Monarquia Serpente - Bughead escrita por Fortunato


Capítulo 2
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Música do capítulo: Lewis Capaldi - Bruises



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Elizabeth Cooper

(música)

Depois da fuga de Polly com Jason, minha mãe quase não parava em casa. Segundo ela, estava procurando por quaisquer vestígios que o casal pudesse ter deixado. De todos os defeitos que minha mãe possuía, exigir a perfeição de nós era o que mais doía, pois no fundo eu compreendia que nunca seria tão boa quanto Polly, ou boa o suficiente para agradar a ela completamente.

Sua obsessão por encontrar Polly foi tão doentia que a consumiu em corpo, alma e mente. Fazia duas semanas que minha mãe havia sumido do mapa, sem levar roupas ou dinheiro, sem deixar recados ou pistas. Meu pai agia naturalmente demais, fazendo um boletim de ocorrência apenas por insistência minha, dizendo que ela na verdade havia perdido a sanidade e quis nos abandonar. “Sua mãe amava muito a Polly, ela era muito importante para Alice, assim como você”, me lembrei de meu pai me afagando enquanto eu chorava impaciente – “mais importante do que ficar comigo?”, pensava.

Archie, Verônica e Kevin me ajudavam na busca por informações, como bons amigos, mas principalmente por pena, em ver o quanto eu estava desesperada. Eles faziam tudo o que podiam, buscando informações e espalhando cartazes. Entre todo o caos, o mais difícil foi associar que na cidade de Riverdale, ninguém era realmente o que aparentava ser, nem mesmo a minha família e eu.

A investigação trouxe à tona um passado sombrio sobre minha mãe que eu não esperava conhecer. Ela não foi assim como eu e Polly, uma garota estudiosa do lado norte. Minha mãe havia sido uma serpente, linha de frente da gangue, rebelde do lado sul. Entregue e desmascarada por uma antiga notícia de jornal que anunciava sua prisão quando ainda era adolescente, sendo liberta por fiador anônimo. Os motivos pelos quais ela se foi pareceram se entrelaçar ao seu passado no momento em que descobri um bilhete feito à mão entre seu material de trabalho.

Alice, você sempre honrou fielmente nossas leis e a mim... Eu sei o quanto foi doloroso para você esconder isso por tanto tempo, mas eu devo te lembrar: nenhum serpente fica sozinho. Assim que possível, o encontraremos, te dou essa certeza”.

Por piedade do tenebroso inverno, alguns raios de sol escaparam entre as nuvens revelando a manhã. Dormi pouco novamente, refletindo sobre o que a carta estava dizendo “o encontraremos”, a busca da minha mãe não era por Polly? Um turbilhão de coisas passava pela minha cabeça quando ouvi meu pai bater à porta:

— Betty, querida! Archie está aqui em baixo para te acompanhar até a escola!

— Tudo bem, já vou descer pai!

Em menos de quinze minutos já havia amarrado o cabelo e me vestido. Nunca fui muito vaidosa ou estilosa, qualquer peça do guarda-roupa me agradava, poupando meu precioso tempo matinal. Desci as escadas em um pulo, observando Archie se levantar da mesa engolindo uma torrada. Vesti o casaco abrindo a porta.

— Betty, não vai comer nada de novo? – meu pai resmungou da mesa, enquanto Archie e eu saímos pela porta.

Ele me analisou apreensivo, reparando no resultado de algumas noites mal dormidas. Eu diria que Archie era a pessoa que mais se preocupava comigo no momento, até mais que o meu próprio pai. Após toda essa situação com o desaparecimento da minha mãe eu havia perdido o apetite e alguns quilos de forma sobrenatural. Desde então Archie me buscava em casa para ir até a escola todos os dias e em algumas vezes me obrigava a comer algo. Que a propósito se revirava em meu estômago durante todo o dia. 

— Você está horrível sabia? – ele balbuciou – está vivendo à base de água? Já não come mais? – me repreendeu enquanto caminhávamos.

— Archie, relaxa, eu fiz um lanche de madrugada...

— A luz do seu quarto ficou acesa a noite toda. – assoprou as mãos em busca de calor – Pesadelos de novo?

— Sim... – fiz o mesmo com minhas mãos.

