Lances de Carnaval escrita por Tai Barreto


Capítulo 1
Bal Masqué


Notas iniciais do capítulo

Olá, queridas.
Sejam muito bem-vindas.
É um imenso prazer as ter por aqui.
Eu estou com a cabeça cheia de ideias e eu resolvi externar alguns contos para aliviar a pressão.
Como dito na sinopse, esse vai se passar no Baile de Máscaras.
Eu espero que gostem.

Sem mais, boa leitura



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Esse era o primeiro ano que Daniela ia ao Bal Masqué. Ela não queria ir com fantasia comum, como de Colombina, Rainha de Copas, bruxa, princesa, anjo ou diabinha. Foi por isso que ela optou por usar um desenho animado esquecido. Como prova, quando pediu que o amigo, cabeleireiro e maquiador, pintasse seus cabelos curtos no tom de cinza do personagem, ele fechou a cara. Matheus queria que a amiga usasse outro desenho, talvez alguma princesa da Disney, porém, ela se manteve firme. O homem conseguira deixar os cabelos da loira o mais próximo possível do desenho. O uniforme fora produzido pela vizinha da mãe dela, que era a melhor costureira do bairro. Claro que a mulher também estranhou o modelo, contudo, fez o mais real possível.

Daniela estava diante do espelho do seu quarto, usando o macacão preto, justíssimo. Colocou o cinto prata com detalhes verdes, calçou as botas que foram customizadas e as luvas.

Danny Phantom! — bradou a amiga, que não sabia da fantasia que Daniela escolhera. — Ah, fala sério. Eu tive um crush nele.

A loira sorriu, arrumou a gola alta.

— Eu também tive e como sabia que poucas pessoas lembram dele... — Ela deu uma voltinha, para que Natália visse cada detalhe possível.

— Eu amei. Poxa, amiga, eu queria. — A morena fez beicinho.

— Tarde demais. — Daniela deu uma piscadela. — Vamos? — Ela pegou a bolsa de mão e se aproximou da amiga.

— Você está usando lentes?

— Verdes. Com o personagem. — Sorriu, orgulhosa.

— Se você tivesse me dito, eu poderia ir com a fantasia da melhor amiga dele.

— Sam Mason. Você está incrível de Kim Possible.

As duas saíram do quarto.

— Como foi que eu esqueci desse desenho? — Matheus se colocou de pé. — Poderíamos ter nos fantasiado de iCarly. Ninguém nesse mundo está mais para Sam do que Dani e Natália, para Carly.

— O carnaval vai chegar. Podemos fazer isso para os outros dias. Vamos?

Os três saíram. Daniela morava com os amigos num apartamento no bairro das Graças, na cidade do Recife. Por mais que o local do evento estivesse há menos de dois quilômetros, Matheus optou por chamar um carro de aplicativo. Primeiro porque as amigas estavam de salto. Segundo: não queria chegar suado. Ele estava fantasiado de Ron, melhor amigo da Kim Possible.

Assim que chegaram na frente do prédio, o carro parou e Matheus abriu a porta do banco de trás. Daniela foi a primeira, seguida de Natália e por fim, ele entrou. O trajeto durou dez minutos, graças ao fluxo de pessoas que também iam ao baile e ficaram na fila para entrar.

— Se formos ao Galo da Madrugada, eu não vou de Danny Phantom — disse Daniela. — Eu quero pular, não assar.

— Eu também não vou de Kim Possible.

— Que tal irmos nas cores das Três Espiãs Demais? — sugeriu Matheus. — Ou Meninas Super Poderosas?

— É por isso que você sempre está nos roles que marcamos. — Daniela beijou a bochecha dele. — Você é um amigo incrível.

— E não é um hétero topzera que pede foto de agora — brincou Natália, fazendo os dois rirem. — Entende de cabelo e maquiagem.

— É para enaltecer a beleza de vocês. — Ele abraçou as duas.

— Que mentira que foi para enaltecer a sua. — Natália o empurrou de leve.

Matheus riu. Era o que chamavam de metrossexual. Ou como Natália gostava de falar: era um homem com vaidade ou higiene. Achava um exagero esse termo, mas não podia negar que o amigo fazia um excelente uso dos seus conhecimentos. Tanto é que elas viviam de pele limpa, hidratada e belíssimas. Além de cabelos sempre lindos. Fora o responsável pelo corte pixie da Daniela, diante do calor que tem feito na cidade desde a chegada do verão. Doou os fios ao hospital de câncer para que alguma mulher ou garota fosse feliz. Era sua intenção desde que decidira cuidar deles e deixar que crescessem até a cintura.

