Strength escrita por Mandalay


Capítulo 1
Strength — capítulo único




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Ela gostava de ir a praia admirar o mar, por mais que não fizesse o perfil de sair para nadar, vez ou outra ela o fazia submersa nele, vendo a areia clara e algumas conchas de formas diferentes. Era raro o evento de ela se deparar com algum peixe, pelo que havia pesquisado, as praias em Death City não tinham uma fauna muito abundante de peixes. Isto é, nos dias mais quentes, quando o sol sorria e a fazia arrastar os amigos consigo para uma tarde na praia, podia não ser a melhor jogadora de basquete, mas sabia boiar pelo menos.

Mas hoje não. Hoje ela só se resumia a olhar o mar com uma expressão triste.

Era inverno e o céu estava completamente cinza, deixando a água que vinha de encontro a areia com uma coloração escura, efeito daquele dia sombrio. Sem o céu azul e límpido para ser refletido, tudo o que se via era uma imensidão cinza e sem graça. Da mesma forma como ela se sentia. Havia um espaço vazio dentro de si, por mais que ela houvesse dito que estava tudo bem, era só uma resposta automática já que era difícil definir ao certo o que sentia de verdade.

Sentia falta da companhia que Chrona oferecia. Era triste não ter mais aquela amizade derradeira ao seu lado, ainda mais depois de tudo o que haviam passado. Foram altos e baixos, mas ela tinha a certeza da amizade que havia conseguido, tudo para no final as coisas terminarem assim. Alguns meses após a festa de celebração que Kid fizera para comemorar o fato de ter se tornado um shinigami completo, a melancolia havia retornado ao coração da Albarn.

Uma coisa era certa para a loira, Chrona faria uma grande falta para ela. E ter de observar o mar cinza a fazia remoer parte dessa ideia, a outra ainda carregava um entusiasmo que ela não queria aceitar. Preferia viver aquele momento, nem que fosse apenas para clarear as ideias. Porém, agora teria companhia. Sentiu a presença de uma alma caminhando atrás de si, vindo em sua direção, uma alma que tanto conhecia e que batalhara junto de si naquela noite em que a lua se tornara preta.

Soul. Ela tinha certeza de que a arma havia mudado em vários aspectos ao longo de sua caminhada, mas depois daquela noite teve a certeza de que algo que o vinha incomodando a muito - muito - tempo, uma inquietação, finalmente havia se dissipado e aquilo, de certa forma, a alegrava bastante.

— O que houve, Maka?

Ela se virou para encara-lo, não evitando de sorrir por saber que, não importava para onde fosse, o rapaz sempre a seguiria. O semblante de seu olhar mostrava a preocupação por ela ter saído, depois do almoço apenas com a desculpa de que queria ver o mar. Ela notou o som pesado que fez ao expirar o ar guardado em seu peito.

— Precisava pensar um pouco. Ainda não estou cem por cento satisfeita com o desfecho daquele embate.

O albino entendera o recado.

— Pensei que já tinha superado isso.

— Pensei que fosse rever sua família mas olha só, você ainda não fez isso - brincou sem emoção.

Soul fizera uma careta.

— Certo, eu não mexo na sua ferida e você não cutuca a minha.

Ela sorriu com um aceno de cabeça. Com isso notara a mudança na água, as ondas pareciam mais fortes e o mar mais revolto. A própria brisa que antes parecia suave agora acoitava seu rosto com mais força, fazendo os cabelos soltos voarem para cima. Ela se encontrava aturdida tentando organizar o fios, o que fez Soul rir.

— Ei, não ria disso! - vociferou o encarando com o canto dos olhos.

— Então melhor fazer isso - respondeu colocando as madeixas loiras por baixo do gorro felpudo do casaco que ela usava.

— Obrigada.

— Não por isso mas sinceramente falando, é bom você arranjar uma forma de se acalmar quanto a isso, Maka. Não quero ter que vir atrás de você sempre que você quiser "pensar um pouco".

— Eu nunca disse que você precisava me seguir - respondeu cruzando os braços.

— Eu não te segui.

Tal comentário a fez rir, observando a face irritada do rapaz. Mas em um ponto Soul estava certo, ela tinha de conseguir uma resposta para aquilo. Toda noite, quando tinha de encarar a lua negra, se pegava pensando em Chrona e como seria se sua então amizade não tivesse ficado presa em sua própria prisão, naquele sangue espesso, somente para salvar a ela e seus amigos. Ela poderia culpar Medusa quantas vezes quisesse pela forma como criou Chrona, mas ela estava morta e Maka tinha certeza que, desde o começo ela tivera Chrona com o objetivo de ser uma cobaia para suas experiências com o sangue negro. Grande mãe aquela mulher fora. Agora ela se encontrava assim, remoendo seus atos por algo que nem tinha a certeza de que daria certo. Vencerem a luta com todos são e salvos.

