O Lobo-homem e o Feiticeiro Mestiço escrita por Melvin


Capítulo 1
O lobo e o feitiço sob a lua.


Notas iniciais do capítulo

~ok, respira, Melvin.~
Oie!
Fico feliz pelo interesse.
Desejo uma boa leitura.



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Sob o brilho de uma lua redonda, eu caminhava nas sombras das árvores. A noite estava calada e procurava um caça, farejando o vento atrás de amigos e inimigos. Minhas patas se afundavam na camada de neve, mas sustentava o focinho sobre as velhas trilhas de presas. Não tinha nenhum destino em mente. Como um lobo solitário, vago dia após dia em silêncio e sobrevivendo. Há meses não ouço ninguém, não encontro rastros de cervos ou bisões, é uma solidão enlouquecedora e fria de inverno. Tudo que sinto gosto são dos pequenos pássaros e os roedores que raramente capturo. Desejo uma morte mais digna do que a que a fome me oferece, seguida pela solidão de meu cadáver congelado.

Um urro abafado chama minha atenção e me faz caminhar para o outro lado da colina branca, arrastando a calda e afundando no gelo a cada passo. Farejo um urso fedido e planejo: se o venço, me alimento, e se perco, encontro a morte digna. Rebaixo meu corpo ao ver o volume escuro cavando a neve onde pretende dormir. Meu oponente é jovem e pequeno.

Aproximo-me, levando comigo meu estômago vazio, dou um salto e corro em sua direção. Agarro o coro de seu pescoço, me parece sucesso até sentir suas garras cortar meus pelos cinzentos. Afasto-me e logo salto contra ele novamente, mordo sua pata enorme, largo-a e ataco seu rosto para cegá-lo. Seus urros me ensurdecem ao cortar a noite silenciosa, mas antes que eu recue mais uma vez, ele consegue morder meu ombro, afunda seus dentes e grunhe vitorioso. Ganindo de dor, mordo-o para que me solte, mas ele me arrasta feroz. Não há socorro para mim... ele é mais forte.

Em último ato desesperado, arranco a ponta de sua orelha direita com os dentes, só então ele me joga para longe. Contudo, ao cair continuo rolando na neve, sem parada, descendo por uma ladeira em um golpe de sorte de meu inimigo. Sem forças, perco a consciência depois de alguns giros.

Desperto com um cutucar em meu ferimento que gera uma dor aguda. Por muito pouco, não abocanho o pássaro que estava pousado sobre mim e bicava meu sangue. A neve branca, tão linda de manhã, agora estava manchada com o sangue de minha ferida. Meu corpo estava frio, me sinto tonto, choramingo por me notar em mal estado e me deito, adormeço de fome e cansaço. Quando a nova noite chega, levanto-me. É necessário que me afaste do local marcado com meu sangue se não quero ser comido por inimigos. Não há como usar o ombro ferido, pois doí, então manco em um novo rumo, avançando no meu resto de vida lupina.

Depois de tempos, sento-me em meio às arvores e encaro a lua brilhante no céu limpo. Ela é a única testemunha do meu fim e minha única companheira nessa vida. Meu corpo treme involuntariamente e não reage muito, estou ficando sem forças. Uma sede tremenda consegue enganar a minha fome, deito-me devagar sobre a neve e mordo o tapete branco, mastigo, me alivio, mas não faz sentido, sinto-me agindo como louco.

Enquanto espero em paz que a morte me alcance, um chamado aconchegante surge sussurrante em meus ouvidos. Sinto-me um pouco mais animado e ouço suas palavras: “Siga até mim predisposto guardião. Sirva-me em minha proposta e viva por um proposito maior”.

Confuso, levanto-me da neve. Acredito que qualquer um escutaria a voz, ao chamado, poderia encontrar um inimigo, mas mesmo assim caminho na direção da repetição das frases, ecoando com uma melodia doce e encantada. Encantada como um sussurro da lua para mim...

Espreito nas sombras do bosque, circulo ao redor da clareira de neve intocada onde uma mulher estranha e de vestes longa espera sob o brilho da lua. Não sou tão bom com o silencio, pois manco, mas, mesmo assim, não sou percebido e ela prossegue recitando suas palavras sem mover seus lábios, concentrada.