Quando, enfim, entraram no salão, Matheus foi ao bar, pegar cerveja, enquanto as amigas ficaram no canto. Estavam ali para se divertir e beber e era isso que iam fazer.

— Eu notei que ela estava dando mole para ele — disse Natália, de repente.

— Quem? — Daniela franziu o cenho, sem entender nada. — Menina, dá para tu começar do início? Precisa sempre começar a narrativa pelo meio?

Natália riu.

— Eu não consigo perder a mania. — Encolheu os ombros. — Desculpa.

— Eu sei. — Ela também riu. — Vai, começa de novo.

— Karina. Eu percebi que ela estava de olho no Matheus. Quando estávamos no bar ontem.

— Ah, sim. Isso não é segredo para ninguém. Aquele tabacudo quem não desperta. A mina mó caída por ele.

— Quem é tabacudo? — Matheus se aproximava com três cervejas.

— Tu — respondeu Natália. — Eu vi Karina de olho em tu e o que tu fez?

— Ei, eu não percebi. — Ofereceu uma cerveja a ela e outra à Daniela.

— Claro que não. Estava concentrado em falar leseira com os meninos. — Ela revirou os olhos e ele olhou Daniela.

— Tu, quando quer ser tabacudo, faz com louvor. — Dani riu e sorveu da cerveja. — Tu te supera, meu irmão.

— Ei, na moral, tu chega a ser pior do que nós duas, quando queremos pagar de loucas. Real.

— Eu não queria me chegar nela ou ficar encharcando. Eu acho chato. — Ele deu uma golada generosa.

— Manda a real — pediu Natália. — Tu tá ou não na dela?

— Na Karina?

— Olha só, parece que é de peixes. — Ela balançou a cabeça em negativa. — Dani, é a tua vez.

— Ei, peraí, eu não sei. Eu nunca a olhei de outra forma. — Deu de ombros.

— Oxe. Agora pronto. — Natália fechou a cara.

— Matheus, abre o jogo. Se não gosta dela ou não tem interesse, manda a real. Eu não acho certo que a mina fique criando expectativa à toa.

— Minha gente, eu nem sabia que ela tinha interesse em mim. Peraí. Deixa eu me tocar, a ficha cair.

— Pois acelere, porque ela chega daqui a pouco.

— Como assim?

— Ei — chamou Natália e o rapaz a olhou. — A gente pode dançar?

— Claro.

Ela se afastou, impaciente.

— Como é que tu é desenrolado para um monte de coisa, mas o maior retardado para outras? — indagou Daniela. — Ei, meu fio, abra os olhos.

— Ei, Dani, na real, eu não percebi.

— Agora sabe. Ela achava que tu tava com uma de nós, mas Nat disse que não havia possibilidade nem mesmo remota, de isso acontecer. E tu tá ligado que combinamos com uma galera da facul de se encontrar aqui. Daqui a pouco eles tão chegando e tu vai ter tua chance. Ou tu te liga, ou dança.

Natália estava concentrada em dançar, mas não podia fechar os olhos para o que via. Ela sabia que Daniela era linda. Tanto é que as duas viviam se endeusando. Ela havia gostado da fantasia da amiga e sabia que ela chamaria atenção por onde passasse. Daniela tinha um corpo lindo, resultado das aulas de pilates e umas idas à academia. Era estudante de ginecologia e estava no último ano.

Um grupo de quatro pessoas olhava para Daniela. A maioria dos que estavam ali, usavam fantasia comuns: Batman, Mulher Maravilha, diabo, anjo. O referido grupo estava de Guardiões da Galáxia. Tinha Nebula, Senhor das Estrelas, Gamora e Drax. Era a moça que estava de Nebula que olhava a amiga da Natália. O cara que estava de Peter Quill também olhou. Pareciam comentar sobre ela.

Viu a moça caminhar em direção à amiga e pediu licença ao rapaz com quem dançava e se aproximou.

— Com licença — disse Nebula, olhando para Daniela. — Você está fantasiada de Danny Phantom?

— Sim.

