Carta para você escrita por Carol McGarrett


Capítulo 3
Finalmente notícias


Notas iniciais do capítulo

Voltei com mais um capítulo! E até que não demorou muito!
Não tenho muito a dizer, só que estou amando inventar a personalidade da Kelly!!
Boa leitura!!



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Europa, 1998

Carta 05

 Filha,

 

Eu sei que prometi te escrever toda semana, mas como você mesma percebeu, o trabalho que estou fazendo aqui, às vezes fica complicado demais, o que impede que eu te escreva e te mostre que eu estou bem. Por favor, após essa carta, quero que se acalme e, por pelo menos um tempo, foque só em você e esqueça o resto. Muito provavelmente essa carta vai chegar depois da sua viagem de férias, e eu sinto muito por você ter passado estas duas semanas tão preocupada e pensando na minha segurança. Te prometo que irei te recompensar um dia, Kells.

 Como você notou, não sou quem estou escrevendo, e sim, é a Sherpard. Durante uma de nossas missões acabei por machucar o ombro e agora ele está imobilizado. Não é nada grave e já estou relativamente bem. Portanto, nada de surtar ou escrever um testamento me xingando ou querer a cabeça da Jenny porque ela não me deu o necessário apoio. Coisas assim acontecem e mais frequentemente do que você pode imaginar. 

 Como fiquei muito tempo sem te atualizar, estou te mandando não o presente que você pediu, mas vou procurar algo que combine com você e que você goste. Talvez até faça par com o anel que te mandei, e aproveitando, não é um anel espião. É um anel comum como todos os outros que você tem, a única diferença é que foi comprado na Europa.

Fico feliz que tenha gostado da festa. Apesar de não ter estado aí para que você pudesse me contar exatamente o que aconteceu, você parece ter se divertido muito. E pelo jeito descobri que não sou o único da família que tem aversão a aniversários. Mas até onde sei, você sempre gostou de se reunir com suas amigas e celebrar. Deve ser coisa de adolescente mudar tanto de opinião.

Nunca duvidei que você fosse conseguir boas notas nas prova. Além de inteligente, você sempre se esforçou além do necessário para poder ir bem na escola. E sim, talvez eu te recompense sobre isso. Tudo vai depender do resultado final anual. Mas se continuar assim, vou ter problemas pra achar tantos presentes para você! E, se duvida tanto assim da minha capacidade de saber o que você pretende fazer, eu aposto o presente que você não ganhou que será medicina. Você tem o dom de querer ajudar a tudo e a todos. Me diga se acertei.

Por fim, só quero te informar que você ganhou uma aliada. Pelo que entendi, eu pareço não entender nada sobre o “universo feminino” e Jenny resolveu que é uma boa hora pra ser sua amiga e te defender por aqui. Como disse a ela, ainda bem que vocês estão bem distantes uma da outra, porque senão eu não teria um minuto de paz.

 Fique bem e tranquila e nós voltaremos a nos falar assim que possível, mas nunca se esqueça, filha, que eu te amo e nunca, jamais, irei te abandonar.

 

Te amo e também estou com saudades.

 

Papai.”

 

————————-

 

Sinceramente, de inicio eu não gostei da ideia de que uma pessoa completamente estranha a minha vida escrevesse essa carta, mas, Kelly estava tão preocupada e pedindo por respostas que eu não poderia deixá-la sem notícia alguma. Contido, depois que Jenny já tinha lido as quatro cartas e ficado sabendo de coisas que eu jamais tinha contado pra nenhuma das minhas ex-esposas, e ainda levando em consideração que eu não podia mexer meu braço, não tive outra opção a não ser pedi-la para escrever.

Logicamente Kelly ficaria curiosa com a caligrafia, e então eu teria que explicar quem estava escrevendo e o porquê de isso ter acontecido. Claramente ela não poderia saber a verdade. Tudo bem que ela sempre soube que o meu trabalho era perigoso, mas eu não precisava colocar mais preocupações na sua jovem cabeça.

 Não pude deixar de notar de que, desde o momento em que eu pedi que Jenny escrevesse a resposta eu fiquei curioso com suas reações a cada palavra. E, mais uma vez, ela me surpreendeu. Em momento algum ela discordou de algo ou deu sua opinião. Esse último fato foi até curioso, pois aprendi que ela sempre tem opinião sobre tudo. Contudo, se algo não a deixou feliz, ela escondeu muito bem. Mas mesmo assim eu estava curioso..