Seria aquilo realmente possível?

— Você está certo. Pensei que já houvesse me entendido quando a isso mas ainda não consigo ficar satisfeita, não consigo parar de pensar num final diferente para aquilo - suspirou — Me desculpe por preocupá-lo.

Ele colocou uma das mãos sobre o gorro, com um sorriso tranquilo no rosto.

— E você sabe que pensar nas possibilidades não é a resposta. Sério Maka, você consegue ser melhor que isso.

Um bico se formou nos lábios da garota, fazendo com que ela o observasse, claramente vencida. Soul a conhecia bem - bem demais - não era a toa que eles formavam uma boa dupla, mas o que ela poderia fazer? Não conseguia pensar em alguém capaz de elucidar suas dúvidas além de... além dele! Finalmente se lembrara de alguém que definitivamente poderia ajudá-la.

— Soul, me leve até a casa do professor Stein!

A surpresa estava clara, no modo com que os olhos de íris vermelhas aumentaram de tamanho.

— O quê- porque você quer ir até lá?

— Acho que ele pode me ajudar a encontrar uma resposta.

— Tem certeza? Depois que ele teve a bebê ficou mais estranho que o normal - comentou com uma careta coçando nervosamente a nuca.

— Tenho - respondeu com firmeza já observando a moto que pertencia a ele ao fundo, não fora a toa que ele chegara tão rápido.

Soul finalmente direcionara seus olhos para cima, fitando o quão pesadas as nuvens pareciam estar, depois encarou o mar revolto, tentando entender o que aquilo tinha de tão mágico para Maka, porém, a única certeza que tinha era de que logo mais choveria. Uma chuva forte.

— Certo, mas é melhor não demorarmos muito - estendeu a mão para que ela a segurasse e assim que ela a agarrou, seguiram em direção ao possante.

Depois de se acomodarem devidamente em seus lugares - e da loira se agarrar fortemente ao corpo dele - escondendo seu rosto na jaqueta preta que ele vestia. Pode ouvir o som do motor ressoar como um estrondo e no segundo seguinte haviam tomado a estrada. Ela não tinha muito carinho pelo meio de transporte que ele usava, odiava o medo que crescia dentro de si toda a vez que era obrigada a se agarrar a Soul, sentindo o vento açoitar seu rosto, como agora que sua cabeça estava descoberta e seus fios loiros mais pareciam pequenos chicotes a machucar suas bochechas. Era como se estivesse vulnerável, sem nada para lhe proteger.

Agradeceu quando sentiu o estrondo que a moto produzia diminuir aos poucos, mostrando que haviam chegado ao seu destino. O prédio decorado de remendos ainda lhe causava calafrios, a lembrando da primeira vez que estiveram ali.

— Eu ainda não me acostumei a vir aqui - disse o rapaz com um sorriso nervoso, exibindo seus dentes pontiagudos.

— E eu ainda não me acostumei a andar de moto. Por mais rápida que ela seja.

Soul deu de ombros.

— Enfim, chegamos. É melhor entrarmos logo, antes que comece a chover de uma vez - advertiu, entrando no terreno em busca de um lugar para deixar sua preciosa moto a salvo da chuva.

Acabou a deixando embaixo de um lugar coberto, seguindo em direção a Maka, que acabara de tocar a campainha. Em menos de dois minutos a porta fora aberta, dando lugar a figura loira e sorridente de Marie com uma criança chorosa nos braços, a surpresa em rever seus alunos estava estampada em seus olhos, aquilo a deixava mais do que feliz.

Depois que tivera seu bebê, a então professora teve que se desligar da escola por tempo indeterminado, alegou a seus alunos que gostaria de passar mais tempo com sua filha. Agora que tinha um bebê poderia finalmente realizar seu sonho de ter uma família, deixando de lado a loucura que era a vida de uma arma. Depois disso, eram raros os dias em que via o rosto de seus alunos logo, encontrar com dois deles num dia tempestuoso como aquele era algo que a deixava imensamente feliz. Se não fosse pelo bebê esperneando em seus braços.

— Soul, Maka. Como é bom poder ver vocês de novo! Eu os abraçaria, se não fosse por essa garotinha aqui - agitou os braços sorridente, tentando acalmar a criança.

Os dois riram um tanto nervosos, mas fora Maka quem se pronunciou.

— Nós também sentimos sua falta, professora Marie. Hm, podemos entrar? - perguntou sem graça.

A mulher os encarou sem graça, dando espaço para que entrassem.

— Desculpem por isso, desde que ela nasceu eu tenho ficado um pouco distraída demais. Mas sentem-se, a casa é de vocês - disse indicando o sofá e duas poltronas que estavam alocados na sala pequena — Desde que me mudei para cá tenho tentado mudar os gostos de Stein, não sabem da batalha que foi para conseguir essa sala!

— Imagino, vendo como o professor Stein é - soltou o rapaz de cabelos grisalhos.