— Quero outra cerveja. Você pode pegar? — Natália olhou Matheus e ele se afastou.

— Eu estava comentando com meu amigo, porque pedi aquele retardado para usar essa fantasia e ele se recusou. Eu tinha um crush nele.

Daniela riu.

— Eu também tinha, por isso estou usando a fantasia.

— Ficou incrível demais. Eu amei.

— Obrigada. A sua também está incrível.

— Eu posso tirar uma foto com você?

— Claro, amor.

Natália sabia que se fosse um homem, Daniela não seria tão doce e adorável. Homem comumente chegava elogiando ou puxando pelo braço e ela não tinha paciência para esse tipo de coisa. Ela havia dispensado dezenas de homens que chegaram assim.

O homem que estava fantasiado de Peter Quill se aproximou e tirou a foto das duas.

— Muito obrigada.

— Imagina, linda. — Dani sorriu.

Quando Matheus voltou com a cerveja, Natália pegou e foi para junto do rapaz que ela nem sabia o nome. E nem queria saber. O que importava a ela era dançar.

— Vamos dançar. — Matheus pegou a mão de Daniela e ela cedeu.

Começou a tocar um forró e a loira revirou os olhos.

— Eu prefiro músicas de Alceu Valença, Almir Rouche. É carnaval, não São João — reclamou.

— No Galo, você escuta esses dois e outros mais.

Ela dava uns goles na cerveja e dançava com o amigo. Ao fim da música, viu os demais amigos se aproximarem: Karina, Geovane e Carlos. Foram os cumprimentar e se acomodaram numa mesa.

Conversaram até que iniciou a competição de fantasias, rei e rainha do baile. Parecia que eles eram os jurados: dando opinião a respeito das fantasias e passos de frevo que as pessoas faziam no palco.

— Cheguei. — Natália sentou no colo de Daniela.

— Onde estava? — Dani arrumou os cabelos castanhos da amiga.

— Estava dando uns pega num boy ali e resolvi dar um perdido.

— Oxente. Por quê? — Karina franziu o cenho.

— Ele veio com a conversa de que eu era única. Pra cima de mim?

Daniela riu.

— Se tem uma coisa da qual tu manja é de boy enrolão — disse.

— Manjo. — Natália se gabou. — Tu é louco? Eu saí com uma quantidade de boy suficiente para me dar noção.

— Como foi que tu deu o perdido? — perguntou Carlos.

— Disse que ia no banheiro, rapidão. Se ele aparecer, eu pago de louca. O cara vem de comédia pro meu lado. Quase perguntei se ele estava conversando merda.

— Ei, bebezinha, sossega aí — disse Geovane. — Acontece. Tu deu o perdido. Fica de boa.

— Sossega a raba. — Daniela deu um tapinha na coxa da amiga.

— Vai procurar outro boy pra dar o perdido — brincou Matheus.

— Eu não fiz por querer. Só tô evitando boy lixo — se defendeu.

— Eu tô contigo — disse Karina. — Tem muito homem tóxico nesse mundo.

Ao fim do concurso, Carlos tirou Daniela para dançar e antes que Matheus se safasse com Natália, ela puxou Geovane. Não achava maturo da parte do Matheus ficar evitando Karina. Era mais sensato abrir o jogo.

— Tua fantasia está incrível, mas eu não sei do que é — comentou Carlos.

— Claro que não sabe. Ele não foi seu crush.

Ele riu.

— Do que cê tá falando?

— Danny Phantom é uma animação de 2004. Passava na televisão. Lembrei de repente e quis fazer.

— Ah, era daquele moleque que se transformava em fantasma?

— É. Essa fantasia é dele como fantasma, porque a roupa dele comum é mó sem graça.

— Responde uma coisa. — Carlos prendeu os lábios, contendo o riso, porque sabia que ia provocar a amiga.

— Diga.

— Tu vai falar assim quando tiver no consultório?

— Vai pra merda. Sabe que quando eu tô no estágio, eu sou educada. Não quero mais dançar contigo. Vou no banheiro.

Ele riu.

— Vai dar perdido em mim?

— Pra tu, eu mando a real.

Daniela se afastou e foi em direção ao banheiro, segurando sua bolsa. Ela não desgrudava, porque era onde estavam seus documentos, batom, espelho, celular e dinheiro. Depois ela ia acertar o valor que Matheus tinha gastado com as cervejas. Entrou no ambiente ocupado e quente e foi até o espelho.

