Never Enough escrita por oicarool


Capítulo 19
Capítulo 19




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Darcy não costumava seguir seus sonhos. Acreditava em praticidade, pés no chão. Ao longo dos anos teve alguns empregos, sempre com o objetivo simples de ajudar a sustentar sua família, pagar suas contas, não deixar que nada faltasse em casa. Quando foi chamado para o exército, Darcy não pensou duas vezes. Tinha um bom salário, e a distância de casa e da família era um preço a ser pago. Não houve drama – exceto por parte de Charlotte e de Veridiana. Mas não de sua parte.

Mas, naqueles meses de aproximação com Elisabeta, Darcy via a cada dia o quanto Elisabeta lutava para tornar seus sonhos realidade. E ela não perdia a praticidade. Apenas batalhava para fazer o que queria fazer, nem que precisasse percorrer um caminho mais difícil e cansativo. E foi inspirado por ela que Darcy Williamson entrou na sede da Fitzwilliam, a empresa responsável pela construção de ferrovias no Brasil.

Darcy adorava trens. Era fascinado por eles desde criança. Lembrava até hoje sua felicidade ao ver um de perto pela primeira vez. E se pudesse escolher algum trabalho, Darcy escolheria dar vida às ferrovias, abrir os caminhos para que as pessoas pudessem viajar, as mercadorias pudessem ser entregues. E quando o senhor Harry, o inglês de forte sotaque que comandava a empresa, ouviu Darcy dizer tudo isso, deu a ele um emprego no mesmo minuto.

E nas últimas três semanas Darcy se dedicava inteiramente à Fitzwilliam. Ao contrário da fábrica, sequer via o tempo passar. E Harry Fitzwilliam o tratava como um filho, mostrando à Darcy todos os passos e todos os detalhes, inspirado por sua juventude e fascínio. Darcy voltava a ser criança a cada informação nova, toda vez que sabia alguma coisa sobre os planos da empresa.

Embora estivesse imensamente feliz com seu novo emprego, e agora compreendesse Elisabeta ainda mais, Darcy tinha uma decisão difícil a tomar. Seu novo emprego exigiria que Darcy passasse longos períodos no Vale do Café. Já havia visitado o pequeno município muitas vezes, quando os Williamson e os Benedito passavam feriados e verões na casa dos avós de Elisabeta. Mas não imaginava voltar para o local após tanto tempo, muito menos que seria praticamente o seu lar nos próximos dois ou três anos.

E agora, ao contrário de sua mudança provocada pelo exército, Darcy sentia que tinha algo a perder. Sua família sempre estaria ali por ele, seus amigos certamente ficariam felizes de poder vê-lo, mesmo que apenas de vez em quando. Mas teria que abrir mão de Elisabeta e daquela relação que despontava. Teria que abrir mão do sentimento que aquecia seu coração.

Porque sabia que era pedir demais que ela o esperasse. Elisabeta tinha sua vida em São Paulo, trabalhava em dois jornais agora. Tinha um futuro brilhante pela frente, e Darcy não sabia nada sobre o seu próprio destino. Seriam dois ou três anos de construção no Vale do Café, mas seu patrão havia compartilhado os planos de ferrovias que cruzassem todo o país. Não poderia prometer nada a ela.

Seu dilema fez com que se afastasse abruptamente, sem encontrar a coragem de contar à Elisabeta sobre seu novo trabalho. Ignorara as tentativas dela de conversar com ele, faltara à maioria dos jantares, e nas últimas semanas não tivera nenhum momento a sós com ela. Elisabeta estava furiosa, ele sabia. E talvez ela estivesse coberta de razão, mas Darcy acreditava estar fazendo o melhor para eles.

Naquele dia, em especial, ela o fitava com um olhar irritado. Discordou de tudo o que Darcy tentou dizer, e distribuía comentários irônicos sobre ele. Era como estar nos velhos tempos, exceto por seus sentimentos em relação à ela. Antigamente ficaria irritado com a implicância, responderia a altura, discutiriam como sempre. Agora apenas sentia-se triste, com vontade de puxá-la para seus braços e pedir para que parasse de olhá-lo com tanta raiva.

Mas não podia fazer nada disso. Como deixar prosseguir algo sem futuro? Machucaria os dois, ele tinha certeza disso. Era melhor que ela estivesse irritada. Assim, quando ele partisse, em duas semanas, Elisabeta apenas seguiria com sua vida. Sem sofrimento, sem dor, sem despedidas. Seria como se nada tivesse acontecido. Exceto pela sensação de que nunca a esqueceria.

