Morfeu escrita por Caramelo


Capítulo 1
Noite Chuvosa


Notas iniciais do capítulo

Entre dois mundos a vida paira como uma estrela,
Entre noite e aurora, sobre a linha do horizonte.
Quão pouco sabemos do que somos!
E menos ainda do que podemos ser!

Lord Byron, "Don Juan"



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Ano 1840, Dover.

O som voluptuoso da chuva densa que despenca feito pequenas pedras sob o telhado do orfanato, consegue ocultar até o barulho mais alto que a pequena Emma Price poderia fazer. Ela conseguia escutar perfeitamente os trovões que soavam como trombetas em meio à tempestade sem fim, podia ter um pequeno vislumbre do brilho dos relâmpagos através da janela de vidro do sótão mofado em que estava. Não devia passar nem das nove da noite àquela hora...

A garotinha sentia tanto frio que mal podia se mexer. Estava deitada sob o chão de madeira, encolhida, em um canto escuro onde não podia enxergar. Não havia velas naquele lugar ou qualquer coisa para ilumina-lo além da janela de formato oval que era muito alta para que Emma pudesse alcança-la. Suas pálpebras pareciam tão pesadas quanto chumbo depois de chorar por horas... Sua  garganta parecia que ia rasgar pelos diversos gritos que dera tentando chamar por alguém, porém ninguém a escutava.

As freiras estavam todas ocupadas cuidando das outras crianças para pensarem em uma garota qualquer que ficara presa no sótão. Jamais notariam que faltava uma entre tantas outras. Ainda sim, Emma não podia abandonar a esperança. Ficar só sempre fora seu maior temor e agora ele concretizava-se como nunca antes. O desespero e a tristeza que sentia eram tão profundos quanto o oceano que banhava as praias de areia branca de Dover.

Não era apenas a solidão que a assustava, de modo algum, havia também aqueles ruídos... Sons estranhos e abafados que perturbavam sua mente desde aquela fatídica noite. Às vezes, ela gostava de imaginar que aquilo era apenas um sonho, um terrível e assustador sonho, do qual acordaria a qualquer momento e estaria sã e salva em sua cama. Aquilo não podia ser real, sua vida não podia acabar assim... Emma Price não poderia acabar como uma órfã. Aquela realidade era dura de mais para que ela pudesse aceitar.

Emma costumava viver em uma casinha qualquer nos subúrbios de Marselha, uma pequena cidade ao norte do País. Ela nunca fora uma das moças mais ricas, mas o dinheiro nunca fora importante para ela. Enquanto pudesse ter seus pais, tudo estaria bem... Mas as coisas não costumam acontecer do jeito que queremos. Seu pequeno mundo foi arrancado de seus braços de repente e sem qualquer explicação.

Emma ainda podia lembrar-se perfeitamente da sensação que sentira quando as rodas da carruagem deslizaram para fora da estrada... O som dos relinchos assustados dos cavalos ainda a assombravam todas as noites. O brilho dos relâmpagos que emana da janela não chegava nem perto da luz que virá pela janela da carruagem àquela noite. Era branca e dourada ao mesmo tempo, parecia algo divino, como se um anjo tivesse descido dos céus apenas para testemunhar aquele momento.

Seu corpo ainda parecia estar rodando dentro da carruagem, batendo contra as portas e chocando-se contra os corpos de seus pais. Sentia seus ossos quebrando, um por um, enquanto despencava de um precipício escuro e profundo. A dor, o medo e a adrenalina ainda pareciam correr pelas suas veias, como pequenas agulhas alfinetando-a sempre que tentava esquecer.

A sensação de cair era como se o mundo inteiro estivesse de cabeça para baixo... Tudo rodava ao seu redor. As árvores, a grama, o céu noturno e enevoado em meio àquela tempestade... Tudo, parecia sair do lugar e dançar envolta da carruagem. A vista pela pequena janela era a única coisa que impedia a garota de virar os olhos e encarar os rostos de pavor que seus pais faziam. Aqueles curtos segundos que se passaram, pareciam ter durado horas na mente de Emma.

Então todas aquelas sensações são substituídas pelo som da madeira colidindo contra o chão de pedras. As paredes da carruagem quebrando-se ao meio com o choque... O cheiro de sangue fresco. Todos aqueles gritos e sons ininteligíveis que Emma escutara durante a queda parecem ter sumido completamente e serem substituídos por um silêncio quase absurdo. Seus sentidos parecem desaparecer por um instante.

