A Bastarda de Lily Potter - LIVRO 2 escrita por thaisdowattpad


Capítulo 18
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Capítulo Dezoito
Outra vez.

Recuperada do tombo repentino, Tori se sentou rapidamente e olhou para os apuros do amigo. Reconheceu um vulto magrelo e de cabeça vermelha tentando abocanhar Carlinhos, conseguindo agarrar na pele na última tentativa.

Ao ser atacado, o mais velho gritou de horror e rolou para o lado, conseguindo alcançar a varinha e prestes a usá-la.

— Não! — Tori gritou e se levantou rapidamente, encarando o amigo com um olhar suplicante — Totó, seu menino feio, solte o braço do Carlinhos agora mesmo! — brigou com o Barrete-Vermelho, seu tom sendo muito autoritário.

Parando os movimentos em tentar arrancar o braço de Carlinhos, a criatura encarou a conhecida de rabo de olho e permaneceu no mesmo lugar, sem se mover um centímetro sequer. Diante disso, a menina cruzou os braços e ficou com uma carranca firme, enquanto batia o pé algumas vezes no chão demonstrando que sua paciência estava se esgotando.

— Totó, eu estou te avisando... — ela insistiu, intensificando as batidas no chão.

Mesmo infeliz ao ser contrariado, o Barrete-Vermelho se soltou devagar do braço do garoto e pulou no chão, acabando por cair sentado por ainda estar fraco. Carlinhos fez uma careta ao ver o corte em seu braço, mas não se abalou completamente. Ele retirou sua gravata e fez uma espécie de torniquete para não continuar a perder tanto sangue.

— O seu braço... Ahhhh, eu sabia que não deveria ter chamado ninguém. Totó era para ser um problema só meu! — choramingou Tori, ficando em uma posição murcha ao ver o ferimento do garoto, um corte que ia do cotovelo ao meio do antebraço.

— Não se preocupe comigo, Tori. Isso é pouco perto dos ferimentos que já tive por conta de criaturas. Quando acontece aqui em Hogwarts e preciso da Pomfrey, eu nem preciso explicar nada, ela já se acostumou. — riu de leve e trouxe para perto sua mochila usando magia, logo depois movendo a varinha algumas vezes sobre ela — Um Barrete-Vermelho tem classificação XXX, isso quer dizer que apenas bruxos habilidosos podem enfrentá-lo. Mas você conseguiu sem sequer usar magia. Seja lá o que você fez, isso foi incrível! — ele a elogiou e colocou a mochila, agora reparada, ao seu lado.

— Não fiz grande coisa, porque ele ainda conseguiu te machucar... — se agachou e encarou um pouco mais de perto o braço ferido do garoto, como se tentasse enxergar alguma mínima piora.

O que não aconteceu.

— Não se preocupe, eu vou ficar bem. E Totó só agiu conforme sua natureza, ele não teve tanta culpa assim. — Carlinhos falou e se apoiou no braço sadio para levantar.

— Como você consegue continuar tão tranquilo? Ele te machucou, então você deveria estar, no mínimo, muito irritado por isso! — Tori mexeu os ombros, agoniada, e encarou a criatura de relance.

— Fazem alguns anos que tento me acostumar a todo tipo de coisa vinda de criaturas, qualquer que seja. Eu decidi que quero estudar Dragões assim que terminar Hogwarts e sei que com eles será bem mais barra pesada. — ele caminhou devagar para perto da criatura, que pareceu não gostar da ousadia e ficou em posição de ataque.

Notando isso, a menina se levantou rápido do chão e foi para perto de Carlinhos. Isso fez com que os ânimos fossem acalmados.

— Dragões? Você só pode estar doido! — balançou a cabeça de forma inconformada, causando risos no garoto — Eu fico tonta só de me imaginar diante de um, fico muito pior imaginando alguém que eu gosto diante de um. Será que não poderia escolher uma profissão mais fácil? Uma profissão que não vá matar a senhora Molly do coração? — reclamou e se colocou no lugar da mãe dos amigos ao imaginar Harry perto demais de uma dessas criaturas tão perigosas.