— Não vai dizer nada?

— Perdão?

— Sobre a carta. Não vai dar nenhuma opinião? Você parece ter sempre uma opinião formada sobre tudo!

— Não, Jethro.

Olhei pra ela espantado. Não era da sua natureza.

— O que foi? - Ela parecia irritada com a minha cara.

— Ainda acho que você tem algo a dizer.

— Por Deus! Eu não tenho nada a dizer. Jethro, você me pediu pra escrever o que você fosse falando, foi o que fiz. Isso aqui - e ela me mostrou a carta já pronta, escrita com sua caligrafia elegante. - é você e sua filha. E eu não tenho que dar opinião sobre nada! É a sua vida particular, e ao contrário do que você possa pensar, eu não me meto em todos os assuntos! Sei quando devo e não devo falar ou emitir um comentário!

Ela definitivamente ficará irritada. Eu a julgara mal.

— Quer que coloque mais alguma coisa? - Ela mudou o foco, mas o assunto continuou o mesmo.

— Não. Assim está bom. Pelo menos ela tem um pouco das respostas que pediu.

— Ok. Vai querer mandar mais alguma foto? Tirei outras desde a sua última carta, e levando em consideração que estamos de partida de Positano, acho que ela gostaria de receber as últimas imagens da Itália!

— Sem problemas. Pode escolher as fotos. Vocês duas parecem ter o mesmo gosto.

— Você quer dizer “Bom Gosto”, não é?

Eu ainda vou entender o porque que ela gosta tanto de me provocar. Acontece que, da mesma forma que as tiradas dela me deixavam maluco, eu sabia que meu silêncio a matava de ódio. Então resolvi entrar no jogo da maneira que ela não iria gostar. Simplesmente me mantive quieto. E sua falta de paciência jogou do meu lado, mais uma vez, pois assim que não obteve nenhuma resposta verbal, saiu clicando os saltos pelo sótão afora. 

 

—————————

 

Eu juro que um dia eu ainda vou atirar nele!! Como ele pensa que pode me colocar nessa saia justa de pedir a minha opinião sobre a carta que ele está escrevendo para a filha dele??? Céus! Eu sei muito bem quando me calar e quando dar a minha opinião sobre as coisas, e sobre essa carta eu não tinha que comentar nada! Eu não conheço a Kelly e mal o conheço, apesar de gostar dele de um jeito não apropriado para duas pessoas que são apenas parceiras...

No mais, eu acho que deveria escrever para a garota, só pra avisar que tudo está realmente bem. Sei que ele não me pediu para fazer isso, mas quero só confirmar as suas palavras, pois se ela for tão desconfiada quando o pai, com certeza não vai acreditar de primeira nas palavras dele. Principalmente se se levar em conta que se passaram dois meses sem qualquer notícia, e de repente ela vai receber uma carta com uma caligrafia totalmente diferente! Já deu pra perceber que ela não é boba, é lógico que vai somar com dois e pensar o pior, talvez muito pior do que realmente aconteceu. E é isso que eu quero evitar. Quero acalma-la de uma vez por todas. Só espero que Gibbs não fique possesso comigo. Mas por vias de dúvidas, acho melhor comentar com ele...

Apesar de que ele adora testar a minha - falta - de paciência, eu teria que encará-lo para poder informar que escreveria para a filha dele.

— Você não se importaria se eu escrevesse um bilhete para a Kelly, não é?

— Por que?

— O porque vou escrever ou o porque estou te pedindo opinião?

— A primeira opção.

— Para confirmar suas palavras.

— Mas minha filha nunca duvidou do que falo pra ela.

— Não duvido disso. Mas leve em consideração que você ficou dois meses sem escrever, e quando está carta chegar, será com outra letra que não a sua. Ela vai ficar desconfiada de que algo grande aconteceu. 

Ele não me respondeu, mas parecia considerar o que eu acabara de dizer.

— Você acha que isso vai deixá-la mais calma?

— Tenho certeza que sim!

— Se é o que você quer...

Não era exatamente o que eu queria, era o que eu deveria fazer... uma adolescente estava sozinha do outro lado do mundo e estava preocupada com a saúde e bem estar do pai. E como eu já passei por isso, tenho certeza que mais uma palavra de conforto nunca será demais.

 

———————————

 

Itália, 1998.

 

Olá Kelly! Tudo bem?

 

Meu nome é Jenny Shepard e como você já sabe estou trabalhando com o seu pai aqui na Europa. 

