Aracnídeo: Sangue Perdido escrita por Gabriel Souza, WSU


Capítulo 15
Capítulo 14


Notas iniciais do capítulo

Esta é a culminação da revolução.



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Só uma coisa era certa para Jonas Ferreira naquele momento, sua morte estava mais próxima do que nunca. Preso em uma barreira especial com outros seis corrompidos com sangue nos olhos, do lado de fora, outras centenas de pessoas desejando a sua morte. Não havia muita margem para a sua sobrevivência.

— Galera... — Aracnídeo girava sob um único ponto mantendo uma postura defensiva, seu corpo já não aguentava mais lutar e ainda assim, ele teria que enfrentar mais seis adversários poderosos, sua única vantagem era ter algum treinamento de combate prévio — Vamos com calma.

— Parece que alguém ficou com medo — Bernardo gargalhou enquanto assistia três dos corrompidos avançarem contra Jonas que se esquivava dos ataques com extrema velocidade.

— Não é medo — Um soco foi acertado na mandíbula do Aracnídeo que rolou no chão, porém se reergueu rápido, não podia dar tempo para seu corpo sentir os golpes senão morreria — É só bom senso — saltou, girou no ar e disparou teia para baixo prendendo dois adversários — algo que você não tem.

— Não tenho? — Bernardo caminhava ao redor da barreira, queria aproveitar cada detalhe, de cada ângulo — Você que não tem, defendendo pessoas que não dão a mínima para você, herói — sorriu ao ver o Aracnídeo se chocar contra a barreira após ser atingido no peito por uma descarga elétrica — Muitos lhe odeiam, mesmo assim, aí está você, apanhando por eles, ao invés de defender e honrar seu povo, você é uma vergonha.

— Talvez eu seja — Aracnídeo segurou dois chutes que haviam sido aplicados contra ele, girou a perna de um e chutou as partes baixas de outro — Mas a verdade é que eu não luto para ser reconhecido, não quero a fama, luto pelo o que é certo.

— Luta por aqueles que são verdadeiros opressores? Seu povo sente medo — Aracnídeo sentia a pressão, era questão de tempo até que cedesse e fosse derrotado — E você aí, tentando impedir a maior conquista deles, você não merece ser um corrompido.

Jonas demorou a responder, sua atenção estava voltada à um corrompido alto com habilidade de criar bolas de energia amarela com extremo poder corrosivo.

— Eu não mereço? Você não merece! — vociferou enquanto desviava das bolas de energia — O medo gera ódio, o ódio faz com que as pessoas sofram, o que você faz? — saltou para a barreira, para sua sorte conseguia aderir à parede transparente — Você se aproveita desse ódio e incita ás pessoas a fazerem o que normalmente não fariam, você as torna violentas, você os corrompe.

Jonas se focou de forma excessiva no que falava ignorando seus sentidos o que o fez ser atingido por uma bola de fogo. O povo do lado de fora comemorava.

— Acredite no que quiser Aracnídeo. Só lembre-se que você só não está aqui, conosco, porque lhe falta esse ódio do qual tanto fala, você não sofreu o bastante para saber o quanto seu povo precisa se erguer — Bernardo fitava o Aracnídeo que sofria cada vez mais com a pressão imposta pelos seus adversários — Uma pessoa só é capaz de entender o que a outra passa, se vivenciar a mesma experiência ou algo semelhante, só assim uma pessoa pode entender a outra de forma completa, sem isso, podemos no máximo imaginar, simular e comparar com nossa própria experiência, tomando para si uma opinião fundamentada nos nossos próprios preceitos.

— A verdade é, você não nos entende porque não passou por aquilo que passamos, lhe falta sensibilidade, mas não se preocupe, você irá sofrer muito ainda e no fim, quando estiver próximo de morrer, verá o quão errado está e suplicará ao seu povo, aquele o qual você traiu, que tenha misericórdia de você. — Bernardo sorriu ao ver o Aracnídeo sendo acertado repetidas vezes, o vigilante mascarado parecia finalmente ter cedido — Este momento será a hora em que eu permitirei a sua morte, quando você perceber que tudo o que defende não passa de um idealismo adolescente.

 

 

 

***

 

O coração de Andressa batia em alta velocidade, toda a adrenalina em seu corpo fazia questão de deixá-la 100% centrada na batalha. Cassandra, uma das mulheres que Andressa mais odiava a enfrentava, seus companheiros de antigas batalhas, lutavam contra os seguidores da corrompida extremista. Por Deus, como ela desejava que aquela desgraçada tivesse morrido na explosão.