— É o que eu gostaria de fazer, Tori. Não consigo me imaginar em nenhum outro lugar. — explicou e foi se abaixando devagar até ficar de joelhos — Agora vamos focar nesse amiguinho aqui. — encarou Totó, que retribuiu com um olhar meio desagradável.

— Se comporte, Totó. Nós só queremos te ajudar! — ela brigou com o Barrete-Vermelho e se sentou mais à frente, estendendo os braços para que a criatura viesse para ela.

Ainda inseguro, Carlinhos tocou na ponta da varinha no bolso, enquanto encarava o Barrete-Vermelho se aproximar da conhecida. Mesmo sem sinais de ataque, não dava para confiar totalmente. 

Somente quando o ambiente parecia seguro, que o garoto soltou a varinha e focou em sua mochila, retirando alguns frascos com Poções que pretendia usar. E ainda inseguro com a criatura próxima demais de Tori, ele começou a trabalhar.

Nos primeiros usos de Poções, Totó não gostou muito da aproximação de alguém estranho e tentou morder Carlinhos mais duas vezes. Porém, com outras broncas da aparente amiga humana ele acabou ficando quieto outra vez.

O Barrete-Vermelho ficou com uma aparência bem melhor do que antes e era capaz de ficar de pé sem cambalear para os lados, após longos minutos de tratamento. Mas apesar de ser um grande avanço em sua melhora, ainda parecia não ser suficiente.

— Eu disse que ele ficaria bem! — Carlinhos cutucou o braço da menina com o cotovelo sadio e ela sorriu de leve.

— Obrigada, Carlinhos. Sem você eu nem sei o que aconteceria com o Totó. Agora ele terá um tempo a mais para procurar comida e se adaptar melhor na floresta. — Tori agradeceu e o sorriso ainda estava preso em seu rosto.

— Aí é que está... Totó não pode continuar aqui, não é seu habitat e o que eu fiz agora foi apenas algo artificial, não vai segurar por muito tempo. O que aconteceu hoje vai voltar a se repetir em poucas horas e talvez nem dê tempo de ajudá-lo de novo. — explicou, parecendo que aquelas palavras o afetavam por afetar a amiga principalmente — Fora que ele estava perto demais do Castelo, poderia atacar alguém e causar algo pior do que um braço rasgado. — acrescentou.

— O Totó não mataria ninguém. Ele é... — tentou defender, mas foi interrompida.

— Um Barrete-Vermelho, conhecido por atacar pessoas e ainda usar o sangue delas. — o garoto completou, esticando o braço para tocar o ombro da menina — Ele não te machuca, mas é da natureza dele machucar pessoas, Tori. Aqui não é o lugar dele e eu lamento por isso te magoar! — suspirou.

— Você tem razão. — a menina desistiu de continuar a rebater — Mas... mas eu vou sentir a falta dele... — soluçou e escondeu o rosto nas mãos enquanto iniciava um choro baixo.

— Só pense que ele vai estar com seus iguais, que em bando vai estar mais protegido do que aqui sozinho num lugar cheio de criaturas superiores a ele. Vai estar bem melhor no lar dele. — Carlinhos tentou melhorar a situação, enquanto dava palmadinhas leves nas costas da chorosa — Como seu Monitor te ordeno a parar de chorar. Pessoas são feias chorando e com você não é diferente! — falou usando um tom cômico.

Tori afastou as mãos para o encarar, uma sobrancelha agora erguida, para logo depois começar a rir. Um riso breve, mas suficiente para suavizar a expressão preocupada do mais velho e faze-lo sorrir de novo.

— Vamos procurar Hagrid? — o Weasley perguntou e estendeu as mãos para ajudá-la a levantar do chão, que aceitou de imediato.

— Tudo bem. — suspirou, enquanto desviava o olhar para a criatura que ainda estava por ali.

Enquanto Carlinhos recolhia suas coisas de volta para a mochila usando alguns gestos de varinha, Tori aproveitou para livrar qualquer sinal da floresta de sua roupa. Bateu as mãos pelo tecido da saia tirando algumas marcas de poeira, aproveitando para observar Totó não muito longe dali.