Tomei a liberdade de te escrever somente para te tranquilizar. Sei que você deve ter estranhado a letra na última carta dele e deve ter imaginado mil cenários diferentes para o motivo disso ter acontecido. Não precisa se preocupar. Tudo está bem. E ele vai ficar bem também. Como ele disse na carta que te enviou, são os ossos do ofício, às vezes ficamos bem, outras acidentes acontecem. Mas nunca se esqueça que somos treinados para entender, aceitar e evitar isso. É por isso que sempre mandam duplas, para que sempre possa cobrir as costas do outro.

Te entendo mais do que você possa imaginar, pois já fiquei no seu lugar tantas vezes que cada sentimento que você está sentindo foi o que senti. A preocupação e, talvez, o pensamento de que o pior aconteceu, são normais, mas não perca a fé. Nunca. Você disse que a primeira coisa que faz pela manhã é pedir pela segurança de seu pai. Continue fazendo isso e sempre, sempre, mantenha o pensamento positivo. Você não faz ideia do quão é importante para nós que estamos em missões assim ter alguém que nos quer bem e que nos espera em casa!

Não vou me alongar muito, pois sei que quer tem os seus planos.

Agradeço suas palavras de carinho nas cartas e pode deixar que não vou deixar de tirar mais fotos e de te mandar as melhores!

 

Atenciosamente,

 

Jenny

 

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Logo que acabei de escrever a carta, sim, porque bilhetes são bem menores, perguntei se já poderia enviá-los.

Então, um pouco antes de nossa mudança efetiva de sede de vigilância, fui ao posto dos correios e despachei as duas cartas junto com mais algumas fotos que já tinha separado. Creio que Kelly ficará feliz quando receber essas notícias. A pobrezinha já está tão aflita que era possível sentir pelo que ela estava passando somente lendo suas últimas cartas. Espero solenemente que estas não demorem para chegar, ainda mais se levarmos em consideração que sua última postagem foi em abril e nós já estávamos em meados de maio. 

 Como ainda faltavam algumas horas para nosso embarque resolvi dar um último passeio pelas principais ruas e avenidas da cidade e, logicamente, tirar umas últimas fotos, não sei se voltarei aqui algum dia e como amo fotografia, nunca é demais aproveitar uma oportunidade e vista como essa!

 

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Duas semanas depois que Jethro acordou seu pequeno “sono de beleza”,- que ele nunca saiba que apelidamos assim o que aconteceu com ele - partimos para Marselha. Era a parte dois de nossa missão. Se tudo desse certo, depois daqui seriam mais dois destinos, Sérvia e Paris. E assim se passariam mais 18 meses e, enfim, poderíamos voltar para casa e para as novas designações que o Diretor nos daria.

 A viagem até a nova cidade foi rápida e cercada de belas paisagens. A passagem por Mônaco foi propriamente registrado, afinal, o Principado é conhecido por ser a casa de famosos esportistas e celebridades, e agora eu sei o motivo, é realmente deslumbrante e de tirar o fôlego à vista para a marina! Tirei varias fotos, e tenho certeza que algumas vão para a coleção de Kelly!

Já a chegada à Marselha não foi o que esperávamos. Por conta do tiroteio e das consequências da falta de cuidado de Decker, fomos informados que deveríamos nos apresentar no escritório local para maiores informações. O que, trocando em palavras mais fáceis, o diretor queria uma atualização pessoal, nos verificar e, por fim, arrancar nossas orelhas de tanto que ele iria falar.

Acontece que não conversamos sobre o que aconteceu. Depois da melhora de Gibbs resolvemos de forma silenciosa que ninguém tocaria mais no assunto, mas que todo aquele susto servisse de lição para as operações futuras. Então, quando fechamos as malas e rumamos para nosso novo destino, tínhamos em mente que nada mais sairia errado. Contudo o Diretor queria novas informações e éramos, então, obrigados a conversar sobre a falta de apoio e o lapso de Decker.

 

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Se tem algo que eu sempre fui bom em fazer é colocar uma pá no passado. O que aconteceu, aconteceu, não pode ser mudado por mais que se queira fazer diferente. E foi isso que resolvi fazer com o tiroteio do beco. Eu fora atingido? Sim. Fiquei com a pior parte? Sim. Mas consegui sair dessa só com mais uma cicatriz? Sim. Tanto faz. A operação deu certo no final das contas e o mundo tinha dois bastardos a menos para se preocupar.