— Desista Andressa — Cassandra caminhava em meio à rua destruída — Você sabe que não pode me vencer, não tem força para tal.

— Cala a boca! — Andressa movia-se com velocidade sobre-humana, sabia que era arriscado, porém aumentava a energia cinética de suas moléculas, numa tentativa de atacar e contra-atacar de maneira mais eficiente.

— Já devia saber que você não tem o que é preciso para ser a última de pé — Cassandra focava seu poder em um único alvo, a corrompida de cabelos negros que corria em sua direção — Você é fraca, tanto fisicamente quanto de espírito.

Uma rajada de energia foi lançada na direção de Andressa que, graças à toda a adrenalina em seu corpo, conseguiu perceber o ataque antes que a acertasse, saltando para o lado e lançando uma rajada fria contra Cassandra que se defendeu com uma bola de energia.

— A melhor defesa é o ataque — comentou a líder extremista.

— Talvez — Andressa se aproximou e focalizou toda à sua energia em um último ataque — Fica fria aí.

Num movimento arriscado a corrompida forçou todos os átomos ao redor de Cassandra a desacelerarem, reduzindo bruscamente a temperatura do ambiente, simultaneamente ela forçou as células do corpo de sua odiada inimiga à diminuir exponencialmente seu metabolismo, gerando cada vez menos energia. A somatória das duas ações de Andressa acarretaram no brusco congelamento de Cassandra que se tornou uma estátua de gelo humana.

Uma lembrança de Letícia, a pessoa mais próxima de uma irmã mais velha que Andressa já teve, passou por sua cabeça e um ódio profundo tomou conta dela que criou uma adaga de gelo.

O rosto petrificado de Cassandra a fitava sério, a adaga em sua mão já lhe fazia doer os dedos, porém Andressa não finalizava, havia algo dentro dela que a impedia de pôr um fim àquela vida, um valor idiota colocado lá dentro por Jonas.

— Droga — Andressa largou a adaga que se quebrou no chão.

Olhou ao redor e viu seus amigos começando a controlar a situação. Pelo menos naquela área da cidade, as coisas estavam sendo favoráveis. Andressa deu um sorriso pensando em como contaria a Jonas sobre ele ter feito ela poupar Cassandra e logo em seguida caiu no chão, desmaiando de exaustão.

 

 

 


***

 

Havia sangue para todos os lados, dezenas de corrompidos caídos ao chão, todos inconscientes, porém não sem vida, ainda. Enrique os fitava, odiaria admitir que havia chegado ao ponto de se sentir cansado, seu corpo já não aguentava mais continuar naquele ritmo, sua velocidade nos últimos minutos havia diminuído consideravelmente, a potência de suas descargas elétricas, também.

— Alguém na escuta? — questionou pressionando o fone em seu ouvido, era a primeira vez que havia usado para se comunicar com alguém, o restante do tempo ele só ouvia o que os outros falavam. Se irritou por não ouvir nenhuma resposta — Eu disse — gritou — Alguém na escuta?!?

Alguns segundos de silêncio se sucederam até a voz desesperada de Rafael surgir, ao fundo era possível ouvir Beatriz falando algo.

— Enrique, graças a Deus — Sua voz deixava claro que algo de errado estava acontecendo — O Jonas, ele tá levando a maior surra em frente à prefeitura...

— Não precisa falar mais nada — O espadachim o interrompeu, mesmo que tivesse consciência de que seu corpo estava começando a sentir os efeitos da fadiga, ele detinha a obrigação moral de ir ajudar o Aracnídeo, ele sabia disso e estava determinado a agir — Chego lá em 3 minutos.

 

 

 

***

 

Para Serena aquele dia estava sendo um mar de lembranças de tudo o que ocorreu em Primavera, sua cidade natal e local a qual ela se viu repentinamente envolvida em uma revolução, por assim dizer, onde ela perdeu quase tudo após fazer uma burrada com seus poderes.

Naquele instante, ela via muitas das coisas se repetirem e temia que pudesse sair ferida da mesma forma, por conta disso ela se esforçava ao máximo, mais do que jamais se esforçou, para que tudo saísse bem.

