareceu e ele se rendeu ao seu cheiro, seu toque, sua textura e a sua pessoa.

Era certo, estavam apaixonados.


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