As coisas andaram estranhas entre Jenny e Decker desde que acordei. Não sei o que ela fez ou falou ou não falou para ele. De certo modo ele fora o culpado por tudo o que acontecera, ele tinha que estar lá, não estava. A coisa toda poderia ter sido mais fácil. Não foi. Ele aprendeu a lição dele. Jenny, muito provavelmente teve o primeiro grande susto da carreira dela, mas também aprendeu uma ou duas coisas. Às vezes é mais fácil confiar em quem está na sua frente e não em quem vai tomar conta das suas costas.

E agora o Diretor queria nos ver. Eu não tinha muito o que falar. Li os relatórios da Shepard, e eles estavam completos, apesar de que achei que ela pegou leve com William, se levar em conta o quão irritada ela ficou.

Quanto aos relatório dele, ele fora sincero e assumiu a culpa, não espera por menos. Mas tudo isso deve ter sido passado e revisado inúmeras vezes por Morrow, e ele chegou à conclusão que quer conversar conosco. O que ele tem pra falar que um mero memorando não pudesse dizer, eu não sei. Só nos resta aguardar.

 

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E, na hora e local marcados estavas aguardando a transmissão direta de Washington. Como esperado Morrow tinha uma péssima cara e seu humor estava pior ainda.

Disse que. se logo na primeira parte da operação nos já arrumamos uma encrenca dessa, ele temia que seríamos incapazes de concluí-lá. Falou por aproximadamente uma hora até que pareceu que tinha tirado todo o ódio que tinha por nós de dentro dele e, finalmente, nos deu a palavra. Mas quem seria o primeiro a falar?

Seguindo as ordens de relatório, Decker se pronunciou e assumiu a culpa por tudo, tanto eu quanto Jenny nós mantivemos calados enquanto Morrow despejava outra rodada de xingamentos e reclamava da incompetência dos três.

Foi aqui que notei que Shepard não estava gostando nada do que estava acontecendo. Pelo que pareceu era a primeira vez que ela tinha que ficar  frente a frente com um superior e se explicar... isso seria interessante, já que a cada palavra do Diretor ela ficava ainda mais irritada. Ela não gostara de ter sido notificada que os três teriam o incidente devidamente anotados em seus Arquivos, e que nada nem ninguém iria tirar isso de lá.

Eu já passei por xingamentos piores enquanto eu estava na Corporação, então as palavras de Morrow não fizeram nenhum efeito. Principalmente, porque eu nada tinha o que reportar, até onde os dois agentes do meu lado falaram, eu fora o grande prejudicado pelas falhas de um deles.

E o último ponto que foi discutido, depois de Jenny ter sido advertida que não cabe a ela a decisão de chamar ou não um médico quando se tem acidentes deste nível, foi se o trio deveria continuar a missão ou deveria ser dissolvido.

Confesso que não gostei disso, éramos uma boa equipe. Cada um tinha lá os seus problemas, e lapsos, por mais que eu os odeie, acontecem também.  E não valia a pena desmontar essa equipe que trabalhou tão bem. E, em quem, apesar de tudo, eu aprendera a confiar. Não só no lado profissional, mas também no pessoal,. Não conseguia me ver concluindo essa operação sem a Jenny do meu lado. 

Ficamos em um estado de ansiedade por mais ou menos 30 minutos, Morrow tinha desligado a chamada e estava conversando de forma privada com o secretário da Marinha. Enquanto isso, na pequena sala de conferência do NCIS de Marselha, nós três nos encarávamos e tentávamos não culpar um ou outro por isso.

 

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Eu detesto ameaças. Sempre achei que se uma pessoa tem que fazer algo que ela pegue e faça sem ficar fazendo ameaças veladas ou colocando o mundo em pausa enquanto ela se decide.

Morrow não ficou feliz com o acontecido em Positano. Ok, eu também não! Passei os piores momentos da minha carreira naquele quartinho. Mediante uma incerteza quanto a saúde de Jethro e a vontade de esganar Decker com minhas próprias mãos.

Cada vez que William aparecia na minha frente durante aqueles dias eu juntava todas as minhas forças para não dizer nada, pois tinha a certeza de que ele diria com todas as palavras que eu estava sendo exagerada e que a única pessoa que poderia culpá-lo era Gibbs. Então me mantive calada e somente o olhava torto. 

E as coisas começaram a melhorar a medida que Jethro ficava melhor, até que em um acordo mútuo, não tocamos mais no assunto, afinal se todos fossem começar a discutir a culpa, ficaríamos dias culpando uns aos outros.

