Amor, em primeira pessoa escrita por Anaruaa


Capítulo 20
Família




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Eu corro o risco de parecer exagerado, ou dramático, mas o momento mais difícil da minha vida, foi aquele em que eu tive que deixar os gêmeos e voltar para casa.

Na semana que eu passei com eles eu descobri um tipo de amor que eu nunca imaginei que existisse, um amor imenso é totalmente incondicional.

Isabel me convidou para ficar na casa dela e eu saí do hotel para passar mais tempo com meus filhos. Eu ajudei a cozinhar para eles, fiz dever de casa, brinquei com eles, cuidei dos bichos, fomos à praia. Foram dias diferentes de tudo o que eu já tinha vivido.

Dona Carmem me mostrou as fotos das crianças desde o nascimento, eu me emocionei vendo o quanto eles eram fofos. Eu chorei quando vi as fotos de Isabel grávida. Ela sempre foi especial para mim, e eu sempre achei que ela era linda, mas grávida ela era como uma Deusa. Ela tinha muitas fotos da gravidez, mas as mais bonitas, ela fez na praia e no parque. Havia uma foto em que ela estava nua, em um lago, ela foi fotografada de perfil, os cabelos longos jogados de lado, tampando o seio, a barriga enorme em destaque. Aquela era a foto mais linda dela e eu lamentei por não ter estado lá com ela, por ter desperdiçado tanta coisa. Eu deveria ter ido atrás dela desde o início. Eu pedi a cópia daquela foto e pensei em fazer um poster para colocar no meu quarto, além de várias fotos dos gêmeos. Eu estava tão feliz, que me esqueci que tinha de ir embora.

As crianças também se apegaram a mim, e quando chegou a hora de partir, elas choraram e me pediram para ficar. Isso partiu meu coração.

Eu já tinha experimentado separações dolorosas antes, mas nada era como essa. Ver meus filhos chorando porque eu não podia ficar com eles estava me matando.

Eu tentava falar com eles todos os dias, mas eu tinha tanto trabalho que sempre chegava em casa tarde, muitas vezes eu só conseguia ligar para dar boa noite a eles.

Eu estava tentando diminuir o ritmo no trabalho, mas além dos meus vários clientes, eu era sócio da empresa e tinha muitas coisas para resolver, muitas responsabilidades. Decidi não aceitar novos clientes e comecei a passar os antigos para outros advogados do escritório, eu pretendia ter mais tempo para os meus filhos.

Eu só consegui voltar para os gêmeos dois meses depois, exatamente no aniversário deles. Minha mãe estava ansiosa para conhecer os netos e viajou comigo. Ela ficou muito emocionada ao conhece-los, abraçou Isabel e reclamou por nós dois não termos ficados juntos. Nós levamos muitos presentes para as crianças.

Eu voltei algumas vezes durante aquele ano, sempre por poucos dias. Eu ficava na casa de Isabel todas as vezes e comecei a me acostumar com aquela vida simples, tão diferente da que eu tinha na cidade. O meu apartamento grande, luxuoso e solitário, começou a me oprimir, eu me sentia mais em casa na chácara de Isabel.

Eu consegui convencer Isabel e dona Carmem a trazerem as crianças para passarem o natal comigo. Elas chegaram no dia 22 no início da noite. Dona Carmem preferiu ir para a casa do irmão, mas Isa e as crianças ficaram comigo.

Eu precisei trabalhar no dia 23 e Isabel aproveitou para visitar amigos e levar as crianças ao parque e ao cinema. Voltei para a casa mais cedo e eles ainda não tinham voltado, resolvi cozinhar para eles.

Nós jantamos juntos e depois demos banho nas crianças e os colocamos na cama. Eu me sentia imensamente feliz, porque aquela era a minha família, e era bom tê-los na minha casa, onde eu não era apenas uma visita. Naquela noite, eu senti de todo o coração, que eu queria viver aquilo todos os dias da minha vida.