Enquanto corria pelas ruas de Recife, sua nova cidade, milhares de ideias passavam pela sua mente, a maioria, pessimista, ouvir pelo fone que Jonas estava apanhando deixara-a apreensiva. Havia um misto de medo e desespero crescente em seu ser, lembrava-se de seu pai o que dava mais forças para ela correr o mais rápido possível para a prefeitura, numa tentativa de salvar o garoto que estava ajudando-a a superar todos os seus problemas mais recentes.

Chegar próximo à prefeitura havia sido relativamente fácil, grande parte dos corrompidos haviam se dirigido para o local, ou seja, a dificuldade estava em se aproximar de Jonas. A dificuldade só aumentava com a parede de energia gigante que cercava o local onde Jonas estava preso.

— Jonas... — Serena murmurou preocupada, tinha medo de também perdê-lo.

Cortava caminho entre os corrompidos, àquela altura, ninguém conhecia ela e mesmo se a conhecesse, estavam ocupados demais comemorando a derrota do Aracnídeo, enquanto assistiam o padre Bernardo e uma corrompida alta segurarem o Aracnídeo. O que estão fazendo com você? Pensava.

— É lindo não é? — Uma mulher à parou, a feição de alegria em seu rosto era incontestável — Estamos um passo mais próximo de sermos aceitos — Serena não podia crer no que a mulher falava, como seriam aceitos após causarem tantos problemas? O que Bernardo fazia com essas pessoas, com seus poderes, era irreal.

— Sim — mentiu, sabia que não deveria chamar atenção indesejada naquele momento, ela poderia ser a única esperança do Aracnídeo — O padre realmente é um verdadeiro herói.

— Não há sombras de duvidas garotinha — O sorriso em seu rosto ficava cada vez maior. Serena pôde ouvir Jonas gritar, um grito tão alto que ela não estranharia se ele passasse uma semana sem voz se sobrevivessem a aquilo — Finalmente derrubamos o símbolo da opressão, minhas netas finalmente poderão frequentar uma escola de verdade.

— Que bom... — Serena se distanciou lentamente, não queria perder seu tempo com aquela mulher visivelmente desequilibrada, tudo o que ela queria era descobrir um jeito de salvar Jonas, recrutar o resto do grupo e acabar logo com aquilo, um longo banho quente seria perfeito.

Mais um grito do Aracnídeo e Serena pôde jurar que vira a mulher que acompanhava Bernardo tocar a testa de ambos, silenciando o jovem Aracnídeo e os apagando, por poucos segundos. O líder corrompido fora apoiado rapidamente nas costas da corrompida responsável por isso.

 

 


***

 

— Onde eu estou? — Jonas despertou em um ambiente claro, não havia nada ao seu redor além de uma vasta imensidão sem fim.

— Você está preso em uma das habilidades de Shieva, Jonas — Bernardo surgiu alguns metros à frente — Ela tem a capacidade de criar um laço comunicativo entre duas ou mais pessoas, isso não é incrível? — Jonas não lhe respondeu, apenas fechou o punho e tentou acertá-lo para descobrir que atravessou o corpo de Bernardo — Você realmente não entende nada não é? Aqui não é o mundo real, estamos apenas nos comunicando através dela, não há como você me ferir.

— Desgraçado — Jonas já estava irritado, o cansaço físico e mental que ele sentia ultrapassava a barreira da realidade, ele os sentia até naquele plano. Ele fechou seu olhos tentando manter a calma — Você não me traria aqui sem nenhuma razão. O que você quer?

Bernardo sorriu.

— Bem, apenas desfrutar de minha vitória. — Bernardo caminhava pelo vazio — Quero ver sua cara ao saber que foi derrotado e bem, já que sua cara está toda cortada, inchada e suja de sangue, vir aqui seria a melhor maneira de apreciar este momento.

De certa forma, aquilo era um blefe do padre, ele realmente desejava ver o Aracnídeo sofrer e perceber que perdera, mas havia um lado racional nele, mais apegado à Andressa, que a queria de volta, e esse lado sabia que o único jeito seria convertendo o homem à sua frente para o seu lado.

— É só isso? Você é alguém tão doente que nem se preocupa com o que pode lhe acontecer lá fora ou com os outros corrompidos? Você só quer ver minha cara de derrotado?

— O que pode me acontecer? Você sabe qual é a velocidade de um impulso nervoso? É muito rápido, lhe garanto que nós não estamos conversando nem à um segundo completo ainda — Bernardo parou de caminhar ficando frente à frente com Jonas, os rivais se encaravam  — Qual é a sensação de saber que morrerá por ter lutado em nome de uma causa errada?

