Reunião escrita por Jafs


Capítulo 1
Reunião


Notas iniciais do capítulo

Esse site não aceita capítulos com mais de 20.000 palavras, portanto eu criei um capítulo de complemento para este aqui.



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O ruído da máquina ressoava pelo cubículo claustrofóbico e Sasa olhava para o seu próprio reflexo no espelho do elevador, tentando se distrair daquilo ou de algo mais que ela não queria admitir.

Estava vestindo uma blusa nova, com alça e meia manga, de cor azul marinho, e uma calça skinny preta. Para completar, uma bolsa tiracolo e rasteirinhas brancas.

Um visual para uma ocasião especial.

A porta do elevador se abriu e ela caminhou, passando na frente das entradas de apartamentos, com passos cada vez mais pesados. Eventualmente chegou a uma entrada com uma placa.

Mami Tomoe

Ela parou em frente à porta. Havia silêncio, será que não tinha ninguém? Seria bom demais para ser verdade. Ela foi apertar o botão, chegou a tocá-lo, mas não o fez. Ao invés disso, ela recuou e baixou a cabeça, falando consigo mesma, “O que estou fazendo aqui...”

Visitar Mami e ser amiga dela era uma coisa, bem discreta, aliás, mas agora ela havia sido convidada para uma festa de aniversário, com tantos convidados quantos embaraços. Uma ode aos sucessos e felicidades da pessoa que seria o centro das atenções naquele dia e uma promessa da continuidade disso.

Sasa rangeu os dentes.

Seus aniversários sempre foram uma ode à hipocrisia. No dia seguinte, se não no mesmo dia, as pessoas que lhe desejaram sucesso estavam sabotando os seus esforços e então cobrando mais do mesmo, em um cinismo irretocável.

Os braços começaram formigar e Sasa tocava as pontas dos dedos, sentindo pequenos choques. Era uma estranha sensação que ela andava sentindo ultimamente, mais um motivo para não estar ali. Ela tinha tempo para ir embora, inventar uma desculpa.

... Se você se comportar bem...

Ela deu um pisão contra o chão. A voz da deusa era clara e ela com certeza havia sido convidada também. Ela e aquela guardiã. Sasa não sabia qual das duas era a mais assustadora.

De repente, passos apressados e a porta se abriu, acompanhado por uma voz mais infantil, “Eu estou indo buscar ele na estação!”

Sasa viu que Nagisa estava pronta para o evento. Era um vestido de alça de azul turquesa, com uma saia que chegava na canela, do qual estavam cobertas por uma meia cinza com bolinhas brancas como o par de sapatilhas. Até o par de chucas que prendiam o cabelo estavam mais coloridas que o usual e havia uma doce fragrância de um perfume colocado recentemente.

“Certo, mas retorne logo. Eu preciso da sua ajuda.”

Nagisa ainda estava olhando para dentro do apartamento até a resposta da Mami, só então ela notou quem estava na entrada.

“Hmmmm...” Sasa timidamente acenou. “Olá.”

Nagisa sorriu e virou a cara, chamando, “Mami!”

Sasa arregalou os olhos e estendeu a mão. “N-”

“Sasa-chan chegou!”

“...ããããoooo...” Era tarde demais.

Porém Nagisa havia ouvido. “Hã?”

Sasa tentou se recompor rapidamente, sorrindo. “Eehhh... Eu estava querendo fazer uma surpresa.”

A garota de cabelos brancos franziu as sobrancelhas. “Sério?”

Desde quando essa garota ficou esperta? Forçando mais o sorriso, Sasa assentiu.

Nagisa não expressava convencimento, balançando a cabeça, mas então sorriu e cochichou, “Veja. Você deve estar preocupada por ter escondido de nós que era uma garota mágica e amiga da Madoka.”

“Ah...” Sasa suspirou e deu de ombros. “Talvez.”

“Não se preocupe com isso. Hmmm...” cutucando a própria bochecha e olhando para cima, pensativa, Nagisa continuou, “nós estamos... acostumados com a desconfiança. Eu conheço outra pessoa que tende a evitar se expor muito logo de cara, mais por cautela.”

“Sim, eu sou cautelosa também.” Sasa abriu um grande sorriso.

“Pelo o que soube da Mami, você parou de ir à escola sem avisar. Ela ficou muito preocupada.” Ouvindo passos atrás dela, Nagisa se lembrou. “Ah! Eu preciso ir.” Ela saiu apressada, acenando. “Logo eu volto.”

Sasa acenou também. “Até mais.” Então ela viu quem agora estava na porta.

A loira de cabelos soltos carregava em sua face um tenro sorriso e vestia um avental de tons amarelados com detalhes verdes.

Sasa estranhou aquilo, esperava ver Mami já bem vestida.

“Nagisa lhe deixou aqui fora por tempo demais,” Mami convidou, “por favor, entre.”

“Com licença...” Sasa entrou e ficou descalça.

“Como você está?” Mami perguntou enquanto fechava a porta.

“Estou bem...” Vendo a outra ainda sorrindo para ela, Sasa abaixou olhar, abrindo a sua bolsa. “Acho que já é hora...”

Mami ergueu as sobrancelhas, curiosa.

Ela tirou da bolsa uma minúscula caixa de presente com laço e ofereceu, com uma expressão alegre. “Feliz aniversário!”

“Oh...” Mami pegou com a caixa com cuidado, parecia haver algo delicado ali dentro.

“Eu não sabia o que dar pra você.” A expressão alegre se foi e Sasa virou cara, ainda olhando de relance para a aniversariante. “Então resolvi dar algo pequeno. Assim, se você não gostar, pode se livrar dele fácil fácil.”

Mami desatou o laço, abrindo a caixa e revelando um par de brincos.

“São bijuterias, não sou rica, tá?”

Mami as colocou na palma da mão. “Ah... São de pressão...”

Sasa rangeu os dentes. “É... Eu sei que esses aí parecem mais pra criança, mas... mas...”

“Eu prefiro assim.”

“Hã?” Os olhos azuis vivos de Sasa se abriram mais.

“Um dos incômodos de ser uma garota mágica.” Mami colocou o presente de volta para a caixa. “Quando você perfura o lóbulo da orelha, o buraco logo se fecha, mesmo se manter o alfinete ali. Nesse caso, ele vai sangrar quando tentar remover.”

Sasa olhou para o anel prateado em sua mão esquerda, com uma gema azulada. “É verdade.”

Mami pressionou a caixa contra o seu peito e se curvou. “Eu adorei!”

Com um peso em seus ombros indo embora, Sasa pôs as mãos na cintura e deu piscadela. “Você pode se orgulhar de sua kouhai!”

“Oh...” Mami desviou o olhar. “Acho que não deveria mais usar isso, pois não estudamos mais na mesma escola.”

Sasa mostrou confusão a princípio, mas então sorriu e brincou com as pontas duplas de seu cabelo. “Ah... sim... haha.”

Mami convidou a visitante para segui-la. “Eu estou feliz por ter chegado cedo.”

“Cedo?”

Elas chegaram à sala de estar, com o sofá e a mesa de vidro. O belo céu azul com poucas nuvens e o horizonte urbano da cidade podiam ser vistos através das grandes janelas.

Mami deixou o presente sobre uma cômoda, enquanto explicava, “Hoje eu só estava esperando a sua visita e da Madoka-san e Homura-san...”

Sasa abaixou as pálpebras sutilmente. Eu sabia que aquelas duas viriam.

Elas então chegaram à cozinha.

“Wow!” Quando Sasa chegou, viu a bancada tomada por eletrodomésticos e travessas. O forno estava ligado e um cheiro doce e quente pairava no ar, além do cheiro da farinha. Havia bastante comida pronta, mas não parecia aquilo ser o suficiente.

Mami continuou, “No entanto, eu recebi uma chamada e agora virão mais pessoas. Nagisa também resolveu trazer o namorado dela para me conhecer.”

“Ehhh...” Sasa ficou boquiaberta, piscando os olhos. “Ela tem um namorado?”

A loira apenas assentiu.

“Você não parece muito feliz.” Ela deu um sorrisinho.

Mami fechou os olhos. “Apenas acho que é muito cedo para isso, mesmo que ele seja da mesma idade dela.”

Aproveitando a oportunidade de ninguém estar olhando, Sasa ergueu uma sobrancelha e seu sorriso passou a ser mais malicioso. ‘Apenas’? Será que tem algo mais nisso? Enquanto sua voz continuava alegre. “Awww... Não devia se preocupar, o amor nessa idade é o mais puro. Eu ficaria com inveja.”

Sem dar uma reposta, Mami se aproximou da bancada e começou a mover alguns eletrodomésticos. “É devido a tudo isso que eu trabalhei a manhã toda aqui. Falta pouco agora, mas eu preciso ainda tomar banho e me arrumar. Sua chegada é uma benção.”

Sasa franziu a testa. “O quê?”

“Com a sua ajuda vai dar tempo...” Mami pegou um avental com estampas de vários tipos de queijos. “Nagisa estava usando esse. Você é baixa, deve servir.”

“Espere! Espere!” Sasa ergueu as mãos. “Eu... não sei cozinhar, muito menos preparar bolos.”