Sua maquiagem estava impecável. Fora da primeira coisa que Matheus cuidara para a noite, depois que ela colocou as lentes. Deveria ter colocado a caixa na bolsa, assim, se livraria delas. Retocou o batom, que tinha saído enquanto tomava sua cerveja.

Uma das mulheres que estavam lá, puxou assunto com ela e foi onde ficou. Ao sair, Carlos dançava com outra.

— Com licença — pediu uma voz masculina e ela olhou na direção. Era o amigo da Nebulosa. — Desculpe se eu estiver sendo inconveniente, mas queria saber se podemos dançar?

— Claro.

Ele estendeu a mão e ela segurou. Começaram a dançar.

— Desculpe a falta de educação. Eu me chamo João.

— Daniela.

— Eu tenho a impressão de ter visto você em algum lugar.

— Eu moro aqui perto.

— Acho que isso explica. Também moro. Na Madalena.

— Provavelmente nos vimos em algum supermercado. Eu sou viciada em ir, nem que seja só para comprar pão.

Ele riu.

— Sério?

— É. Pode perguntar a qualquer amiga minha. Eu sempre estou lá. Tem dias em que eu vou cinco vezes. Acho que os atendentes não aguentam nem olhar mais na minha cara.

— O que é que tem lá que te atrai tanto?

— Um dos fornecedores de laticínios é um gato. Vou para olhar na cara dele e ficar babando em casa.

— Você me parece o tipo de mulher que age.

— Eu sou, mas com ele, fico de boa só olhando. Até porque, ele pode ser comprometido e eu não quero fazer o que não devo.

— Não seria mais fácil saber?

— Não. Gosto de ficar nessa. Terminei um lance tem umas semanas aí. Estou curtindo minha companhia que é a melhor nesse mundo.

— Eu não tenho dúvidas. Sua fantasia está incrível. Sempre que eu ver algo a respeito, vou lembrar de você.

— Obrigada. Foi tudo feito sob medida.

— Ficou sensacional.

— Não foi? A sua também está incrível. Eu tenho uma tara no Chris Pratt. Na verdade, minha tara é por homens altos.

— Algum motivo específico?

— Nada. Acho que acima de um metro e oitenta e abaixo de dois, porque homem alto e desengonçado não dá para mim.

— Amiga! — Natália quase se enfiou entre Daniela e João. — Vamos sair daqui?

— O quê? — Daniela parou de dançar e olhou o rosto da amiga, procurando qualquer vestígio de brincadeira. — Cê tá falando sério?

— É. Aqui deu o que tinha que dar. Vamos beber lá no Marco Zero.

— Fantasiadas, Natália?

— Claro que não, porra. Moramos há menos de dez minutos de carro daqui.

— Que fogo é esse?

— Tá a fim de ir? — Natália olhou o rapaz. — Tu vai em casa, tira isso tudo, bota uma camisa, bermuda, chinela e a gente se vê lá.

— Camisa, bermuda e chinela?

— É. Eu vou de short jeans e camiseta.

— Você vai? — Ele olhou Daniela.

— Vamos, amiga. — Natália juntou as palmas mãos.

— O que Matheus falou?

— Ele vai. Tu sabe que ele não perde a oportunidade de beber.

— Tá bom. Vamo simbora.

Natália arrastou os amigos para fora do clube, junto com os Guardiões da Galáxia e combinou com eles uma forma de se encontrarem. Trocaram números e Matheus chamou o carro.

No apartamento, Daniela pediu a Natália que abrisse seu zíper; fechara com a ajuda de um pedaço de fio dental. Retirou as luvas, lavou as mãos e se apressou ao quarto para tirar as lentes. Aquilo estava incomodando. Retirou as botas e o macacão. Permitiu-se desfrutar do frescor que a nudez lhe dava, removeu a maquiagem, lavou o rosto e foi em busca de algo confortável. Nem tinha noção das horas.

Pegou um vestido justo, de alças finas e uma jaqueta jeans. Pegou mais dinheiro, cartão de crédito e calçou sandálias rasteiras. Os pés agradeceram. Encontrou os dois amigos na sala. Matheus estava de bermuda jeans, casaco moletom cinza mescla e chinelos e Natália, short jeans, camiseta e uma jaqueta na cintura.

