Estrela Branca - Antologia do Amor escrita por PatrickTulher


Capítulo 4
Parte IV - Violetas




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O baile, que estava tão bonito com toda aquela calorosa turma, se encerrou ao soar da nota final. Os aplausos inflamados permearam o ambiente, deixando em prantos felizes a cantante que eu tanto apreciava. Emocionada, veio até mim, ainda sendo perseguida pelos olhares dançantes dos presentes.

— Vê como gostam de mim quando eu canto? Ah, fico tão alegre..!
— Bem se entende essa admiração do público! Já disse e repito, cantas tão bem!
— Lhe agradeço novamente! Venha, quero te mostrar uma coisa.

De uma hora para outra ela se transforma, de uma leve cancioneira entristecida, para a conhecida e jocosa menina, que me pega a mão e sai ligeira para que eu a acompanhe. E eu acompanhei-a.
       Atravessamos todas as barracas e bancas montadas, onde se vendia doces, refrescos e outros quitutes. Havia toda uma atmosfera colorida de adornos, produtos unidos às fitas suntuosas e brilhantes, lâmpadas e candelabros que esclareciam o local. Foi do lado de uma venda de uvas que eu percebi o que ela queria me mostrar.
       Chegamos num belo conjunto de cestas repletas de flores das mais diversas cores e pétalas, postos sobre uma mesinha de madeira. Ela sorria com fervorosa excitação, me mostrando as rosas, cravos e margaridas, detalhando-as, me deixando sentir o aroma de todas, e enfim dizer que ia vendê-las.

— Então você vende flores?
       — Sim, vendo..!

Novamente sinto dificuldades em exprimir meus sentimentos; apenas afirmo a clara vermelhidão do meu rosto, que viu naquela moça tudo o que há de mais feliz. Ela ria, sorria, numa alegria, sentia-se exultante em cantar e vender flores, ofícios tão belos e singelos, puros... mágicos!

— Te admiro, nobre moça! — Disse-lhe eu, acanhado.
       — Oras, deixe disso! — Respondeu.
       — Posso te ajudar nos negócios? Eu tenho lá uns dotes de comerciante...
       — Faria isso por mim? É claro!

Aquela prosa me deixava mais acostumado em lhe falar. Perdi aquela timidez que me pungia, e aqueles foram meus primeiros pensamentos racionais próximo dela. O amor nos transforma deveras, não acha?
Tentei usar minhas experiências de comércio angariadas durante a juventude. Postei-me frente às cestas, retirei o casaco, e pus início às peripécias.

       — Senhoras e senhores, namorados e amores, venham cá nesta barraca que quer encher-lhes de flores..! Prometo que daqui, arrependidos não sairão! Pois o aroma dessas flores é o melhor da região!

Fui bradando, meio em canto, meio em discurso, para que todos ouvissem. Encontrava as rimas involuntariamente, e assim as pessoas foram rindo e se aproximando. Usei também de certa pantomima natural que agradava bem os mais jovenzinhos e também os mais velhos. Senti-me um palhaço e jamais imaginaria que faria tais coisas.
          Ela me olhava com satisfação, ria junto e chamava as palmas. Depois de uns vinte minutos já nos circundava uma multidão de pessoas, que foram desembolsando o suficiente para presentear as damas e os senhores.
No fim do meu tímido espetáculo, notei as cestas vazias.
       
       — Vendemos tudo! — Disse ela, maravilhada.
       — Vendemos!
       — Como posso te agradecer?
       — Não precisa, faço com gosto!

         Quando proferi tal frase, ela nota debaixo da mesinha, uma última cesta repleta de violetas.

     — Oh não, esquecemos de vender estas daqui! — Disse ela, me mostrando aquele belo conjuntinho.

Eu já me preparava para recomeçar as brincadeiras. Mas logo me alertou, puxando-me pelo pulso.

— Não, venha cá. Leve essas violetas como um presente pela sua ajuda!

No momento confesso que pensei em recusar, mas sabia que tais flores poderiam me trazer plenas recordações suas. Havia lhe ajudado por gosto mesmo, por afeição, talvez; olhei bem o rosto dela, que transmitia um quê de gratidão e alegria, e então aceitei o regalo com certa gratificação e felicidade.
         Já que tínhamos vendido tudo tão ligeiramente, tivemos tempo para aproveitar as brincadeiras que se espargiam pela festa. Ela me parecia tão contente, chamava-me às diversas bancas e jogávamos juntos as gincanas. Pulamos cercas, lançamos dardos e aros, dançamos vendados, e enfim posso dizer que nunca havia me divertido tanto, em tantos anos de vida.
      As celebrações já iam chegando ao fim, perto da meia-noite. Os comerciantes iam indo embora, as canções se silenciando, junto com as prosas e multidões. Nós dois fomos naturalmente seguindo a manada até alcançar a ponte; ela quis se despedir ali.

— Penso que você pode ir na frente. Ainda tenho que agradecer os músicos e cumprimentá-los, sabe..?
— Ah, claro... bem, então...
— Espero que aprecie as violetas, são minhas flores preferidas..!
— Oh, sim! Sempre me recordarão de você.
— Fico tão feliz de ouvir isso! Muito lhe agradeço.
— Não é por nada.

Depois disso, um novo abraço. Ah, por que me cai esse vazio abstrato de razão quando me vejo pronto a descrever um momento sublime de beleza..? Apenas vos digo que úmidos, meus olhos fizeram questão de ficar. Antes de partir ao palco, tratou ela de cingir-me um último sorriso, até sair saltitando...
         Esta noite foi uma daquelas ocasiões especiais, recheadas de momentos de inspiração, em que íntimos detalhes da paisagem, dos sentidos, sons, cores e aromas, marcam sua memória e trazem calor, afabilidade e bonança. Eu sai daquele local assim, voando, flutuando, em total paz de espírito, tranquilo e carregando comigo uma dúzia de violetas.
         Porém trouxe-me nervosismo um ato que fiz ao tocar o casaco, já frente à porta da pousada.

— Esqueci-me do colar!


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