Na verdade havia dias que eu não dormia bem. A descoberta do bilhete e do passado de minha mãe reacendeu a esperança que eu havia perdido. Basicamente, eu precisava apenas esclarecer algumas coisas sobre sua adolescência com os Serpentes do Sul, uma gangue de motoqueiros fora da lei distribuída ao longo do lado ruim da cidade. Porém, eu não sabia com quem falar ou se eles aceitariam responder algo, a não ser que eu fizesse parte deles e fosse de confiança. 

Ainda ontem eu pensava que esse plano seria infalível. Sabia que demandaria de um pouco de coragem, mas nesse momento estava disposta a tudo por respostas. Até descobrir que não dependia só de mim e que provavelmente seria mais difícil do que simplesmente vestir uma jaqueta.

 

— Ontem Jughead não me aceitou nos serpentes e ainda zombou de mim, pensei que talvez você pudesse falar com ele.

— Vou ver o que faço Betty, mas já adianto, ele é muito cabeça dura. Se decidiu que não te quer na gangue vai ser difícil fazê-lo mudar de ideia.

— Conversei com Verônica ontem. – acenei enquanto a observava se aproximar de nós, já na porta da escola – Ela teve uma ideia, mas não sei se consigo aderir.

◙ ○ ◙ ○ ◙

— Betty, veja bem: – Kevin disse se ajeitando no sofá – Se Jughead não quer que você entre porque você é uma princesinha delicada... – ele sorriu – Então, talvez seja o momento de libertar a ogra que existe dentro de você!

Joguei uma das almofadas nele, fingindo ter me ofendido.  Dois alunos entraram na sala de lazer da escola com a jaqueta de cobra. O mais alto olhou para mim de soslaio e sorriu gentilmente sem que ninguém percebesse, retribui tímida. Sweet Pea sempre havia sido cortês comigo desde que fizemos dupla para as aulas de química. Entretanto, sua cortesia não ia além de cumprimentos simples e acenos de cabeça minimalistas pelos corredores.

Na minha concepção ele me tinha como uma amiga, porém sentia vergonha de que alguém o imaginasse próximo da Fada, como ele me chamava durante a aula. Não lhe tirava a razão, nem eu gostaria de ser amigo de mim, acabaria com a reputação de qualquer um. Desabei com meu próprio pensamento.

— Eu não sei se consigo ser assim, ou me vestir assim. – apoiei o rosto nas mãos em uma cena completa de desespero.

— Então você está dando razão para Jughead, Betty! – Verônica colocou a mão sobre meu ombro se aproximando de mim – Se você não é capaz de se adequar a um novo modo de vida, então não deve entrar para uma gangue, pois só provará o quanto o que ele disse é verdade!

— Sim. – Archie complementou enquanto eu levantava o olhar para ele, sentado no braço do sofá – Isso põe a prova o quanto está disposta a encontrar sua mãe. – girou a bola de futebol americano nas mãos, ele acabara de ser aceito no time – Caso contrário, esquece essa investigação e tenta se adaptar à ausência dela.

— Você sabe que não posso! – lamentei ainda com as mãos entre as laterais do rosto.

— É uma coisa ou outra Betty... – concluiu Kevin.

Observei Toni Topaz entrar na sala e cumprimentar os serpentes que já estavam ali. Ela tinha os cabelos pintados em rosa, andando sobre botas altas que elevavam sua confiança. Usava croppeds que exibiam sua barriga jovem e sarada. Não se preocupava com pensamentos alheios e confrontava qualquer um que ousasse ofendê-la, inclusive Cheryl Blossom. Não pode ser tão difícil assim, pensei por um segundo a encarando.

— Perdeu alguma coisa Cooper? – Toni ergueu uma das sobrancelhas cruzando os braços quando percebeu meu olhar analítico.

— Tudo bem, eu topo gente! – sussurrei me voltando aos meus três confidentes – Mas vou precisar muito da ajuda de vocês.

— Ótimo! – Verônica aplaudiu sorridente – Vamos para minha casa depois da aula, tenho várias roupas para te dar.

— Isso vai ser bom! – Kevin trocou um olhar divertido com ela, rindo em uníssono.

