Mar de flores. escrita por Mestre do Universo dos Vermes


Capítulo 2
Encontro de águas.


Notas iniciais do capítulo

Inspiração do dia: The cave - Mumford & Sons.
Música legal, recomendo!

Eu ia esperar pelo menos uns dois dias entre cada capítulo (a Little Hobbit sugeriu uma semana, mas até parece que eu me aguento por sete dias com uma história já escrita), mas aí eu recebi um comentário e fiquei muito animado.
Afinal, uma coisa é receber um comentário, outra é receber um comentário de alguém que você considera muito.
Enfim, só estou de blá blá blá de novo.

Sem mais delongas, o capítulo:



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Nino acreditava que seu coração era seco e duro como pedra.

Entretanto, essa opinião não era unânime. Apesar de muitas pessoas o verem como um homem estoico e impiedoso, especialmente no ramo dos negócios, havia alguém cuja opinião diferia.

Alguém chamado Alexandre, para ser mais preciso.

Alexandre não via Nino como um “tubarão de terno” ou seja lá como os rumores o descreviam. Não... Ele via apenas alguém com um coração vazio.

E um coração vazio é muito diferente de um coração de pedra.

Alexandre conheceu Nino no escritório. Ele admite que ficou curioso para conhecer o “impiedoso tubarão executivo” que era o centro de tantos boatos, e ficou ainda mais surpreso com o que encontrou. Não um homem cruel e frio, mas alguém que mantinha as pessoas longe para se proteger, para esconder um interior quebrado.

Nino era cordial, mas distante. Talvez por Alexandre ser o único no escritório que não se deixava intimidar pela frieza aparente, este conseguiu ganhar uma amizade pela persistência. Algo em Nino o atraía... Talvez a personalidade ambígua, os rumores ou o modo que ele dizia o nome de Alexandre, que o fazia sentir especial.

E, se ele queria mais que amizade, bem... A vida nem sempre é sobre o que queremos, certo?

Alexandre descobriu que Nino era bastante pessimista. Tanto por comentários quanto por opiniões, dava pra ver que sua visão de mundo era melancólica para se dizer o mínimo.

Ele via os espinhos e não as rosas, as nuvens e não o sol, a chuva e não o arco-íris. Em resumo, era o tipo de cara do “copo meio vazio”.

Já Alexandre via a beleza do sol nascente surgindo lentamente no céu, apreciava as rosas e aceitava os espinhos, dançaria na chuva se pudesse e, se não pudesse ver o sol, daria formas engraçadas às nuvens.

Otimista? Claro. Ingênuo? Nem um pouco.

Alexandre vivia no mundo dos negócios no fim das contas. E aquele velho ditado “você colhe o que planta” com certeza não se aplica aí. A vida pode ser cruel ou, no mínimo, amoral. Você pode plantar apenas o bem e não colher nada e, nessa situação, você passa fome ou devora outra pessoa para sobreviver. Negócios eram isso, pessoas que sorriem para você enquanto esperam a chance de te apunhalar pelas costas.

No fim, eram todos canibais, devorando uns aos outros apenas para sobreviver.

E, modéstia à parte, Nino era muito bom nisso. Implacável.

Alexandre, apesar de não gostar dos métodos, já havia visto e mesmo feito o mesmo. Todo mundo precisa comer, certo? E era o emprego que ele tinha.

Mesmo assim, ainda era vergonhoso. Precisar trair e enganar para conseguir dinheiro no fim do mês. A falsidade de um escritório e a frieza dos negócios.

Ele imaginava se Nino sentia o mesmo...

Seja como for, ele se agarrava à esperança.

Ironicamente, levou meses de amizade para Alexandre ficar sabendo do passado “famoso” de Nino. Mesmo que na época o acidente tenha sido muito noticiado, Alexandre nunca se interessou muito pelo ramo dos esportes, então não prestou atenção ao navegador azarado.

E, por algum motivo, ninguém na empresa falava nisso. Era quase como um tabu.

De certa forma, ele achou surpreendente alguém que ganhava a vida velejando acabar preso num escritório. Parecia tão... Incompatível.

Nino não falava muito daquela época, o máximo que Alexandre já conseguiu tirar dele foi “É.... Isso foi há muito tempo.” e “Ah, foi só um sonho adolescente.”.

Por curiosidade, ele buscou vídeos das competições que Nino venceu e, bem, seu interesse já atiçado apenas cresceu. O garoto contente e de sorriso fácil que desbravava o mar e gritava a plenos pulmões na linha de chegada não se parecia em nada com o homem de terno e sorriso calculado.

Nos vídeos, Nino tinha um brilho no olhar que Alexandre nunca viu pessoalmente.

