Gelo Negro escrita por Marzipan


Capítulo 2
Capítulo II - Segredos expostos




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[...]

Um mês se passou e continuei a minha rotina: ir a enfermaria e criar poções. Numa tarde comum, no laboratório, um homem apareceu na porta.

— Riza, está ocupada?

— Sim? Ah, não muito. O que foi? - Perguntei.

 - Sou Valkyon, ainda não nos conhecemos bem. Sou o chefe da guarda Obsidiana.

— Muito prazer, Valkyon. - Levantei e estendi minha mão com um sorriso no rosto.

Ele estranhou e não me cumprimentou.

— Vim perguntar se sabe lutar. É importante que todos na guarda manuseiem pelo menos uma arma.

— Acho que você não vai querer me ver lutado, ha ha.

— Eu quero. - Disse sério.

— Bom... Então o que estamos esperando? -

Valkyon me levou até a área de treino do lado de fora do Q.G. Os outros já estavam lá esperando.

— Olá, meninos.

Nevra e Leiftan responderam satisfeitos. Ezarel fez careta.

— Escolha sua arma.

— Não vou usar arma. - Sorri.

Ninguém entendeu. Valkyon pegou um machado.

— Está pronta?

— Claro.

Riza ficou estática, em pé em frente a Valkyon. Com as mãos seguradas atrás da cintura, ela cantarolava enquanto Valkyon tentava entender o que ela iria fazer. De repente, partiu para cima dela. Riza, num movimento rápido e leve, foi para baixo de seus braços, atravessando o machado, e tocou seu dedo indicador direito na testa de Valkyon. No mesmo instante ele largou a arma e caiu.

— O... O quê...?! - Ele absolutamente não entendeu o que aconteceu.

Os demais ficaram impressionados.

— Você é muito lento. - Ela sorriu de forma meiga. - Paralisia. Você demorou tanto para me atacar que consegui recitar o encanto inteiro.

— Riza. – Miiko apareceu na entrada, séria.

— Sim? – Perguntei.

— Tem um rapaz no nosso porto chamado Häns afirmando ser marido de Nymeria Valgerður e insiste que ela está aqui em Eel. – Ela disse olhando feroz.

Riza ficou estática e seu sorriso sumiu de seu rosto.

— Você foi a única que chegou aqui na época que o Häns mencionou. Riza, se você está escondendo algo, diga logo. Não tenho tempo para gracinhas.

— Não... É um engano... - Riza pela primeira vez demonstrou medo nos olhos.

— Você pode começar a falar. Agora. – Miiko disse extremamente rigorosa.

— Eu...

— Qual é o seu nome, Riza? – Ela a pressionou.

— Nymeria...  – Mal consegui falar.

— Você é a rainha?! – Todos ao redor falaram.

— Pelos deuses, Riza! Por que escondeu algo tão sério?! Nós te acolhemos! – Miiko estava furiosa, começando a gritar.

— Eu não posso voltar! Vocês não entendem! –Eu mal conseguia falar. Minha voz tremia demais. – Eu tentei fugir tantas vezes daquele inferno que, quando o tsunami nos atingiu, eu fugi e parei no primeiro lugar que achei, que por acaso foi aqui!

— Por que você fugiu? Você é da realeza... – Nevra perguntou indagado.

— Eu não quero falar sobre isso. Só, por favor, não me devolvam para ele.

— Seu marido? – Miiko perguntou.

— Ele não é meu marido. É um encosto. – Gaguejei.

— Riza, precisamos dar uma resposta para eles... Eles estão nos aguardando com todo armamento possível. Acham que nós te raptamos.

— Eles sabem que eu fugi. Já fugi inúmeras vezes. Me perdoem por isso. Por favor, não me sigam. Eu não quero que vejam.

— Ver... O quê? – Ezarel respondeu com medo.

Ela caminhou até o lado do porto e se deparei com dez navios e seu marido Häns.

— Nymeria, sua imbecil! – Ele me deu um tapa no rosto e eu caí no chão.

Todos da guarda de Eel que estavam ao redor se assustaram com essa brutalidade.

— Você se acha no direito de fazer o que der na telha? EU sou o rei! Você não pode me desobedecer só porque é a rainha! – Gritou.

— Você não é rei. – Falei com vigor, olhando-o do chão com o cabelo em meu rosto.

Todos ficaram sem entender e começaram os murmúrios.