Não gosto dela, algo em mim diz que eu devia partir e abandoná-la em seu ritual. Mas ela me atrai intensamente com seu cheiro, seu canto enfeitiçado e a força que emana... Hesito e paro próximo da raiz de uma árvore, ouvindo mais uma vez sua oração. Sinto o cansaço do meu corpo e sento-me, porém logo me deito, observando atentamente as costas da mulher absorvida em seu chamado. Ela não é algo comum, pode até ter o cheiro de humana, mas me assusta por não parecer fraca ou temorosa, mesmo estavam no meio da selvageria.

Desconfio quando ela se silencia de repente. Ouvimos então um uivo distante da alcateia em que nasci e que havia me expulsado há muito tempo. Eles anunciam uma missão de caça, uma caçada à mulher que recita as palavras ecoantes na montanha.

— Saia das sombras, animal — ela diz, agora é sua voz tomando a clareira. Imediatamente sinto que é comigo e me enraiveço, pois odeio ser chamado de animal. — Eu mandei que saia, ou não ouvirá o que tenho a lhe dizer.

Curioso e fraco demais para enfrenta-la, demoro uns segundos para decidir me levantar sobre as três patas boas e adentrar na clareira, atento aos seus movimentos. Lentamente, a mulher vira-se na minha direção, analisa-me séria e depois uma expressão caridosa surge.

— Deve ter passado por muita coisa, jovem lobo solitário. Parece estar prestes a encontrar o julgamento de sua alma no outro mundo... Contudo, foi o único a ouvir-me e terá uma nova chance em gratidão. — Observo-a, sei bem que estou magro e meu coração bate lento, como se estivesse mesmo em seus últimos minutos. — Venha... — ela estende uma mão pálida em minha direção. — Aceite servir á minha proposta e viva mais com um proposito.

Aquela noite era densa e silenciosa, eu encarava os olhos castanhos enigmáticos e não refleti muito, o que me importava era que eu iria sobreviver. Estendi a pata do ombro ferido, era a que podia oferecer, entreguei-a e logo o olhar dela brilhou ao confrontar o meu, inundando-me de pensamentos, informações, força e saúde em segundos. Depois, assustado, tomei ciência de que minha ferida estava curada e minha pata se transformava em uma mão humana, com dedos longos e sem garras, em seguida meu braço era também transformado e, em segundos, meu corpo todo era de um homem. Larguei-a assombrado, incomodado e estranhando-me. A mulher se tornara mais baixa que eu e exibiu um leve sorriso.

— Achei que se tornaria um homem magro e pequeno — disse-me com graça. — Mas sua alma se revela forte e determinada. É melhor do que eu esperava — Seus olhos analisam meu corpo despido quando anda a minha volta, num circulo completo. — Não pode ficar desprovido de cobertas, apesar de não ser uma visão desagradável — ela parou, girou uma de suas mãos, um foleio, e roupas humanas me cobriram.

Feiticeira — murmurei espantado, com uma voz estranha saído de minha garganta e nas palavras dos homens.
Ela sorriu e tocou meu rosto.

— Sim, mas não tenha medo meu jovem lobo-homem, preciso de você para uma boa causa.

Senti um estalo em minha mente, meu cérebro pareceu pressionado naquele crânio, grunhi até passar e então me voltei a ela, chocado:

— Gerastes um filhote do líder da alcateia!

— Sim — disse-me sem abalo e até contente.

— Zombastes do ciclo natural... E agora querem matá-lo.

— Exatamente — ela baixou o rosto, assumindo pesar. — E antes que me julgue mais, deve saber que amei o pai, amei a qualquer custo, porém ele me deixou. Talvez, nem mesmo tivesse me amado...

Era lógico para mim que nenhum lupino se uniria romanticamente e para sempre com uma humana, ainda menos se esta tivesse dotes de encantamentos e feitiços.