A criatura  retribuiu o olhar e parecia encará-la com compreensão, como se soubesse o que estava prestes a acontecer e entendesse. Isso fez com que Tori voltasse a chorar enquanto diminuía a distância entre os dois e caía de joelhos, puxando o elástico que prendia o cabelo e o permitindo cair livremente pelas costas. Acabou abaixando também o rosto, que foi escondido por todo o cabelo ruivo que escorreu para a frente.

Permaneceu assim até sentir algo tocar a ponta com certo cuidado. Então um sorriso de reconhecimento se abriu em meio às muitas lágrimas, enquanto voltava a erguer o rosto devagar e via Totó, como de costume, apreciando algumas mechas.

— Espero que nunca se esqueça do meu cabelo, Totó. — chorou pela despedida e riu pela frase, tudo ao mesmo tempo.

◾ ◾ ◾

Enquanto seguia sozinha para o treino de Quadribol, Tori não disfarçava o rosto chateado. Algumas horas atrás Carlinhos e ela haviam conversado com Hagrid e ele levaria Totó embora até o fim daquele dia. Tudo o que ela mais queria era o bem estar de seu amiguinho tão peculiar, sendo perto ou longe dela, porém isso não a impedia de sofrer com a despedida.

Os devaneios da nova Artilheira foram interrompidos quando ouviu passos por perto e até alguns sussurros, tendo de se virar para ver de quem se tratava. Mas reparou que era a única pessoa por ali, apesar de ter certeza de que não estava ouvindo coisas.

Virando-se e caminhando outra vez, notou que os passos e sussurros haviam voltado. Por estar sem a varinha, Tori puxou sua Nimbus para mais perto de si e encarou o cabo. Caso precisasse se defender, aquilo teria que servir. Talvez, por ser um objeto mágico, causasse um estrago maior do que uma vassoura comum causaria.

Assim que passou pela saída do Castelo para os terrenos, a menina foi rápida e se desvencilhou para a parede ao lado de fora, se encostando e procurando ser o mais silenciosa o possível. Atraída pelo som de passos prestes a sair também, ela ergueu a vassoura e esperou. Uma sombra apareceu e ela impulsionou os braços para agir.

Quando duas pessoas surgiram, sem olhar exatamente quem era, Tori abaixou a vassoura e acertou as cerdas em uma cabeça, logo dando atenção para a segunda e a acertando também. Os dois atingidos gemeram alto e se esbarraram, acabando por caírem juntos no chão.

— Vocês? — os olhos de Tori se arregalaram ao reconhecer as duas cabeças ruivas que havia acabado de tentar rachar ao meio — Fred, Jorge... eu lamento muito por isso! — largou a vassoura e correu para perto deles.

— Eu disse que ela estava falando sério ontem quando nos ameaçou, eu disse! — reclamou Jorge, massageando a cabeça com certo exagero.

— Meninos, eu lamento muito, muito mesmo! — se desculpou mais uma vez e puxou um braço de Fred para ajudá-lo a levantar, mas quase caiu quando ele se jogou para trás gemendo e colocando a língua para fora.

— Vou morrer... — o menino gemeu outra vez, tocando a testa com uma das mãos.

Notando o exagero teatral dos dois meninos, Tori se afastou um pouco e colocou as mãos na cintura. Ela começou a rir logo depois, encurvando um pouco o corpo e recebendo resmungos em resposta.

— Quase nos mata e fica aí rindo da nossa desgraça! — mais uma vez Jorge reclamou, agora diminuindo o drama e até se levantando sozinho.

— Dramáticos! — ela arrumou a postura e aproveitou para secar lágrimas nos cantos dos olhos — Eu nem bati com tanta força assim. Mas, caso eu rachasse a cabeça dos dois, seria mais do que merecido, pois me chatearam muito ontem. — relembrou.

— E você não deu chance de nos explicar. Nos expulsou aos berros da Ala Hospitalar! — Fred também relembrou; a menina riu outra vez.

— Perdão, meninos. Ontem eu exagerei, assim como agora. Não queria ter expulsado vocês, nem partido para a agressão. Vocês, além do Lino, são meus melhores amigos e poderíamos ter resolvido tudo com uma conversa... — acabou reprimindo o riso e deu de ombros uma vez.