Com as crianças dormindo, achei que seria bom ter um momento só com Isabel. Nos últimos tempos eu vinha pensando muito nela, eu sentia saudades das nossas conversas e de passar tempo com ela. Mas Isabel parecia me evitar, tentando manter uma certa distância de mim. Quando eu estava na casa dela, só nos víamos à noite e nunca estávamos sozinhos. Pensei que aquele seria um bom momento para nós dois. Eu já ia convidá-la para tomar um vinho comigo, quando ela comentou o quanto estava cansada.

—O dia foi cheio. Vou tomar um banho e depois vou dormir. Boa noite Carlos.

—Boa noite Isabel. — Respondi decepcionado.

Ela foi para o quarto e eu fiquei na sala, vendo tv, acabei adormecendo no sofá. Acordei mais tarde com uma movimentação na cozinha, fui até lá e era Isabel. Ela usava uma camisola cor-de-rosa e seus cabelos estavam soltos caindo pelas costas.

— Desculpa se te acordei, eu só vim tomar água.

—Não se desculpe Isabel, você está em casa. Não consegue dormir?

—É. Mesmo tão cansada, não consigo relaxar aqui. É estranho estar na sua casa.

Ela estava parada diante de mim encostada na bancada, com os braços cruzados, como se quisesse se esconder.

—Estranho por que? Eu sempre fico na sua casa e você não parece ter problema com isso.

—Eu não tenho, mas lá, a casa não é só minha, ela é dos seus filhos, minha mãe também está lá. Aqui é a sua casa, do seu jeito. Eu te percebo em cada detalhe aqui.

—E por que isso te deixa desconfortável?

Ela me olhou nos olhos, como se quisesse me fazer sentir sua sinceridade.

—Por que eu não faço parte disso. Nada aqui lembra que um dia você… Enfim é estranho.

Eu olhei para Isabel e vi que ela estava triste. Ela virou-se para sair, dizendo que ia tentar dormir. Quando passou por mim, a luz refletiu em seu colar, o que fez o pingente de meia lua brilhar. Ela ainda usava o colar que dei a ela, tantos anos antes. Quando ela passou por mim, eu segurei seu braço, gentilmente, fazendo-a virar para mim.

—Eu quero te mostrar uma coisa.

Eu a conduzi até o meu quarto, ela parou na porta e eu acendi a luz, então apontei para o móvel ao lado da minha cama, onde eu mantinha a estátua de onça-parda que ganhei dela anos antes.

—Lembra dela?

—É a onça que eu te dei? Você guardou?

— Mais do que isso. Eu a mantive pertinho da minha cama todos esses anos, para sentir você por perto.

Ela instintivamente levou a mão a meia lua em seu pescoço e sorriu.

—Eu entendo. Algumas coisas são difíceis de esquecer.

—E algumas a gente simplesmente não quer esquecer.

Isabel e eu ficamos nos encarando por algum tempo, sem dizer nada. Eu não queria fazer nenhuma besteira e estragar a relação que estávamos reconstruindo. Mas eu não podia negar o desejo do meu coração: ele ansiava por ela. Eu fui me aproximando devagar, Isabel não se afastou. Eu toquei seu rosto e ela fechou os olhos e estremeceu brevemente, depois mordeu os lábios, daquela maneira que eu conhecia e que me deixava louco. Eu sorri e me aproximei para beijá-la. Meus lábios tocaram os dela rapidamente, mas ela pulou para trás assustada, afastando-se de mim, quando a voz da nossa filha chamou por ela.

—Mamãe! - gritava Raquel, assustada.

Isa me empurrou de leve e correu até o quarto, onde as duas crianças choravam baixinho. Ela pegou um, depois o outro e ficou abraçada com eles, como se isso fosse algo que acontecesse sempre.

—Calma filhotes, foi só um sonho ruim, vocês estão acordados agora. Já passou.

—Podemos dormir com você mamãe?

—Claro, vamos para a cama da mamãe.

—Posso ir também? — perguntei para as crianças.

Raquel esticou o braço me chamado, e eu entrei naquele abraço, a peguei no colo e levei para o quarto de Isabel, então me deitei com eles, as crianças entre nós dois. Eles rapidamente dormiram. Isabel e eu ficamos nos encarando por um bom tempo, avaliando um ao outro, até pegarmos no sono.


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