Acontece que o Diretor não pensava assim. E achou que passar uma reprimenda coletiva era a melhor solução. Eu queria morrer de ódio. E agora estava aqui, aguardando a boa vontade de Morrow e SecNav decidirem o destino dos três.

Na verdade, nem demorou tanto, após os meus três cafés, nossos superiores apareceram na tela e disseram que nos dariam uma nova chance de provarmos que poderíamos trabalhar como uma equipe e levar um resultado positivo para Washington.

Parecia que eles somente queriam nos assustar. E isso me irritava em um ponto que era inimaginável. Mas mordi a língua e me mantive calada, não queira ser aquela que daria o surto. Até porque era a única mulher ali, e com certeza levariam para o lado da brincadeira qualquer palavra de desagrado que falasse agora.

 

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Nessa parte da operação, além da tocaia, passaríamos a nos envolver propriamente com nossos alvos. Os primeiros na Itália, a Agência já tinha as provas suficientes contra eles para autorizar o assassinato. Contudo, esse negociante russo era outra história. Há anos que a tanto a CIA quanto o NCIS vinham monitorando suas atividades e, até então, ninguém conseguira colocar as mãos nas provas concretas do que ele realmente fazia. Então, cabia a Jethro se disfarçar de negociante francês de armas e eu faria o papel de esposa troféu. Já que os homens são propensos a achar que toda mulher bonita ao lado de um bandido era burra e, assim, entre se vangloriar de sua masculinidade e contar quantas outras “gostosas e burras” eles têm ao seu dispor, acabam por falar mais do que gostariam. 

Como Gibbs seria revistado todas as vezes, quem levaria as escutas era eu. Muito simples, uma joia bem cara e chamativa, e lá estava a gravação que queríamos.

Demoramos para localizar o barco onde as negociações de Zhukov eram feitas e, assim como na Itália, nos instalamos em um sótão bem em frente à marina. Era início do verão, e, pelas nossas contas, entre finalmente conseguir fazer contato como potenciais compradores e entrarmos de vez dentro do covil do inimigo, passaríamos o verão e uma parte do outono ali dentro. Seriam noites longas, pois ao contrário do sótão de Positano, esse aqui só tinha um quarto e sala e uma cozinha, portanto, nada de conseguirmos dormir separados...

Vigília iniciada. Era agora ou nunca para conseguirmos levar a missão até o fim.

 A única parte boa de tudo isso era que, por estarmos em uma cidade que tinha um escritório permanente do NCIS, as cartas de Kelly chegariam e seriam enviadas sem nenhum atraso. E não demorou muito para que isso acontecesse. E para meu espanto e de Jethro, também recebi a minha. Acho que acabei de descobrir o que irei fazer até que possamos realmente nos infiltrar nessa organização russa!

 

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Foram quarenta minutos de expectativas para nada. Eu sabia que final das contas nem o Diretor nem SevNav iriam cumprir suas ameaças, e isso se dava por um único motivo: ninguém mais queria vir para cá, ou os que queriam não eram qualificados o suficiente, portanto, era essa equipe ou não tinha missão.

 Então, depois de liberados com a recomendação de que mais um incidente como esse estaríamos fora do NCIS, pudemos finamente nos instalar no local de vigilância. E esse era menor do que o outro. Se naquele eu e Shepard já nos estranhávamos, mesmo tendo espaço, nesse aqui era melhor deixarmos as armas descarregaras e bem longe um do outro, porque senão um dos dois voltariam para a América em um caixão de Pinho.

Teríamos que resolver a questão do quarto, e mais adiante, os turnos que tomaríamos, mas, por enquanto, a minha maior preocupação era abrir a última carta que minha filha tinha me mandado.

 

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“Alexandria, 30 de abril de 1998

 

                                      Carta 08

 

Leroy Jethro Gibbs!!!

 

Você por acaso tem algum plano maligno para tentar me matar do coração? Tem? Por que você não faz ideia do meu desespero quanto abri a sua última carta e tinha uma caligrafia completamente diferente dos seus garranchos?!!Eu quase tive um troço!! Só me acalmei completamente quando li a cartinha que a Jenny me mandou!! Você realmente está bem, né? Não tenho nada que ficar preocupada e começar a procurar notícias internacionais sobre o que pode ter acontecido, né? Espero que a resposta para a primeira pergunta seja SIM!; e todas as respostas sejam um belo e sonoro “NÃO!”