— Acho que não vamos te perdoar não. Não agora. — Jorge ficou sério, assim como o irmão — Talvez quando nossa cabeça parar de latejar ou quando sentirmos falta de uma chata de galochas mandando em nós! — agora sua pose relaxou e ele riu.

— Não sou chata, seu bobo! — deu um soquinho de leve no braço dele e o abraçou; o outro menino se juntou ao afeto para mostrar que por ele tudo também estava bem, tornando um abraço triplo.

— Ah, mas que belo casal... espera, casal de três? Isso é meio nojento, não acham? — uma voz conhecida, uma lembrança extremamente desagradável, apareceu por ali de repente.

Os três amigos se afastaram e respiraram fundo em sintonia.

Além do adorável Marcus Flint, haviam outros Sonserinos que costumavam andar junto com ele, incluindo Adrian que foi o único que não riu da piada.

— Cale a boca, Flint! — rosnou Fred enquanto se aproximava do garoto, mesmo tendo a desvantagem de ser alguns centímetros mais baixo.

— Ou o quê? Adoraria saber. — Flint também se aproximou e trombou no menino, que cambaleou alguns passos para trás.

Notando que aquilo poderia sair do controle e gerar uma confusão, Tori passou a frente de Fred e se colocou entre os dois.

— Crianças, aqui não é hora e nem lugar para contato físico. Tenho certeza que o cérebro de vocês tem capacidade de resolver a situação em uma boa conversa. — trocou o olhar entre os amigos e o inimigo — Talvez nem todos, mas podemos tentar. — apertou um lábio ao outro para evitar um riso.

— Sai da frente, imunda! — o Sonserino xingou e avançou um passo — E não pense que esqueci o que aconteceu no Beco Diagonal. Saiba que o que é seu, está bem guardado! — a encarou feio; a menina ficou séria.

— Não fale assim com minha amiga, seu covarde! — agora foi a vez de Jorge retribuir o xingamento, enquanto ele e o irmão avançavam juntos.

— Relaxa, Jorge, Fred, que esse cachorro só late. — Tori conteve os amigos com as costas das mãos.

Irritado com a falta de temor na menina que antes costumava ser tão medrosa, Flint sacou a varinha e apontou para o rosto dela. Ela encarou o objeto mágico que quase tocava a ponta de seu nariz e então o rosto daquele que a ameaçava.

— Não exagera, Flint! — Adrian, que estava um pouco atrás, passou pelos outros Sonserinos e chegou perto da confusão.

— Que é, Pucey? Vai defender essa estranha? — rosnou para o conhecido, mas sem desviar o olhar — Não me diga que está apaixonado!? — cuspiu uma risada desdenhosa, contagiando os outros companheiros.

— Não, mas só acho que você não deveria contribuir para perder pontos que você quase nunca ajuda a conquistar para nossa casa. Pare de arrumar confusão a toa! — com uma fala entediada e um revirar de olhos, o menino se defendeu.

— Ouça o seu amigo ou eu também não vou me importar em perder pontos para minha casa ao espancar um trasgo dentuço! — uma nova voz conhecida surgiu.

Todos os rostos se viraram para encarar a chegada repentina de Aurora, onde a expressão raivosa não combinada em nada com suas bochechas sempre rosadas e o lacinho colorido enfeitando o cabelo.

Apesar de não parecer intimidadora, ela apontou a varinha para o estômago de Flint e o fez recuar alguns centímetros.

— Você nunca cansa de se meter em confusões que não são suas, menina? — o garoto resmungou, ainda mantendo a varinha apontada.

— Se envolve meus amigos, a confusão é minha também! — Aurora rebateu, avançando mais um pouco e fazendo a ponta da varinha cutucar a barriga do rival.

— Cuidado. Uma hora eu posso atender ao seu desespero para chamar minha atenção e dar um pouco do que você também merece! — Flint avançou um pouco e empurrou a varinha para trás.

— É uma ameaça? — a menina empurrou a varinha outra vez, nem se importando da mesma estar ficando curvada.

