O namorado da minha melhor amiga. escrita por A garota do livro


Capítulo 7
Trabalho em dupla - parte II




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Desde o aniversário Bruna não fala comigo ou olha na minha cara, isso já faz mais de uma semana. Todas as vezes que tentei falar com ela, fui ignorada. Quase todas as garotas viraram a cara para mim. Acho que só me aturavam e agora que tem um motivo para me odiar não perderam tempo. Sinto-me a própria Jenny Humphrey de Gossip Girl contra as garotas más. Ainda bem que a Julia e a Camila não são como as outras. Foram as únicas que ficaram do meu lado.

Sou bolsista no colégio Buarque. Lembro que minha primeira semana foi um verdadeiro inferno. Os alunos caçoaram das minhas roupas, me excluíam de qualquer atividade e faziam piadinhas de mau gosto. Quase desisti, ia pedir para minha mãe cancelar minha matricula e voltar para a escola publica em que eu estudava. Um dia chegue a escola decidida que seria o último, mas encontrei Bruna chorando no banheiro. Ela tinha menstruado pela primeira vez, sua calça ficou toda suja e nenhuma das suas amigas a ajudou. Emprestei uma calça minha que estava dentro da mochila e consegui um absorvente na enfermaria. Nos tornamos amigas naquele dia e depois foi ficando suportável conviver com tanta gente mesquinha.

Fico pensando se essa briga é uma daquelas que afasta as pessoas de uma vez por todos.

Depois da aula vou com Felipe para sua casa finalizar o trabalho de história. Agora que eu sei onde seu novo endereço ele concordou que fosse na casa dele. Estamos sentados lado a lado no ônibus. Ele abre um pacote de bala fini, meus olhos brilham, eu amo essas balas. Felipe me oferece e como quase o pacote inteiro.

— Eu não sei você, mas gosto de andar de ônibus – Ela diz enquanto olha lá fora pela janela.

Será que eu ouvi direito?

— É sério?

— Tipo, da para ler um livro – como se ele lesse vários – ouvir uma playlist do spotify ou tirar um ronco.

— Então você prefere andar de ônibus do que de carro?

— Não disse isso. Só que de carro não dá para tirar um ronco legal porque não sacode pra lá e pra cá.

Ele balança o corpo de um lado para o outro. Dou risada.

— Então você é do tipo que vê o copo meio cheio?

— Sou otimista sim, e você?

Penso um pouco.

— Acho que sou realista.

— Quem ta sempre com o pé no chão não sabe o que é voar.

Cada dia que passa, percebo que não se deve julgar as pessoas pelo o que falam dela. Isso deveria ser obvio, mas é quase inevitável criar uma opinião sobre uma pessoa pelo o que se fala dela. Felipe é muito diferente do que eu pensava.

— Porque as garotas falam tão mal de você? - pergunto

Ele pensa por um tempo.

— Acho que virou uma competição para elas. Fazem isso para afastar a concorrência.

— Você não acredita mesmo que é um jogo, acredita?

— Acredito.

Felipe coloca a toca da blusa na cabeça.

— Esperava um pouco mais de você.

— Nunca iludi ninguém, todo mundo sabe que já fiquei com um monte de garota. Não saio com ninguém prometendo relacionamento sério e exclusividade e ainda assim ficam magoadas quando eu não quero mais nada.

— Elas se sentem usadas – eu me sentiria usada.

— Por quê? A gente curte o momento juntos. É momentâneo.

— E onde fica a competição?

— A competição é me conquistar, quem me conquista ganha. – ele explica.

— Nenhuma garota é boa o suficiente para você?

— Eu que não som bom o suficiente para nenhuma garota.

Felipe é muito sincero. Ele nunca tenta mascarar quem realmente é.

Ficamos em silêncio pelo resto do caminho. Não é um silêncio incomodo, como se faltasse assunto. Só não precisamos falar todo o tempo.

Tento entender seu modo de pensar sobre as garotas, é difícil porque eu sou uma garota. Talvez ele esteja certo. As meninas estão sempre querendo provar que são melhores que as outras, mais bonitas, engraçadas e inteligentes. Imagine só Felipe namorando, a “sortuda” vai sapatear na cara das outras. O que essa garota tem que nenhuma outra tem, o que ela fez diferente e o que a torna melhor? É muito ridículo pensar que a garota é melhor que as outras só porque está namorando um cara que pelo menos metade da escola já beijou.