##

Elisabeta bufou quando Darcy anunciou que estava indo embora. Era assim agora. Ele dava desculpas toda vez que ela se aproximava, evitava ficar por perto, evitava qualquer contato. Nos primeiros dias ficava apenas imensamente chateada e confusa. Agora, sentia-se extremamente irritada. Mal podia acreditar que havia chorado por ele. Mal podia acreditar que havia se apaixonado por ele.

Porque sim, estava apaixonada por Darcy Williamson. Como se o universo não houvesse avisado durante, literalmente, anos. Como se Darcy Williamson não fosse a criança mais irritante que conhecera. Como se não houvesse sonhado em dar um tapa em seu rosto adolescente toda vez que olhava para ela com desdém. Como se não tivesse passado uma vida inteira praticamente o odiando. Ainda assim, fora estúpida o suficiente para se apaixonar por ele.

Estava decidida a ignorá-lo. Mas ele insistia em falar, e sua voz fazia coisas com ela. Insistia em invadir sua casa, insistia em olhar para ela em silêncio, ainda que evitasse qualquer contato. Insistia em ser grande demais, sendo impossível ignorar sua presença. Por isso tinha vontade de gritar com ele. E, naquele dia, quando ele se despediu sem sequer olhar para ela, Elisabeta apenas sentiu sua frustração transbordar.

E por isso saiu de casa minutos depois, pela porta dos fundos. E caminhou decididamente até a casa dele. Não se incomodou em bater na porta – certamente Darcy havia deixado a porta aberta para quando seus familiares voltassem. Também não refletiu muito sobre o que estava fazendo quando abriu a porta do quarto dele, encontrando Darcy sentado em sua cama, com os cotovelos apoiados nos joelhos e a cabeça escondida por suas mãos.

Ele ergueu os olhos, e Elisabeta podia dizer que estava surpreso. Talvez esperasse um de seus irmãos. Talvez estivesse esperando outra mulher. Céus, ela iria enlouquecer tentando entender o que passava pela cabeça dele. Precisava apenas entender, apenas que ele dissesse com todas as letras que não queria mais nada. Que havia acabado o que mal tivera a chance de começar.

— Elisa? – ele perguntou, sem esperar uma resposta.

— E quem você esperava que fosse? – ela bufou, a irritação na voz.

— O que você está fazendo aqui? – Darcy permaneceu sentado.

— Eu não faço a menor ideia. – Elisabeta riu, irônica. – Não faço ideia de porque estou perdendo tempo com você, já que você claramente não tem nenhum interesse em me ver.

— Elisa, não é assim. – ele tentou dizer, levantando-se.

— Ah, não é? – Elisabeta cruzou os braços. – Então como é? Estou curiosa.

Darcy ficou em silêncio, incapaz de responder.

— Como eu pensava... – ela sorriu, sem humor, voltando-se para a porta.

Ele engoliu em seco, vendo-a parar novamente, a mão na maçaneta.

— Eu não sou mais nenhuma criança, Darcy. Se você não queria mais, era só me dizer. Eu não iria insistir. – Elisabeta disse, antes de sair, fechando a porta atrás dela.

Parou no escuro do corredor, respirando fundo. Era isso, então. Era essa a sensação de achar que havia encontrado alguém especial, tocado um pedaço do céu, apenas para perceber que era tudo ilusão. Seu coração apertou naquele momento, tornando difícil respirar. Maldita a hora que havia deixado Darcy entrar em sua vida daquele jeito. Seus olhos queimaram, mas se recusou a chorar.

A porta se abriu, de repente, e a luz do quarto dele iluminou o corredor. Elisabeta virou-se instintivamente em direção à iluminação, no exato segundo em que Darcy saiu do quarto. Elisabeta não teve tempo de pensar quando ele se aproximou, as duas mãos procurando a cintura dela, a boca já buscando a sua. Sabia que deveria empurrá-lo, sair dali, mas seus lábios se tocaram e ela sabia que seria em vão.

Darcy suspirou ao senti-la se entregar. Aprofundou o beijo, odiando a si mesmo por fazê-la pensar que não a queria. A queria de uma forma quase enlouquecedora. Por isso a beijou como um louco. Colando seu corpo ao dela, puxou Elisabeta em direção à seu quarto. Apagou a luz e fechou a porta atrás deles. Elisabeta ouviu o barulho da chave, sem conseguir evitar passar as mãos pelo pescoço de Darcy.