Mami voltou a sorrir. “Então talvez você possa continuar a ser a minha kouhai. Huhu...”

“Claro...”

Vendo que a outra não estava muito confiante, Mami falou enquanto entregava o avental, “Eu vou te instruir, assim como faço com a Nagisa.”

Ela tá me comparando com aquela criança. Sempre tão pisando em mim. Lixos! Todos são uns lixos! Sasa cerrou os punhos. Aquela deusa me pôs nessa situação ridícula pra me humilhar. Por que eu aceitei isso?

Uma súbita dor em seu abdômen e Sasa olhou para baixo, vendo a ponta de um fino espigão prateado que havia a atravessado, rasgando a blusa e a carne. Grossas gotas de sangue caíam e marcavam o piso da cozinha, enquanto seu corpo formigava intensamente seguido por um crescente zumbido em seus ouvidos.

“S-Sasa-san?”

Ela trocou olhares com Mami e zumbido se fora, assim como a dor e formigamento. Ela voltou a olhar para a barriga e nada havia ali, nem mesmo a ferida e o sangue, e sua blusa estava intacta.

“Você está pálida!” Mami exclamou, mais preocupada.

“É medo...” Sasa ergueu a cabeça e se esforçou a sorrir. “Medo de estragar alguma receita e você não gostar mais de mim.”

“Não! Eu jamais faria isso.” A loira se aproximou e ajudou a outra a colocar o avental. “Se algo errado acontecer, eu sou sua senpai e é minha responsabilidade.”

Sasa colocou a mão sobre a barriga. A morte, mesmo com a intervenção de uma deusa, ainda permanecia.   Entretanto, ela não podia negar que sendo confortada assim por Mami estava ajudando a lhe trazer calma. “Certo... O que eu posso fazer?”

“Você pode fazer as claras em neve.” Mami guiou a sua aprendiza para se aproximar da bancada.

“Ah... Isso precisa de ovos, né?”

Mami ergueu as sobrancelhas. “Sim...”

Sasa olhou para ela, fazendo uma careta. “E precisa quebrar eles, né?”

“Não sabe fazer isso?”

A garota de cabelos castanhos balançou a cabeça.

“Tudo bem. Vamos lavar as mãos na pia que eu te mostro.”

Depois de terem feito isso, Mami colocou um ovo sobre a palma de Sasa. “Segura bem o ovo e dê um golpe leve contra a superfície da bancada e veja se criou um amasso.”

“Assim...?” Sasa acertou o ovo, mas ele continuou intacto.

“Vá colocando um pouco mais de força até conseguir.”

Obedecendo, ela precisou mais duas tentativas. “Amassou, mas é pequeno.”

“Não, está perfeito.” Mami pegou uma vasilha e colocou dentro da pia, depois puxou o braço de Sasa para que a mão com ovo ficasse sobre a vasilha. “Agora precisamos abrir o ovo e colocar apenas clara aqui dentro. Você vai precisar das duas mãos e faça com cuidado. Incline um pouco o ovo, pressione os polegares contra o amasso e puxe as duas partes para separar a casca.”

Após colocar os polegares, Sasa começou a puxar e logo uma rachadura se formou e o ovo se abriu. Isso foi tão de repente, que a surpreendeu. Um pouco da clara escorreu para a vasilha, mas a maioria do conteúdo ainda estava dentro de uma das partes.

E era o que Mami estava examinando. “Muito bem, nenhum pedacinho de casca na clara e a gema não quebrou.”

“O que acontece se a gema quebrar?”

“Se gema se misturar com clara, nós teremos que começar tudo de novo.”

“Vixe...” Sasa olhou para vasilha que ainda precisava encher. “E agora?”

“Eu quero que você derrame gentilmente o conteúdo na palma da sua outra mão.”

Sasa franziu a testa, mas fez o que foi pedido. “Eca...”

“Huhu. Eu acredito que esse é o método mais seguro para você começar.” Mami alcançou um liquidificador. “Deixe a clara escorrer entre os seus dedos e quando terminar coloque a gema nessa outra vasilha aqui. Não se preocupe se ainda houver alguma clara nela.”

“Quantos ovos eu ainda preciso quebrar?”

“Mais uns dois deve ser o bastante. Lave a mão antes de pegar o próximo, não se esqueça de retirar a vasilha da pia antes.”

“Claro...” Não muito feliz, Sasa deixou a gema em sua mão deslizar até a pequena vasilha que Mami havia apontado. Ela ficou observando a outra garota pegar farinha, leite e o açúcar.

A loira parou e trocou olhares. “Eu vou precisar dessas gemas.”

“Ah... Sim! Sim...”

Sasa foi bem devagar, tanto que Mami já tinha terminado de colocar os ingredientes no liquidificador e estava esperando, mas no final havia três gemas em uma vasilha e a clara na outra. “Feito.”

“E sem incidentes. Viu como é fácil?” Mami colocou a gemas no liquidificador e o tampou.

“Com a ajuda da minha querida senpai~...”

Sorrindo, mas sem perder tempo, Mami pegou a vasilha com a clara e despejou o conteúdo em uma vasilha funda de vidro e então trouxe a batedeira. “Eu normalmente bato a clara manualmente, outro dia eu te ensino.”

“Ok.”

Depois de terminar de montar o equipamento e colocar a vasilha, ela explicou, “A clara precisa ficar firme, mas ela não pode passar do ponto. Vamos ligar a batedeira em uma potência baixa e deixe-a trabalhar por um ou dois minutos, depois desligue para eu ver a consistência.”

“Certo!”

E então a cozinha foi tomada pelo som alto do liquidificador e da batedeira.

Sasa ficara tão distraída com a transformação da clara, que quase perdeu a noção do tempo. “EU DESLIGUEI!”

Mami sorriu. “Eu notei, não precisava anunciar.”

“Ah, bem...” Sasa escondeu a face com as mãos.

“Huhu, deixe-me ver...” A expressão de Mami era de decepção. “Nada bom, ainda muito líquido, os ovos ficaram muito tempo fora da geladeira. Vamos precisar de açúcar para estabilizar.”

“Quanto vai precisar?”

Já pegando o pote de açúcar, Mami respondeu a pergunta de Sasa. “Não é algo que tem em receitas, você faz conforme achar melhor.”

“Então isso é uma daquelas coisas que separa as pessoas talentosas das que não são.”

Mami sentiu amargura na conclusão da sua aprendiza, mas ela não procurou um significado por trás daquilo. “Eu diria que é mais tentativa e erro e um pouco de sorte.” Ela virou um pote com cuidado, colocando açúcar na clara.

Sasa olhou com curiosidade para aquela quantidade, era mais açúcar do que ela esperava.

“Pronto.” Mami guardou o açúcar e retornou ao liquidificador. “Você pode aumentar a potência da batedeira agora.”

“Entendi.” Sasa girou o seletor de potência, colocando-o no máximo.

Mami arregalou os olhos. “Sa-”

Era tarde demais, assim que a batedeira foi ligada, a clara de ovo respingou para todas as direções, incluindo a face de Sasa. “AIE!”

O mais rápido que pôde, Mami tirou o plug da tomada, fazendo-o desligar.

“Merda!” Recuando, Sasa passou as mãos nos olhos e então pulou de raiva. “Eu não sirvo pra essas coisas, não dá! Dá tudo errado!” Logo, para a sua surpresa, Mami veio ao seu encontro e a segurou.

“Acalme-se. É normal cometer erros e é minha culpa por não dizer o quanto de potência devia colocar.”

Sasa não estava prestando atenção, a loira estava muito perto. Foi então que ela viu e sentiu o dedo da outra garota deslizar em sua bochecha.

“Além do mais... Há ainda muita clara na vasilha.” Mami lambeu o dedo com a clara parcialmente batida e sorriu. “Doce...”

Sasa ficou sem reação.

Com isso, o sorriso de Mami foi desvanecendo até se tornar uma boca aberta tentando dizer algo. Ela desviou o olhar e, por fim, virou a face. “Eu não devia ter feito isto, desculpe.” Limpando o dedo em seu avental, ela alcançou uma toalha e ofereceu para Sasa. “Aqui.”

“O-Obrigada.” Ela começou a limpar a face, procurando falar algo para quebrar aquele estranho momento, “tomara que não tenha manchado a roupa.”

“Não, eu vi, mas um pouco caiu em seu cabelo.”

“Ai, não!” Sasa esfregou a toalha vigorosamente e depois tentou arrumar o cabelo usando os dedos como um pente.

Mami já havia preparado a batedeira. “Vamos continuar,” ela disse, com um sorriso hesitante.

Sem mais desastres, Sasa observou a clara ganhar volume e ficar esbranquiçada.

Enquanto isso, Mami retirava uma forma redonda do forno, onde havia uma massa assada que ela testou com um palito de dente. Estava no ponto.

Alguns minutos a mais e a batedeira foi desligada. A clara havia adquirido uma textura cremosa, leve, porém firme.

Com pressa, Mami pegou a vasilha e foi derramando o conteúdo dentro do liquidificador, com ajuda de uma colher, até ficar satisfeita.