Saíram e não demoraram a ir ao Marco Zero. Em quinze minutos estavam lá. O pessoal que estava com eles no clube foi chegando aos poucos. Fizeram a cota e os rapazes foram comprar as cervejas. João estava de carro e como não ia beber, levou uma caixa térmica com gelo.

— De onde vocês são? — Natália quis saber.

— Madalena — respondeu Gabriela.

— Ah, pertinho de casa. Somos das Graças.

— O que vocês fazem da vida? — Matheus sorveu da sua cerveja. Nem lembrava qual era aquela. Talvez fosse a quarta da noite.

— Eu trabalho no hospital do câncer. Acho que vi você lá. — A moça que se fantasiara de Gamora olhou Daniela. — Desculpa a falta de educação. — Ela sorriu amarelo. — Eu sou Morgana. — Era a única que não tinha se apresentado.

— Ah, foi lá que eu te vi, com toda certeza — comentou João, ao lembrar. — Eu fui buscar a Morg. — Ele bebeu um pouco de água.

— O que tu foi fazer lá?

— Doar meu cabelo.

— Ai, mentira — o tom de voz de Morgana foi tomado pela incredulidade. — Menina, e ele estava de que tamanho?

— Na cintura. — Daniela bebeu um gole da sua cerveja. — Pesado, trabalhoso, calor. Pelo amor de Deus. Foi a melhor coisa que eu fiz na vida.

— Um gesto muito lindo — elogiou João.

— E você não bebe por quê? — Ela o olhou.

— Eu doo sangue.

— Você fala que meu gesto foi lindo, mas o teu é mais, porque tu tá abrindo mão de algo que te afeta diretamente.

— Eu nunca bebi. Não faz diferença.

— Certíssimo. Falou tudo. — Natália aplaudiu. — Álcool não leva ninguém a nada.

Matheus estava conversando com os demais: Karina, Geovane, Carlos e Felipe sobre política. O jovem hoje em dia não sabia conversar sem expor sua opinião quanto a isso. Ou era assim que o trio formado por Natália, Daniela e Matheus pensava.

— Só serve para influenciar os outros a darem pt.

— Tão falando de política também? — Matheus quis saber e Natália riu.

— Ó o outro, louco já. — Natália riu.

— Eu fiquei interessada nessa de doar sangue — comentou Daniela. — Eu vou abrir mão do álcool.

— Se chover canivete, a culpa é tua — ameaçou a amiga.

— Porra. Eu sou uma alcoólatra para você? — Daniela fingiu choque.

— Não, amiga, imagina — ironizou.

— Essa vai ser minha despedida.

— Eita porra. Agora senti firmeza. — Ela ergueu a long neck e brindaram. — Se joga no que é certo, minha pirraia.

— E esse teu cabelo? — inquiriu Gabriela.

— Vai ficar cinza até a tinta cair — respondeu Natália por ela.

— Ou eu jogo uma cor escura por cima. — Ela passou a mão nos fios lisos.

— Qual foi o melhor lado de ter cortado desse jeito? — Foi a vez de Morgana.

— Sentir o ventinho na nuca depois de correr louca atrás de ônibus. — Sorveu da sua cerveja.

— Tu mora nas Graças. Sério que anda de busão?

— Moro porque divido o apartamento com mais três: Natália, os pais dela e Matheus. Minha faculdade é privada, mas ganhei bolsa de setenta por cento e eu sou estagiária. Acho que isso te esclarece algumas coisas. — Ela riu e deu outro gole na cerveja.

Estavam sentados no banco, lado a lado, concentrados na conversa e bebidas.

— Vamos dar uma volta. Tão a fim de ir? — Matheus se aproximou.

— Sentei aqui e só saio depois que secar a última garrafa — respondeu Natália, erguendo e berbendo.

— Eu tô me despedindo do álcool. Tô com Nat. Vão vocês dois sozinhos. Não tem nada de mais que pode acontecer — disse Daniela.

— Eu vou. — Morgana levantou, arrumou a barra do short jeans e amassou um pouco os cabelos crespos e volumosos.

— Eu também. — Geovane se juntou a eles e os quatro partiram, deixando Felipe.

— Sabe que eles foram se pegar, não é? — Natália olhou João.

— Pelo menos eles vão se divertir — brincou e deu de ombros.

— Eu vou procurar algum barzinho pra usar o banheiro. — Levantou e deixou a garrafa vazia de lado.

