Vossa majestade escrita por Hamona Wayne


Capítulo 1
Capítulo um: Maldito sino




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/775795/chapter/1

Como são seus cabelos? Já os teve lisos? Atualmente, os cabelos lisos estão sendo a sensação da garotada. Até eu mesma, por um certo tempo, passei quilos de creme para que ele ficasse assim. Mas posso ser sincera? Cabelo cacheado é bem melhor. Aquelas mechinhas lindas onduladas, que é quase impossível de não querer tocar. São como ondas do mar, lindas e intocáveis. Isso, nunca toque no meu cabelo. Apenas duas pessoas podem tocar no meu cabelo. Uma delas é o vento.

— Vem logo! Vem!

— Eu não acho isso uma boa ideia, Ast.

  Sabe qual a pior solidão? Ter uma grande ca... Uma mansão com tão pouca vida. Por sorte, nunca passei por isso.

— Ast, mamãe e papai vão briga! – Avisou minha irmã mais nova

  Eu tinha ela.

— Eu não ligo!

  Muitos acreditam que só há duas razões para que irmãos sejam realmente unidos: não morarem juntos ou passar por um grande trauma. Não considero o tratamento dos nosso pais como um trauma, vejo como uma benção de Deus.

— E se nos prenderem no quarto? – Perguntou Daph assustada

— A gente faz a festa lá! – Comuniquei

  Se tinha uma coisa por qual eu era completamente apaixonada eram os vestidos leves. Normalmente, se procurar fotos de Astória Greengrass aos nove anos, vai sempre me ver com mechas onduladas e bagunçadas – de tanto correr –, vestidos de diversas cores e sempre descalça – me ajudava a se mexer melhor. É, eu sei. Hoje estou muito diferente, não é?

  Abri aquelas enormes portas com toda força que pude, eram muito pesadas. Puxamos as cortinas para que aquela escura sala se tornasse clara outra vez. Só faltava uma coisa.

— Cadê a música, Ast? – Perguntou Daphne

— Bobinha – Me aproximei dela – Tem que ligar primeiro.

  Daphne era dois anos mais nova do que eu e ainda a via como um bebê. Adorava arrumar ela, brincar com ela e até levar broncas do que ela fez para não se sentir sozinha. Ela não era só minha irmãzinha, era e ainda é a melhor coisa que aconteceu na minha vida – família é tudo. Sem ela, não teria nada. Como aconteceu por um certo tempo.

  A música iniciou e começamos a dançar e cantar. Era o que mais gostávamos de fazer. A música era importante para nós, talvez mais para mim do que para ela. O que eu mais amava fazer era girar meu vestido verde, amo verde bem clarinho.

— Canta, Ast! Canta!

  Se lembra que eu cantava? Esse dom que carrego por tanto tempo. Amava cantar para Daph e, segundo ela, tinha a voz de um passarinho dourado. Pena que Cassy e Morgano não puxaram esse dom, não é mesmo? Fazer o quê?

  Enfim, não sei por quanto tempo ficamos no salão de dança, porque não temos noção de nada quando estamos lá. Só sei que giramos tanto que caímos no chão, de barriga para cima, rimos.

— Te amo, Ast. – Declarou-se Daph

— Também te amo, maninha.

  Comecei a beijar o rostinho dela, enquanto ria. Estava tudo indo bem quando aquele maldito sino tocou. Ah, como eu o odiava! Daphne me olhou com uma cara de medo. Não queria vê-la chorar, tive que inventar alguma coisa.

— A última que chegar é a mulher do trouxa!

  Por favor, não pense que eu era ou sou preconceituosa. Eu só tinha nove anos e repetia tudo o que ouvia.

— Feito!

  Com um sorriso nos lábios e a vontade nas pernas, Daphne disparou dali e começou a correr. E eu fui atrás. O problema era saber de onde vinha o som, era um sino portátil que poderia está sendo tocado em qualquer lugar. Mas de uma coisa tinha certeza, era no andar de baixo. Mesmo tendo pernas mais largas, ainda conseguia ser menos rápida. O que podia fazer? Eu era cantora, não corredora!