Olho para Felipe e ele está com os olhos fechados, não sei dizer se está dormindo. Seu rosto é angelical, é engraçado que quando as pessoas dormem ficam com um ar inocente, e nesse momento é como se ele fosse uma criança dormindo. Tenho vontade de acariciar seu rosto, é muito estranho ter vontade de tocar uma pessoa assim. Felipe abre os olhos e me flagra olhando para ele, imediatamente eu desvio os olhos e meu rosto inteiro esquenta, devo estar parecendo um pimentão vermelho.

Ele se levanta. Será que vai trocar de lugar? Claro que sim, eu também trocaria se o visse me observando enquanto durmo. Dou espaço para ele passar e continuo sentada, ele me olha confuso.

— Nós temos que descer no próximo ponto – Felipe explica porque continuo sentada.

Como eu sou idiota.

— Claro.

Me levanto sem jeito.

Descemos do ônibus e andamos algumas quadras. Fico em silêncio, estou morta de vergonha. Felipe discute com alguém pelo celular, ele manda vários áudios mas não consigo prestar atenção no assunto pois ainda estou pensando em como meu rosto ainda está queimando.

Quando ele vai em direção ao portão com a chave na mão sei que aquela é sua casa. Observo a fachada, é uma casa antiga mas está bem cuidada. A garagem fica em baixo e a casa em cima, subimos alguns degraus e passamos pela porta que está aberta. Estamos na sala, é grande e bem arejada. Os objetos são muito sofisticados para casa, talvez se eu não soubesse o antigo padrão de vida da família de Felipe não ficaria tão evidente, mas não consigo deixar de reparar que o quadro pendurado na sala fica muito entranho naquela parede cor de areia.

—Fique a vontade – ele diz.

A mãe de Felipe entra sala. Ela está com um pano de prato nas mãos e o cabelo preso em um coque desarrumado. Sempre que via a mãe de Felipe ela estava impecável, de salto alto e terninho.

— Olá – ela se aproxima de mim e me cumprimenta com um beijo no rosto – seja bem vinda.

— Obrigada – retribuo seu sorriso.

— Estão com fome? Estou terminando o almoço.

— Ah mãe, desculpa – Felipe faz um sinal para que eu o siga – comemos no caminho, depois faço alguma coisa rápida.

Estou morrendo de fome mas não digo nada.

— Ah, então ta bom – Márcia não se incomoda de que Felipe recusa o almoço.

O sigo até chegar no seu quarto. Será que ele realmente considera um saquinho de bala fini uma boa refeição? Meu estomago está roncando.

— Desculpa por ter recusado o almoço – Felipe se desculpa baixinho – a comida da minha mãe é horrível. Depois eu preparo alguma coisa pra gente comer.

— Tudo bem.

— Minha mãe nunca gostou de cozinhar, mas agora não dá pra pagar alguém ou ficar comprando comida pronta, então ela tem que se virar.

Fico triste por ela. Deve ser difícil ter de mudar todos os seus costumes.

— Bom, minha mãe cozinha muito bem. Se ela quiser umas dicas.

— Serio? Vou falar para ela – Felipe fica todo animado com a idéia.

Entro em seu quarto e fico impressionada. Assim como a sala o quarto de Felipe é bem amplo. O bom de casa antiga é isso, costuma ser grande. Tem os móveis como de costume em um quarto; cama, guarda roupa, mesinha de computar e tem uma televisão também. O que me chama atenção é uma parede cheia de fotos, quase não dá para ver a parede a traz delas. Não é um mural de fotos de família ou pôsteres de bandas, são fotos quase que profissionais. Me aproximo e presto atenção. Imagino que são pessoas aleatórias. São fotos de crianças brincando em uma praça, senhores jogando cartas, um casal de mãos dadas na rua. Tem gente sorrindo e chorando. Fico olhando por um bom tempo até que me lembro que Felipe está ali esperando para fazer o trabalho.

Viro-me e percebo que ele estava me olhando.

— São suas? – aponto para as fotos.

— Sim – é a única coisa que ele diz.

— São muito boas – digo com sinceridade.