— Traz um chiclete para mim. — Daniela abriu a bolsa. — E uma garrafa de água. — Pegou dez reais da carteira e ofereceu a amiga.

— Eu pago, amiga. Fica de boa.

— Eu também estou apertada. — Gabriela se colocou de pé.

— Vai embora todo mundo. — Daniela empurrou a amiga pela bunda e ela riu.

— É sério, porra. Eu tô apertada.

— Vão escoltando as meninas. — Mais uma vez, ela expulsou o pessoal e ficou sozinha com João. — Fala mais de você. — Ela cruzou as pernas e o olhou.

— Faço ortodontia na Federal e tu, faz o quê?

— Ginecologia. — Guardou o dinheiro e pegou outra garrafa. — Acho que vou emendar com fisioterapia.

— Oxe. Duas graduações?

— É. Eu estou pensando em ser fisioterapeuta pélvica. — Sorveu da nova cerveja.

— Ah. Gosta tanto assim da área?

— Sem dúvidas. Sempre foi meu sonho passar doze horas do dia vendo vaginas.

João riu alto e Daniela bebeu mais.

— Você não existe. E pensar que eu não estava nem a fim de ir ao baile. — Ele balançou a cabeça em negativa.

— Por quê?

— Cansado. Estagio numa clínica popular e atendemos aos sábados.

— Muita gente?

— Sim. — Ele pegou uma garrafa de água. — Eita. Você mandou comprar, tendo aqui. Desculpa.

— Relaxa. Tem chances de Natália ficar com alguém e esquecer ou só esquecer.

— Vocês se conhecem há muito tempo? — Abriu e sorveu do líquido incolor.

— Sim.

— Ela também faz ginecologia?

— É. Matheus faz fonoaudiologia. Vai trabalhar em clínica particular, não é?

— Sim, mas eu penso em fazer atendimento a preço popular. Não é todo mundo que tem cinquenta reais para uma extração, ou trezentos para uma limpeza.

— Tem razão.

— Ter atendimento de qualidade não cabe no bolso de todo brasileiro. Ainda mais com o que tem acontecido.

Daniela concordou com a cabeça.

— Eu tenho pensado muito em fazer isso também. Tinha até conversado com Natália um dia desses. Vamos trabalhar juntas, e nada mais justo que fazer um preço acessível. Até porque, não estamos visando ficar milionárias com o nosso trabalho no primeiro ano.

— Eu entendi. — João sorriu. — Estão visando atendimento de qualidade para a classe baixa. Isso é bom. E pelo menos você tem a Natália. Eu estou sozinho nessa.

— Não convidou ninguém?

— Eu não tenho coragem. — Ele deu de ombros. — Sei lá. Eu vejo uma quantidade grande de gente que tem um pensamento diferente do nosso, entende?

— Completamente. — Daniela passou a mão nos cabelos outra vez.

Ficaram em silêncio e ela olhou o mar. O cheiro que vinha com a brisa era bom, capaz de acalmar a mente caótica da mulher. Sorveu mais da sua cerveja e olhou o homem perto de si. João tinha os cabelos e olhos escuros, expressão serena e pele clara. Tinha muito do que comumente atraía a atenção dela.

Foram despertos pela risada da Natália, escandalosa e Daniela meneou a cabeça em negativa. O grupo que fora ao bar se aproximava, rindo e enfim, sentaram. Olhavam-se e caíam na risada.

— Que porra tá acontecendo com vocês? — João quis saber, sem entender nada.

— Cadê meu chiclete, Natália?

— Eita. Sabia que tinha esquecido alguma coisa. — Ela fez uma careta.

— Porra, amiga. Tu misturou bebida?

— Não. — Ela se conteve e o pessoal riu outra vez. — Vão se foder. Parem de rir. Perdeu a graça.

Daniela secou a garrafa.

— Vamo comigo no banheiro?

— Porra, Dani, cabei de chegar de lá. Vai com o João. Pelo menos é um homem e nenhum vai se atrever a te cantar por estar acompanhada.

— Viram o Matheus, Karina e os demais?

— Vimos. Foi deles que estávamos rindo.

— Por quê? — João indagou outra vez.

— Pelo amor de Deus, me diz que eles não estavam trepando na rua — pediu Daniela.