  E como sedentária que era – e ainda sou –, tive uma ideia brilhante. Sentei no corrimão e fui descendo direto. Só de ruim, dei um sorrisinho para Daphne, a fazendo acelerar os passos. E no que meu sedentarismo me ajudou, também me complicou. Fiquei com preguiça de sair e acabei caindo de bunda no chão. Daphne riu e voltou a correr. É, a nojenta nem me ajudou a levantar.

  Fui obrigada a ser mais veloz e entrar na sala de estar com tudo, Daphne também fez isso e acabou caindo em cima de mim. Começamos a rir que nem duas retardas.

— Hum-hum!

  Sabe aquela pessoa que lhe dá calafrios na barriga, que tem aquela cara de enjoada? Esses eram meus pais. Mamãe, uma mulher chata e rigorosa. E papai, um homem quieto e assustador. Juntos formavam o casal do terror, vai compreender. Sempre ficavam juntos no escritório, resolvendo os negócios da família. Raramente os víamos, e quando os víamos, não era nada agradável.

  Mas aquele dia era diferente. Aquele dia, vimos mamãe e papai com visitas. Sim, isso mesmo, visitas. Rapidamente nos levantamos, era uma família muito estranha. Todos loiros: um pai mandão, uma mãe enjoada e um filho mimado.

— Como se diz, meninas? – Interrogou mamãe, com um sorriso forçado

— Olá. – Falamos sem gosto

  Daphne, coitada, se escondeu atrás de mim. Por certo, ficou com medo do pai, parecia nos analisar de cima para baixo. Quer dizer, todos nos analisavam. Não gostei nada disso e como sou atrevida

— ‘tão apreciando minha beleza? – Perguntei

  A família pareceu se espantar com meu comentário, deviam imaginar que eu estava com medo e nunca diria algo do tipo. Mal sabiam o que faria com eles.

— Astória – Chamou a pesada e lenta voz de papai – Esses são os Malfoy.

— É, legal. – Soltei

  Os senhores Malfoy dessa vez não se importaram com o que falei, já o filho achou um desrespeito. Devia ser mais um mauricinho chato e irritante.

— Por que não o leva ao jardim? – Sugeriu mamãe

— Porque nem o conheço.

— Draco Malfoy – Chegou perto e beijou minha mão com aqueles gélidos lábios – Ao seu dispor, senhorita.

  Ele era bonito e parecia ser educado. A questão era: com quem? Todas as famílias puro-sangue são educadas desde cedo, mas só com seus iguais. Os inferiores eram serem tratados como lixos desprezíveis. Acontece que eu sou considerada esquisita, perto de quem cresci – digo das meninas de outras famílias. Normalmente, elas se derreteriam e se apaixonariam loucamente pelo gatinho do Draco Malfoy. Mas eu não sou assim, eu sou Pheobe de Friends, que riria na cara dura. E foi o que eu fiz. Eu não dei uma risadinha tímida e envergonhada, ri como quando vejo alguém caindo.

— Você é engraçado, Draco.

  E claro que todos olharam torto para mim. Qual pessoa em sã consciência chamaria Draco Malfoy de engraçado na cara dele e na frente quatro pessoas chatíssimas? A única que se divertiu foi Daphne, que já tinha saído de trás de mim e se segurava para não rir da cara das pessoas. Ela tinha medo de morrer, eu não.

  Ele soltou a minha mão de repente e limpou, disfarçadamente, na calça. Eu, observadora, vi tudinho e não fiquei calada.

— ‘tá limpando o óleo que pas-

— Astória – Papai engrossou mais a voz – Leve ele!

— Sim, senhor.

  Você não era rebelde? Sim, mas tudo tem limite. E papai sabia muito bem como impor. Quando estávamos para sair, pude ouvir mamãe proibindo a vinda de Daphne.

— Por que ela pode ir e eu não?

— Porque não está na sua vez.