Já que é assim, posso te contar como foi em Stillwater? Você dizendo sim ou não, eu fazer! Porque eu descobri o seu passado, senhor esquentadinho do Futebol Americano!! Sim! Eu sei de tudo!!

Então, começando, porque o senhor nunca mencionou que era tão bom quarterback? Sério! Eu vi a parede dos recordes e seu nome ainda está lá! Papai o senhor poderia ter jogado entre os profissionais! Imagina eu sendo filha de um jogador da NFL? Eu ia ficar muito metida!! Ehehehe

Ah! Também descobri que você era o garotão popular que todas as garotas eram apaixonadas!! Que isso!! Eu tentando sobreviver ao Ensino Médio, tentando passar despercebida pelas Líderes de Torcida chatas e mesquinhas e meu pai, O MEU PAI, era o tipo de cara de quem elas vivem correndo atrás!! É inacreditável! E não pense que isso vai ficar só por aqui - até porque tenho certeza que você irá ignorar essa parte completamente na sua resposta - eu vou querer detalhes do seu dias de glória! Pois eu não faço a mínima ideia do que isso significa!! 

Quem me surpreendeu foi a mamãe! Eu sempre achei que ela era a Líder de Torcida, afinal com aquela aparência ela deveria ter sido, mas não! Ela era a garota que tentava ser invisível, assim como eu faço! Acho que aqui é que está a nossa grande semelhança! Mas levando pelo outro lado, devia ser mais complicado ser assim em Stillwater do que aqui em Alexandria! Porque a cidade é minúscula! Então todos se conhecem, o que tornava a vida muito mais complicada e difícil se você não gostava da atitude da “Filha do Prefeito”, por exemplo!

Aliás, eu fiquei sabendo também que você era o grande partido da cidade... também pudera, jogador de futebol, bonitão, filho do dono do supermercado local... e escolheu a garota ruiva que trabalhava numa lojinha de roupas. Pelo que vovô me contou, quando você e mamãe assumiram o namoro e logo depois do ensino médio deixaram a cidade, pôde-se ouvir vários corações sendo despedaçados!! Juro que não consigo imaginar isso! Eu tento mas não consigo! Pra mim você sempre será o Marine de cara fechada que conheço! 

Má eu nunca entendi o motivo de vocês dois teriam saído de lá e nunca mais terem voltado! Isso sempre soou estranho pra mim e continua sendo uma grande incógnita! Mas deixa pra lá, talvez um dia eu entenda ou talvez eu descubra que eu nunca quero saber de verdade!

Fora isso, conversei um pouco com vovô Jackson, e me pergunto o motivo de vocês dois mal se falarem até hoje! Nossa pai, o vovô sente saudades de você e foi o único até agora que conseguiu te entender, pelo menos no quesito de você ter ido pra Europa nessa missão! E ele também sente não estar tão presente assim na minha vida desde que mamãe se foi. Será que seria possível vocês dois se acertarem para que eu possa ter os dois na minha vida? Olha, não precisa ser hoje ou amanhã, o senhor ainda tem um longo trabalho aí na Europa e tudo mais, porém não custa pensar no assunto quando der um tempinho, né? Promete que vai pensar? Muito obrigada!!

É pra finalizar, eu resolvi te mandar uma foto! Uma não, quatro! Uma é minha, da última viagem! Vê se o senhor nota algo de diferente. E as outras três... bem uma é sua com a mamãe no que me pareceu um baile de inverno!  Estavam bem chiques, hein? E as outras duas, eu só tenho uma coisa a dizer: ninguém fica bem em foto de anuário!!! 

Posso dizer que custei te reconhecer na foto! Sabe por quê? Tá faltando o cabelo branco!!! Por favor não me mate! Eu jurava que isso era uma espécie de condição genética sua, sabe? Daquelas que a pessoa não tem melanina e nasce com o cabelo branco? Mas não! Você já teve cabelo colorido e diga-se de passagem, era da mesma cor do meu!! Será que meu cabelo também vai ficar branco cedo assim?? Me diz que não!! 

E agora finalizando mesmo, você tinha tudo pra ser o grande namorador do Colégio, poderia ter escolhido qualquer garota, mas ficou somente com uma, durante todo o Ensino Médio... Era amor verdadeiro mesmo, né pai? Ela era tão linda quando nova! E não mudou quase nada... tinha me esquecido do quanto que o sorriso dela era bonito. Acho que te entendo, sei porque você escolheu ela...