— Eu não sei, pergunto isso a você mais tarde.

Bernardo gargalhou, esperava uma resposta do gênero vindo de Jonas.

— Sempre se achando o engraçadinho, o dono da razão, quem você acha que é, Jonas Ferreira?

— Eu não sou ninguém — Lembrava-se de John Soares o humilhando, mostrando-lhe que ele não era tudo o que achava ser — E pra ser sincero, hoje, eu nem quero ser ninguém, só quero lutar pelo bem.

— Mas o que é isso? Frase de efeito?

— Não. Só a verdade de alguém que já tá cansado de você e de toda a sua porcaria.

— Não Jonas — Bernardo mantinha o sorriso em seu rosto — No fundo você é igual à mim, quer liderar, quer ser aquele que salvará seu povo de alguma forma. A diferença? Eu sou esse cara, você é só alguém que almeja isso.

— Talvez, o meu eu passado quisesse ser o centro de tudo como você disse, o meu eu ingênuo e babaca. Mas a verdade é que eu mudei, eu quis mudar, hoje não sou mais aquele cara, mas você ainda é. — Jonas fixou seu olhar em Bernardo — Não importa com quantas palavras você falar em seus discursos, não importa o quanto você queira enganar aos outros e a si mesmo, nada negará o fato de quem você é, um cara que não sabe lidar com as perdas e culpa o mundo por isso.

— Isso é o que você acha? Não existe mais significado nas minhas perdas passadas, eu transcendi a elas, hoje eu sou o responsável por um povo, aquele que os guiará para a felicidade. Sou um guia que levará os corrompidos para outro nível, o segundo Moisés.

— Não. Você é só Bernardo, uma pessoa normal como eu. Você cresceu em dificuldades, sofreu preconceito, perdeu alguém que era precioso para você e sabe como é se sentir no fundo do poço. É por isso que você queria algum propósito, algo para justificar sua existência, afinal, viver sem um propósito é o mesmo que estar morto — Jonas não tirava seu olhar de Bernardo.

— Você passou meses, anos, influenciando pessoas, criando uma religião e uma ideologia própria apenas para ser respeitado e amado para assim sentir aquilo que um dia sentiu com uma pessoa importante. Tudo bem, seus objetivos são bons, são puros, mas agora, olha só para você, temos o mesmo o sonho, dar fim ao preconceito aos corrompidos, mas no fim você se tornou o oposto do seu sonho, uma semente de ódio e mais preconceito!

— Não...  o que eu estou fazendo não é o oposto de meu sonho, eu só fui forte o suficiente para dar um passo à frente para conclusão dele. Afinal, como quer cumprir o seu sonho parado?

— Você realmente acha isso?

Bernardo fechou seus olhos pensativo, Letícia voltava à sua mente.

— Sim, é verdade, esse é o caminho que eu trilhei, o único caminho possível no meu sonho, não há motivos para ficar parado esperando que as pessoas mudem, você deve forçá-las à isso.

— Do que está falando? Você percebe as palavras que saem de sua boca — Jonas cerrava os punhos — Você fala como um ditador. Quero ajudar as pessoas a mudarem, não forçá-las à minha vontade!

— Diria a mesma coisa se soubesse que as pessoas não mudam assim? Não há mudança espontânea do dia para a noite.

— Quem te disse que elas não podem mudar? Só saberá se tentar ajudá-las, quem sabe até guiá-las de forma justa. O caminho que você escolheu é o caminho da fuga, um caminho obscuro, tentador pelo poder, mas errado.

— É isso o que pensa?

— Não, é isso o que sei, é por isso que quando eu sair daqui, quando eu acordar eu vou me levantar e acabar com essa revolução, não deixarei que você se afunde mais e leve todo um povo com você.

— Isso não cabe a você Jonas.

— E cabe a você? — Jonas limpou sangue de seu rosto — O que a garota corrompida de 5 anos que sonhar em ser dançarina ou atriz vai fazer? O que ela quer? Você decide, não é mesmo?

— Não... — Bernardo respondeu na defensiva.

— As pessoas são únicas. Todos têm seus carros, suas ambições, seu ego e principalmente a vontade e necessidade de se destacar, você conseguiria manter?

Letícia retornava mais uma vez à mente de Bernardo, mas diferentemente de todas as visões que ele tinha dela, ele lembrou-se de um dia calmo com ela, o dia em que ela lhe revelara seu sonho, ser atriz, a primeira atriz corrompida a ganhar um Óscar, esse era seu sonho e para isso ela acabaria com o preconceito mútuo que existia no mundo.