— Vez de quê?

  Não foi respondida. Daphne esqueceu isso logo, mas essa pergunta rondou minha mente por dois anos. Andávamos no longo corredor, em completo silêncio, ele parecia explorar cada cantinho do local. Estava quase explodindo, não consigo ficar quieta por muito tempo.

— Por que anda assim?

 Se surpreendeu com a minha pergunta. O que podia fazer? Tinha o comportamento de um velhinho chato de oitenta anos.

— Como assim? – Questionou

— Assim, todo certinho.

— Ando como todos deviam. Inclusive você.

— Por que eu?

— É uma puro-sangue?

— Sou.

— Uma menina?

— É, né?

— Então deveria melhorar seus modos.

  Parei de andar e ele me encarou.

— Meus modos?

— Sim. Deveria melhorar seu vocabulário, suas roupas e saber quando ficar quieta.

— Tenta dizer isso pra minha mão.

— Viu? Uma garota não deveria se comportar assim!

— É, mas eu não sou uma garota qualquer!

— E que tipo de garota você é?

  Abri um largo sorriso. Segurei em sua mão e comecei a correr. O menino chato tentou evitar, mas permitiu ser levado. Só parei quando chegamos perto de um arbusto.

— Me trouxe pra cá?!

  Eu ia responder, quando vi seus fiozinhos arrumadinhos todos de pé e suas roupas quase amassadas. Estava muito irritado com seu estado.

— Ainda falta mais. Me segue.

  Encostei na moita, relaxei e deixei ela me absorver. Acabei rolando de costas no morrinho e fiquei rindo. Pode perceber que eu ria há cada cinco minutos. Depois de um tempinho, Draco finalmente chegou. Se já estava ruim, deveria ver depois que rolou no chão.

— Sua besta! – Ele xingou – Olhe como estou!

— Um pitelzinho. – Brinquei

— Vou contar ao meu pai!

— Ou você pode brincar de balanço.

— Isso é coisa de criança!

— Bocó, você é uma criança.

— Não sou, não! Tenho dez, e próximo ano, vou à Hogwarts.

— ‘tá, mas não deixa ninguém te chamar de pitelzinho, ‘tá?

— Você é chata e desagradável!

— É pra eu me importar?

  Cruzou os braços e sua cara brava ficou pior do que nunca. Não liguei muito, segurei a mão daquele chato e o levei até o balanço. Sinceramente, não sei porque ele sentou e porque deixou-me balança-lo. Só sei que me arrependi na hora de ouvir suas reclamações.

— ‘tá devagar!

— Mais rápido!

— Não come, não?

— Anda logo!

— Acelere, menina!

  Não aguentei mais e o empurrei no chão, sujando mais aquela roupinha carinha. Sentei no balanço como de costume, uma perna de cada lado. Comecei a cantar baixinho.

— Vou contar a meu pai! – Ameaçou Draco – Sua esquisita! Chata!

  Não me importei com suas palavras, só quando

— Não sei o que é mais feio, essa voz de sangue-ruim ou essa bucha que chama de cabelo!

  Não me controlei, o empurrei de novo e fiz a pior coisa para ele. Cuspi na sua cara.

— Vou contar ao meu pai!

  Se ele contou ou deixou de contar agora não mais importa. Até porque, que diferença faz, uma reclamação ou outra? Depois daquele dia, não vi a sra. Malfoy e seu filho chato, na mansão, por um certo tempo. Apenas o pai, para tratar de negócios secretos. E sempre olhando feio para mim.

  O espaço da mansão foi ficando minúscula para mim e Daphne, quase todos os dias, vinha alguém tratar de negócios. Ficávamos toda hora no quarto, comendo do que nosso elfo-doméstico trazia.

  No dia vinte e cinco de março, eu e Daphne acordamos bem cedo. Preparamos um belo café da manhã e subimos para o penúltimo andar, o quarto dos nossos pais.

— Papai. – Chamei – Papai.

  Ele tossiu um pouco, demos um passo para trás.