— Você é da Corvinal, a casa dos sábios. Me responda você. — o garoto piscou, mostrando seus dentes estranhos em um sorriso mais estranho ainda, então abaixou o olhar para o foco inicial — Outra hora terminamos essa conversa, Evans. — usou um tom de ameaça enquanto se virava e chamava os outros para saírem dali.

Mal deu dois passos e foi atingido por algo que o jogou para frente, esbarrando nos outros garotos e os derrubando como um perfeito strike de boliche. Eles gemeram com o ataque surpresa, a dor da queda repentina latejando nos corpos.

— Duas vezes. DUAS VEZES! — Flint berrou enquanto se levantava do chão, seu rosto muito vermelho de raiva — Isso não vai ficar assim! — ameaçou.

— Ainda não entendeu que não trabalho com ameaças? — Aurora avançou apontando a varinha outra vez.

Mas Tori se colocou à frente, segurando a menina pelos ombros e a impedindo de se envolver ainda mais em problemas. Os meninos atingidos aproveitaram a deixa para fugir dali, com Flint tendo de correr para alcançá-los.

— Aurora, você ficou doida? Quer se encrencar? Ser expulsa? — deu bronca e fechou a cara quando a Corvina começou a rir.

— Não vai me acontecer nada. Fique tranquila, Tori. E não, não tenho medo da encrenca quando apenas me defendi. — deu de ombros e voltou a guardar a varinha nas vestes.

— Defendeu? Ninguém mais estava sob ameaça física. Você os atacou pelas costas e isso é muito feio! — Tori resmungou e fez uma cara feia ao notar que os meninos também estavam rindo.

— Feio é o que o Flint fez, que queria te azarar. Uma garota. — Fred se intrometeu e depois se virou para Aurora — Você ainda fez pouco para o que aquele bosta merece. Parabéns, princesa. — ele riu e abraçou a defensora, tirando-a do chão por ser mais alto.

Diante do gesto, Tori piorou ainda mais a cara, aproveitando a irritação de todos os acontecimentos dos últimos minutos para acertar um tapa no braço de Jorge ao notar que ele ainda ria. 

— O negócio parece estar bom, mas precisamos ir. Temos treino agora. — avisou, mas foi ignorada — Já chega, Frederico! — foi para perto do amigo e o puxou pelo uniforme do time.

— Folgada. — ele reclamou e livrou o tecido de sua roupa — Eu só não te chamo para assistir o treino porque você é do time rival. Mas depois nos falamos, ok? — se despediu da outra amiga com beijos nas mãos.

Tori e Jorge se entreolharam, ambos com as sobrancelhas erguidas, ambos levando a mão para a frente da boca no mesmo instante para abafar um riso.

— Tente não ser arrebentado por um balaço, príncipe. — Aurora sorriu.

Assim que Fred foi para junto dos dois companheiros de time, eles começaram a rir dele, desabafando todo riso abafado em consideração a Aurora, com quem não tinham tanta intimidade ainda.

— Que piegas! — Jorge debochou e acertou um tapa na nuca do irmão, correndo logo em seguida para evitar ser retribuído.

— Princesa? — Tori o encarou e arqueou uma sobrancelha — Fred, você está sendo beijoqueiro de novo? — cruzou os braços.

— Beijoqueiro? Eu? — perguntou como se tivesse ouvido o maior absurdo do mundo — Claro que não, Tori. A Aurora só é uma pessoa que se tornou especial rápido demais. — esbarrou no ombro da menina de propósito.

— Acho bom! — ela empinou o nariz num gesto mandão — Você é novo demais para isso e... — foi interrompida.

— ...tenho que estudar, blá blá blá. — ele continuou — Eu sei disso, Tori, não se preocupe. — sorriu e deu umas palmadas nas costas dela.

Ao ser deixada para trás após se distrair com os próprios pensamentos, Tori apertou o passo com destino ao campo de Quadribol. Ela sabia que com toda a confusão havia estourando alguns minutos do horário do treino, justo ela que precisava tanto ficar boa o suficiente para não decepcionar o time.

Como o esperado, todos já estavam reunidos no campo, sendo os três os últimos a chegar. E ao avista-la, Olívio se aproximou parecendo entre animado e ansioso.

