(Continuação... São Paulo, 9 de dezembro de 2016)

— Oi, licença! Que livro é esse? – perguntou um garoto, interrompendo minha leitura.

— O-oi. – falei, ainda confusa por aquela interrupção no mínimo abrupta. – É “Crime e castigo”, do Dostoiévsky. - disse, mostrando a capa do livro ao levantar a capinha de tecido.

Foi nesse momento que olhei pra cima e pude reparar no garoto pela primeira vez. Ele era muito alto, loiro e tinha os olhos azuis. Mas não era isso que fazia ele parecer, aos meus olhos inebriados pelo fato de ele ter traços tão marcantes, um príncipe encantado. Era a primeira vez que algum garoto bonito e que não era da minha sala puxava papo comigo. Senti instantaneamente meu rosto inteiro corar, e escondi o rosto de volta no livro.

— Mas a história é sobre o quê? – ele insistiu. Droga, ele precisava ser tão simpático!?

— É um romance russo do século XIX em que um personagem mata alguém com um machado. – respondi, voltando para a leitura. Certamente isso faria com que eu parecesse antipática, mas eu não sabia como soar simpática e estabelecer uma conversa com um desconhecido por mais que 2 segundos, e a Julieta não estava ali para me ajudar.

— Nossa, que interessante! E quanto ao ambiente da história?

Merda! Ele realmente estava a fim de conversar, não se importava nem um pouco com a música do ambiente, ao contrário dos jovens da nossa idade. Se a Julieta estivesse aqui, faria de tudo para que eu interagisse com ele. Pois bem, por ela me esforçaria a manter aquele diálogo com um estranho bonitão.

Parei de ler e dei um panorama geral da história. Ele se sentou ao meu lado e pareceu bem interessado. Até que avistou um amigo do outro lado do auditório e o convidou para se sentar conosco. Como se já não bastasse um, eu teria outro estranho ao meu lado. Que maravilha! O nível de embaraço só aumentava a cada instante.

Mas o amigo dele não deve ter visto o aceno, e pude ouvir Bel me chamando para irmos embora.

À noite, quando eu e Julieta conversamos por chamada de vídeo, ela mal podia acreditar:

— Você, conversando com um estranho!? Que notícia maravilhosa! Como ele era? Bonito? Feio? Inteligente? Parecia gostar de ler ou era só curioso mesmo? Qual o nome dele?

— Calma, eu não sei o nome dele. – respondi, com um riso débil. - Ele parece gostar de ler, ao menos estava bem interessado na história. É muito simpático. E bem bonito também. - falei, sentindo minhas bochechas arderem.

— A imagem não está em alta definição, mas é bem visível que você está com as bochechas bem vermelhas. Ora ora, Senhorita Pimentão... Temos alguém envergonhada aqui! - disse ela, gargalhando.

Conversamos mais um pouco, nos despedimos e fui me arrumar para o baile...

(Continua)