— Papai?

— Meninas? – Abriu os olhos com dificuldade – O que – Tossiu novamente – O que duas lindas meninas estão fazendo aqui?

— Fizemos seu café, papai – Contou Daphne animada – Feliz aniversário!

— Que gentil. – Tentou se sentar – Um instante.

— Quer ajuda, papai?

— Não – Tossiu – Estou velho, mas não tão velho.

  Fez força para se sentar, apoiado na cabeceira. Seus olhos estavam avermelhados e ele soava muito. Daphne colocou a bandeja em seu colo.

— Querida, poderia me dá um – tossiu – um cachimbo para o seu velho pai?

— Sim, senhor.

  Daphne correu para o casaco longo de papai, estirado no cabide. Pegou o cachimbo e o entregou. Tossiu mais um pouco, saiu sangue de sua boca.

— Papai.

— Não se preocupe, Daph. – Tossiu – Papai só está em um péssimo dia. Amanhã, estarei melhor. Ast, querida, poderia cantar para mim?

— Sim, papai.

  Ele acendeu o cachimbo com a varinha e eu e Daph cantamos baixinho para ele (Autora: Que é tão lindo, Balão mágico), tentando evitar a fumaça esverdeada. Papai se juntou a nossa canção, nos fazendo sorrir.

— Que barulheira é essa? – Mamãe ficou vermelha ao nos ver – Era só o que me faltava, as duas baderneiras no meu quarto! – Abaixamos a cabeça – E que cachimbo é esse, Albert? O que é isso em cima de você?

— Um café da manhã, mamãe. – Respondi, cabisbaixa

— Diga, olhando nos meus olhos, Astória! Não pari um elfo-doméstico! Daphne, ajeite a coluna!

— Será que nem em meu aniversário, eu posso ter paz? – Bronqueou Papai

  Enfurecida, mamãe jogou a bandeja no chão. Segurei na mão trêmula da minha irmãzinha e a tirei de lá. Ouvimos diversos gritos e objetos sendo quebrados.

— Por que ela grita tanto, Ast? – Quis saber Daphne, me abraçando com medo

— Tudo por causa do seu pai! Tudo por causa dele!

  Mamãe me dava banho com o lado que machuca da esponja.

— Mamãe, isso dói!

— Também doeu quando tiveram que cortar minha barriga para você nascer! Quando meus dentes caíram! Meus seios amoleceram! Meus pés incharam! – Esfregou com força – Sabe, eu era bonita antes de ficar grávida.

— E-Eu sei.

— Você acabou comigo, Astória.

— E-Eu sei, m-mãe.

— É melhor você ser uma coisa boa quando crescer para compensar todo estrago que você fez.

— E-Eu vou ser, m-mãe.

— Devia ter me casado com o Dolohov. Estando em Azkaban, eu ficaria com todo dinheiro dele e sem filhos, sem estrias. Culpa do imbecil do seu avô. Escute o que eu digo, Astória. Filhos são um bando de vermes ingratos que vão sugar tudo de você. – Lembre-se disso, será muito importante daqui alguns momentos – Sei disso porque roubei tudo do seu avô, por isso ele morreu.

— O-O vovô mo-morreu po-por sua causa?

— Claro que não, não é minha culpa se era um velho canalha! Se o dinheiro não tivesse no nome da sua irmã, estaria bem longe daqui! É bom não estragar ela, não precisamos de outra vergonha. Garotinha tola! E pare de chorar, que eu não te bati! Talvez eu deva cortar esse seu cabelo – Ela o puxou – Odeio seu cabelo!

— Meu cabelo não, mamãe!

— Quieta! É bom que tenha puxado a persuasão dos Travers – Família de mamãe – Se não conseguir um bom marido, eu darei um jeito em você!

 Foi assim por dois anos, quando finalmente chegou a minha carta de Hogwarts. Eu e Daphne jantávamos na vazia mesa da sala de jantar. Conseguíamos ouvir os adultos conversando.