E não foi porque ela era ruiva.

Era porque ela era a garota mais inteligente da escola e você, sendo o popular jogador de futebol que não tinha tempo para mais nada a não ser se vangloriar do seus jogos, precisava de notas altas e namorando a nerd você sabia que conseguiria! É ou não é esse o motivo?? 

Brincadeira... você nunca me contou como se conheceram e como acabaram juntos... não precisa ser na carta, mas me conta um dia?

Muito obrigada! 

Vou ficar esperando a sua resposta! E não se esqueça, se demorar muito eu escrevo pra Jenny, se ela não me responder eu vou até no Diretor pra conseguir notícias, tá!!

Te amo muito e estou super feliz que você está bem!

Um beijo,

Kelly!”

 

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Eu sabia que essa viagem para a minha cidade natal não seria nada boa. Agora minha filha volta cheia de perguntas sobre o motivo de eu não conversar com meu pai. Se isso fosse fácil se falar. Se não envolvesse tantas histórias que ela ainda não vai entender.

Eu não era esse tudo isso que ela escreveu. Apesar de ter sido o melhor jogador dos meus três anos no Ensino Médio, e de ter algumas líderes de torcida atrás de mim, eu era uma verdadeira bomba relógio, nunca controlei o meu gênio e isso me meteu em alguns problemas, não por minha causa, mas acontecia sempre que mexiam com a minha mãe e com a minha garota. E pelo jeito não comentaram isso com minha filha.

Mas acho melhor ela nunca ficar sabendo da verdade, ou só pioraria as coisas.

 

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Quando Jethro abriu o envelope que lhe entregaram ainda na sede do NCIS ele fez a mais estranha das caras. Primeiramente abriu um sorriso ao verificar que se tratavam da carta da sua filha e depois, sem explicação nenhuma, levantou a sobrancelha e olhou torto do envelope que tinha nas suas mãos para mim e de volta para o envelope. Eu, que estava sentada na sua frente na mesa apenas fiquei observando sua mudança repentina de humor sem entender nada.

— Isso aqui é pra você. - Ele disse com um tom de voz entre a raiva e o ciúmes.

— Pra mim? O que é?

— Sim! Pra você. E não sei, Kelly quem mandou.

Eu fiquei surpresa, não esperava que ela me respondesse. O devo ter ficado com uma cara de espantada por um bom tempo, porque quando dei por mim, Jethro balançava o envelope na frente dos meus olhos.

— Olha, eu sei que você não tem que responder nem nada, você não pediu por isso, mas ela ficará...

Tomei o envelope da mão dele e imediatamente o olhei zangada:

— Não pense que você irá ler essa carta e dizer à sua filha que eu não quis responder! Minha falta de reação é que eu não esperava que ela me respondesse! E pode ter certeza de uma coisa, Gibbs, que eu vou sim respondê-la, você querendo ou não. E dizendo isso, abri envelope como se a mais importante das notícias estivesse ali! E a garota não me decepcionou:

 

——————

  

“Alexandria, 30 de abril de 1998

 

                                      Carta 01

 

Oi Jenny! Que bom poder conversar com você!

Sabe, é esquisito conversar com uma pessoa que eu nunca vi, mas que de algum modo torto, eu sei que posso confiar!! E eu queria te agradecer. Você não faz ideia da felicidade que fiquei quando li a carta de papai! É lógico que, de início, eu me assustei, pois não reconheci a letra, mas depois, quando li o restante, e vi o seu bilhete, eu fiquei aliviada. Sei que você tomou conta dele todo o tempo, mesmo que vocês não tenham falado. Pois é isso que parceiros fazem! E eu sou grata por isso. Jenny, eu te considero a minha amiga! Espero que você ache isso de mim também. E também espero que essa não seja a única carta que trocamos, porque sinto que você já me conhece um pouco, mas eu não sei nada de você! Mas é claro, se não te perturbar!  

Sabia que papai deve confiar muito em você? Sério! Isso nunca aconteceu. Mesmo com as duas ex dele! Elas nunca entravam no meio da nossa relação, digo, elas não sabiam de tudo. Papai nunca contou e eu também não. Mas é fácil fazer isso com você. Eu acho que, de uma maneira estranha, você consegue me entender... não sei, mas acho que você passou por isso, ou por algo parecido... Mas deixa pra lá. Eu só estou muito feliz por receber notícias!!