— Tori, que bom te ver aqui! — Wood correu até a amiga e a ergueu do chão em um abraço; ela riu com o gesto — Eu não esperava que você viesse hoje, mas que bom que conseguiu. Você ia fazer falta. — falou ao desapertar o abraço e dar um pequeno passo para trás.

— É mesmo? Que honra! — Tori abriu um sorriso largo — Mas... eu ainda sou tão ruim, então que falta eu faria no treino? Aliás, para quem? — perguntou e encarou o menino com expectativa pela resposta.

— Todo mundo sentiria sua falta, oras! — respondeu e deu de ombros; o sorriso da menina diminuiu — O time titular sempre vai fazer falta, pois são os que mais treinam, enquanto os reservas apenas assistem e tem um trabalho menor nos treinos. Então é ótimo que você veio e está bem! — apertou os ombros dela uma vez e girou para sair dali.

Antes mesmo de dar cinco passos para perto dos outros integrantes do time, Olívio deu meia volta e foi para perto da Artilheira outra vez.

— Quase esqueci de falar: Carlinhos não veio hoje, mas me pediu para te avisar que, qualquer coisa que você sentir, qualquer sinal de que não está bem, você pode voltar para o dormitório mais cedo. Você parece muito saudável, mas devido as circunstâncias vai ter que pegar mais leve por esses dias, só para não arriscar. — o Goleiro deu o recado e cruzou os braços em frente ao corpo — Eu falei para ele que você talvez recusasse, pois não quer continuar tão atrás do time por muito tempo, mas temos que obedecer nosso Capitão, certo? — sorriu, porém uma ruga de preocupação apareceu em sua testa.

— Você tem razão. Não precisa mesmo me tratar como algo frágil, eu estou bem agora. — Tori negou com a cabeça uma vez.

Isso fez com que o rosto do garoto se iluminasse completamente outra vez, trazendo um novo sorriso, tão largo e fofo que fez a Artilheira nem sequer piscar para não perder a oportunidade de continuar olhando.

— Essa é a minha garota! — Olívio apertou de leve as bochechas da amiga, acertando também um beijo rápido na testa dela antes de se afastar pulando pelo campo.

Enquanto ele ia se afastando, Tori ficou encarando as costas dele tendo um sorriso bobo preso nos lábios.

— Ele me chamou de garota dele... — murmurou, suspirando alto em seguida.

◾ ◾ ◾

Ao final do treino, todos se reuniram no centro do campo e Olívio elogiou que todos haviam ido muito bem, tanto os titulares quanto os reservas. Também deu um aviso que Carlinhos havia passado para ele, de que voltariam a se encontrar ali no fim da semana, mas que antes teriam pequenas reuniões na Comunal todos os dias para combinar táticas de jogo.

Quando todos foram dispersando para os vestiários, Tori notou que o goleiro havia permanecido no mesmo lugar, encarando em volta do campo e sorrindo com muito satisfação, e se aproximou outra vez.

— O treino de hoje foi muito bom. — mesmo tendo dificuldades de andar de tão exausta, ela mancou para perto do amigo — Acho que quando o Carlinhos se formar, o time pode estar em ótimas mãos. Se perguntarem minha opinião, pode ter certeza que meu voto é todo seu! — garantiu.

— Sério mesmo, Tori? — um sorriso se abriu nos lábios do goleiro ao mesmo tempo que o rosto se iluminava de alegria — Seria uma honra para mim! — sorriu ainda mais.

— Acho que desconheço alguém mais experiente, talentoso, esforçado e que arranque o melhor de cada um... nem que seja na base da força! — deu de ombros e riu, fazendo o garoto colocar as mãos na cintura e a encarar com uma sobrancelha erguida.

— Achou esse treino puxado, é? Pois espere só no próximo ano, quando não tiver Carlinhos para te salvar. Vou fazer todos saírem do campo direto para a Ala Hospitalar! — brincou enquanto cruzava os braços e empinava um pouco o nariz, fingindo autoridade.

— Sendo assim, retiro o meu voto. — a menina tocou no peito do garoto e fingiu tomar de volta algo invisível.