— Maurice – Chamei o elfo-doméstico – Maurice!

— Sim, madame?

— Por que tem que ter tanto garfos na mesa?

— Etiqueta, madame.

— E por que você não usa nenhum?

— Não sou digno, madame.

— E por que não?

— Meu objetivo é servir a família Greengrass. Me igualar a eles seria desprezível.

— Desprezível é sua roupa! – Apontou Daphne – Um horror!

— Perdoe-me, madames!

  Ficou de costas para a parede e bateu sua cabeça várias vezes lá.

— Maurice, pare! – Ordenei – Pare!

  Meus pais eram cruéis, fizeram Maurice não parar de se machucar até que ele achasse necessário. O pobre elfo-dosmético foi chutado no chão com força.

— Não percam tempo com essa criatura, meninas. – Sugeriu Quirrell – É uma perca de tempo.

  Ele mesmo, o próprio. Momentos antes de sua morte, o falecido professor veio a nossa casa fazer uma visitinha.

— Professor. – Cumprimentamos sem olha-lo nos olhos

— Sabe, meninas, parecem ser muito inteligentes. – Tocou no meu cabelo – Gostaria de tê-las como minhas – chegou perto da minha orelha – alunas especiais.

  Meu corpo tremia um pouco, não gostava da presença dele. Um homem assustador e bizarro como tudo na mansão. Maurice resmungou algo, enquanto acordava.

— Antes de partir, lhe tenho algo, menina cantora – Tirou uma carta de seu bolso – O próprio Dumbledore escreveu.

  Quando ouvimos a porta bater, Daphne correu para se juntar a mim e abrir a carta.

“Prezada srta. Astória M. Greengrass

  Temos o prazer em informar que V.Sa tem uma vaga na escola de magia e bruxaria de Hogwarts. Lhe aviso para ter muito cuidado, perigos fantasmagóricos podem persegui-la...”

— Perigos fantasmagóricos? O que isso quer dizer? – Interrogou minha irmã

— Quem liga? Eu vou a Hogwarts!

— Me dê isto aqui! – Mamãe leu a carta, na sala de estar – Um tolo, esse diretor! Devíamos envia-las para a escola francesa, teriam classe lá! Por bem ou por mal.

  Eu e Daphne engolimos o seco.

— E deixar os outros falarem? – Indagou papai, em sua habitual cadeira de rodas – Não seja ridícula! A culpa é sua, se não são tão bem treinadas!

— Seu fumante desgraçado! Tudo o que faz é acender esse miserável cachimbo e eu? Sou obrigada a lidar com essas filhas de trouxas e o inútil que não consegue se levantar!

  Papai fez força, não resistiu. Caiu no chão.

— Papai! – Nós duas corremos para ajuda-lo – Papai! Papai! Mamãe!

— Deixe-o morrer! Um problema a menos.

  Ele não morreu, não naquela tarde. Vomitou um pouco de sangue e precisou da nossa ajuda para voltar a respirar. Maurice o deitou na cama e passamos o dia sem brincar, preocupadas.

— Para silencia-las, ele serviu. – Comemorou mamãe ironicamente, no jatar – Daphne, se interessa pela França? Lá tem muitas pessoas como nós.

— Ast vai?

— Sua irmã é uma desmiolada que não sabe se comportar.

— E a senhora é uma senhora muito má!

  Ela se levantou e eu também, morrendo de medo.

— Vomite tudo o que comeu e vá para seu quarto!

— O quê?

— Vomite! – Estendeu a varinha – Ou eu mesma farei?

— Faça! Não tenho medo!

  Ela me deu um tapa forte.

— Mamãe!

— Calada, Daphne! Apenas escute, escute como sua irmã arruína nossa imagem! Sabe como é estressante ficar preso na merda dessa mansão, com crianças demoníacas e um homem horrendo? É a pior coisa do mundo! E sabe por quê? Porque um miserável espalhou que nós sofremos de uma maldição! Mas quer saber de uma coisa, no momento que tive você, o estrago da minha vida, passei a acreditar!