— Lobo, ouça-me! — chamou-me a atenção. — Meu filho completará dezoito anos em breve, idade em que nós, feiticeiros, assumimos nossos poderes por completo e também, eu acredito, que ele poderá expor suas habilidades alternativas diante de sua miscigenação com lobos. Com isso, ele não será compreendido pelo mestre de feitiçaria e não encontrara um lugar. Entreguei à sua mente informações para que seja um guardião apto para as situações que ele ira enfrentar. Tua missão com a nova vida que lhe dei é protegê-lo e ensiná-lo sobre vocês. Quando ele estiver seguro, você será libertado.

— Encontrou o lobo errado. Sou solitário e tudo o que posso dizer da alcateia é de meu passado distante e infantil.

— Isso basta. Ele apenas precisa saber como é a vida de um lobo — observei-a, incerto. — Não tenha medo de fracassar. Eu vejo, meu querido lobo. Vejo em seus olhos cinzentos que você será tudo que ele precisa nesse momento. Você será forte quando ele se achar fraco, você será seu herói quando estiver em apuros, você será mais que seu amigo quando ele se sentir solitário, você o levará aonde ninguém e nenhuma outra criatura foi.

— Se ele não for morto pelos lobos.

A expressão sonhadora dela se desfez.

— Você não o deixará perder a vida pelos dentes daqueles animais.

— Mas eu os entendo — disse-lhe frio. — Não podem deixar um primogênito mestiço vivo, não podem permitir que ele torne-se o herdeiro da alcateia.

— Como assim? Eles devem ter outros para eleger, devem ter sangues puros.

— Na verdade, o alfa estava doente a bons tempos. O único meio irmão de seu filho é um filhote, que resiste com dificuldade a três meses de vida.

— O alfa está doente? — ela pareceu preocupada e confusa.

— Sim, minha senhora. É um lobo velho, viveu mais que qualquer outro, mas não teve outras proles de sucesso até seu filho mais novo nascer esse ano.

— Ah, se eu pudesse fazer mais! — ela tampou seu rosto brevemente, chorando em silencio. Esperei. —... Lobo conheça que neste momento uso todo meu poder em ti, você é minha esperança. Faça meu filho viver e conquistar todas às glorias, certamente ele saberá valorizar sua lealdade. E no fim, quando tudo estiver bem, liberto-o desta sina e poderá viver em um novo lugar, onde não passará fome ou ameaças e poderá formar seu próprio grupo.

Eu não tinha mais escolha, ao estender a pata aceitei as condições apenas para continuar vivo, se chegasse a ter vida e liberdade no fim disso, seria um bônus.

— Que assim seja — respondi.

A feiticeira sorriu, aproximou-se e selou seus lábios nos meus docemente, uma onda de ardor se espalhou em uma linha sob minhas clavículas e braços. Estranhei a sensação, mas então ela se afastou, e a certa distancia suas vestes brilharam intensamente e mulher desapareceu. A noite voltou a ser mais sombria e preenchida com os sons fracos da natureza. Girei-me em volta de mim sozinho, o par de pernas era estranho, mas era como se já as tivesse há tempos. Inspirei o ar frio me sentido vivo e forte, para um lobo a beira da morte estava renovado. Agora só tinha que encontrar o garoto.

Em meu primeiro passo, meu pé se afundou profundamente na neve intocada da clareira – onde estranhamente nem mesmo havia as pegadas da mulher – e cai de lado. Sentei-me sobre o tapete frio e fofo, estranhando a dificuldade, então, numa súbita ideia, joguei minhas mãos na neve a frente, querendo ser lobo, e meu corpo todo se transformou novamente. Minha estrutura lupina estava maior, mais robusta e bem alimentada, como o corpo de um alfa, minha pelagem mesclada de cinza e branco era mesma. Segui meu rumo, sabendo que havia um vilarejo em que teria pistas do paradeiro do mestiço.


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Notas finais do capítulo

Obrigado por ler!

Deixe um comentário.
Vou até ajudar: Gostaria se saber se está bom, se gostou, se algo pode ser melhorado, se devo continuar, o que acharam dos personagem, o que esperam nos próximos e coisas assim.


Eu sou uma boa pessoa, sério, sem medo ou vergonha, ok?
Até o próximo.
Um abraço!



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