Depois desse momento sua memória transforma-se em apenas vultos e luzes estranhas que Emma não consegue discernir. Sua mente permanece confusa mesmo agora... O que aconteceu após a queda permanece perdido em seus pensamentos e, por mais que tente, ainda não consegue entender o porquê de ainda estar viva e seus pais não. Por que apenas ela sobreviveu àquela queda? Não era justo... Nem mesmo os médicos entendiam tal motivo. Isso deixava a garota ainda mais indignada que qualquer coisa. Nada daquilo deveria ter acontecido... Então por quê... Por quê?

A garotinha abraça as próprias pernas enquanto enterra seu rosto sob os joelhos. Ela entoa seu choro baixo e fraco agora... Sua voz rouca, cheia de lamúrias, perece muito mais alta do que realmente é, ecoando por todos os cantos enquanto o som da chuva diminui conforme a tempestade cessa. Seus pensamentos são trazidos de volta à realidade quando o som de batidas pesadas contra a porta de madeira do sótão começa a ressoar.

— Emma? - a garotinha escuta a voz de uma das freiras do outro lado da porta trancada, chamando por ela - Está ai dentro?

Emma levanta-se rapidamente do piso frio e tenta limpar as lágrimas em seus olhos com as mangas do vestido em tons de terra que ganhara do orfanato. Embora sua respiração ainda esteja pesada, ela luta para tentar acalmar-se e acabar com o choro antes de responder.

— Sim, estou aqui irmã... - Ela responde baixo, porém é o suficiente para que Irmã Teresa possa ouvi-la.

— Oh, céus, pequena! - responde a mulher enquanto vasculha o molho de chaves no cinto de seu hábito. - Como foi parar ai dentro?

— Isso foi... - Emma começa, porém interrompe-se imediatamente. Não deveria dizer a freira o que aconteceu, apenas faria com que ela se preocupasse a toa.

— As chaves não estão aqui... - a garotinha ouve a freira resmungar do outro lado.

"É claro que não estão..." Emma pensa consigo mesma. "Sei perfeitamente onde vai encontra-las, ou melhor, com quem..."

— Espere um pouco, minha criança - continua a freira -, irei pedir à Abadessa as chaves reserva. Volto em um instante.

Emma nada diz, apenas escuta os passos da freira afastando-se rapidamente da porta. Então o silencio toma forma mais uma vez. A chuva agora está tão fraca que mal se ouve sob o telhado... É como se toda aquela tristeza que Emma estava sentindo tivesse sido levada junto com a tempestade. Tudo em que a garotinha consegue pensar nesse momento é em deitar e dormir... Está exausta demais para fazer qualquer coisa além disso.

☽☼☾

A tempestade ainda permanecia forte enquanto o jovem de cabelos prateados andava pelas ruas de Dover naquela noite por volta oito horas. Embora seu mestre tivesse lhe dito para ser o mais discreto possível, Azazel não costumava passar despercebido. Mesmo em sua forma humana, o rapaz podia roubar toda a atenção de quem estivesse ao seu redor... Um de seus "privilégios divinos", como gostava de chamar.

Conseguia sentir as gotas densas de chuva que pingavam sob sua cartola negra e escorriam em direção aos cantos de forma que encharcavam os ombros de seu casaco. O chão asfaltado de Dover parecia brilhar como um céu estrelado enquanto Azazel observava pequenas poças formando-se próximas à calçada. A luz fraca e avermelhada que emanava das velas pelas janelas de vidro esfumado das casas ao seu redor, era a única fonte de luz naquele momento.

Os portões de ferro, que separavam porcamente os pátios na frente das casas, soltavam rangidos estranhos quando balançados pelo vento forte que lembravam a Azazel as barras de ferro das prisões infernais. As casas pareciam imergir da escuridão e projetarem-se infinitamente para os céus, uma quase grudada a outra, como que poluindo todo aquele ambiente e deixando bastante evidente a superpopulação de Dover. Azazel sempre imaginava como os humanos podiam viver dessa forma... Era tão sufocante e nojento.

Porém suas opiniões eram menos que nada para seu mestre, ele era apenas um bode expiatório naquele momento, procurando por alguém que talvez jamais encontrasse. Ainda não entendia bem o porquê fora escolhido para algo tão banal quanto caçar alguns mestiços, mas nada disse quando lhe foi incumbida tal missão. Na verdade, "caçar" seria uma palavra forte demais para o que estava fazendo, já que não tinha permissão para ataca-los, ele deveria apenas localizar um pequeno grupo e relatar ao seu mestre...