— É a pior mãe do mundo!

  Me deu outro tapa.

— Espero que ninguém queira você e eu te jogue na Floresta proibida, onde possa ser devorada por todas as criaturas! – Cuspiu em mim – Aberração!

  Saí da mansão e corri o mais depressa possível. Com as lágrimas embaçando minha imagem, não pude ver quando caí em buraco recém-aberto. Com um corpo lá.

— AAAAAAAHHHHH!

  Não me lembro de muita coisa, só que fui tirada de lá e que desmaiei depois. Acordei sentindo o cheiro de madeira velha.

— Papai?

— Calma, querida. Está tudo bem.

  Sentava no colo dele, na sala de estar. Caía uma leve neblina à manhãzinha. O abracei, mantendo o silêncio por um bom tempo.

— O que acha de uma musiquinha, em?

— Sem Daph, papai?

— Ela está dormindo, meu bem. Assim que acordar, se juntará a nós, está bem? – Assenti – Vamos então!

  Ele tocava o piano e eu cantava alegremente (Autora: Um pouco de açúcar, de Marry Poppins). Daphne desceu as escadas na pressa e juntou a nós. São momentos como esses que me fazem esquecer que a mansão Greengrass era um lugar triste e sombrio. Dançar e cantar é tão

— Magnifico – Contava papai, como história para dormir – Era como meu pai, Gregory Greengrass, me elogiava. E todas as meninas enlouqueciam quando eu tocava.

— Me ensina, papai? – Pediu Daphne, na cama ao lado

— Não, uma menina como você deve dançar para o rapaz que conquistá-la.

— Mamãe dançou para o senhor?

— E para todos os rapazes da minha série.

— Hora de dormir – Mamãe puxou a cadeira de papai – Durmam para não crescer olheiras em vocês!

— Ast? – Chamou Daph, minutos depois – Está dormindo?

— Não, por quê?

— Mamãe quer me levar para a escola francesa, não quero ir! Não sem você!

— Não se preocupe, ninguém vai nos separar.

— Promete?

— Prometo.

   O problema é que isso não dependia só de mim. Não é o universo que complica nossa vida, são as pessoas que moram nele. Nas férias de verão, Daphne e eu usamos lindos vestidos, cantando (Autora: chim chaminé, de Marry Poppins) e dançando, girando sem parar, ao som do piano de papai.

— Meninas! – Bronqueou mamãe – Parem, parem agora! – Sentamos no sofá – Nossos convidados estão para chegar e é bom que se comportem! Eu mandei parar, Albert!

— No dia que eu te obedecer, Constance, paro de fumar!

— Por que não engasga logo com essa maldita porcaria que tanto ama?

— E deixar de fazer o inferno na sua vida? – Papai riu malignamente – De jeito maneira! Se bem que você é o diabo da casa!

— E você é o – A campainha tocou – Chegaram! Não esqueçam dos bons modos que ensinei a vocês! Nada de cantar! Dançar!

— E gritar! – Aborreceu papai

— Seu-

— Madame. – Chamou Maurice

— Saia da frente, seu verme!

  Os primeiros foram os Zabine. Blásio beijou minha mão e piscou o olho, Daphne fez cara de nojo quando ninguém via. Muitos vieram, os Parkinson, Flint, Carrow, Crabbe, Goyle, Malfoy, Fudge, Bulstrode, muita gente mesmo. Sentávamos em uma mesa de crianças.

— É seu primeiro ano, certo? – Questionou Marcus Flint

— Sim. – Confirmei

— Uma pena, poderia ficar com a gente. – Lamentou-se Blásio

— Triste. – Ironizei

— Nós também iremos entrar. – Avisaram as gêmeas Carrow

— Interessante. – Falou Goyle

— Souberam da última? O fracassado porco fez mais um show. – Anunciou Parkinson

— Qual a da vez? – Quis saber Pucey

— Voo em um carto, carro, sei lá como se diz essa coisa de trouxa – Contou ela – Muita gente viu, parece que foram salvar ele da casa dos tios.