O sinal para a aula nos convocou para as salas. Assisti Topaz deixando a sala com seus companheiros e de repente a resignação tomou conta de mim. Eu não era tão delicada assim. Como a mais inteligente da classe e provavelmente da escola inteira, eu poderia solucionar qualquer problema. Este seria o meu momento de provar, não só para Jughead, mas para todos, o quão determinada e forte Elizabeth Cooper poderia ser para conseguir o que quer.

◙ ○ ◙ ○ ◙

— Ok, então Betty, te serviu? Estamos ansiosos para te ver. – gritou Verônica da sala de sua casa, onde todos esperavam ansiosos.

Eu não possuía sequer uma camiseta preta em meu guarda-roupa. No fundo da terceira gaveta havia encontrado um blazer em tom azul marinho, mas não seria suficiente para vestir a nova Betty Dark, como Verônica me apelidou em concordância com Kevin.

Meu pai havia viajado para uma cidade vizinha para uma cobertura do jornal, o que me deu total liberdade para a transformação. De acordo com ele, voltaria em dois dias ou menos. Mesmo tingindo algumas das minhas roupas, elas eram engomadas e comportadas demais, algumas até ficaram com manchas rosa espalhadas em sua extensão, um total desperdício. Nada que uma boa customização não resolvesse depois.

Deixei apenas roupas em tom neutro, as brancas, as cinzas, as tingidas em preto e qualquer outro tom escuro que fosse. Os pijamas de ursinho e roupas intimas eram caso à parte, ninguém me veria os vestindo mesmo. Verônica havia separado caixas lotadas de roupas para me dar. Por sorte tínhamos praticamente o mesmo corpo e seu gosto pelo preto não poderia ser uma coincidência melhor.

Me observei no espelho enquanto terminava de fechar o zíper do cropped preto. Passei a mão sobre a cintura, estava um pouco apertado, porém delineava minha cintura e elevava os seios. A calça rasgada nos joelhos demarcava fielmente as regiões sensuais de qualquer corpo feminino, passei a palma da mão em minhas coxas, enxugando o suor. Estava tudo tão apertado.

— V, eu acho que está um pouco apertado! – disse tímida abrindo a porta.

— Oh. Meu. Deus. – Kevin disse pausadamente se levantando para me girar – Você vai ser a piranha serpente mais gata de Riverdale!

— Não sei Kevin... – cobri a barriga exposta com um dos braços – Uma garota precisa de muita confiança para usar isso.

— Betty você tem um corpo lindo, se olha no espelho e a confiança surgirá. – Kevin segurou meu rosto entre as mãos. Percebi uma troca de olhares entre Verônica e Archie.

— Tem razão Betty. – Archie se levantou também – Isso não vai dar certo, você é a típica garota fresquinha e privilegiada do lado norte – deu a volta por mim e eu senti minhas bochechas queimarem em raiva – Nunca deixará de ser a barbie frágil e nada fará de você algo a mais, agora eu penso realmente que deveria desistir disso tudo.

— Isso é o que vamos ver Archie! – cuspi as palavras sem pensar e elas saiam naturalmente – Você não entende o quanto estou disposta a alcançar o que preciso e nem tem ideia do que estou acabando de me tornar. Sou capaz de fazer o que eu puder para encontrar minha mãe! 

Senti como se estivesse saído do meu próprio corpo e outra pessoa tomara a Betty que estava ali antes, se recusando a usar uma roupa rasgada e ou mais atraente. O silêncio dominou a sala por poucos segundos enquanto Archie me encarava sério. Até que por fim ele sorriu orgulhoso, causando pés de galinha na ponta dos olhos. Compreendi imediatamente a finalidade da sua provocação.

— Eu sei disso Betty. – ele me abraçou – Agora quero que repita isso a você mesmo, toda vez que se sentir menos do que realmente é.

Completei seu abraço me sentindo em casa. Verônica e Kevin nos olhavam com compaixão, qualquer lugar com eles poderia ser chamado de lar. E eu concluía ali, naquele momento, que um lar não se tratava de um lugar, mas sim das pessoas que nos envolviam. Era por isso que eu precisava dar tudo de mim para buscar pela pessoa que tornava o meu lar completo. Minha mãe. 


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