“Você não vai colocar tudo?” Sasa indagou.

“O resto eu vou usar para o recheio.” Depois de adicionar fermento, Mami ligou o liquidificador. Depois ela untou outra forma redonda para receber a massa misturada.

Enquanto Sasa observava. Tudo estava indo mais rápido com o certo silêncio que havia surgido entre as duas.

Mami colocou a forma no forno. “Agora vou preparar a cobertura e o recheio.”

Sasa a seguiu, vendo ela, em rápidos movimentos, encher uma panela de água para ferver. Não parecia que haveria mais ‘práticas’.

Da geladeira, Mami trouxe um pote transparente contendo uma calda vermelha com pequenos pedaços de fruta.

Sasa as reconheceu. “Cerejas?”

“Uma compota caseira.” Mami alcançou a forma que ela havia retirado anteriormente do forno e colocou a massa assada em um prato ornamentado. Aquela era base do bolo, do qual ela espalhou a clara em neve em cima, então as cerejas e outra camada de clara.

“Mami-senpai, a água...”

“Uhum.” Ela apagou a chama do fogão e pegou uma pequena bacia metálica e colocou sobre a água quente da panela. Ela picou uma grossa barra de chocolate, que caiu na bacia e logo começou a derreter.

Os cheiros doces das cerejas combinado com o chocolate fizeram Sasa salivar.

Mami mexeu um pouco o chocolate com uma colher antes de dizer, “Vai levar ainda alguns minutos até a massa assar. Nós podemos lavar a louça enquanto isso.”

Sasa olhou para pia que estava com pilhas de louça suja. “Nós duas?”

“Eu lavo e você seca.” Mami já abria a torneira.

“Ok...” Com má vontade, Sasa pegou a toalha que a outra garota apontou.

A loira lavava com destreza e velocidade. A visitante mal havia pegado a primeira louça para secar, já havia outra no escorredor.

Sasa tentou imitar aquele ritmo, mas a louça em sua mão continuava molhada em certos pontos. No escorredor agora havia cinco. Em uma mistura de desespero e esperteza, ela tentou distrair Mami. “Por que você não tem uma máquina de lavar louça?”

“Boa pergunta.”

Mami não havia parado como Sasa esperava, mas ao menos desacelerou.

“Eu acho que a minha mãe nunca se interessou em ter uma.” Mami sorriu para si mesma. “Eu e ela lavávamos e secávamos a louça juntas e eram os momentos de longas e boas conversas.”

“Legal...” O escorredor já estava quase cheio quando Sasa pegou a segunda louça para secar.

“Você e sua mãe nunca trabalharam juntas na cozinha?”

“Nah, ela sempre está muito ocupada.” Sasa deu de ombros. Sendo uma preguiçosa inútil.

“Então deveria vir aqui com mais freqüência.” Mami viu que não havia mais espaço no escorredor e pegou uma a toalha para ajudar. “Eu posso ensinar algo fácil. Você poderia impressionar os seus pais.”

Mami Tomoe...

Sasa olhou de relance para a outra garota.

Você é tão boa em tudo. Eu lhe odeio tanto...

Então olhou para o fraco reflexo de si na louça, uma mera sombra.

No entanto, ao mesmo tempo...

“Como vai a escola?”

Sasa estremeceu com a pergunta de Mami. “Escola?”

“Sim. Você não me falou nada sobre essa escola em Kazamino do qual você foi transferida.” Mami sorriu para ela. “Fico feliz que você tenha convencido os seus pais de que não estava gostando de Shirome.”

“Ah é, só tinha lixo lá.” Notando o que acabara de proferir, Sasa tratou de corrigir. “Exceto você, haha.”

“Hmmmm...” Não tão sorridente, Mami voltou focar nas louças. “Está fazendo amigos lá?”

“Na nova escola... é... eu estou me adaptando.” Sasa prendeu a respiração e apertou os lábios.

“Bom. Eu gostaria que você mostrasse fotos do lugar algum dia desses...” Mami foi em direção ao forno. “A massa deve estar assada. Vou tirar para deixar esfriar.”

As duas continuaram a lidar com as louças por mais alguns minutos. Ainda havia uma pilha na pia quando pararam, do qual Mami tratou de cobrir com uma toalha para não deixar à vista.

A nova peça assada de bolo foi colocada sobre a base e o recheio e então tudo foi coberto pelo chocolate derretido.

“Ainda sobrou um pouco da clara,” Sasa comentou.

“Ela vai ser usada.” Mami a colocou dentro de um saco com um tubo fino e ofereceu para a aprendiza. “Pode decorar o bolo para mim? É só apertar gentilmente, eu te mostro por onde começar.”

“C-Certo.”

A decoração do bolo começou em volta da base. Sasa aplicava lentamente a clara em neve, seguindo um padrão de pequenas ondas.

“Você tem jeito para isso.”

“Jura? Eu estou tentando fazer que nem um que eu vi em uma propaganda...”

No topo do bolo, Sasa tentou fazer gotas em forma de espiral. Não obteve sucesso, mas Mami compensou isso colocando cerejas sobre elas. O bolo estava finalmente pronto.

Sasa olhou bem de perto. “Oh... Parece coisa de profissional.”

Sorrindo de satisfação, Mami levou o bolo até a geladeira. “O chocolate precisa endurecer pouco mais.”

Quando notou que no interior da geladeira havia mais bolos, inclusive um cheesecake, Sasa arregalou os olhos. “Você preparou tudo isso para hoje?!”

Mami cruzou os braços, com um sorriso nervoso. “Bem, eu acho que me empolguei.”

“Quando você começou?”

“Eu preparei alguns ingredientes ontem, mas comecei a montar bolos quando o Sol nasceu.”

Sasa não tinha mais o que dizer. Ela tinha perdido a noção do tempo durante o preparo do bolo, mas já havia passado algumas horas depois do meio dia quando havia chegado ao apartamento.

“Nagisa está demorando.” Mami ficou preocupada. “Será que ela ainda está esperando pelo garoto na estação?”

Sasa sorriu. “Ou eles estão aproveitando um tempo a sós.”

Um tanto agressivamente, Mami tirou o avental. “Eu vou tomar um banho.”

Sasa a seguiu até a sala de estar e a viu se apressando pelo corredor dos quartos. “O que posso fazer?”

“Você pode lavar o resto da louça, eu ficaria agradecida.”

“Sem chance que eu vou fazer isso...” Sasa sussurrou para si mesma.

A campainha tocou.

“Ah não! Deve ser a Madoka-san!” Com a toalha e roupas em mãos, Mami correu para o banheiro. “Sasa-san, atenda elas por mim? Há um bule com chá na cozinha.”

Sasa rangeu os dentes. “Droga...” Ela foi até entrada e destrancou a porta, mas ao segurar a maçaneta, sentiu a sua mão fraquejar, mesmo sabendo que não tinha escolha.

“Foda-se.” Ela abriu de uma vez e se deparou com um garoto loiro magro, de olhos vermelhos ansiosos. Vestia simplesmente uma camisa manga curta alaranjada e calça marrom e estava segurando uma caixa de presente relativamente larga.

“É... É uma honra te ver, Mami Tomoe-sama.” Ele se curvou, ofertando a caixa. “Feliz aniversário. Por favor, aceite esse modesto presente.”

Nagisa, que estava ao lado da entrada, quase riu. “Não, Aki! Essa é a Sasa-chan, amiga da Mami.”

Sasa sorriu, mais devido ao alívio que sentia do que daquela gafe. “Então você é o namorado da Nagisa-chan.”

“Bem...” Aki passou a mão na nuca.

Nagisa ficou curiosa. “Mami te contou?”

“Ah sim, ela não quis manter a surpresa.” Sasa fez menção para eles entrarem. “É sua casa.”

Eles entraram no apartamento. Enquanto removia os calçados, Nagia comentou, “você ficou um dengo nesse avental.”

Foi então que Sasa se deu conta. “Ah! Eu já devia ter tirado!”

“Hehehe... Mami fez você trabalhar duro na cozinha, não é?”

“É... Ela está no banho agora.”

Eles foram até a sala de estar, com Sasa liderando o casal, pensativa. O namorado de Nagisa é um garoto comum, não muito esperto. Não entendo o porquê de Mami ficar tão preocupada com esse relacionamento bobinho.

“Você também é uma feiticeira?”  

Ao ouvir a questão do garoto, Sasa se virou com um olhar fixo para ele.

“Aki!” Nagisa puxou o braço dele. “Você não devia perguntar assim! E se ela não fosse uma?”

“D-Desculpe, mas você tinha me dito que haveria outras aqui que nem você e sua tia...”

Ele sabe?! Aquilo instigou o interesse de Sasa. Seria isso? Mami é bem discreta sobre ser uma garota mágica, ela não compartilha nada comigo, mesmo agora ela sabendo que eu sou uma também. Esse garoto ingênuo saber tanto deve incomodar ela. Será que consigo tirar proveito disso? Ela sorriu. “Sim, eu sou uma feiticeira, mas não é algo que a gente fica espalhando por aí.”

“Foi um acidente,” Nagisa disse, sem dar mais detalhes.