Os dois riram juntos.

Apesar de tão exausta e faminta, Tori não se importava em gastar mais alguns minutos ali no campo em companhia do causador da exaustão de todo mundo. Parecia que quando estava perto do amigo, o sentimento bom que sempre aparecia em seu peito parecia mais do que suficiente para melhorar tudo ao redor. Esses momentos eram tão bons, que ela se sentia até capaz de voar sem vassoura.

— O que será que ela quer aqui? — o riso de Olívio diminuiu enquanto ele arrumava a postura e passava a mão pelo cabelo, como se tentasse melhorar a confusão ali.

Seguindo o olhar interessado do amigo, Tori avistou Eileen adentrando o campo com passos inseguros, porém firmes. Mesmo com uma expressão chateada no rosto ela parecia ainda mais bonita, o que fez com que todos os garotos do time parassem na metade do caminho do vestiário para apreciar a bela visão.

— Ô mulherzinha que mendiga por atenção! — Faith fez questão em reclamar alto e sair pisando duro em direção ao vestiário.

Concordando com a mais velha, Tori também se moveu para sair dali, apressando os passos para alcançar a outra Artilheira.

— Tori, posso falar com você? — a voz da professora fez com que a menina parasse na metade do caminho e revirasse os olhos.

— Não dá. Eu estou exausta e não tenho tempo e disposição para mais nada hoje. Com licença, professora! — Tori respondeu sem se virar e voltou a caminhar.

— Por favor! — Eileen suplicou e conseguiu agarrar um pulso da aluna, sem sequer apertar, apenas para conter os passos que não pareciam dispostos a parar.

Tal atitude fez com que o olhar da Grifinória descesse até o braço tocado, para logo depois lançar um olhar rude para a mais velha. Olhar suficiente para ter o braço liberto. 

— Seja rápida, pois estou realmente cansada e quero voltar para a Comunal. — se abaixou para o gramado, se sentando ali e encarando os próprios joelhos, tudo para não olhar a mulher.

Tori moveu o olhar apenas quando reparou que Eileen tirou os sapatos de salto que usava e também se abaixou para o chão, sentando-se em sua frente. Ela ousou também em tocar o queixo da aluna e obriga-la a encarar de volta.

— Dessa forma você saberá se estou mentindo. — ela explicou e recolheu a mão — Eu não tentei te matar, se é isso que você anda comentando com as pessoas por aí. Eu nem cheguei perto de você, eu não consegui. Eu não sou perigosa, Tori, então me dói ser tratada como se fosse. — os olhos inundaram-se de lágrimas, mas ela se esforçou para segurar.

— Uma pessoa que não apresenta perigo não vê outra sendo atacada e fica só olhando. — Tori rebateu, tendo em seu rosto uma expressão um tanto severa, os olhos retribuindo os da professora.

Um silêncio que parecia irreversível surgiu entre as duas, fazendo com que ambas desviassem o olhar para direções opostas. O local ficou tão silencioso, que Tori entendeu como o fim daquela tentativa falha de explicação e impulsionou o corpo para se levantar outra vez.

— Eu coloquei todos em risco, então mereço a forma como você está me tratando, mereço que me olhe como se eu fosse algo perigoso. — Eileen quebrou o silêncio, o que fez a menina parar outra vez para ouvir — Eu cometi um erro, um erro que eu jamais poderia. Eu confiei no que um professor anterior ensinou antes de mim, então achei que seriam capazes contra criaturas tão bobas levando em consideração que aprenderam sobre piores, que conheceram feitiços mais potentes. — explicou.

— Que bom que reconheceu que errou. Já é um grande avanço, professora! — a artilheira voltou a se mexer e se levantou, batendo uma mão na outra para tirar pó e grama que grudaram ali.

— Sim, eu reconheço. — a mais velha pegou os sapatos e também se levantou — E espero ter uma segunda chance, uma chance de não cometer o mesmo erro que o antigo professor. Pular fases não é seguro e eu aprendi isso, mesmo que da pior forma possível. — suspirou pesado e então se calou.

