Ao Cair da Noite escrita por MilkandHoney


Capítulo 2
Um pequeno estranho




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Passava das seis da manhã quando Sasuke sentiu o cheiro forte de café. O fogo da lareira á sua frente já havia se dissipado e restava apenas uma leve fumaça que insistia em sair por entre a madeira enegrecida. Ouviu uma risada feminina que parecia vir dos fundos da casa e instintivamente lembrou-se das cenas que presenciou naquela madrugada.

Seu avô tentando abrir a porta com pressa, algo pesado caindo no chão, o cabelo cor-de-rosa... Por um breve momento julgou ter sido apenas um sonho dos mais esquisitos, porém ao olhar para a mesa que havia ali, viu dois pares de xícaras e pratos sujos de pão. Levantou-se com um salto, livrando-se dos cobertores que o mantinham aquecido. Sentiu o frio roçar por entre suas bochechas e se encolheu um pouco com a ideia de sair de casa, mas a vontade de saber o que estava acontecendo era maior.

Enquanto calçava suas botas ouviu a voz de seu avô. Ele cantava alegremente uma canção que fez parte da história de Niangard e de sua infância. Há tempos não o escutava cantar, principalmente uma canção tão feliz.

“Jutsker hoijar, vetsch tir oyhe klynch!”

“Grande mestre justiceiro, é sua a graça e a vitória!”

Enquanto caminhava até os fundos, escutou uma voz feminina cantarolando enquanto batia palmas. Era uma voz cheia de vida e com um leve sotaque que acompanhava seu avô usando a língua antiga daquela província. O sotaque, Sasuke não conseguiu definir de qual região pertencia, porém a voz daquela garota o fez viajar em pensamento, para os verdes campos daquelas terras que agora se escondiam na neve que caía dia após dia.

Encontrou os dois sentados nos bancos que ficavam na varanda de trás. Sr. Ento o olhou como se não o visse há meses, tamanha a alegria em seu semblante. No entanto, os olhos da garota ao lado se arregalaram em surpresa ao lhe ver.

— Oh, olá Sasuke! Você não tem ideia do que aconteceu!

— Oi, vovô. – Disse ele ainda analisando a figura surpresa da menina – Quem é ela?

Sem esperar apresentações, a garota levantou-se devagar e, deixando para trás o assombro, sorriu com vigor.

— Olá, sou Sakura. Amiga do seu avô.

Sr. Ento alternava o olhar entre os dois mais novos e sorria abertamente. Não podia acreditar que estava presenciando aquele encontro. Sasuke por outro lado, se perguntava como seu avô podia ser amigo de uma garota tão jovem. Sakura aparentava seus dezesseis anos, no máximo dezoito. Nunca havia os visto juntos até aquele dia e, por certo, sua mãe teria lhe contado algo sobre isso, já que era conhecida por “dar nos dentes” com qualquer coisa que soubesse.

— Vejo que está surpreso também, Sasuke. Vamos, pegue um banco e junte-se a nós.

— Não me disse que ele era tão parecido com você, Ento. – Disse ela transferindo o olhar do mais novo para o mais velho.

— Beleza de família, minha querida.

Sasuke que já havia arrastado com os pés um banquinho que estava mais afastado,  sentou-se e pigarreou um pouco, não que quisesse chamar atenção para si, mas a garganta estava seca devido ao frio.

— Sasuke – começou o avô – Ontem, quando conversávamos sobre o segundo inverno que ocorreu em Niangard, você lembra que falei sobre uma amiga que perdi naquela época?

— Sim, lembro sim.

— Ainda não sabemos como, mas... Essa garota que está vendo é a minha melhor amiga de décadas atrás.

Sasuke olhou para o avô como se houvesse escutado alguma piada. Baixou um pouco a cabeça e riu baixo, logo levantando e dando de cara com o velho e seu semblante sério.

— O senhor está falando sério?

— Também não entendemos o que houve. Pra falar a verdade, é como se Sakura vivesse em outra realidade durante todos esses anos em que esteve desaparecida.

— Anos aqui nestas terras, não passaram de dias onde eu estava. – começou a garota ao ver a confusão no rosto de Sasuke – Não é á toa que continuo com a mesma aparência de meu último dia aqui...

Ele em vão buscava palavras que pudessem expressar sua surpresa. Olhava para o avô como se buscando uma explicação convincente para a sua mente e logo após olhava para a garota tentando acreditar no que ela dizia.

— Se você é quem diz ser – disse ele mirando os olhos verdes que o encaravam – o que viu nesse “outro mundo”?

— Vi muitas coisas, pemptch. Vi pessoas exatamente como nós, vivendo em um mundo miserável, mas também vi monstros maiores do que a maior coisa que você já viu. Foi... Horrível.

