Ele e Eu escrita por Thay Chan


Capítulo 19
Capítulo 18


Notas iniciais do capítulo

Desculpem a demora! Espero q gostem! ;)



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— ENTÃO, COMO ESTAMOS? – perguntou o sr. Hatake, brincando com seu anel de prata.

Olhei para ele sem entender.

— Quero saber se está melhor da gripe – esclareceu ele.

Olhei para baixo, ao responder.

— Uhm, sim.

— Você está mesmo mais corada – disse ele, daquele jeito educado mas de alguma forma sarcástico, que eu já conseguia reconhecer como um traço de sua personalidade complicada. Eu tinha certeza que ele estava se referindo ao fato de eu estar vermelha de vergonha. E que sabia o motivo.

Eu só esperava que ele não jogasse isso na minha cara. Porque eu não saberia o que dizer caso o fizesse.

Mas ao invés disso, ele se levantou, andou até a sua mesa e pegou um conjunto de papéis, que eu imaginei ter algo a ver comigo. Poderiam ser as suas anotações sobre o meu caso. Só que eu nunca tinha o visto escrever nada antes.

Talvez ele anotasse suas percepções depois, eu pensei. Não seria o primeiro médico a fazer isso.

Mas então por que eu estava com a sensação de que era algo pior que isso?

Eu não entendia como poderia ter tantas impressões ruins sobre o sr. Hatake antes mesmo dele fazer alguma coisa. 

Quando ele estendeu os papéis para mim, meu coração batia tão rápido que eu o conseguia ouvir.

E quando os examinei, mais uma vez tive a certeza que o sr. Hatake era exatamente quem eu achava que era.

— O que é isso? – eu perguntei, num fio de voz. Eu não sabia se estava realmente precisando de uma resposta. E nem se a única outra pessoa na sala comigo tinha ouvido.

Mas claro que tinha. O que passava despercebido por ele?

— Essas são fotos de alguns de seus trabalhos. Pedi seu pai para me enviar.

Claro que tinha pedido. Por que eu tinha achado que faltar uma consulta iria fazê-lo desistir? Eu fui muito ingênua.

Eu olhei para o outro lado da sala, piscando repetidamente para afastar as lágrimas.

— Você não tinha esse direito – eu disse, baixo. A minha vontade era de nunca mais pisar naquele lugar. E eu faria isso se papai não estivesse em colapso por causa do livro que ele precisava escrever. Fazer outra mudança ou mesmo procurar um novo médico mental tomaria todo o tempo que ele poderia estar dedicando a escrita do manuscrito. 

Sem dizer nada, o sr. Hatake se sentou na sua poltrona, para só então se pronunciar:

— Na verdade, como seu médico, eu tenho sim esse direito. É meu dever buscar seus antecedentes. Ainda mais se achar que isso vai ajudá-la.

Eu não queria mais ouvir. Ele sequer parecia arrependido. Eu não queria olhar para ele naquele momento, por isso apenas me levantei do sofá, peguei minha mochila e me encaminhei para a porta. 

— Ainda não acabamos – ele disse, às minhas costas. 

Sem me virar, respondi:

— Acredite, se eu tivesse opção, teríamos acabado com isso definitivamente.

 

Quando saí do consultório, encontrei papai a alguns passos da porta me esperando. Embora sua atenção estivesse totalmente em mim, seu corpo estava virado de lado, como se estivera andando de um lado a outro da recepção antes de eu chegar. Sua expressão estava tensa, dura como mármore. Seus olhos cheios de compaixão me liam como se pudessem me ver por dentro. Foi quando eu pensei Oh, ele sabe. É claro que sabe. Sabia como eu me sentia em relação à exposição demais; sabia como era difícil para mim ter de visitar toda semana um estranho para falar sobre a minha vida; sabia como eu prezava pela descrição das minhas telas quando o assunto eram os médicos mentais. 

Eu sabia que havia sido ele quem enviara as fotos dos quadros, mas tudo o que eu queria naquele momento era um abraço seu. Se eu estava com raiva dele? Um pouco. Mas não a ponto de não o perdoar. Por que no momento que o sr. Insensível dissera a ele que era para o meu bem, papai não pensou duas vezes. Não precisava de muito para ver que ele estava se martirizando, eu não pioraria mais as coisas pra ele. Por isso, apenas cumprimentei com a cabeça a recepcionista e olhando para ele, perguntei:

— Podemos ir?

Papai me olhou como se também quisesse me abraçar, num pedido mudo de desculpas. Mas ele apenas colocou uma mão no meu ombro, como sempre fazia quando queria me confortar mas não podia por que estávamos em público, e respondeu: 

— Claro, querida.

A verdade era que ele não queria ir agora, ele queria falar com o sr. Insensível, pude ver quando olhou incerto para a porta às minhas costas um momento antes de me responder. Mas ele queria se redimir e tentaria me agradar tentando não me dizer "não" sempre que possível. Esse era o modo como papai tentava se retratar quando invadia minha privacidade e fazia algo que eu não aprovava. 

Numa situação normal, mesmo que ele tivesse culpa no cartório – como agora –, eu faria o possível para não me aproveitar da situação. Eu tentaria evitar perguntas que envolvessem as respostas "sim" e "não" e, caso ocasionalmente alguma passasse despercebida, eu diria algo como "Pai, talvez o senhor não acredite, mas eu estava pensando a mesma coisa!" e tudo terminava bem.

Mas hoje, só dessa vez, eu faria uso da minha vantagem. Por uma causa nobre: eu precisava ir embora ou começaria a chorar ali mesmo, na frente da recepcionista bonita, no único lugar da face da Terra no qual eu não queria estar naquele momento.

Por isso forcei a barra me despedindo da recepcionista bonita e indo na direção do elevador, sem esperar para ter certeza que papai estava me seguindo. 

Felizmente, estava. E enquanto descíamos até a garagem do prédio, papai quebrou o silêncio:

— Você está bem? 

Minha boca abriu e fechou algumas vezes, até que por fim eu disse:

— Eu só preciso de um tempo.

O número 3 acendeu em vermelho no indicador de andar. Porém o elevador continuou descendo, sem abrir as portas. Ainda éramos só papai e eu no pequeno cubículo de aço. Queria que não fossemos.

— Sá, eu sint… – ele começou.

— Está tudo bem. Não é nada. Só estou um pouco cansada – eu não queria conversar por isso continuei a olhar para a porta do elevador até ela se abrir no estacionamento.

 

Eu não entendia por que vizinhos precisavam ir um a casa do outro. Para mim não parecia necessário que eles se gostassem. A verdade era que eles se conheciam apenas por conveniência: eles precisavam de um teto para morar e por acaso – não por destino – acharam um na mesma rua. Era lógica pura e simples. 

Era por isso que eu não entendia por que Mikoto e o filho dela estavam no nosso sofá na noite passada. Mikoto disse que era porque queria que fossemos amigos, mas de novo, eu não via razão para isso. 

Ela ficou me olhando como se eu fosse um daqueles bebês que se sujavam enquanto comiam papinha sozinhos e que por algum motivo as pessoas sempre achavam fofos. E eu não gostei. Eu não era uma criança ou, como provavelmente ela pensava, uma criança com problemas psicológicos. Para ser mais clara, eu não era uma retardada.


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Notas finais do capítulo

E então, o q acharam? Espero q tenham gostado! Me digam nos comentários! Até a próxima ;*



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