— Eita. Olha a outra. — Natália olhou Carlos. — Cheia das ideia.

— Vai, Natália. Diz aí, inferno.

— Vai no banheiro e eu vejo se conto ou não.

Daniela revirou os olhos e levantou.

— Pode me acompanhar? — Ela olhou João.

— Claro. — Ele também levantou.

Os dois se afastaram. Aquela não era a primeira vez que Daniela frequentava o lugar, logo, sabia em que bar poderia usar o banheiro. Lá, utilizou, lavou as mãos só com água e ao sair, encontrou João falando com quatro pessoas sentadas à uma mesa.

— João — chamou e ele a olhou.

— Falou. — Ele estendeu a mão e ela se aproximou e segurou. — Eu não perco o Galo esse ano nem fodendo.

— Tu vai estar por onde? — A negra de cabelos crespos quis saber. —Decidiu?

— A gente se vê por lá.

— Porra, vai ter dois milhões de pessoas. Tu acha que vai dar pra gente se ver? — Ela riu e olhou Daniela da cabeça aos pés. — Janaína. — Estendeu a mão para ela e a loira segurou firme e a cumprimentou.

— Daniela.

— Foi o pessoal dela que tu encontrou no baile? — O negro olhou João.

— É. Se quiserem chegar por lá, é só me ligar.

— Vão ficar aí até que horas? — O loiro perguntou, olhando Daniela da cabeça aos pés.

— Não sei, mas com a quantidade de cerveja que tem, acho que ficamos mais uma hora. — João olhou o relógio no punho. — Eita. São duas da manhã.

— Natália só vai depois que não tiver mais nenhum tostão para gastar com cerveja — disse Daniela. — Eu espero que ela não encontre um caixa 24h, senão, ela só vai ao amanhecer.

— Depois chegarmos lá — disse o loiro.

— Eu vou comprar o meu chiclete. — Daniela voltou ao bar e fez o pedido.

— Tranquilo — ouviu João dizer e eles se afastaram do bar.

— Vocês não precisam ficar até o fim — disse ela, abrindo a embalagem do chiclete e colocando na boca. — Quer?

— Eu aceito. — Ele pegou o que ela ofereceu.

— Eu sei que está cansado. Você nem ia ao baile.

— Foi bom ter ido. Estava precisando conhecer gente nova e que bom que foram vocês. Eu gostei da amizade de vocês. Da forma como se conhecem.

— Eu sou mais tranquila que a louca da Natália — garantiu.

— Que tal sairmos mais tarde, à noite? — sugeriu, um pouco inseguro. — Sei lá. Eu gostei muito do papo que tivemos.

Daniela parou de caminhar e o olhou.

— Onde iríamos?

— Rodízio de pizza.

Ela sorriu.

— Eu chego a comer dez fatias.

— Se você comer, eu pago a conta. Normalmente Gabriela abandona a disputa na quarta fatia.

— Se eu não comer, dividimos a conta. — Ela estendeu a mão e ele apertou.

— Fechado. Eu vejo um restaurante e te ligo.

— Eu vou esperar.

João continuou segurando a mão dela, olhando nos seus olhos claros. Aproximaram-se e beijaram. Ele colocou uma mão na sua cintura e ela, as suas, na nuca dele. Daniela correspondia, lentamente, sentindo o sabor de menta do chiclete. Pelo menos não era o da cerveja que ela havia bebido.

O beijo era bom, calmo, com uns afagos e um leve aperto na cintura. Ela gostou disso. Ele parecia interessado em a agradar. A diferença de altura entre eles ajudou a fazer com que ela ainda estivesse o beijando. Daniela gostava de homens altos.

Afastaram-se, levemente ofegantes e ele beijou a testa dela.

— Isso foi melhor do que eu esperava.

— Também acho. O rodízio ainda está de pé?

— Agora mais do que nunca. — João deu um beijinho nela. — Vamos voltar para o grupo?

— Não acho que tenhamos muita escolha — brincou.

Com uma mão na lombar de Daniela, João a manteve junto de si, enquanto voltavam para o grupo que ainda bebia e se divertia.


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Notas finais do capítulo

Minha tara no Danny Phantom não é de hoje. Pensei em centenas de fantasias.
O que acharam?
Eu não sei quando volto com o conto 2, mas saibam que ele já está pronto. Falta só revisar.
Boa semana
Revisado em 09.01.2020



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