O rapaz sabia muito bem como esgueirar-se nas sombras, porém preferia não fazê-lo naquela noite. Queria ser notado. Era como uma afronta aos mestiços imundos que ousaram se rebelar contra seus superiores, afinal que poder eles teriam contra ele? Eram apenas uma raça inferior, mutantes, que não pertenciam a lugar algum. Tinha - acreditava ele - mais nojo deles do que dos humanos.

A medida que avançava pela rua linear, seus sentidos captavam passos apressados e respirações ofegantes não muito longe. "Mestiços". Ele concluiu imediatamente. "Sempre tão estúpidos...". Azazel já estava acostumado com o desleixo e falta de furtividade daqueles seres. Jamais seriam capazes de enfrentar alguém como ele, então por que não se divertir um pouco caçando-os devidamente? Embora seu mestre ordenará a ele que não agisse precipitadamente, Azazel não podia evitar...

O som da corda de um arco sendo puxada, invade a audição aguçada do rapaz. Os passos multiplicam-se atrás dele, como que entoando uma sinfonia de cerco ao seu redor. Azazel não consegue evitar um sorriso no canto dos lábios enquanto desacelera os passos até parar por completo no centro de um cruzamento. As ruas aparentemente vazias, pareciam estar lotadas em sua cabeça... Sabia exatamente onde encontravam-se cada um dos mestiços.

Então o som cortante de uma flecha sendo disparada ecoa de cima do telhado de uma das casas. Azazel apenas levanta sua mão direita e a segura segundos antes de acertar seu olho esquerdo. A ponta afiada corta delicadamente a pele nua de suas mãos enquanto ele cerra o punho envolta da mesma. A dor é quase imperceptível, pois o rapaz está acostumado com coisas muito piores. Ele levanta seu olhar para encarar o atirador enquanto joga a flecha em direção ao piso molhado. 

— Podem revelar-se - ele diz. - Já estou cansado de ouvi-los me perseguindo.

Imediatamente, do alto da abobada de um dos telhados cinzentos, uma garota de cabelos vermelhos surge. Suas roupas, nada convencionais, estão completamente encharcadas pela chuva, indicando que estava seguindo-o há muito tempo. Ela salta de onde está para o chão e pousa perfeitamente, como se tivesse feito este movimento milhares de vezes. Outros mais, ao redor de Azazel, fazem o mesmo. Brotando de todos os cantos do cruzamento e cercando o rapaz.

— Então é verdade o que dizem sobre Os Sete — diz a garota ruiva de olhos dourados enquanto caminha até ele. - Impressionante eu diria...

Ela é extremamente alta, mais até que Azazel. Porém ele não está surpreso, essa é uma das características de sua linhagem sanguínea. A ruiva é extremamente atraente, "para uma mestiça, é claro". Azazel completava em sua mente. Seus cabelos da cor do fogo caem delicadamente sobre a face sardenta dela, quase que ocultando o belo formato das suas maças do rosto e os lábios pequenos.

— Sabe quem sou? - pergunta Azazel ainda admirando a jovem.

— Por que não saberia? - responde a garota evitando a pergunta. - Estava nos rastreando há dias... Era meu dever investiga-lo...

Outro sorriso forma-se no canto de seus lábios, um mais irônico que o anterior. Quem poderia imaginar que esses mestiços seriam inteligentes o bastante para perceberem que estavam sendo seguidos... E ainda mais para obter informações sobre ele. Subestimar os outros sempre fora uma terrível fraqueza para Azazel.

— Mestiços são ainda mais estúpidos do que eu pensava... - comenta ele sem tirar os olhos verdes e vívidos dos dourados e intensos da ruiva a sua frente.  - Mesmo sabendo quem sou e do que sou capaz, ainda tem coragem de vir até mim.

— Dizem que quanto mais difícil é a presa - a garota entoa enquanto aproxima-se cada vez mais do rapaz -, maior a recompensa pela caçada.