“Pemptch” na língua antiga significa “menininho”. Não era chamado de menininho havia tempos e isso lhe ofendeu um pouco, muito embora a feição dela não demonstrasse brincadeiras ou alguma ironia, o que lhe deixou encabulado.

— Esses... monstros. Como eles eram? – Perguntou Sasuke enquanto coçava a cabeça.

— Haviam muitos tipos deles. A maioria parecia homens grandes, do tamanho de pinheiros adultos. Tinham a pele amarelada e muito grossa, nunca vi nada mais resistente que a pele deles, para falar a verdade. – Enquanto falava, tentava demonstrar com as mãos o tamanho do que viu.

Sr. Ento olhava para os dois e sorria, revelando seus dentes amarelos devido ao fumo. Não prestava muita atenção no que eles falavam, apenas tentava apreciar aquele encontro inusitado.

Sakura e Ento eram inseparáveis desde a infância. Seus pais brincavam com a ideia de que um dia poderiam se casar e até mesmo a mãe dela o chamava de “trich”, uma palavra equivalente a “genro”. Porém, mesmo com a chegada da adolescência nunca se preocuparam muito com a relação que tinham, gastavam seu tempo juntos brincando durante o dia e contando estrelas á noite, pareciam não ter tempo de pensar em mais nada, até chegar aquele fatídico dia em que Sakura desapareceu na floresta. Ento a procurou por incontáveis dias, até que se deu conta que era um esforço em vão. Mas foram raros os dias em que não pensou em sua querida amiga de cabelos cor-de-rosa e olhos claros.

— Vovô – disse Sasuke, percebendo o desinteresse de Ento pelo que estavam falando – O que o senhor acha que aconteceu?

— Passei a madrugada tentando achar uma explicação, mas não consegui pensar em nada lógico.

De repente, ouviram um leve farfalhar de folhas secas vindo da floresta repleta de neve. Os três olharam na mesma direção com o susto e Ento se levantou com um salto lembrando que Sakura podia ter sido seguida, como afirmou a garota ao chegar. Se aqueles monstros que ela conheceu naquele mundo desconhecido estivessem ali, não saberia o que fazer, pois não havia armas em casa. Apenas facas grades que eram usadas para tentar abrir caminho por entre a mata densa, mas nem isso tinha consigo.

— Pode ser algum lobo que se perdeu da matilha, melhor entrarmos. – Disse Ento tentando acalmar os mais novos.

Sasuke, que estreitava os olhos a fim de ver o que provocava o barulho, achou ter visto algo pequeno se movendo rápido, mas não tinha certeza. Deu passos curtos e tímidos indo em direção da floresta, mas estancou ao ver o vulto outra vez, dessa vez ele não podia negar.

— Tem algo ali! – Disse ele aos demais.

Saiu então de um  arbusto seco um ser de mais ou menos quinze centímetros. Não parecia com nada que tinha visto antes, exceto pelas orelhas grandes e pontudas que lembravam a de um coelho. Era tão branco quanto a neve que havia no chão, isso explicava porque não conseguiam identificá-lo no meio dos arbustos. Vinha na direção dos três saltitando rapidamente e em breves segundos já estava os encarando de perto.

— Érij! – Gritou Sakura animada.

— Então você sabe o que é isso?

O “animal”, ouvindo a voz da garota, pulou em seus braços como se já a conhecesse há tempos. Ela o elevou na altura dos olhos e fez afagos calorosos em sua cabeça.

— Érij era meu... Como posso dizer? Meu animal de estimação onde eu estava.

— Esse é um dos monstros que você disse ter encontrado lá? Me parece muito fofo. – Sasuke a olhava com desdém, caçoando da conversa que tiveram mais cedo.

Ela por sua vez enrijeceu o corpo e o olhou desafiadora. Não estava acostumada com pirralhos caçoando de si.

— Talvez um dia tenha a oportunidade de ver um monstro de verdade de perto, pemptch.

Ento que permaneceu calado até ali, os olhava com diversão. Parecia que seriam como gato e rato, mas não achava que deveria se preocupar com aqueles dois.

— Sakura, como ele veio parar aqui? – disse o velho apontando para o pequeno ser com o indicador.

— Eu não sei... Mas o que é isso?

No pescoço do pequeno animal havia uma fina corrente prateada e nela um pingente pequeno e redondo, ornamentado com o que pareciam minúsculas pedras de ametista. Não demorou muito para que percebessem que se tratava de um relicário e o abriram com certa dificuldade. Encontraram ali dentro um papel, já muito afetado pelo tempo e que parecia ter sido molhado diversas vezes, pois as letras estavam muito borradas.

“Koir Abrannik”, era o nome que havia ali. Sasuke encarava o papel com um misto de incerteza e confusão, mas Ento e Sakura instintivamente se olharam por alguns instantes.

Monkiest! - "Meu irmão!"

 


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