— Como é que é, mulher? – Ele disse agarrando meu pulso, me puxando do chão – Você vai pra casa AGORA e eu CANSEI de você fugir o tempo todo!

— Me solte. Agora. – Disse com um ar assustador.

— Ou o quê?

Os olhos azuis de Riza de repente ficaram pretos. A mão de Häns que segurava Riza começou a ficar escura e segundos depois ele gritou de dor. Todos ao redor agora estavam assustados e surpresos. Algumas pessoas fugiram da cena.

— Gelo negro... – Miiko falou boquiaberta.

Riza possuía uma herança esquecida chamada gelo negro, gelo obscuro ou ainda gelo das sombras. Ele queima tudo que toca e não derrete, ao contrário do gelo comum. Esse poder é de origem daemon.

— Eu mandei me soltar. - Disse fria, olhando Häns ao chão gemendo de dor.

— O quê...?! Que merda é você?! – Ele exclamou.

— Como acha que minha família subiu ao trono? - Falei com raiva, minha voz ecoando pelo porto.

Todos ao redor não emitiram um único som.

— Renuncie.

— Você ficou LOUCA?! - A cada insulto, o gelo subia para o seu braço.

— Você terá tempo para pensar até que o gelo cubra o seu corpo.

Häns entrou em pânico e parecia estar tendo uma crise. Nunca o vi assim.

— Isso não será tão fácil! Você não pode me obrigar a isso! Prendam-na!

Nenhum soldado se mexeu. Logo ficou claro que todos estavam ao meu lado.

— Me obedeçam, seus inúteis!

— Você nunca mais irá me bater. - Minha voz agora tremeu de fúria. - Você vai para onde merece. Vai apodrecer na prisão! - Gritei.

— O quê?! Mas você...!

— Eu sou a rainha. O trono é meu por direito! - A cada palavra, meu sangue fervia ainda mais.

As lágrimas de Häns agora escorriam até o pescoço, próximo ao gelo negro - que agora estava no ombro.

— Tire isso de mim! Tire!! - Ele gritou agonizado enquanto os guardas o levaram de volta para o navio. - C-Como...! Sua puta! Piranha!!!! - Ele gritou a última palavra antes de ser devolvido ao convés.

Um dos guardas se aproximou de mim, sussurrando “é bom vê-la”. Brevemente os navios partiram.

— Riza... – Miiko disse ainda boquiaberta.

— Eu sei. Eu devia ter contado. - Minha voz enfraqueceu.

— Você já havia planejado... Isso tudo? – Não só ela, como todos da guarda estavam se perguntando.

— Não... - Fiquei com vontade de chorar - Não achei que fossem me achar.

Pausei.

— Eu... Fiz uma carta caso isso acontecesse... A entreguei para o comandante que veio falar comigo. É minha renúncia ao trono... Darei para minha irmã mais nova.

— Eu não acredito nisso, Riza! - Miiko gritou furiosa.

— Sinto muito. Sinto muito... - Eu não aguentava mais, iria desabar de choro a qualquer instante.

— Você nos usou! - Miiko agora parecia furiosa - Nos infundiu uma confiança falsa!

— Está enganada! - Minhas lágrimas escorreram com meu impulso - Eu tentei proteger vocês de quem sou!

— De quem você é? Você é VOCÊ! Você tem sangue daemon! Pode matar todo mundo em um piscar de olhos se quiser! Vá embora, Riza. Você está banida de Eel. Eu não quero mais vê-la aqui.

— Miiko, calma... - Keroshane falou por trás.

— NÃO ME DIGA PARA ME ACALMAR! Essa mulher nos usou, nos manipulou! - O fogo azul de Miiko já estava rodeando seu corpo.

Senti que minha única chance de finalmente ter uma vida normal acabou de se esvair para sempre. A taquicardia me impediu de responder. Busquei Elliot, o montei e saí da Guarda.

O restante voltou para dentro, ainda extasiados pelo o que aconteceu. Ninguém ousou ainda falar com ela.

 

[...]

— Eu disse. Ela era suspeita. - Valkyon quebrou o silêncio da sala.

— Ela não fez nada de errado. - Nevra disse irritado.

— Você não viu o que aconteceu? - Ezarel o questionou.

— Miiko ficou irritada porque a Riza mentiu sobre ser uma camponesa. Só isso que eu vi. Onde isso é motivo para um banimento? - Nevra virou-se contra Ez.

— Nevra... Ela é uma daemon. - Valkyon disse com desgosto.