E decidiu que queria ver esse brilho de novo.

Ele era um otimista afinal, e achava que corações vazios podem ser cheios novamente.

Seu novo objetivo era salvar Nino da própria miséria, de si mesmo. Não importa como.

 

As primeiras tentativas foram um fracasso.

 

Alexandre tentou do modo alegre e otimista: mostrar a beleza da vida, perguntar do passado, se ele não sentia falta do mar, falar das coisas boas e do lado positivo.

Ele conseguiu uma semana de tratamento do silêncio, algumas brigas e uma amizade (que ele ainda desejava ser algo mais) quase desfeita.

Rejeição doía.

Rejeição doía muito.

Mas ele encontrou força nessa dor. Ele não tinha estragado tudo, ainda havia uma chance, havia esperança.

Ele só precisaria mudar o método.

Alexandre acabou percebendo que era hipocrisia perguntar do passado de Nino sem falar do seu. Querer honestidade e omitir coisas. Pedir que Nino seguisse sua paixão e não encontrar a própria.

Se ele queria que Nino pegasse o que merecia no mundo, teria que fazer o mesmo.

Vai ver era isso que o atraía tanto em Nino no começo: a sensação de que ambos não pertenciam àquele lugar.

Talvez os dois estivessem meio quebrados por dentro.

Mas Nino pertencia ao mar, à instabilidade e à aventura, não à segurança e monotonia de um escritório.

E Alexandre... Bem, ele ainda não sabia onde pertencia, e precisaria passar um bom tempo descobrindo, mas com certeza não era ao mundo traiçoeiro dos negócios. Ele chorava ao pensar nas injustiças que já viu, em quantas mulheres e crianças perderam tudo por trapaças e apunhaladas. Isso simplesmente não era justo. Ele não sabia aonde iria, mas com certeza seria para um lugar melhor.

Era um plano cheio de furos, falhas, mau-planejamento, assustador e com tudo para dar errado, mas ele queria segui-lo mesmo assim.

“Vamos pedir demissão.” Disse num dia qualquer. Nino simplesmente o olhou como se ele estivesse insano.

(O que talvez fosse meio verdade).

Nino abriu a boca para falar exatamente todos os motivos pelos quais essa era uma ideia ridícula, inviável e simplesmente insana, mas Alexandre não o deixou. Ele não ouviria o que Nino tinha a dizer, não dessa vez. Ele queria liberdade. Para os dois.

Então ele foi honesto. Falou de como odiava o trabalho, da vergonha de vender a própria moral por um salário, de como viu, ainda criança, seu pai perder o emprego por causa de armações nos negócios e como sua família sofreu por isso. Como via isso se repetir de novo e de novo e de novo e de novo e como isso o fazia chorar. Falou até do que via em Nino, de como ele era um bom homem e que queria vê-lo feliz e do quanto gostava dele e que não o deixaria se afogar em pessimismo e auto piedade.

Enfim, ele falou até perder o fôlego e, quando acabou, sabia que tinha dito tudo. Toda a verdade. Só restava esperar a dor da rejeição ou a improvável aceitação.

“Tudo bem.” Foi a resposta, e parecia uma resposta muito simples depois de tanta coisa dita, mas foi a melhor coisa que Alexandre ouviu.

Tudo bem ele se abrir sobre o passado.

Tudo bem ele odiar o emprego e a injustiça em geral.

 Tudo bem ele gostar de Nino.

Tudo bem, ele teria uma chance.

Uma chance de mostrar seu ponto de vista a Nino, sua forma de ver o mundo. E ele viraria o mundo de Nino de cabeça pra baixo de precisasse só para vê-lo sorrir de novo, sorrir de verdade. Ele queria ver Nino cantando e gritando e se divertindo e se expressando de verdade, queria vê-lo feliz, não com uma corda imaginária no pescoço e se afogando em si mesmo.

 

Os dois se demitiram.

 

Alexandre, como sempre, se agarrava à esperança de que tudo daria certo.

Ele não só queria liberdade, ele precisava de liberdade. E achava que Nino precisava também, por mais que não admitisse nem para si mesmo.

Enfim, agora estavam largados no mundo, apenas um com o outro. E isso era tudo que Alexandre precisava.

Quando conheceu Nino, Alexandre não tinha um objetivo. Era só trabalhar num trabalho péssimo para sobreviver. Agora ele tinha um objetivo: libertar Nino, o homem que ama, de si mesmo, e talvez se encontrar no caminho....

Enfim, agora era ver o que essa tal liberdade traria para eles.

Não é emocionante?


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Notas finais do capítulo

(Espaço ainda reservado para fazer propaganda da história da Little Hobbit quando eu convencê-la a postar)

Espero que tenha gostado!

Bye!