Dito isto, a garota saca uma adaga prateada de dentro da manga de sua blusa negra e disfere um golpe rápido e certeiro sobre o rosto de Azazel. O rapaz se protege colocando os braços sobre o rosto, mas isto não impede a lâmina de atingi-lo. O corte fino sob seu olho direito arde enquanto deixa um pequeno filete de sangue escorrer pelos cílios e gotejar pelo piso molhado do cruzamento. Sua cartola voa de sua cabeça deixando que seus cabelos, tão brancos quanto a luz do luar, fiquem expostos à chuva densa da tempestade.

Imediatamente, Azazel faz um curto movimento para acertar a ruiva com um chute, porém ela consegue ser mais rápida. A garota salta para trás com um mortal e para há alguns metros de distância sem qualquer dano. Um sorriso forma-se em seus lábios enquanto ela encara o garoto ferido desafiadoramente. O som de dezenas de outras lâminas sendo sacadas ecoa nos ouvidos de Azazel... O rapaz não consegue ocultar sua surpresa e indignação, deixando que seus traços demoníacos comecem a tomar forma.

— Pensa que pode me matar apenas com uma adaga qualquer? - Azazel vocifera. - Sua vadia imunda, vou mutilar esse sorriso desprezível em seu rosto!

— Estou contando com isso... - responde a ruiva enquanto acena em direção aos outros mestiços. - Espero que nos dê mais diversão que seus amigos, jovem Azazel.

Os olhos dilatados do rapaz, em contraste com sua face pálida, conseguem captar os movimentos incrivelmente rápidos dos outros mestiços que correm em sua direção. Imediatamente, Azazel deixa que suas azas negras despontem de suas costas, bloqueando as lâminas que são disparas em uníssono. As penas, tão resistentes quanto aço, protegem seu corpo e servem como adagas conseguindo cortar qualquer mestiço que ousasse se aproximar. Ainda sim, isso não os impede.

Embora Azazel fosse habilidoso, tantos mestiços atacando-o ao mesmo tempo poderia confundir até o mais poderoso dos demônios. Aqueles golpes... Não eram convencionais. Havia algo errado com aqueles mestiços, Azazel podia sentir. Porém, antes que conseguisse organizar seus pensamentos, foi interrompido pela imagem de um homem de olhos prateados que saltava sob sua garganta derrubando-o no chão com força.

Os relâmpagos que brilham como nunca sob o as nuvens que ocultam os céus de Dover iluminam o rosto marcante e vívido do Daemonis. Destacando seus traços fortes de uma forma quase macabra. Os sons dos trovões que reverberam sem fim conseguem fazer até mesmo Azazel tremer naquele momento. As mãos grossas e proeminentes do homem descem em direção ao peito de Azazel com uma adaga idêntica a que a ruiva usara antes.

A dor lasciva de sua carne sendo rasgada invade os sentidos do rapaz, fazendo com que ele urre e perca a concentração por um instante. A chuva intensa e gelada desaba sobre seu rosto ocultando as lágrimas que ele não conseguira impedir de escorrem. "Mas como!?" Ele se pergunta. "Como posso estar perdendo para simples mestiços?" O sangue vermelho intenso de seus cortes escorre como nunca antes, manchando tudo ao seu redor. "Por que isso dói tanto? Não deveria ser assim..."

Azazel luta para voltar a si, porém seu corpo parece estranhamente fraco... "Por que não consigo me curar?". Ele lança as pontas afiadas de suas asas em direção à garganta do homem que o prende contra o chão, deixando um corte profundo no lugar. O corpo inerte cai para o lado e Azazel levanta-se com dificuldade impulsionando suas asas para cima...

— Não o deixem escapar! - grita a garota ruiva aos outros que continuamente correm em direção à Azazel, desferindo dezenas de golpes contra o rapaz que mal consegue desviar deles. - Arranquem as asas desse abutre!

Azazel tenta alçar voo, porém é impedido pelas dezenas de golpes que o puxam em direção ao chão novamente. Seu sangue não para de escorrer e a dor parece não desaparecer... O garoto cai de joelho sob o piso frio enquanto cospe grandes quantidades de seu próprio sangue. Sente a bile subindo pela garganta e sua cabeça rodando enquanto protege-se fracamente com a força das asas.

— Prepare-se para morrer, demônio - ele ouve alguém dizer porém sua mente não consegue discernir de onde o som vem. É como se seus sentidos estivesse embaralhados...

— Conflueverant — diz outro e, imediatamente, o som de correntes pesadas de metal surgem... Um calor súbito toma conta de tudo ao redor e o cheiro de enxofre invade as narinas de Azazel. Ele não consegue dizer se aquilo é real...