— Tirar de um lixo para um chiqueiro – Zombou Malfoy – Muito progresso.

  Todos riram. Daphne também, mas parou com a leve cotovelada que dei nela.

— Esse ano, vamos ganhar, com certeza – Sonhou Flint – Com as novas vassouras que seu pai nos deu, nada nos derruba.

— Meu time tem do melhor, Flint! Aprenda isso.

— Pensei que um time fosse liderado por todos. – Falei e todos olharam para mim – Que foi?

— Você é maluca ou o quê? – Brigou Parsy – Ele é Draco Malfoy!

— E eu sou Astória Greegrass.

— Quem é você, perto de mim? – Irritou ele, querendo se sentir superior

— Uma rainha, pitelzinho. Com licença.

  Daphne também saiu, pois não queria ser atacada enquanto risse. Fui para o quintal, na frente do tumulo que havia caído. Me pergunto quem está lá, se era mau. Certamente que não.

— Madame – Chamou Maurice – Madame.

— Estou indo.

  Ter que aturar um monte de preconceituosos é o maior saco. Acho que eu não fiquei assim porque o desprezo da minha mãe por mim é maior do que ela tem pelos trouxas. Fiquei a vagar pelos corredores, quando ouvi a nossa música, a música que eu e Daph cantamos para papai em seu aniversário.

  Corri e arregalei os olhos ao ver quem tocava.

— Pitelzinho?

— Olá.

— Não sabia que tocava piano.

— Meu pai me ensinou.

  Me sentei ao seu lado e sorri ao ouvir a melodia outra vez.

— Me ensina?

  Achei que ele diria a mesma coisa que meu pai, que menina nenhuma devia saber tocar. Mesmo tendo qualidades a mais que minha mãe, papai ainda sabia ser preconceituoso e rancoroso. E como sabia.

— Claro – Franzi a testa – É bem simples, olha. Esse é o Sol.

  Devo ser a primeira pessoa a saber tocar uma canção sem saber os nomes dos acordes. Minha voz não se recusou a se libertar, ele tocava uma parte e eu, outra. Quando a música acabou, mergulhamos nos olhos do outro. Lindos olhos. Saímos do transe com as palmas – que nem percebemos suas chegadas.

— Essa é minha garota! – Afirmou papai orgulhoso 

   Quem não gostou foi mamãe, ela simplesmente odeia tudo o que faço.

— Bom, até Hogwarts. – Me despedi na saída – E obrigada por me ensinar a tocar.

— Eu que agradeço. Graças a sua festinha, finalmente peguei Parkinson.

— Com pegar você diz-

— Beijar, é claro. E não é que ela beija bem.

  Ambos trocaram olhares maliciosos.

— Você é tão nojento!

— O quê?

— Como pode usar a mansão para trocar bactérias? Que nojo!

— Ah é, esqueci que só é uma criança.

— Criança?

— Olha, quando parar de acreditar em fantasia, me avisa, ok? Não gosto de andar com gente lesada.

— Eu é que nunca quero andar com você, seu nojentinho!

  Não quis ouvi-lo, algumas pessoas – da nossa idade – paravam para prestar atenção e isso é tudo o que não precisávamos, um escândalo.

— E o Malfoy, querida? – Perguntou papai ansioso, na manhã seguinte – Conseguiu algo?

— Como, por exemplo?

— Uma garantia, é claro! Foi só vê-los tocando que qualquer um percebe, uma aliança Inquesita.

— O que isso quer dizer? – Perguntou Daphne

— Não sei, ouvi de um chinês.

— Não ouçam o que ele diz, está velho e enferrujado – Mamãe dobrou o Profeta diário – Precisa fazer algo mais para conquista-lo, tocar uma musiquinha boba não adianta.

— Por que iria casar com ele?

— Porque é rico, poderoso e bem fluente, por Merlin! Precisaria ter outro motivo para uma aliança?

— Amor, talvez.