Analisando com mais cuidado para não demonstrar fraqueza tão facilmente, Tori conseguiu sentir sinceridade na mulher. A aparência reforçava ainda mais suas suspeitas, que diferente da vaidade sempre tão impecável, agora o rosto de Eileen estava abatido, contando com olheiras e uma palidez nada saudável.

— Ok. — Tori murmurou ao mesmo tempo que suspirava muito alto — Eu não sei fazer isso direito, não sei ignorar um pedido de desculpa quando ele parece meio sincero. Eu desisto! — jogou os braços para o ar.

— Então estamos bem? Nada de falso julgamento? Nada de rancor? — perguntou Eileen, enquanto a esperança iluminava seu rosto.

— Eu não guardo rancor das pessoas, professora. É só que... não consigo mais confiar tanto em quem acabei de conhecer. Experiências ruins do ano passado, entende? — sorriu de leve — Então está tudo bem entre nós. Mas... com um olho aberto e  outro fechado. — estendeu a mão para a professora, que logo apertou e abriu um enorme sorriso.

— Obrigada, Tori. — após o aperto, ela recolheu a mão — E saiba que eu não costumo desistir tão fácil, eu vou ser digna de sua confiança! — garantiu e mais uma vez sorriu.

— Tudo bem. Agora com licença, professora, que eu estou realmente exausta. Acho até que depois do esforço de hoje, se a Grifinória não ganhar o campeonato, eu vou roubar o troféu e fugir! — brincou, causando risos já esperados na professora — Eu não acredito nisso. — ao se virar para sair dali, fez uma careta para algo e depois revirou os olhos.

Não muito longe dali, todos os integrantes masculinos do time ainda estavam em campo, todos fingindo estar em uma conversa interessante, apontando para as arquibancadas e em volta, mas vez ou outro com o olhar focado na bela presença no campo.

— Que simpáticos. — Eileen sorriu ao notar o fingimento — Olá, meninos! — aumentou o tom de voz para cumprimentá-los e acenou.

— Olá, Eileen. — todos responderam em um coral desorganizado, porém tendo sincronia no suspiro apaixonado ao final da frase.

— Simpáticos? Isso deve ser muito incômodo! — fez uma caretinha — Ainda bem que não passo por isso, ou morreria de vergonha! — riu de leve e colocou para trás da orelha uma mecha que se soltou de seu coque.

— Como assim você não passa por isso? Tem só doze anos, mas já é tão linda. E não é aquela beleza infantil que beira a fofura, é beleza de mocinha em formação, digamos assim. — a professora ergueu uma sobrancelha — Cabelos ruivos e olhos azuis. É uma bonita combinação. — sorriu, de novo.

— Não gosto dos meus olhos. — confessou Tori, enquanto tentava mudar o rumo da conversa e não ser tão elogiada.

— Eles são do seu pai. — Eileen refletiu, os olhos ligeiramente distantes.

— Biológico, não pai. — corrigiu e ficou encarando a mulher com certa curiosidade — Conheceu o Rosier? — perguntou.

— Estudei aqui na mesma época que ele, só que em casa diferente. — encarando a menina de volta, a professora desviou o olhar em seguida e focou em calçar os sapatos outra vez — E também tinha a Lily, Tiago, Lupin, Pedro, até mesmo Bangles e também... Sirius. — voltou a encarar quando citou o último nome.

— Sirius. — a artilheira fez uma careta ao repetir o nome, mas logo depois tentou relaxar e até mesmo sorriu — Aposto que tem histórias ótimas para me contar sobre a época de Hogwarts. Adoraria que me contasse mais sobre minha mãe e os amigos, obviamente menos a escória desse grupo, ele não me interessa. — levou uma mão ao pulso e segurou ali.

— Podemos marcar um chá. — sugeriu Eileen.

— Substitui por suco de maracujá e eu aceito. — Tori usou um tom de brincadeira para relaxar outra vez.

— Feito. — a professora aceitou e sorriu.

— Tchau, professora. — se despediu outra vez e saiu mancando com destino ao vestiário.

Encontrou Olívio na metade do caminho ainda babando pela professora assim como todos os outros. Então o puxou pela manga do uniforme, o obrigando a sair dali também e ignorando qualquer resmungo em protesto.

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