“Para mim tanto faz...” Sasa se virou e foi em direção cozinha, com uma maliciosa expressão. Vacilona.

Prestando atenção ao som do chuveiro, a garota de longos cabelos brancos sugeriu ao seu namorado, “Vamos sentar perto da mesa, você pode escolher a almofada.”

“Ok.”

Enquanto isso, Sasa finalmente se desfez do avental. Feiticeira... Soa muito melhor. Kyuubey tem um péssimo gosto. Ela viu o bule com chá que Mami havia mencionado e o casal na sala de estar, com uma idéia em mente. Vamos ver se consigo descobrir algo mais antes que aquela deusa venha.

Sasa voltou para sala, sorridente, pegou uma almofada e sentou-se à mesa triangular de vidro, dizendo, “Você demorou bastante, Nagisa-chan, sua tia já estava preocupada. Foi um contratempo?” Ela ergueu as sobrancelhas. “Ou outra coisa?”

Nagisa e Aki trocaram olhares. Ela respondeu, “Ele estava muito nervoso, pois ele quer impressionar a Mami.”

O garoto assentiu. “Eu não quero estragar tudo ou ela pode me transformar em um sapo ou algo assim.”

Já Nagisa balançou a cabeça. “Eu já lhe disse, ela jamais faria isso.”

“É.” Sasa abriu um sorriso maior. “Transformar alguém em sapo é algo que bruxas fazem. Feiticeiras fritariam você.”

“Sasa-chan!” Nagisa exclamou em tom de reprimenda, “não tente assustá-lo mais com essas brincadeiras. Foi difícil convencer ele a vir...”

O som do chuveiro parou.

“Agora temos que ficar esperando por ela...” Sasa fez uma cara de tédio e suspirou. “Depois que vi tudo o que Mami-senpai preparou, eu fiquei com uma fome.”

Nagisa cruzou os braços sobre a barriga. “O mesmo para mim, hehe.”

“Seu namorado deve estar também e eu acho que ela ainda vai esperar os outros convidados chegarem,”  Sasa olhou para um ponto qualquer, ponderando, “é uma pena que não haja nada pra oferecer enquanto isso.”

“Na verdade.”

Sasa voltou a olhar para ela, aguardando pela resposta esperada.

“Eu sei que Mami preparou um chá.” Nagisa consultou Aki, “Você vai querer? Talvez lhe ajude a relaxar.”

Ele coçou cabeça. “Ehh... Parece ser uma boa idéia.”

“Eu já volto!” Nagisa saiu correndo.

Sasa esperou ela entrar na cozinha, para então fixar o olhar ao garoto que estava no outro lado da mesa.

Aki reagiu com um sorriso, mas suas mãos estavam inquietas.

“Ei,” Sasa sussurrou, com um sorriso inocente e se inclinando para ele, “você é um rapaz de sorte. Nagisa-chan é uma graça, não é?”

Aki enrubesceu e baixou a cabeça. “Ela é uma pessoa incrível, não porque de ela ser uma feiticeira. Desde o dia que eu a conheci, pouco a pouco ela foi se tornando especial para mim.”

Que brega. Sasa continuou a sorrir. “Ah, mas ela deve ter demonstrado alguns truques mágicos pra você. Eu sei de alguns que ela faz, mas eu sou muito curiosa, você consegue descrever pra mim?”

Aki balançou a cabeça. “Ela não me mostrou nenhum feitiço... Eu não sei se a face dela conta.”

Sasa franziu a testa. “A face dela?”

“O que vocês estão conversando?” Nagisa veio com uma bandeja contendo um conjunto para chá.

Droga, ela rápida e eficiente que nem a Mami. Eu devia ter colocado o bule em um lugar difícil de ver. Sasa respondeu, “Seu namorado estava me contando sobre o quão incrível e especial você é.”

“Esse é mínimo que ele tem que dizer sobre mim, ou será eu que irei transformá-lo em um sapo,” Nagisa disse brincando.

Aki sorriu. “Por favor, seja gentil... hehehe...”

“Mas chega de falar sobre magia, certo?” Nagisa distribuiu o bule, os pires e as xícaras na mesa. “É chá preto, eu não sei se você tem alguma preferência, Aki.”

Vendo-a pôr o líquido fumegante em sua xícara, Aki se curvou em agradecimento. “É parecido com café, né? Lá em casa estamos acostumados com-”

Com o súbito silêncio, Nagisa notou que seu namorado estava olhando para outra direção.

Sasa também havia percebido isso e ela ouviu passos.

Mami estava vindo pelo corredor. O cabelo arrumado, com seu costumeiro grande par de cachos. Estava vestindo uma camisa manga longa com botões. O tecido amarelado era visivelmente leve e de qualidade, como era de se esperar da seda pura. A saia sobre a camisa era marrom e longa, abaixo dos joelhos, contratando com um tecido mais pesado. Como detalhe especial, ela usava uma laço rosa como se fosse um cinto, com um glamoroso amarro no lado direito.

Sasa estava mais curiosa do que impressionada. Aonde ela vai com essa roupa? Pra uma entrevista de emprego?

Aki se levantou e rapidamente se aproximou da loira. Em um movimento robótico, de tão bem ensaiado, ele se curvou para ela e ofereceu a caixa.

Mami recuou um pouco com aquela surpresa.

“É uma honra te ver, Mami Tomoe-sama. Feliz aniversário. Por favor, aceite esse modesto presente.”

Nagisa se esforçava para não esconder a face.

Já Sasa estava curtindo a vergonha alheia. Garoto, você realmente gosta de forçar a barra.

Mami pegou a caixa. “É um prazer conhecê-lo também, Aki Hidaka-san.”

“Você é exatamente o que eu imaginava ser.”

Mami ficou curiosa.

Ele ergueu um pouco cabeça, olhando para ela. “Alguém de uma beleza estonteante e madura.”

Sasa fez uma careta. Vixe, você acabou de chamá-la de velhaca.

“Hmmm...” Mami sorriu, acariciando o cabelo um tanto desajustado do menino. “Você não precisa ser tão formal comigo.”

Aki se ergueu rapidamente. “Ah... desculpe.”

“Não!” Ela gesticulou. “Sem problema.”

Nagisa decidiu pôr um fim naquela situação embaraçosa. “Mami, você vai abrir o presente?”

“Ah, sim, sim!” Ela desatou o laço que prendia a tampa. “Vamos ver... oh.” De dentro da caixa, ela retirou um xale branco com bordados de flores laranja. “É bonito. O que você acha, Sasa-san?”

“É perfeito!” ela exclamou. Para completar o seu visual de vovózinha.

Mami perguntou para Aki, “Foi idéia da Nagisa, não foi?”

“Como você sabe?”

“Um palpite...” Ela trocou olhares com a sua pupila, que respondeu com um sorriso tímido. “Eu estou muito agradecida por esse presente.”

Em um exalo de alívio, Aki se curvou mais uma vez antes de retornar para o seu local à mesa.

Mami colocou o presente junto com o outro muito menor na cômoda e depois se sentou em uma almofada. Todos então aproveitaram o chá preparado com carinho.

Sasa era a exceção, em parte, pois a ansiedade incomodava. “Elas realmente vêm?”

Degustando o chá sem pressa, Mami respondeu, “Se aconteceu alguma coisa, Madoka-san ligaria para mim.”

Aki perguntou, “Quantas feiticeiras virão?”

Para o incômodo de Nagisa. “Eu disse que chega! Eu não quero ouvir você falando sobre isso.”

“Desculpe, eu pensei que aqui eu poderia...” Ele forçou um sorriso, admitindo a culpa. “Eu estou muito curioso e essa seria uma oportunidade... Tipo, na ficção, magia é algo que precisa de muita dedicação e tempo para aprender. Contudo, vocês são jovens, Nagisa tem a minha idade e... é...”

Compreendendo aonde ele queria chegar, Sasa sorriu e semicerrou o olhar. “Você quer aprender magia?”

Ele ficou sem palavras.

“Você quer ser um de nós?”

Nagisa ficou boquiaberta. “Aki...”

Calma e serena, Mami olhou para ele e afirmou, “Você não pode aprender.”

Ele abaixou a cabeça e suspirou. “Entendo... É proibido...”

“Não é isso.” Mami fechou os olhos e levou a mão esquerda ao peito. “Não é algo que se aprende. O destino fez cada uma de nós fazer uma escolha e nossa magia é conseqüência disso.”

“Ah...” Ele assentiu. “Isso deve ter haver com a lei dos ciclos.”

Sasa franziu as sobrancelhas. “Lei dos ciclos?”

“Sim, Sasa-san.” Mami sorriu. “Do que ele está falando? Sabe de alguma coisa, Nagisa?”

Ela sorriu também e deu de ombro. “Eu não tenho idéia.”

“Haha...” Aki balançou a cabeça. “Entendi...”

Quem não tinha entendido nada era Sasa. Que diabos é essa lei dos ciclos? Deve ter relação com aquela deusa. Parece suspeito...

E a campainha tocou.

“Ah, deve ser elas.” Mami se levantou e foi até a entrada.