  Papai se engasgou com sua torrada e após cuspi-la na mesa, caiu na gargalhada.

— Filha – Batia na mesa com força – Ah, filha – Acendeu um cachimbo – É por isso que gosto de você – soltou uma fumacinha do cachimbo – sempre nos fazendo rir. Não é engraçado, Constance?

— O que o panaca do seu pai quis dizer é que essa ideia é tola. Romance existe apenas em livros e vitrines de perfumes.

— A senhora e papai não se amam? – Interrogou Daphne abismada

— Não! – Negaram os dois

— Astória, quer se internada?

— Não, mamãe.

— Então não ponha idiotices na cabeça da sua mãe! Na sua, já basta.

— Puxou a mãe!

— Cale-se, seu velho arrogante!

— Arrogante? Sua perua desqualificada!

— Vai se casar com Draco Malfoy? – Perguntou minha irmã, deitada comigo no chão do salão de dança

— Espero que não, ele é um nojo.

— Não pensou nisso quando tocava piano. Será que ele me ensina?

— Se não vomitar antes.

— Ei! – Rimos – Astória.

— Oi?

— Não quero me casar sem amor.

— Você não vai, te prometo.

— Não devia ter feito isso, Astória? – Papai encheu seu copo de uísque, com um cachimbo na boca – Sua irmã vai casar. Acha que sua miserável mãe deixaria ela ser livre assim? – Bebeu um gole – Claro que não.

— Papai, isso é saudável?

— Sabe o que não é saudável? Ter a vida de merda que temos! – Bebeu outro gole – Se somos tão superiores, por que bebemos como eles, fumamos como eles e-e... Porra – Jogou o copo no chão – Querida, minha querida. – Segurou minha mão – É uma rainha, não deixe que ninguém te diga o contrário.

— Você não é especial – Mamãe penteava meu cabelo com força, no meu dia de partida – Você só é uma garota que teve sorte de ter o sangue-puro e que – puxou meu cabelo – não valoriza o que tem.

— Desculpe, mamãe.

— Quieta! Olha para mim – Fiquei de pé – No momento que sair desta mansão, tudo o que fizer, com quem fizer, nos afetará, entendeu? – Assenti – Responda com a boca, Merlin te deu uma língua!

— Entendi, mamãe.

  Se abaixou e segurou minhas mãos.

— Você é linda, Astória, e use isso ao seu favor. Só porque é fraca, não quer dizer que todos precisam saber disso. Ao menos uma vez, honre a sua família e nos tire daqui! Você é a nossa maldição, dê um jeito!

  Eu não tenho uma maldição, não uma de verdade. Mas por anos, mamãe colocou na minha cabeça que sou uma tonta que não sabe fazer nada direito.

— Foi a coisa mais gentil que me disse, mamãe.

— Viu? Isso se chama atuação. Se praticar um pouco, você chega lá.

  Me segurei para não chorar, ela era tão cruel.

— Promete que sempre vai me mandar cartas? – Daphne repetiu a pergunta pela milésima vez, na porta da mansão

— Já disse que sim. – Confirmei

— Não vai me abandonar?

— Nunca.

— E se-

— Daphne! – Reclamou mamãe – Deixe a menina ir!

— Eu te amo, Ast. – Declarou-se

— Também te amo, Daph.

  Nos abraçamos com força, seria o maior tempo que ficaríamos separadas. Mamãe e papai não pareciam se importar com minha ausência.

— Astória – Chamou papai – não esqueça para o que foi criada.

  Para que, exatamente? Para me sentir a pior pessoa do mundo a ponto de achar que só um homem rico e puro-sangue me faria feliz? Não preciso disso. Após o longo abraço de Daph, saí da mansão.

  Meus pais nunca saiam de lá – por causa do boato – e não seria naquele dia que fariam isso. Cheguei perto de um auror, que já fora comensal, e segurei a mão dele. Olhei cada detalhe da mansão. Percebeu que nunca chamo de minha casa? É porque meu lar é alguém.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Vossa majestade" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.