— É só um passatempo.

Felipe senta em frente ao computador esperando ele ligar e puxa uma cadeira para me sentar ao seu lado.

— Então você quer ser fotografo?

Pelo jeito todo mundo sabe o que vai fazer depois que terminar a escola, menos eu.

— Ainda não sei. Meus pais me aconselham a fazer outra coisa porque fotografia não dá muita grana.

— Acho que devemos escolher uma profissão por amor. Tem muita gente que se dá muito bem como fotografo.

— E se eu sentir que fotografar se tornou uma obrigação e não um prazer?

— Nem sei o que dizer, só sei que existe muita gente infeliz com seu trabalho.

— E você?

— Eu o que? 

— O que quer fazer? – ele da uma risada.

— Não sei.

É muito frustrante não ter resposta para essa pergunta.

— Tenho certeza que vai descobrir.

Será? Parece que a cada dia estou mais longe de descobrir.

Retomamos o trabalho de onde paramos. Conforme o tempo passa penso seriamente em ir para casa sem terminar porque estou morrendo de fome. Quando fico muito tempo sem comer minha cabeça começar a doer e fico com um péssimo humor. Acho que ele escuta meu estomago roncar pois se virá para mim e diz;

— Vamos fazer uma pausa para comer?

Aleluia, isso era tudo o que eu queria ouvir. Abro um sorriso tão grande e quase pulo em seu pescoço para agradecer.

Eu o sigo para fora do quarto até a cozinha. Acho que não preciso falar que a cozinha é bem espaçosa. Os azulejos são antigos e horríveis, amarelos com flores laranja, será que as pessoas antigamente gostavam mesmo desse tipo de azulejo? Está tudo limpinho mas ainda dá para sentir um leve cheiro de fritura.

Felipe abre o armário e tira de lá sacos de salgadinho e bolacha recheada, será que ele pretende almoçar isso? Começo a ficar aflita, salgadinho e bolacha não vai matar minha fome. Ele olha para mim e depois para as coisas em cima da mesa.

— Isso não é uma boa opção. Acho que vou tentar fazer um lanche.

Ele está muito perdido, parece não saber por onde começar. Claro que ele não sabe cozinhar, eles sempre tiveram empregada para tudo, nunca se viraram sozinhos.

— Posso te ajudar? – pergunto educadamente.

— Por favor.

Felipe vai me mostrando onde ficam as coisas. A despesa deles é bem farta, tem coisas que eu nunca vi e nem sei em qual receita usaria. Frito hambúrgueres e batata frita. Felipe vai montando os lanches conforme eu o oriento.

A irmã dele entra na cozinha. São quase três horas da tarde e ela ainda está de pijama, não que eu não fique de pijama praticamente o dia todo quando estou em casa, mas sua cara está péssima. Não reparo muito, odeio quando alguém fica me encarando.

— Senti um cheiro bom – ela boceja e senta-se a mesa – faz muito tempo que não sinto um cheiro como esse.

Seguro o riso.

— Porque você não tenta cozinhar? – Felipe fala com ela com um tom ríspido, ele continua montando os lanches e não olha para a irmã.

— Não levo jeito – ela dá de ombros como quem não se importa.

Ele respira fundo e não diz mais nada.

— Já que meu irmão não me apresenta... Sou Katarina e você?

— Aline – sorrio para ela.

— Como você agüenta esse chato? – ela faz um gesto com a cabeça em direção ao irmão.

— Fomos obrigados a fazer o trabalho juntos – explico.

— Ai ele te colocou para cozinhar.

— Na verdade eu quis ajudar.

— Katarina, porque você não procura algo útil para você fazer ?

Felipe para o que está fazendo e encara ela.

— Eu to com fome – Katarina rouba uma batata frita e come.

— Nós estamos fazendo pra gente e não para você.

Porque será que ele está a tratando desse jeito?

— Tudo bem. Eu frito mais Hambúrguer.

Katarina sorri para ele o provocando.

Enquanto eu frito mais hambúrgueres os dois ficam se encarando, Katarina não parece se importar com a cara fechada do irmão, ela se ocupa em comer as batatas.

Quando os lanches estão prontos nos sentamos para comer. Quase choro de emoção, estava com tanta fome que quase engulo o lanche todinho.