Quando a porta se abriu, Madoka logo cumprimentou, “Whoa... Mami-san, você está tão chique! Não é, Homura?”

A garota que a acompanhava, com o seu calmo olhar violeta, respondeu, “Tem razão, mas isso não me surpreende.”

Madoka estava usando um arco branco em seu longo cabelo rosa. Contudo, diferente de Homura, seu cabelo não era tão liso, o que dava um ar de rebeldia e despojamento. Parecia que Madoka sabia disso, tanto que estava vestindo uma jaqueta jeans aberta sobre uma blusa rosa clara, calça preta e tênis.

Homura mantinha um visual sem surpresas. Um blazer de corte reto branco com bordas pretas e uma vestido de saia justa cinza. A meia calça era preta e sapatos roxos.

E cada uma carregava uma caixa de presente.

“Eu fico lisonjeada.” Mami assentiu. “Vamos entrando.”

Depois de deixarem os calçados na entrada, elas seguiram a loira até onde estavam os outros.

Lá vamos nós. Sasa tentava conter seu nervosismo.

“Oiii!” Madoka acenou com mão. . “Nagisa-chan! Sasa-chan! Aki-san!”

“Oiii!” Nagisa imitou o cumprimento.

Aki foi mais comedido. “Bom te ver, senpai.”

Sasa sorriu, se preocupando em fazê-lo parecer legítimo, porém, ao notar o olhar atento de Homura, ela ergueu mão. “MAAAADOOOKAAA-CHHAAAANNN!”

Mami se assustou com aquele súbito cumprimento.

“Feliz aniversário!” Madoka ofereceu o presente.

“Feliz aniversário.” Homura também. “Mami-san.”

“Ah...” Retornando a atenção para elas, Mami segurou as duas caixas.

“Nós estávamos pensando em comprar um presente juntas,” Madoka comentou, “mas ficamos na dúvida, então cada uma trouxe um.”

“Bem, eu não tenho nada contra isso... huhu.” Mesmo com as mãos tão ocupadas, Mami conseguiu abrir o presente da Madoka. Era um par de botas de cano longo.

“Você sempre fica elegante neles, hihi.”

“Creio que seja verdade. Obrigada.” Mami prosseguiu em abrir a caixa de Homura. O conteúdo era algo que ela não esperava, um livro de capa preta, com título escrito com letras douradas.

Nunca mais

“Eu li esse livro quando eu estava estudando em Tóquio,” Homura disse, abaixando o olhar, “é sobre amizade e reconciliação. Naquela época eu não havia entendido o que estava escrito nele, mas não tenho dúvidas que você irá.”

Mami sorriu, sentindo certa ironia naquilo. “Você não tem dúvidas, enquanto eu sinto que estou cheia delas. Tomei decisões que eu mesma não compreendo porquê.” Ela fechou caixa. “Muito obrigada. Esse livro pode ajudar.” Então ela arregalou os olhos. “Ah! Isso fez me lembrar... Eu sempre esqueço quando vocês me visitam.” Com pressa, ela deixou os presentes junto com outros e foi ao quarto.

Para curiosidade de todos, exceto para Nagisa, que agora também se lembrava do que seria.

Mami logo retornou com um caderno. Ele estava muito danificado, com a capa rasgada.

Mesmo assim, Madoka o reconheceu. Em uma mistura de estupefação e alegria, ela se aproximou recebê-lo.

“Eu o encontrei quando estava fazendo faxina de ano novo no apartamento. Ele estava atrás de uma cômoda,” Mami falou, olhando por um momento para Aki, “ele deve ter parado ali quando ocorreu aquela grande tempestade na cidade, a janelas daqui haviam quebrado e o vento revirou tudo, mas eu não me lembro de você tê-lo deixado aqui.”

“Sim, eu o deixei aqui em um dia em que você não estava...” Madoka folheou as páginas amassadas até encontrar uma série de desenhos. Era Mami, Homura e ela mesma, vestindo os seus respectivos uniformes de garota mágica.

“É por isso que eu soube que o caderno era seu,” Mami comentou.

“Hihi...” Madoka ficou vermelha.

“Você... me desenhou?”

Porém ela logo ficou pálida ao ouvir Homura atrás dela. “Sim, mas meus traços nunca foram muito bons.”

“O que posso ver é que você caprichou,” Homura respondeu.

Mami cruzou os braços, sorrindo e assentido. “Eu me lembro de ter dito mesma coisa.”

Madoka abraçou o caderno aberto em seu peito. “Os sentimentos que eu tinha quando fiz isso eu pude senti-los novamente. Eu não sei como expressar a gratidão que estou tendo.”

“Huhuhu... Eu acho que saboreando o que preparei para nós já está bom.” Mami fez menção que iria até a cozinha. “Não há espaço na mesa para tudo, então vou colocar comida nas bancadas, junto com os pratos e talheres, e vocês se servem lá.”

Madoka perguntou, “Você não vai esperar por mais ninguém?”

Mami estava quase certa de quem ela se referia. “Eu recebi uma mensagem da Kyouko ontem. Ela e Miki-san estão perseguindo uma bruxa, mas parece que ela é muito elusiva. Mesmo se elas conseguirem derrotá-la, elas ainda estariam longe de Mitakihara e só poderiam vir semana que vem.”

“Estranho...” Madoka pegou o seu smartphone. “Sayaka-chan não me mandou nenhuma mensagem a respeito disso.”

“Ela deve estar ocupada atrás dessa bruxa. Se eu estivesse no lugar delas, eu estaria fazendo mesmo.” Mami foi para cozinha, seguida por Madoka. “Sasa-san, poderia me ajudar na colocação da comida?”

“Tadah!” Sasa ficou de pé em um pulo. “Eu estou sempre pronta pra ajudar a minha melhor amiga e a amiga próxima da minha melhor amiga!”

Enquanto três deixavam a sala, Homura se virou.

Ela tinha outro objetivo em mente.

Deixando o pires e a xícara vazia sobre a mesa, Aki notou que a garota de longos cabelos negros estava vindo diretamente a ele.

Nagia também estava um tanto surpresa, vendo que ela havia parado na frente dele.

Aki se levantou, sorrindo. “Ahn... Nós não cumprimentamos você.” Ele se curvou. “Eu estou honrado em ter sido convidado a essa festa com a sua presença, senpai.”

Homura não reagiu, mantendo um olhar impassivo nele.

Aki se ergueu, agora mais preocupado. “T-Talvez você não esteja tão honrada em me ver...”

“Aki Hidaka-san.” Homura pendeu a cabeça para o lado, sua voz era fria. “Você está pisando um território perigoso. Esteja certo disso, pois as aparências enganam. Um passo em falso e a sua existência, da sua família e tudo aquilo que você ama, estará ameaçada.” Ela então se virou e se afastou.

Catatônico, Aki engoliu seco.

Nagisa tocou a perna dele para chamar a atenção. “Não fique assustado, Homura-chan é assim mesmo. Ela está exagerando um pouco.”

Aki olhou para ela com olhos bem abertos. “U-Um... pouco?” Então sentiu uma sombra. “Ah!”

Homura estava novamente na frente dele. “Além disso, eu peço a você que não se torne um garoto mágico.”

“Garoto mágico?” Ele franziu a testa. “É... eu já sei disso... nada de magia.”

“Se isso fosse possível, eu não permitiria,” Nagisa afirmou, “se caso isso acontecesse, eu terminaria com ele no mesmo instante.”

O garoto abaixou olhar, segurando suas mãos tensas. “Mesmo se fosse para salvar você?”

“Mesmo assim,” Nagisa deu uma resposta seca, consultando a outra garota.

Homura revelou um sutil sorriso.

A voz melodiosa de Mami veio da cozinha. “Venham~ , há comida para todos~!”

E assim se sucedeu. Cada um voltou para sala de estar com um prato com pedaço de bolo e outros quitutes. No caso de Aki, ele trouxe um com cheesecake por insistência de Nagisa.

Quando Mami estava prestes a sentar à mesa de vidro, Madoka chamou-lhe a atenção, “Espere, nós precisamos cantar os parabéns!”

“Oh, não precisa disso tud-”

Madoka bateu palmas. “Parabéns para você! Nesta data querida~”

E os outros a seguiram a canção, batendo palmas também.

Mami ficou sem saber o que fazer com as mãos, envergonhada e ao mesmo tempo cheia de alegria.

Quando a canção terminou, as palmas ficaram mais intensas. Madoka exclamou, “Parabéns, Mami-san!”

Homura foi mais quieta. “Longa vida para Mami-san.”

“Parabéns por mais um ano de vida, minha querida senpai! Hahaa!” Sasa jogou os braços para o alto. E agora nós podemos comer, ao menos algo de bom nisso tudo.

Mami passou o dedo nos olhos marejados. “Obrigada a todos vocês.”

“Vamos comer!” Nagisa anunciou.

Todos se curvaram para a mesa com a comida e se sentaram para comer.

“Hmmm... Esse cheesecake que você fez está muito bom.”

Com um ar de surpresa, Nagisa questionou Aki, “Como sabe que fui eu?”

Ele ergueu a sobrancelha. “Você estava tentando esconder isso?”