Então uma dor alucinante aflige suas asas, como se algo conseguisse atravessa-las. Azazel direciona seu olhar a elas e percebe que estão presas por ganchos de ferro, sujos com algo vermelho... Sua visão borrada consegue apenas avistar uma luz envolta das correntes que o prendem sob o solo.

☽☼☾

Emma entra no dormitório escuro com a Irma Teresa atrás de si. A freira segura uma pequena vela sob um pires metálico de forma que ilumina vagamente o caminho. Emma não teve que esperar muito para que a freira e a Abadessa aparecessem com as chaves reserva... Ambas fizeram-lhe algumas perguntas de como a garota ficara trancada em tal lugar, porém Emma recusava-se a falar com elas.

A garotinha não se sentia segura o suficiente para confiar em qualquer um que fosse. Sentia que todos naquele lugar estavam contra ela e, acima de tudo, tinha medo que, ao dizer qualquer coisa para as freiras, quem a trancou no sótão pudesse fazer coisas ainda piores com ela. Aquele não era seu lugar, sabia disso, e as outras crianças faziam questão de lembra-la todos os dias desde que chegara.

Apesar de parecer pacifico visto de fora, o Orfanato Saint-Marie, próximo à baia de Dover, escondia as coisas mais cruéis que Emma teve que suportar em toda sua vida. Dentro daqueles muros ela era menos que lixo, pelo menos era assim que os outros órfãos a viam. Era solitário e angustiante passar seus dias confinada àquele lugar... Nem mesmo uma criança dignava-se a conversar com ela.

O orfanato fazia parte de um convento de freiras, portanto as Irmãs de Saint-Marie dividiam suas tarefas entre os afazeres do orfanato e suas obrigações para com a Catedral de mesmo nome. Emma gostava de ficar admirando as freiras andando de um lado para o outro, sempre ocupadas com alguma coisa... Fazia com que ela recordasse seus pais. Eles nunca paravam, estavam sempre preocupados com algo, parecia que suas vidas dependiam daquilo... Não eram muito diferentes de outros adultos que conhecera.

Coisas simples como impostos, finanças e outras politicas que Emma desconhecia, sempre pareceram tão importantes para seus pais. Perder ou ganhar era questão de vida ou morte... Quem poderia prever que um dia tudo isso iria tornar-se tão banal. Sentia seu peito doer toda vez que pensava em coisas como essa.

Após mais uma curta sessão de interrogatório que Emma ainda recusava-se a responder, Irmã Teresa deu-se por vencida e concordou em apenas esquecer esse episódio. Deixou que Emma trocasse as roupas e vestisse uma das camisolas brancas que estavam em um armário próximo à porta do dormitório. Todas as roupas das crianças ficavam naquele lugar, exceto por seus pertences pessoais, coisas que herdaram de suas famílias.

Emma não trouxera muito consigo, deixara a maior parte de suas coisas em sua casa em Marselha. Ela não tinha direito a quase nada como filha mulher, tudo que era de seus pais foi leiloado pelo governo ou herdado por um primo distante. Restara-lhe apenas o nome honroso de sua família. Ela era uma Price afinal... Isso tinha que valer de alguma coisa.

Assim que Emma deita sob a cama, Irmã Teresa deseja-lhe boa noite e retira-se do dormitório levando a vela consigo. Emma consegue perceber o olhar triste que a freira dirige a ela... Irmã Teresa foi a primeira pessoa que a recebeu quando foi mandada para o Orfanato Saint-Marie, todos os outros pareciam ter medo dela. Como se houvesse algo ruim dentro dela...

Até mesmo algumas freiras preferiam ignora-la e isto era o pior. Emma sentia-se só mesmo repleta de outras pessoas. Ficava imaginando o que poderia haver de tão errado com ela para que todos agissem dessa forma, afinal ela não era diferente dos outros órfãos, então por quê?

A garotinha fecha os olhos sonolenta e deixa seus pensamentos viajarem para outro lugar, um mais belo e tranquilo... Um lugar em seus sonhos em que nada disso seja real, onde ela possa sorrir novamente e apenas esquecer todos os sofrimentos em que foi imposta.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado desse primeiro capitulo ♥

Deixem um comentário se quiserem, pois quero saber suas opiniões ^^

Em breve postarei mais um, fiquem aguardando, meus amores



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