Felipe e Katarina comem com a mesma vontade e só param para dizer que está muito gostoso.

Terminamos de comer e estou mais que satisfeita, agora só queria minha cama para dormir o resto da tarde. Felipe encosta na cadeira assim como eu e ficamos ali respirando fundo. Katarina se levanta, do jeito que comeu ela deixa o prato e copo sujo na mesa e sai.

— Não consigo entender como a pessoa pode ser tão folgada – ele fala com raiva.

— Deve ser difícil para ela a adaptação.

— Está difícil para todos, mas estamos fazendo o melhor que podemos. Katarina só sabe dormir e comer, ela não ajuda em absolutamente nada.

— Sua mãe não fala nada a respeito?

— Meus pais passam a mão na cabeça dela. A tratam como se ela ainda fosse uma garotinha.

Me levanto e começo a recolher as coisas. Quando vou pegar o prato e o copo que Katarina deixou na mesa Felipe me interrompe:

— Não, deixa ai mesmo. Ela vai ter que aprender que agora tem que colaborar. Ninguém é obrigado a fazer todas suas vontades.

Felipe lava a louça e eu seco. Demora um pouco para ele voltar ao seu humor normal, ele fica bem zangado com a irmã e acho engraçado. Parece até que ele é o irmão mais velho e ela a mais nova. Enquanto seco a louça penso em como seria ter um irmão, se fosse mais velho será que ele seria do tipo protetor que não me deixaria namorar? E se fosse mais novo será que me deixaria brava por mexer nas minhas coisas escondido? Sempre quis ter um irmão ou irmã, mas com o tempo fui mudando de idéia, eu gostava de ter a atenção dos meus pais só para mim.

— Obrigado – Felipe diz de repente me tirando dos meus pensamentos.

— Por?

— Por nos alimentar – nós dois rimos, parece que sou uma tia velha alimentando as crianças – e por agüentar minha chatice.

— Você não é chato – bato com o pano de prato nele – talvez um pouquinho.

Felipe pega o pano de prato na minha mãe e o pendura. Seus olhos estão suaves e seu sorriso aberto mostrando a perfeição dos seus dentes. Quem me dera ter dentes como esses, são tão retos e brancos. Paro de olhar para a boca dele, não é normal alguém ficar reparando nos dentes dos outros.

— Eu gosto de você – Felipe diz pausadamente.

A primeira coisa que penso é que eu também gosto dele, como amigo é claro. Será que é esse tipo de gostar que ele quer dizer ou o outro tipo de gostar?

— Você gosta de mim? – pergunto preocupada com a resposta.

— Gosto – ele responde sorrindo.

Olho para Felipe assustada. De repente o sorriso dele vai sumindo.

— Como amiga né?

— Claro! Você pensou que eu queria dizer gostar de outro jeito?

— Por um minuto sim – suspiro aliviada – que susto.

— Nossa, seria tão ruim assim?

Felipe fica ofendido. Eu sou uma jumenta.

— Não! Não é isso. É que eu descobri que você é um ótimo amigo, seria muito ruim estragar isso. – tento me justificar.

— Então quer dizer que agora somos amigos?

— É o que parece – dou um sorriso amarelo.

— E você vai parar de me tratar como se eu fosse um otário?

— Eu não te tratava tão mal assim.

— Você mal olhava na minha cara.

É verdade, eu sempre o tratava mal e agora pensando sobre isso percebo que ele nunca me deu motivos para ser tão rude. Me sinto mal pela minha falta de educação.

— Desculpa – eu digo sinceramente.

— Relaxa. Águas passadas.

Nós voltamos para o quarto e finalizamos o trabalho.

Minha mãe passa na casa do Felipe para me pegar. Depois que a Bruna decidiu se afastar de mim, minha mãe está sempre me paparicando. Sinto que ela fica preocupada comigo, talvez ela ache que estou deprimida. É claro que eu fiquei triste, mas ainda estou magoada com a Bruna, não fiz nada para que ela me tratasse dessa forma.

Entro no carro. Felipe fica em frente à casa olhando o nosso carro se afastar, ele acena para mim sorrindo e eu aceno de volta, parece até aquelas cenas de despedidas de filme. Pelo jeito nós realmente somos amigos.


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