— Eu sei, mas sinceramente, e daí? Ela foi a melhor coisa que já aconteceu na guarda. - Nevra.

— Temo concordar. A Riza é vítima. Ela ter sangue daemon ou não.  - Leiftan comentou.

— Como podemos perdoá-la? Ela não é confiável. - Valkyon.

— Vocês nunca esconderam nada do passado de vocês? Sério? - Nevra levantou, pisando forte até a porta.

— Aonde você vai?

— Vou encontrá-la. - Disse determinado.

— Nevra, para com isso. - Ezarel já estava de saco cheio da situação.

— Ela já sofreu muito e isso ficou óbvio. A última coisa que ela precisa é ficar sozinha agora.

Nevra saiu caminhando. Leiftan foi atrás dele.

Foram até a saída do portão.

— Nevra, escute. - Leiftan o puxou pelo ombro.

— O quê?

— Procure a Riza. Eu irei conversar com a Miiko sobre isso.

Nevra concordou e Leiftan voltou para a guarda. Passaram-se horas e já estava de noite quando ele lembrou de uma entrada secreta que conhecia na orla e foi até lá. Foi quando ele avistou Riza sentada na areia da praia, com a maré batendo até os joelhos.

 

— Te achei. - Ele disse aliviado.

Ouvi uma voz familiar e olhei para trás, surpresa. Era o Nevra.

— Nevra? - Disse surpresa.

— Oi. - Ele se aproximou de mim.

Ela o olhou com tristeza. Seus olhos pesavam enormes olheiras e estavam vermelhos de choro. Seu vestido estava rasgado e foi a primeira vez que Nevra viu suas pernas: cheias de cicatrizes.

— Eu não tenho medo de você. - Ele disse com carinho.

— Obrigada. - Respondi, mas não consegui olhá-lo nos olhos.

— Você quer ficar sozinha? - Perguntou.

Riza começou a chorar novamente, negando com a cabeça. Nevra então sentou-se ao seu lado na água.

— O que aconteceu com você? - Ele perguntou com cuidado.

— Eu não queria ser princesa... Eu... Eu realmente entrava escondida na biblioteca. Eu não menti sobre isso. - Sorri para ele, tímida.

— Riza. - Nevra ofereceu seu cachecol por causa do vento gelado que vinha do norte.

— Obrigada. - O coloquei, sem jeito.

— Eu acredito em você. De verdade.

— Como?

— Eu sou um vampiro, não sei se você sabe. Eu tenho alguns sentidos a respeito de você e você me exala confiança. Vem, eu vou te levar de volta para casa.

— Casa?

— Sim. Eel. É a sua casa.

Não consegui. Eu caí no choro.

— Tudo bem, tudo bem. - Ele me abraçou - A Miiko já gritou assim com todos nós, principalmente comigo. Ela não te odeia e sei que vai se arrepender. Vem, vamos.

Levantei. Acordei o Elliot e nós três voltamos para a Guarda. Assim que entramos na sala das portas, Miiko estava em pé com um ar preocupado.

— Eu sabia que você iria atrás dela! - Exclamou. Ela parecia aliviada.

— Isso é óbvio. - Ele respondeu bravo.

— Riza... - Miiko me olhou e foi até mim - Eu... Eu sinto muito. Todos nós ficamos tão encantados com você que nem percebemos nada... Foi um choque muito grande saber que você tem sangue daemon.

— Eu sabia que se soubesse quem sou, vocês me rejeitariam...

— O Leiftan ficou a tarde toda tentando me convencer e agora eu entendi tudo... Enquanto isso, Nevra foi atrás de você... Eu... Eu sinto muito. Por favor, volte. Esse mês aqui você transformou a guarda de um jeito que eu nunca consegui em anos.

— Miiko... Eu não lhe tiro a razão em perder a confiança em mim.

— Você salvou pessoas que estavam há meses sem sabermos como curá-las... Criou poções que ninguém nunca conseguiu... Ensinou a Ewelein e o Ezarel. Você tem tudo para ser a melhor rainha que eu já vi. - Miiko falava sem parar.

— Miiko, por favor. Eu lhe contarei tudo que quer saber, mas se aceitar o meu perdão.

— É claro. - Ela sorriu para mim - Por favor, volte ao seu quarto. Vou providenciar uma cama melhor amanhã.

— Obrigada novamente, Miiko, mas não precisa... Essa cama está ótima.

Depois de muita insistência, tive que aceitar uma reforma pequena em meu colchão. Fui dormir tranquila.


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