Na verdade, eu queria dizer muito obrigada, Jenny. Por tudo o que você fez, por ter ficado ao lado do papai e, claaaaarooo pelas fotos maravilhosas que você tira! Sabe aquela que você tirou dele? Aquela que ele não fez pose, mas ficou linda? É a minha favorita, coloquei em um porta-retratos. Agora, se não for pedir muito, será que pode me mandar uma sua? Quero saber como você é! Acho que depois disso, papai já deve ter mostrado uma foto minha! Se não mostrou, me fala que eu vou mandá-lo fazer isso já!

Era só isso!

Beijos.

 

Kelly Gibbs”

 

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Quero ver ela mandar o Jethro me mostrar uma foto dela! Será divertido ver a reação dele! Se ele já ficou todo cismado com a carta, imagina se ele tiver que mostrar uma foto!! Ele vai dar um AVC!

Acho melhor ir devagar com isso, porque senão ele começar a me achar intrometida demais na vida dele.

Estava pensando sobre a carta e como eu iria respondê-la quando um soco na mesa me assustou. Mas o que será que Kelly havia escrito que o irritou tanto? Eu não sabia se perguntava ou se deixava passar. Mas ele foi o primeiro a falar...

— Tem algo que eu deva te explicar nessa carta? - sua voz soava realmente brava com o que ele tenha lido.

Fora o fato de que ele teve duas ex-esposas e que parece nunca ter conversado com elas sobre o passado? Não nada!

— Não tem nada demais. Se você quiser ler... - apresentei a carta em sua direção, mesmo sabendo que ele ainda não tinha o movimento completo do braço direito, sei que se ele quisesse realmente ler o que a filha escreveu ele se virava com o braço esquerdo.

— Não. - ele negou a oferta mas ainda continuava com a mesma expressão de raiva.

— Você não gostou que ela tenha me mandado a carta, não é?

— Não é isso. Era de se esperar que ela o fizesse. Kelly não perde a oportunidade de conversar com alguém.

— Deve ser porque o pai não é de falar muito... - brinquei com a cara dele.

Não deveria ter feito isso, já que seu olhar, dessa vez, realmente me deu medo. Mas mantive o tom de gozação no rosto e olhei pra ele com a sobrancelha levantada.

— Qual é, Jethro! Eu e você sabemos que conversar não é a sua maior especialidade!

— Apesar de concordar com você. E não me olhe com esses olhos arregalados, sim, Shepard, concordei com você e, espera! Onde você está indo?

— Ver se o mundo não está acabando! Você, além de concordar comigo, está pronunciando uma frase com mais de dez palavras! Eu fiquei com medo de o Apocalipse ter chegado!

— Dá pra você se sentar aqui! Então, o que me deixou furioso foi outra coisa...

Repassei as cartas que li em minha mente e seus pequenos comentários sobre ela. A única coisa que poderia tê-li deixado de mau humor era algo relacionado com o seu passado. Será que era isso?

— E então? O que te deixou tão chateado?

Ele me olhou de novo, ponderando se deveria ou não continuar o que tinha começado.

— As perguntas de Kelly.

Assenti, era uma resposta vaga, mas esperei ver se ele iria completa-la.

— Ela acabou por me perguntar coisas que tanto eu quanto Shannon havíamos enterrado há muito tempo!

— Olha, você não precisa responder agora, mas uma hora, mais cedo ou mais tarde, ela vai querer respostas sim. Tem coisas que são impossíveis de se esconder dos filhos.

— Eu sei. - Ele me respondeu visivelmente chateado.- só não queria que fosse agora.

— Não é agora. Você pode explicá-la somente quando voltar, aliás, seria muito melhor se fosse pessoalmente!

— Você tem razão.

— Dê a ela uma satisfação, e diga que vai explicar tudo quando voltar. Ela merece saber, mas você também merece um prazo pra poder colocar tudo no lugar e saber como irá dizer isso.

Mais uma vez ele não falou nada, me olhou nos olhos, suspirou e disse mais pra ele do que pra mim:

— Você daria uma boa mãe, Jenny!!

— Mãe? Eu?! Ficou maluco??

 


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Notas finais do capítulo

Eu adoro esses dois nesse morde e assopra! Ao mesmo tempo em que estão brigando, quase arrancando as cabeças um do outro, eles são capazes de dar os melhores conselhos!
E aí? Essa afirmação do Gibbs, foi um convite??
Muito obrigada por ler!
E como sempre, capítulo revisado, qualquer erro, confusão ou dúvida, é só falar que eu conserto!
E até o próximo!!



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