Não reclamou quando ele a guiou em direção à cama dele, e sentiu apenas seu corpo incendiar quando Darcy deitou-se por cima dela, numa posição que era nova para os dois. O beijo ficou ainda mais profundo, e Darcy entrelaçou seus dedos. Sua outra mão acariciou os cabelos dela, e Darcy descolou suas bocas para explorar seu pescoço. Foram beijos lentos, molhados, e cada vez que Elisabeta suspirava Darcy sentia-se mais fora de controle. Era instintivo para ela tentar aprofundar ainda mais o contato de seus corpos, fazendo os dois prenderem a respiração cada vez que se tocavam onde mais precisavam.

— Eu só não vou mostrar o quanto eu quero você porque eu não posso, Elisa. – Darcy sussurrou nas sombras, mordendo o lóbulo de sua orelha.

Elisabeta puxou de leve os cabelos dele, inebriada pela sensação.

— Se eu pudesse, eu faria você minha agora. – ele continuou, um pingo de tristeza na voz. – Marcaria sua pele com a minha. Eu faria amor com você, Elisabeta.

Ela gemeu baixo ao ouvir as palavras de Darcy, seu corpo procurando o dele, como se perguntasse o que o impedia.

— Eu sei que você gostaria disso tanto quanto eu. – Darcy traçou beijos pelo rosto dela, antes de buscar seus olhos na penumbra. – Mas eu não posso, Elisa. Não seria justo com nenhum de nós.

A seriedade dele foi o suficiente para clarear aquela névoa onde ela estava. Então ela reparou no brilho triste do olhar dele, e sentiu seu coração pular uma batida.

— O que está acontecendo? – ela sussurrou.

E era a hora, ele sabia. Por mais que quisesse aproveitar aquele momento, beijá-la até que perdessem os sentidos, sabia que não podia. Iria embora. Elisabeta seguiria sua vida, encontraria um marido. Não poderia marcar a vida dela daquela forma. Por isso afastou-se dela, sentando-se na cama, ajudando-a a fazer o mesmo.

— Eu consegui um novo emprego. – ele disse. – Por sua causa, porque você me inspirou, eu finalmente tive coragem de pedir um emprego na ferroviária. E eles me aceitaram.

— Darcy, isso é maravilhoso. – ela sorriu, confusa.

— Mas o emprego exige que eu passe a maior parte do tempo no Vale do Café. – Darcy sorriu, triste.

Elisabeta arregalou os olhos, e então os fechou, entendendo toda a situação. Ele estava indo embora. E ela não podia ficar triste por ele, afinal, era o sonho de Darcy. E pela primeira vez ele estava fazendo algo por si mesmo, sem pensar primeiro em sua família.

— Ainda assim, é maravilhoso. – ela sorriu, abrindo os olhos. – E mal acredito que vou dizer isso, mas vou sentir a sua falta.

Darcy sabia que ela estava sendo forte. Sabia o que ela estava fazendo, porque faria o mesmo por ela. Elisabeta não era o tipo de mulher que faria um drama digno de romances. Ela o compreendia, o apoiava. E era por isso que seria tão difícil deixá-la. Ele acariciou o rosto dela, e Elisabeta fechou os olhos novamente.

— Eu não tenho escolha... – ele suspirou. – Se eu pudesse, ficaria em São Paulo.

— Não... – Elisabeta balançou a cabeça. – Darcy, este é o emprego dos seus sonhos. Nada mais importa.

Ela levantou-se, ajeitando o vestido. E o encarou com a sobrancelha erguida.

— Vamos, levante-se. Quero dar um abraço de parabéns. – ela sorriu.

E Darcy o fez, passando os braços em volta dela, escondendo o rosto na curva de seu pescoço. Era um abraço que dizia muito mais do que parabéns. Dizia tudo o que suas bocas não diriam. Elisabeta sentiu uma lágrima escorrer em seu rosto, e outras se seguiram a essa. A camisa de Darcy ficou levemente úmida, e quando se separaram os olhos dele também estavam molhados.

— Quando você vai? – ela perguntou, e Darcy secou com o dedo uma das lágrimas dela.

— Em duas semanas. – Darcy respondeu, triste.

— Então acho que nos falamos antes de você ir. – Elisabeta suspirou. – Eu preciso ir agora, seus pais devem estar chegando.

E se foi com pressa, porque estava prestes a desmoronar e não queria fazer isso na frente dele. Agora sim sabia a sensação de tocar o céu e cair do alto. Porque ao saber que Darcy iria embora, não teve dúvidas de que o amava. Mas amá-lo significava deixa-lo ir. E era o que faria.


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