Sorvete de Laranja escrita por Angie


Capítulo 1
Sorvete de Laranja


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem!



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A lanchonete estava estranhamente vazia. Ao entrar, Betty sentiu a mistura de aromas tão excêntrico, mas, ao mesmo tempo, tão aconchegante do local. Aquele cheiro esteve presente em seus longos dezesseis anos de vida, nos mais diferentes momentos, com as mais diversas pessoas. Naquela quente tarde de verão em particular, o odor de hambúrgueres, milkshakes e cafés era ainda mais especial. Quando pôs seus pés no estabelecimento — depois de passar as férias inteiras fora da cidade — ela percebeu que realmente estava de volta a Riverdale.

Enquanto andava pelo corredor do Pop’s, Betty ouviu risadas infantis surgirem a sua esquerda. Ao virar a cabeça, ela viu duas meninas com colãs cor de rosa e saias rodadas. Os cabelos loiros de ambas estavam impecavelmente presos em coques — feitos por sua rígida mãe, que não admitia que suas garotinhas saíssem na rua com um mísero fio de cabelo fora do lugar. Os pezinhos envoltos por sapatilhas balançavam sob a mesa. Sobre a mesa, repousavam dois sorvetes de laranja, que elas bebericavam entre risadas. Apesar de parecerem um tanto cansadas, os olhos claros das duas brilhavam de alegria.
Quando passou por elas, quase chegando a sua habitual cabine, Betty conseguiu observá-las melhor. A menor — que estava agora em sua frente — não deveria ter mais que oito anos. Seu sorriso era grande e inocente, como se as mazelas do mundo ainda não a tivessem tocado. A mais velha, agora de costas para a jovem Cooper, segurava a mão da outra com amor. Nem era preciso ouvir o que elas diziam para sentir a pureza daquela cena.
Betty sentiu seu coração se apertar. Para evitar que as lágrimas começassem a brotar, ela desviou o olhar, finalmente sentando-se. Olhá-las era como estar em um rio de memórias que corria em alta velocidade, sem a possibilidade de nadar contra a correnteza. Era tudo o que Betty menos precisava naquele dia. Ela sabia que tinha que enfrentar tudo aquilo que estava sentindo em algum momento. Tinha que ter forças para aceitar a realidade.
Quando tomou coragem para olhar novamente para a mesa das pequenas meninas — respirando fundo para evitar as lágrimas —, elas haviam desaparececido. E ela estava novamente largada com seus pensamentos.

Sua única companhia agora era o famoso dono da lanchonete, Pop, que se deslocava lentamente em direção às mesas do lado direito do estabelecimento com um sorriso no rosto. Antes de chegar à Betty, porém, ele parou em uma cabine um pouco à frente, anotando os pedidos de duas garotas um pouco mais velhas que as anteriores. De longe, a jovem Cooper conseguiu ver que a mesa estava lotada de inúmeros cadernos e livros, sobre os quais a menor estava debruçada, totalmente alheia ao mundo. Ao ver o dono do estabelecimento, a mais velha, que usava o traje de líder de torcida de Riverdale High, sorriu.

— O de sempre, meninas? — perguntou Pop, recebendo como resposta um aceno afirmativo da maior. — Mas acho que essa aí não vai beber nada.

A mais velha apenas riu enquanto o homem se afastava, levando o pedido à cozinha. Logo olhou com preocupação para a menina em sua frente, que não levantava a cabeça desde que as duas chegaram à lanchonete.

— Betty, não adianta nada, você não vai conseguir aprender tudo até amanhã — afirmou ela, tocando no braço da mais nova. — Apenas relaxe um pouco.

— Mamãe vai me matar se eu não tirar a nota máxima, Polly — a outra levantou levemente os olhos, afrouxando um pouco seu perfeito rabo de cavalo. — Se você me ajudasse, seria mais fácil.

A mais velha suspirou, pegando um lápis para ajudar a mais nova a terminar um longo cálculo.

— O que vai ser hoje, querida? — Betty voltou subitamente o olhar para o homem que parara ao seu lado, encarando-a. Ele sorria, como sempre, mas ela, diferente da menina da outra mesa, não conseguia retribuir.

— O de sempre, Pop. — Ela levantou os cantos da boca, em uma tentativa falha de realmente parecer feliz.
Quando ele sumiu, outra movimentação chamou a atenção da garota. Agora, as duas meninas sentavam-se do mesmo lado da cabine, mais próximas do que nunca. A maior — que deveria ter no máximo dezessete anos — passava a mão pelas costas da mais nova, que chorava copiosamente com o rosto encostado ao ombro da outra. As lágrimas molhavam o suéter azul-celeste da mais velha, que não parecia se importar. Betty lembrava-se bem daquele dia, em seu primeiro ano do ensino médio — no ano anterior — quando fora chamada de gorda por Cheryl na seletiva para a equipe de líderes de torcida. Nunca se sentira tão humilhada em toda sua vida.

— Ser uma Vixen não é tudo, Betty. — Polly pegou o rosto da irmã, fazendo seus olhos se encontrarem. Com suavidade, ela secou as lágrimas da outra com os polegares. — Ainda é seu primeiro ano, há muita coisa para aprender, para viver. Quem sabe você não acha outra atividade que combina mais com você? Ouvi falar que o jornal da escola está desativado há muitos anos, quem sabe não é você a pessoa que vai reativá-lo? Imagina que legal!

Betty balançou a cabeça, ainda inconsolável. Nada poderia convencer a menina de quinze anos que ser uma líder de torcida não era seu destino no ensino médio. Ela deveria pensar no seu currículo, no seu futuro. Tinha que fazer algo a mais para ser aceita em alguma universidade dali quatro anos. Ela simplesmente não poderia falhar logo na primeira semana!