Por um momento, Bernardo recordou de seu antigo eu, das risadas, brincadeiras e idealismos. Parecia algo tão distante, tão perdido. Era alguém do qual as pessoas se espelhavam, alguém do qual elas queriam se espelhar.

— Entendo...

Tudo se escureceu rapidamente, quando Jonas pôde ver uma luz ela era forte o bastante parra forçá-lo à fechar os olhos em um ato reflexo. Quando os reabriu pôde ver a mão de Bernardo esticada para ele.

— Talvez você esteja certo — Jonas pegou em sua mão e assim se levantou. Bernardo se voltou para o lado exterior — Podem cessar a barreira.

— Padre? — Shieva questionou confusa.

— Tudo bem — A barreira se desfez — Vocês estão melhor sem mim.

Em um movimento rápido, Bernardo sacou uma faca, a mesma que ele desejava usar para matar Jonas e enfiou-a em seu peito, caindo no chão com sangue escorrendo da ferida.

— Bernardo?!? — Jonas se aproximou do padre caído — O que você está fazendo?

Bernardo sorriu.

— Livrando a todos de minha influência, boa sorte, cumpra o sonho dela, o nosso sonho.

— O quê? — Jonas se lamentava ao ver os olhos de Bernardo ficarem sem vida, ele odiava a ideologia dele, mas no fundo entendia suas motivações.

Os corrompidos, desamparados e perdidos em ódio correram em direção à Jonas, porém se viram barrados por uma parede invisível, o herói poderia agradecer à Serena.

Em meio a situação Jonas se viu sem saída, ele sabia que não poderia parar todos os corrompidos, pelo menos não lutando. E Serena não aguentaria para sempre.

— Eu sei que a maioria de vocês não confia em mim — Sua voz ressoava na mente de todos os corrompidos presentes, de alguma forma, a ligação de Shieva havia se espalhado para todos os presentes — Vocês acham que eu sou uma desonra, um covarde, alguém que deu as costas para os corrompidos, mas eu não sou.

Os corrompidos começavam a parar de tentar passar pela barreira imposta por Serena. Estavam confusos, não só por todos estarem ouvindo sua voz, como também pelo início da abstinência de Bernardo.

— Vocês me conhecem como Aracnídeo, um vigilante e pseudo-herói, porém hoje quero que vocês conheçam o homem por baixo dessa máscara. — Para a surpresa de todos os presentes o Aracnídeo levou suas mãos a nuca e retirou sua máscara, mostrando seu rosto inchado — Meu nome é Jonas Ferreira, tenho 18 anos incompletos — Os corrompidos haviam parado por completo, não imaginavam que o Aracnídeo se mostraria para eles sem máscara, muito menos pensavam na possibilidade dele ainda ser um adolescente — Sabe, quando eu descobri meus poderes eu tive medo, receio e um monte de pensamentos ruins, cara, eu me senti uma aberração, porém logo isso mudou e eu me senti extasiado, o cara mais poderoso do mundo, um adolescente com superpoderes, algo tão clichê.

Um leve sorriso brotava em seu rosto:

— Infelizmente dias depois eu descobri que havia algo dentro de mim, algo que eu não gostei quando descobri, um preço pelos meus poderes, alguns poucos corrompidos tem, esse lado negativo varia bastante de corrompido para corrompido, mas no geral, é algo que não podemos controlar, então vocês sabem do que eu tou falando.

— Cara, tive medo do que encontrei em mim no começo, era algo aterrorizante e que quase me fez cruzar uma linha que eu nunca pensei em cruzar. Sabe, eu admito que ainda tenho um pouco de medo até hoje, mas é por isso que eu tou aqui falando com vocês, sei que vocês tem medo, mas olha, todos temos, ainda mais quando temos superpoderes, parece que desenvolvemos super-medos.

Em meio à multidão Serena observava, pensava consigo mesma em todos os temores que ela havia tido nesses últimos meses, ela não era a única que passava por isso, grande parte dos corrompidos começavam a encontrar dentro de si, fragmentos de memórias, de seus próprios temores.