Ela forçou um sorriso. “Eh... Eu acho que não...”

Madoka comentou, “Esses bolos estão divinos, Mami-san.”

A loira respondeu, “Estou feliz em ouvir isso.”

“E como você está em Shirome?” Madoka continuou.

Dessa vez, Mami trocou olhares com ela por um breve momento. “Tudo está indo bem. É uma rotina mais estrita, mas eu já me acostumei. As minhas colegas estão compenetradas nos estudos e não há muitas oportunidades para interagir, mas eu creio que seja melhor assim.”

“Com certeza é melhor assim.” Sasa se intrometeu. “Lá só tem gente da pior espécie.”

Nagisa e Aki pararam de comer ao ouvir aquilo.

Um tanto incomodada com jeito que ela falou, Mami suspirou e disse, “Lá há muitas pessoas vindas de famílias importantes e você pode ser julgada por isso.”

“Eu sei como é.” Homura continuava comendo o seu pedaço de bolo com chocolate e cerejas.

“Isso é terrível!” Nagisa ficou pasma. “Você devia voltar para escola de Mitakihara.”

Mami sorriu. “Eu já me acostumei. É como eu disse, há tanto para estudar que não sobra tempo para eles ficarem fazendo isso.”

Sasa deu um sorrisinho, vendo a oportunidade sutil de por lenha na fogueira. “Eu cai fora de lá por causa disso. Agora eu estou muito mais feliz estudando em Kazamino.”

[Você não está estudando em lugar algum.]

Reconhecendo a voz, Sasa olhou em um rápido relance para Homura. A garota continuava desfrutando de seu bolo, no entanto Madoka estava olhando para ela, como se também já soubesse.

“Bem...” Sasa continuou sorrindo. “Mas a minha senpai é muito corajosa e ela também tem uma postura de alguém da alta classe... Isso a ajuda a se misturar com os outros estudantes.”

“Isso mesmo.” Mami assentiu. “Eu até devo dizer que fiquei curiosa com o novo prédio que estão construindo na escola de Mitakihara. Parece que vai haver uma infraestrutura comparável com as escolas de ensino médio em Tóquio, talvez Homura-san possa ter uma idéia melhor desse assunto...”

Notando que fora incluída na conversa, ela respondeu, “Desculpe, não tenho.”

“Você vai continuar morando em Mitakihara,” Mami comentou, “o lugar onde você morava foi reconstruído e você deixou a casa da Madoka-san recentemente. Quer ajuda em alguma coisa? Talvez na decoração.”

“Não, tudo está bem,” Homura deu uma resposta, sem trocar olhares.

Mami sorriu educadamente, com um toque de desapontamento. A reaproximação seria um longo caminho.

Depois de terminar de comer, Aki se levantou.

“Oh, você pode se servir mais se quiser,” Mami falou.

O garotou hesitou antes de dizer, “Eu preciso ir.”

Antes de qualquer pergunta ser feita, Nagisa se levantou. também. “Essa foi a condição que a família dele impôs para ele poder ir sozinho em uma festa com estranhos.”

“Eu peço perdão,” ele complementou, “mas eles ficaram temerosos quando souberam que Nagisa não tem pais e vive com a tia.”

Mami sorriu. “Entendo.”

“Talvez eles mudem de idéia se conhecer você pessoalmente.”

“Ahn...” Mami ergueu as sobrancelhas. “Nós podemos arranjar isso”

Nagisa disse, “Vamos, antes que eles comecem a ligar.”

“Claro.”

O casal segurou as mãos e foram até a saída.

Mami viu aquela cena sem piscar os olhos.

Aki acenou para quem ficava. “Tchau! Foi legal em conhecer mais feiticeiras.”

Nagisa deu um cutucão nele. “Tchau tchau, logo eu estarei de volta.”

“Tchau para vocês!”

Quando a porta se fechou, veio silêncio seguido de uma risadinha.

“Kukufufufu...” Sasa não se conteve. “’Logo eu estarei de volta’.”

Mami ficou cabisbaixa. “Ah, nem me fala...”

“Eles formam um casal fofo.” Madoka olhou para Homura. “Não acha?”

Ela assentiu lentamente, ponderando, “Eu sinto que há algo entre os dois, algo que eles construíram. Eu acho que vai durar.”

“Espero que sim.” Mami suspirou. “Eu não quero ver Nagisa devastada e perder a fé no amor. Ela também não estaria perdendo um pouco da humanidade dela?”

“Do que você tá falando?” Sasa fez uma careta e sorriu. “Você está exagerando, senpai~.”

A campainha tocou.

Surpreendendo a garota baixinha de cabelos castanhos. “Ela já voltou?”

“Não, Nagisa não usaria a campainha...” Mami se levantou e foi até a porta, sussurrando para si mesma, “Seriam elas? Mas elas me disseram que viriam mais tarde...”

Quando a porta abriu, duas garotas vestindo roupas de viajante anunciaram. “SURPRESA!”

Os olhos de Mami arregalaram-se.

“Bwahahaha! Olha a cara que ela ficou.” Kyouko foi logo entrando no apartamento.

“Desculpe, Mami-san, foi idéia dela de mentir pra você. Nós já estamos em Mitakihara desde ontem.” Sayaka mostrou uma caixa de bombons. “Feliz aniversário. Eu queria dar algo melhor, mas estamos com o dinheiro curto.”

Atônita, Mami recebeu o presente sem dizer nada.

“Eu disse pra Sayaka que não faz sentido comprar um presente pra você com o seu dinheiro, Mami. Heh, ainda mais algo que se dá no dia dos namorados.” Kyouko se livrou de seus calçados e olhou para a sua companheira. “Tu vem ou não?”

“Com licença.” Sayaka entrou e logo disse, incomodada, “Você nem devia falar nada, já que fica comprando chocolate aqui e acolá. Se a gente tivesse mais dinheiro, daria até pra comprar roupas novas pra hoje, olha como Mami-san está bem vestida.”

“Nem vem com essa! Se a gente fosse procurar roupa, enm daria tempo de vir aqui. Você quer experimentar a loja toda!”

Ignorando as duas que estavam se debicando, Mami estava com uma cara de enterro enquanto fechava a porta lentamente.

“Tá brincando né?! Eu me esforço um monte pra convencer você a provar uma peça de roupa e você já quer fugir! Nunca vi alguém ter tanta vergonha... de...” Sayaka, contudo, notou o estado da anfitriã. “Mami-san? Tem algo errado? Você tá pálida.”

“Oi?” Mami saiu do transe e começou a mostrar um sorriso tímido. “Não... não... É a surpresa.”

“Eu te falei que esse plano iria funcionar, Sayaka.” Kyouko então disse para a loira, “a propósito, feliz décimo sexto aniversário.”

Mami fechou os olhos. “Décimo sétimo...”

“Eita...” A ruiva mexeu no seu longo rabo de cavalo. “O tempo passou, hein? É por isso que tu tá vestida assim?”

A face de Mami ficou mais tensa. “O que você quer dizer com isso?”

“Haha! Deve ser alguma brincadeira boba.” Sayaka empurrou Kyouko para a sala de estar. “Estou ansiosa em ver as outras.”

Da mesa, Madoka foi a primeira a cumprimentar, “Sayaka-chan! Kyouko-chan! Eu sabia que vocês viriam.”

A garota de cabelos azuis ficou um tanto surpresa, tanto com o visual de sua amiga como a forma que ela havia afirmado. “L-Literalmente? Ou... talvez você ficou desconfiada que eu não mandei uma mensagem.”

“Vocês não mudaram muito, depois de todo esse tempo,” Homura disse.

“Ah é?” Kyouko deu um sorrisinho. “E você não mudou nada, heh.”

Homura sorveu um pouco de chá, a xícara escondendo o seu sorriso.

Sasa se levantou.

Foi então que Sayaka a notou. “Ah, nós temos uma nova garota mágica. Olá...”

Dando um passo para trás, com uma expressão aterrorizada, Sasa proferiu em meio a um arquejo, “A diaba escarlate...”

“Diaba escarlate?” Mami franziu a testa, mas não chegou a questionar mais ao ver Kyouko se aproximar da garota.

A ruiva estava com um sorriso confiante. “Então você é de Kazamino.”

Sasa nada disse enquanto buscava se recompor.

“Hummm...” Kyouko a examinou da cabeça aos pés. “Seu nome.”

“Sasa Yuuki.”

“Sasa, é?” O sorriso dela se foi. “Eu não me lembro de ter cruzado caminho contigo naquela época.”

A garota baixinha voltou a ficar tensa. “Eu ouvi histórias sobre você...”

Kyouko fez uma cara de cansada. “Não vai me dizer que você fazia parte daquele grupo de garotas mágicas que viviam me incomodando. Tentando me convidar com baboseiras como ‘união faz a força’ enquanto brigavam entre si por sementes.”

“Eu não era desse grupo.” Sasa desviou o olhar. “Elas também ficavam me incomodando.”

“Tinha outra garota mágica também. Uma que eu apenas ouvi falar daquele grupo, elas até pediram a minha ajuda. Tch...” Kyouko ficou mais séria. “Parece que essa garota podia controlar bruxas e matava pessoas pra alimentá-las.”