— Tudo vai se ajeitar, não se preocupe.

Betty somente voltou a atenção à própria mesa quando sentiu o celular vibrando em seu bolso. Em um primeiro momento de pavor, pensara que era a mãe ligando desesperadamente — como fazia frequentemente do que Betty desejava. A menina, no auge de sua raiva e tristeza, saíra de casa sem falar para onde ia, ignorando os chamados dos pais. A mãe, preocupada do jeito que era, deveria estar louca para encontrar a filha e trazê-la de volta para casa no mesmo segundo para ter uma “conversa civilizada”. Para sua alegria, porém, a única notificação em sua tela de bloqueio era uma mensagem.

Já chegou em Riverdale? Vamos nos encontrar amanhã no Pop’s.
Estou com saudades!
—Archie

 

Ela não respondeu. Era óbvio que queria encontrar o melhor amigo. Desde que as férias escolares começaram, os dois não se viam. Ficar longe dele por tanto tempo era muito estranho. Durante seu estágio de verão, eles se falaram todos os dias por mensagem, é claro, mas não era a mesma coisa. Simples palavras em uma tela não a faziam sentir como quando os dois estavam um de frente ao outro. Seu coração acelerava, suas mãos suavam e seu rosto corava: era uma típica adolescente apaixonada. Naquele momento, porém, ela não queria entender outros sentimentos.

O ruivo que estava em sua mente agora era outro: um menino alto com pinta de esnobe que passava por sua mesa, piscando para sua irmã. Polly, sentada em sua frente, tomava seu sorvete de laranja distraidamente, sem dar atenção à irmã caçula. Ela não tirava os olhos do garoto, que parecia correspondê-la. E a única coisa que Betty conseguia fazer era ficar confusa.

Jason, o garoto em questão, era o herdeiro da família mais rica da cidade, os Blossom — convenientemente os rivais históricos dos Cooper. Em seu penúltimo ano do ensino médio, ele era o capitão do time de futebol e, logo, desejado por quase todas as garotas de Riverdale High. Pelo pouco que entendia das relações no ensino médio, Betty sabia que esse não era o tipo de garoto que se apaixonaria por sua irmã — até porque a mãe das duas repreenderia qualquer interação com qualquer representante do sexo masculino, “O foco de vocês duas é o estudo, não esqueçam.”, ela sempre dizia. Ver Polly assim, tão perdida em olhares e suspirando, era algo novo para a mais nova.

— O que está acontecendo entre você e Jason? — ela perguntou, tentando chamar a atenção da outra.
— Não é nada… — Polly respondeu, recebendo um olhar desconfiado da irmã. — Deixe para lá.

Claro que era alguma coisa. A mais velha das Cooper nunca fora de namorar. Pelo que Betty sabia, ela apenas beijara um garoto em um baile do ensino fundamental. Nada mais. As duas meninas, por pressão da mãe, sempre foram muito dedicadas aos estudos e às inúmeras atividades extracurriculares em que estavam inscritas. A mais nova, porém, conhecia sua irmã. Polly era intensa. Quando ela sentia algo, sentia com força, sem ter medo de se jogar para o desconhecido. Era evidente, então, que aquilo que acabara de acontecer não se limitaria a um flerte inocente na lanchonete.

E, como Betty prevera, não se limitou. Logo, a cena que a menina via em sua frente, mesmo com poucas semanas de distância da outra, era totalmente diferente. Dessa vez, era Polly quem chorava. Horas antes, ela e Jason tiveram uma briga séria — sobre a qual a mais nova não sabia nada. Desde que os dois começaram a namorar quase às escondidas, Betty se afastara da irmã. Ao passar pela mais velha no corredor, agora sempre cercada pelos amigos jogadores de Jason, ela se sentia intimidada. Era como se a irmã tivesse se tornado mais uma daquelas meninas mais velhas inalcançáveis que ridicularizavam as tímidas garotas do primeiro ano. Era como se não fosse mais sua irmã.

Apesar de estar magoada, Betty não conseguiu ignorar o choro vindo do quarto ao lado. A irmã chegara em casa correndo, sem falar com ninguém — e ignorando os gritos da mãe — e se trancara. Sua porta se batera com tanta força que a mais nova jurava que até Archie, seu vizinho, conseguira ouvir. Enquanto fazia seus deveres, ela conseguia ouvir os soluços, sentia o sofrimento que, de tão forte, atravessava as paredes da casa. Um sorvete de laranja era a única coisa que poderia acalmar o coração de Polly.

Sentadas uma de frente para a outra, as irmãs permaneceram em silêncio. Desde que saíra de seu quarto — por conta da insistência da mais nova — Polly não falara nada. Ao chegar na lanchonete, só tomara o sorvete, enquanto esperava as lágrimas secarem. Betty não forçou nenhuma conversa, apenas a decisão da irmã, fazendo companhia. Estar ali com a caçula, como deveria ser desde o princípio, era o suficiente para diminuir o sofrimento de um coração partido.

— Seu sorvete, querida. — Pop se inclinou, deixando o copo laranja em frente à garota.

— Muito obrigada, Pop — ela disse enquanto ele se afastava, sorrindo.

Ao tomar o primeiro gole de sua bebida favorita, Betty sentiu algo estranho. O gosto estava diferente, até um pouco desagradável. Não era tão doce como costumava ser, nem tão gelado, e quase não tinha gosto. A menina até pensou em reclamar para o dono do estabelecimento, mas, quando olhou para frente, entendeu o porquê de o sorvete não estar nada como lembrava: Polly não estava mais ali.

Ao perceber que estava sozinha, uma lágrima escorreu pelo seu rosto.


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Notas finais do capítulo

Até a próxima!

xoxo ♥ ACE



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