— Todos temos medos, ninguém é uma exceção que foge à regra, não existe mulher e nem homem sem medo. Nosso maior temor, ao contrário do que a maioria pensa, não é errar, não é mudar, ser diferente. Nosso maior medo é sermos poderosos além da conta, além do que podemos imaginar. Pois é nossa luz, não nossa escuridão o que mais nos assusta... eu sei que parece estranho falar isso, mas é a verdade, temos mais medo das nossas qualidades do que de nossos defeitos, todos tem defeitos, mas as qualidades, muitas vezes ela são únicas, elas nos diferem.

— Infelizmente o ser humano geralmente repudia o diferente, teme aquilo que não está nos padrões, olha, não tou tentando imitar aquela propaganda de tv mas, ser diferente é normal aceitem isso. Eu sei que muitos de vocês de manhã ao acordarem provavelmente pensam, por que eu? Porque sou tão lindo? Tão forte, tão rápido, porque tenho a merda desses poderes? Porque meu deus, deuses ou sei lá o quê, eu tive que nascer um corrompido? Nascer assim?

Jonas olhava para a multidão, sabia que ali era tudo ou nada:

— Deixa eu fazer uma pergunta, por que não você? Quem é você pra não ser assim? Olha, vocês acreditam num deus dos corrompidos, tudo bem vocês seguiam Bernardo, tudo bem eu respeito isso. Agora falando na minha religião, que espero que vocês também respeitem, vocês são filhos de Deus, é isso o que vocês são, se você não acredita nele, tudo bem só entendam que eu quero dizer que todos somos iguais, corrompido ou não. É por isso que vocês são perfeitos a sua maneira, com sua própria luz, com sua própria grandeza e devem lembrar que os outros, os humanos comuns, simples civis sem poderes também são perfeitos à sua maneira, todos somos, pois somos sim, todos humanos — Seu objetivo com aquelas palavras era amenizar os nervos dos corrompidos, fazê-los desistir da ideologia opressora que haviam aceitado.

— Falando nisso, ser pequeno não serve ao mundo, nunca serviu e nunca servirá, não há nada bom ou nobre em nos diminuirmos para que as pessoas ao nosso redor se sintam melhor, para que se sintam confortáveis, é verdade, mas também não devemos nos colocar acima dos outros, ou usarmos a luz que temos contra os outros. Porque aí você perde sua luz e ganha um buraco em seu peito, se torna vazio, pois estará violando a liberdade da luz do outro e se tornando aquilo que odeia, o precursor do ódio.

— Esse é o problema do mundo, todos querem acabar com algum preconceito, mas ninguém acaba com seu próprio preconceito, quando uma mulher que quer acabar com o machismo, mas acha que todo homem é machista. Que toda mulher, mesmo que estando errada, é inocente por ser mulher, quando um negro odeia brancos por achar que todo branco odeia negros, ou quando um branco odeia verdadeiramente negros e vice-versa, nós estamos em meio ao preconceito enraizado não na cultura da sociedade apenas, mas em nós.

— Você pode dizer que a sociedade influência o homem, eu digo sim, influência, mas a sociedade é feita por homens e mulheres, a única forma de mudar essa sociedade é mudando a si próprio primeiro. Isso se aplica aqui, quando vocês que querem acabar com o preconceito contra nós, os chamados corrompidos, mas colocam lenha na fogueira, enfrentam ódio com ódio, por quê não com amor e respeito, não é o que vocês desejam?

— Sei que não queremos que nos vejam como monstros, mas ao enfrentamos os “não corrompidos” com nossos poderes, com violência, nós não estamos, pelo contrário, estamos piorando, estamos nos tornando opressores. Estamos apenas justificando o preconceito deles e criando preconceito naqueles que não o tinham anteriormente. Mas sabem o pior? Criamos, nós mesmos, preconceitos sobre as pessoas "comuns", estamos criando aquilo que combatemos.

— Precisamos exterminar o preconceito sim, todos eles, inclusive o que reside dentro de nós, especialmente esse, precisamos destruir todo o tipo de preconceito. Meu nome é Jonas Ferreira e eu não sou um corrompido, sou só um cara com poderes, que não tem nada de errado pra dizer que foi corrompido.

Finalizado seu discurso Jonas olhou para Serena, ela desfazia a barreira, parte porque acreditava que as pessoas haviam entendido as palavras de Jonas, em outra parte, porque não suportava mais, seus poderes haviam chegado ao limite. Ela olhou para ele e ambos trocaram sorrisos ao ver os corrompidos desistindo de atacá-lo, haviam conseguido parar a revolução, ainda que com algumas mortes infelizes no percurso.

 


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Notas finais do capítulo

Haverá um epílogo.



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