Sasa prendeu a respiração.

“O que disse?!” Mami ficou boquiaberta. “H-Havia alguém fazendo isso em Kazamino?”

“Pode apostar que sim.” Os olhos vermelhos não escondiam a indignação crescente. “Eu até sei que se deixar os lacaios fazerem vítimas, eles podem virar bruxas e assim você pode conseguir mais sementes, mas tratar bruxas como animais de estimação? Isso é uma puta loucura!”

Sasa tentou sorrir. “Eu... Eu tinha me tornado uma garota mágica recentemente e ouvi sobre ela também. Se metade das histórias for verdade, você teve sorte de não ter ficado no caminho dela.”

“Sorte?!” Kyouko ergueu a cabeça e abriu a boca em um riso. “Hah! Se eu a tivesse encontrado, eu teria ganhado na loteria. Eu teria um monte de sementes depois de destruir completamente ela e seus ‘bichinhos’.”

Ainda mantendo um sorriso, Sasa cerrou os punhos. “Eu não teria tanta certeza.”

Kyouko semicerrou o olhar. “É...? O que ti faz pensar assim?”

Sasa desviou os olhos e deu de ombros. “Como eu disse, eu ouvi histórias. Sabe aquele grupo? Elas perderam alguns membros ao tentarem lutar contra essa garota. O que fazia você, uma loba solitária pelo o que eu soube, ter uma chance melhor?”

“Tch, não me compare com aquelas hipócritas.” Kyouko então olhou para Madoka. “Ei deusa rosa, você por acaso resgatou essa garota de que tamo falando?”

Ela assentiu. “Sim, eu salvei a vida dela.”

Se ela contar... Sasa cerrou o punho esquerdo ainda mais, pronta para quebrar a janela e fugir.

Kyouko franziu as sobrancelhas em um semblante frustrado e confuso. “Sérião, é difícil de entender.”

Madoka juntou as mãos em seu peito e fechou os olhos. “Eu sei o desejo dela e o que a levou a fazê-lo. Ela sentiu que havia uma injustiça em seu mundo e não tentou mudar, não tinha fé nisso, mas tentou compensar de alguma forma.”

Compensar. A ansiedade de Sasa em agir desvaneceu.

Esse era o seu desejo. Punir, punir todos que fossem melhores do que ela, para assim ter uma chance na vida, mas isso a fazia ser melhor do que eles? Nunca, nunca teve fé em si mesma. Nunca mudou.

Ela cerrou a mandíbula e fechou os olhos, ou uma eventual lágrima a denunciaria.

“Egoísta ou não, por pior que seja o resultado de um desejo, eu não estou em posição de condená-lo.”

“Então tá.” Kyouko assentiu e retornou a sua atenção para a outra garota. “Sasa.”

Ela abriu olhos lentamente, temendo que eles estivessem avermelhados. “Sim.” Então recebeu um tapinha no ombro.

“Bem vinda ao time.” Kyouko olhou para trás. “Mami, não dá mais pra chamar de Holy Quintet, né?”

Ainda um tanto abalada com o assunto anterior, a loira coçou a têmpora. “Bem...”

E Sasa ficou completamente confusa. “Holy quintet?

“Esquece.” Kyouko abriu um sorriso. “Só diz aí se podemos contar contigo.”

“Contar comigo?” Sasa balançou cabeça. “Eu não sei, eu sou fraca.”

“Besteira, não existem garotas mágicas fracas, só as idiotas e as que não são.” Kyouko apontou para a Sayaka. “Tá vendo aquela ali? Ela é uma dessas idiotas.”

Sayaka prontamente puxou o rabo de cavalo vermelho. “Ao menos eu amadureci, ao contrário de você!”

“Qual é! Não sabe encarar numa boa?”

“Hmmm...” Vendo as duas se brigando, Sasa saiu. “Eu vou pegar mais bolo.”

“Opa, valeu por lembrar disso.” Kyouko olhou para mesa. “Onde tá os pratos, Mami?”

“Na cozinha, eu vou prepará-los e trazê-los para vocês duas.”

“Obrigada, Mami-san.” Sayaka agradeceu.

Assim como Kyouko. “Brigadão!”

Madoka se levantou. “Vocês têm fotos novas para mostrar?”

“Eu acho que tenho algumas.” Sayaka soltou Kyouko.

Enquanto as duas velhas amigas começaram a conversar em um canto da sala, a ruiva se jogou no sofá. “Ah... Estranho.”

Homura, que ainda estava sentada à mesa, perguntou, “O que foi?”

Kyouko pôs o braço sobre os olhos. “Estou me sentindo em casa.”

Homura franziu a testa. “Talvez seja por isso que não esteja agindo com os devidos modos no aniversário da Mami-san.”

“’Mami-san’? Hmmm...” Kyouko sorriu. “Nem, ela iria achar que havia algo errado se fosse o contrário.”

Sayaka mostrou na tela do smartphone. “Essa é a torre do relógio de Sapporo.”

“Ah, a velha Sapporo.” A expressão de nostalgia de Madoka passou a ser de curiosidade ao notar como a outra estava olhando para ela.

“Desculpe, haha.” Sayaka pôs a mão atrás da cabeça. “Eu já te vi com um cabelo mais longo que isso, mas nunca sem os laços. Até parece que você está tentando copiar o visual de certa pessoa.”

“Wehihi.” Madoka puxou as madeixas. “O meu cabelo não chega nem perto comparado ao dela. Você também deixou o seu cabelo crescer um pouco.”

“Não por que eu quis.” Sayaka olhou para garota no sofá. “É porque tem uma pessoa que acha que ir ao cabeleireiro é uma besteira.”

Kyouko continuava com o braço sobre os olhos. “Um desperdício de dinheiro, depois fica falando de mim. Por que não o deixa crescer?”

“Por que eu gosto dele assim. O que é difícil para você entender?”

Ignorando a pergunta, Kyouko retrucou, “Todas nós estamos de cabelo longo. Só você aí que tá querendo ser a do contra.”

“O quê?” Não acreditando no que acabara de ouvir, Sayaka afirmou, “Mami-san também tem cabelo curto.”

“Haha, não. Não me insulte com essa. Nunca viu ela de cabelo solto?”

Sayaka ficou emburrada, mas ao ver quem estava voltando, sua face brilhou. “Ah! Yuuki-san tem cabelo curto!”

Sasa parou, tentando entender o que isso significava. “Sim, eu tenho.”

Mami também veio, perguntando, “O que voc-”

“Ela não conta,” Kyouko disse.

“Como assim?!” Sayaka pôs as mãos na cintura e sorriu, confiante de que tinha a razão. “Não foi você mesma que disse que ela faz parte do nosso time?”

“Recém chegadas não contam.”

“Não vem com essa!” Ela vociferou.

Depois de um bocejo, Kyouko falou, “Sayaka, una-se a raça mestra dos cabelos longos.”

“Não!”

Mami suspirou e colocou os pratos na mesa, dizendo para Sasa. “Vamos comer...”

Kyouko pulou do sofá direto para a mesa. “Sim, vamos comer!”

Deixada no vácuo, Sayaka rangeu os dentes.

Madoka buscou aliviar a situação. “Ela está brincando.”

Ela respirou fundo. “Ela está sendo atrevida demais hoje.”

“Deve ser porque ela está muito feliz por estar aqui.”

“Eu vou acreditar nisso, ela estava bem ansiosa antes da gente chegar.” Sayaka chegou mais perto de Madoka. “Mas, sobre o seu cabelo, eu queria te perguntar uma coisa.”

A garota rosa ergueu as sobrancelhas quando a outra sussurrou em seu ouvido.

“Aquela doida não te fez uma lavagem cerebral? Ou, sei lá, tentou arrancar um pedaço de você ou algo assim.”

Madoka conteve um riso e balançou a cabeça. “Não, não... Ela está melhor agora. Aliás, eu visitei a casa reconstruída dela. Sabia que ela já fez uma reforma no porão?”

“Legal...” Sayaka franziu a testa um pouco.

“Ela me mostrou. Tem uma cama e cadeiras com bichinhos de pelúcia e ela colocou um papel rosa claro. Ela me disse que fez isso para que eu me sentisse em meu quarto.”

Sayaka paralisou, nem sendo capaz de balbuciar uma palavra.

Madoka pôs a mão na boca e ficou vermelha, se esforçando para não rir.

A outra exalou em alívio. “I-Isso não foi engraçado!”

“Eu ouvi ‘porão’?” Homura se aproximou.

“Não é nada,” Sayaka respondeu prontamente.

No entanto, Homura semicerrou o olhar.

A garota azul ficou toda tensa.

“Sayaka Miki.” A voz de Homura foi ficando mais fria e ameaçadora. “Se está planejando seqüestrar Madoka de mim...”

“O QUÊÊÊ?! Bilolou de vez? E Madoka não é su-” Sayaka parou com um ar de surpresa. Homura sorriu, mas seu olhar não continha desdém ou malícia, era simplesmente... normal.

Seus olhos violetas abaixaram. “Ainda é tão fácil de provocar você.”

“Homuuu...” Madoka encostou a cabeça no ombro dela. “Você não devia ser tão cruel com ela.”

O que aconteceu entre essas duas? Sayaka bufou e sorriu. “Ok, isso tá ficando ridículo.” Ela mostrou as mãos, com os dedos movendo-se freneticamente. “É hora de punir. Hehe.”

Madoka arregalou os olhos. “Você não vai fazer...”

“Eu vou! IIAAHH!” Sayaka avançou, tentando alcançar a barriga da outra garota.

“Não!” Madoka evitou e as duas começaram a correr envolta de Homura, que não sabia o que fazer.

Sayaka anunciou com uma voz mais grave. “Sua barriga é minha! Uahahaa...” 

Madoka usou Homura como um escudo. “Me proteja!”

“Claro. Miki-san, pareeaaAAHHH!” Homura se contorceu ao receber cutucões na barriga.

“Você também é sensível aqui.” Sayaka começou a fazer cócegas. “Encontrei o seu ponto fraco, transferida.”

Homura segurou os braços de sua torturadora para impedi-la. “Eu posso agüentar isso.” No entanto, outro par de mãos continuou as cócegas.

“Wehihihihi...”

“M-Mado... Ahhh?!” Homura se contorceu novamente. “Haha, não, pare! Ahh!”

Sayaka aproveitou a oportunidade. “Ataque duplo!”

Homura acabou perdendo o equilíbrio e as três garotas foram ao chão. Ela se debatia, usando os braços e as pernas para se proteger, mas as mãos de Sayaka e Madoka sempre conseguiam encontrar uma brecha.

“Cosquinha! Cosquinha! Cosquinha!”

“Hahaha! P-P-Por favor! Haha! P-Pahahra! HahaHA!”

Testemunhando aquela cena inusitada, Kyouko balançou a cabeça. “Bando de criançolas...”

Mami optou por apenas sorrir e sorver chá.

Já Sasa via ali uma oportunidade de ouro. Ela sussurrou. “Mami-senpai.”

“Hã?”

“Eu me lembrei que tem ônibus partindo para Kazamino logo.” Ela se levantou. “Eu quero chegar lá antes do anoitecer, desculpe por não poder ficar mais.”

“Ah não! Eu estou muito agradecida pela sua presença.” Mami também ficou de pé. “Deixe-me acompanhar você até a saída.”

“Ei,” Kyouko falou, ainda com resquícios de bolo na boca, “vê se não faz cagada lá em Kazamino, hein?”

“Tohtaahh!” Sasa fez uma pose rápida. “Deixe comigo, Kyouko-senpai~!”

Vendo as duas indo em direção a porta, a ruiva franziu o cenho, dizendo para si mesma, “’Kyouko-senpai’... mas que diabos?”

As cócegas e os risos chegaram ao fim e as garota se levantaram. Homura foi a última, ela ajeitou o blazer e jogou os cabelos para trás, suas mechas abrindo como um leque. “Vocês me pegaram de guarda baixa, mas eu terei a minha vez.”

“Hmmm...” Sayaka fechou um olho e deu um sorrisinho. “Eu acho que você vai ter que tentar muitas, muitas, muitas vezes pra conseguir.”

Madoka notou que Mami estava voltando. “Aconteceu algo?”

“Eu estava me despedindo de Sasa-san.”

Homura olhou para ela e disse com uma súbita frieza, “Ah sim...”

Mami ficou surpresa com aquela reação.

Madoka fez uma cara triste. “Uma pena que não pude me despedir. Eu mal conversei com ela.”

“Pois é, eu também,” Sayaka concordou, “você realmente consegue ver que ela é uma garota legal.”

“E ainda novata.” Kyouko sorriu. “Me faz lembrar de alguém.”

Sayaka olhou para ela com suspeita, cruzando os braços. “Ah é? E quem seria?”

“Você é legal, não é, Sayaka?” A ruiva deu uma piscadela. “E aí? Vem comer ou não?”

Sayaka foi à mesa, enquanto Madoka e Homura preferiram o sofá.

Kyouko foi e voltou da cozinha, trazendo mais comida em seu prato. “Festas são feitas pra aproveitar, heh.”

Mami anunciou, “Ninguém se acanhe de pegar mais.”

Entre uma garfada e outra, Sayaka perguntou, “E como está o pessoal da escola? Saotome-sensei continua com as suas mudanças de humor?”

Madoka assentiu, com sorriso de pena, “E solteira também, ehhh... Todos estão estudando bastante para poder entrar no ensino médio.”

Homura complementou, “sim, alguns vão deixar a escola. Shizuki-san vai para Tóquio.”

“Sim, Madoka conversou comigo sobre isso.” Sayaka abriu um grande sorriso. “Eu sabia! Esta cidade não é grande o bastante pra alguém tão esforçada como ela. Haha!”

“Então você também deve saber sobre ele,” Homura concluiu.

“Sim, sim...” Sayaka suspirou. “Eu não poderia estar mais feliz por Kyousuke ter ido pra Alemanha pra aperfeiçoar o seu talento. Meu desejo vive através de sua música.”

“Talvez nós possamos ir a um concerto dele algum dia,” Madoka comentou.

Com um sorriso mais tenro, Sayaka abaixou a cabeça. “Seria um sonho...”

A garota rosa assentiu, afirmando, “Há algo mais que você quer perguntar.”

Os olhos de Sayaka se arregalaram tão rápido quanto seu sorriso se desfez.

Mami ficou curiosa e quase perguntou sobre o que se tratava, mas se conteve ao presumir que era algo sensível.

Preocupada, Kyouko alternava entre olhar para Sayaka e olhar para Madoka.

“Eu...” Sayaka quebrou o silêncio. “Eu gostaria de saber... se você... Minha família conversou contigo?”

“Não, mas eu sei que sua mãe continua morando no mesmo lugar,” Madoka respondeu, “houve uma notícia local em que parentes seus estavam pressionando a polícia para reabrir a investigação da sua morte como homicídio, apesar de não haver evidências que corroboram essa versão.”

“Eu pensei em chegar próximo do condomínio em que eu morava, ao menos ver a fachada, ver as ruas da vizinhança...” Sayaka cobriu a face, sua voz se tornou lamento sussurrante. “Mas eu não posso, pois preciso superar isso. Eu apenas... Eu espero que um dia eles possam superar também...”

Kyouko conversou com Homura, “Ei, sabe aquele cavalo? Eu a batizei com o seu nome.”

“GAAH!” Sayaka gritou, erguendo a cabeça, “COMO VOCÊ PODE FALAR ASSIM NA CARUDA?”

Kyouko sorriu, parecia satisfeita com a reação. “Qual o problema? Eu que dei o nome, então, qualquer coisa, ela vai dizer pra mim.”

“É verdade?” Homura abaixou o olhar e disse, “você não devia ter feito isso...”

“Eu disse pra você!” Sayaka apontou para Kyouko. “É claro que ela iria odiar!”

Kyouko continuou sorrindo. “Nah, eu conheço essa aí. Ela deve tá querendo dizer que o cavalo não merecia esse nome, que há outros melhores.”

Homura franziu a testa. “Na verd-”

“Homura é um nome legal!” Madoka afirmou.

E garota de cabelos negros prontamente assentiu. “Sim, é um bom nome.”

“Heh.” Kyouko cruzou os braços. “Viu?”

“Ainda é ruim.” Sayaka teimava. “Imagina se as duas estiverem juntas e você chamar pelo nome, olha a confusão! Por que não chamá-la de pessêguinha? Muito mais fofo.”

“Nada de pêssego!” Kyouko se irritou. “Se não fosse ‘Homura’, eu iria preferiria dar outro nome a isso, como ‘Mami’.”

A loira levou a mão à boca. “V-Você cogitou em dar o meu nome ao seu cavalo?”

“Ehrmm...” Sem coragem de olhar para ela, Kyouko falou entre os dentes, “Eu... só estava dizendo...”

“Huhuhu!” Mami ficou feliz. “Você ficou com saudades de mim.”

“Veja...” Kyouko puxou o seu rabo de cavalo, titubeando, “é um animal... então eu podia dar um nome de mascote... ‘Bebe Dois’ talvez...”

“Bebe...” Com isso, Sayaka acabou se lembrando. “Mami-san, onde ela está? No quarto?”

“Então vocês não a viram?” Homura disse.

Kyouko ficou confusa. “Do que tu tá falando?”

Mami explicou, “Ela saiu um pouco antes de vocês chegarem. Nós pensamos que vocês tivessem cruzado caminho com eles.”

“’Eles’?” Agora era Sayaka que estava confusa.

O som da maçaneta girando e a porta se abrindo e fechando. Logo Nagisa apareceu na sala e arregalou os olhos. “Hã?! Vocês vieram?”

“Oi, nós fizemos uma surpresa,” Sayaka respondeu, “estávamos agora mesmo falando de ti.”

“É...” Kyouko ergueu as sobrancelhas. “Onde é que tu tava e com quem?”

“Com quem?! O quê...” Nagisa consultou Mami.

Ela deu um leve sorriso. “Conte para elas.”


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