Os dois sorriam enquanto se acomodavam no espaçoso sofá e Marie se contentava com uma das poltronas. A sala, por incrível que pareça, era bem decorada e colorida. Se fossem comparar a fachada que o prédio tinha antes, o que Marie conseguiu havia sido uma revolução.

— Ele é um pouco difícil de se lidar, mas nada impossível. Me lembra da vez que Chrona venho aqui, eu ainda estava começando a trocar os equipamentos de pesquisa que ele tanto venera por móveis de verdade.

A coloração da face de Maka mudou bruscamente e seu sorriso simpático se desfez. Ela não culpava a professora que lhe encarava com uma expressão confusa que beirava a preocupação, Soul havia colocado uma das mãos em seu ombro, como um lembrete de que não fora algo intencional. Ela havia dito aquilo com uma boa lembrança, não é mesmo?

— Mas o que querem, a que devo essa visita? - perguntou sem graça, tentando aliviar a tensão que causara.

— Ela queria falar com o Stein.

— Hm, sobre o quê? Se não for muita curiosidade, claro.

Maka direcionara o olhar a professora, com isso Soul entendeu que ela se recuperara do choque que sofrera a pouco.

— Chrona.

E com isso a mulher entendera o que havia causado a mudança de estado da garota, o que a aliviava um pouco. Ainda assim, se sentia sem graça.

— Ele está no escritório, ou melhor dizendo, na sala ao lado. Foi a única opção que encontrei para que ele não reclamasse demais sobre seus materiais de pesquisa - mudou o tom de voz propositalmente ao terminar a frase, conseguindo arrancar um sorriso dos lábios de Maka — E creio que você queira falar a sós com ele, por isso Soul, não gostaria de me ajudar com o café?

— O quê? - o espanto estava claro na voz da arma.

— Ora, não se preocupe! Eu só quero uma ajudinha.

— É Soul, vai ajuda-la! - incentivou Maka o empurrando do sofá.

A arma lhe direcionou um olhar nervoso que foi claramente ignorado, a loira fez sinal com as mãos para que ele fosse andando quando Marie se levantava da poltrona com o bebê, que agora descaçava calmamente em seu braços, enquanto tentava indicar o caminho.

Somente depois que eles desapareceram por uma porta de madeira envernizada, que ela tomou coragem para se levantar e seguir até a sala onde seu antigo professor apaixonado por dissecação estava. Não teve de se preocupar muito quanto a não encontrar o lugar, foi somente se levantar e virar no corredor ao lado direito que encontrou a tal sala que Marie havia mencionado. Bateu na porta timidamente e depois a entreabriu, permitindo que uma pequena parte de seu rosto pudesse ser vista de dentro do cômodo.

Sua vista fora ofuscada pela nuvem de fumaça proveniente dos cigarros que Stein costumava fumar com frequência, demorou cerca de segundos que mais pareceram minutos para que ela pudesse focar o homem trajado em um jaleco de remendos. Seu antigo professor estava sentado em uma cadeira giratória olhando sem ânimo algum para a tela do computador que parecia ligada, porém fora de serviço. Maka bateu mais uma vez na porta, se fazendo notar pelo homem alto e pálido.

— O que foi agora Mari- começou desinteressado, até notar que não era Marie quem estava a porta — Maka? — no esforço em focalizar a garota que fora uma de suas alunas mais brilhantes ele caiu da cadeira, irritado, começou a girar a engrenagem fincada em sua cabeça.

A loira tentou não rir da falta de cuidado que seu professor tinha.

— Sim, sou eu. Bom, eu gostaria de conversar com você, se não fosse incomodo.

Ele a encarou, curioso.

— Não tem problema nenhum mas, o que te trouxe aqui? Isso é incomum.

— Um pensamento incessante - fez um muxoxo enquanto se lembrava do que a levara até lá, dando entrada na sala afastando a fumaça que parecia secar sua garganta aos poucos — Sobre a batalha na lua. Sobre Chrona. Como seria se o final houvesse sido diferente.

Era difícil discernir o que se passava na cabeça de Stein, seu rosto nada dizia enquanto ele analisava as frases soltas que Maka havia dito. Ela poderia jurar que ouvia o som de engrenagens quando distinguiu que ele girara mais uma vez o parafuso preso a sua cabeça, ele estava sério quando a respondeu.

— Você sabe que é perda de tempo pensar numa realidade em que Chrona não houvesse que se sacrificar por todos nós. E por mais que consiga, tenha ciência de que o Kishin estaria exalando toda sua insanidade sobre o mundo, pois nós não conseguimos detê-lo com toda a nossa força sozinha.

Aquilo fora seco e direto demais do ponto de vista da garota. Ela já tinha em mente que ele diria algo daquele nível. Era da natureza de seu professor falar daquele jeito mas ainda agora, ela ansiava por uma resposta positiva e menos doída para si. Por fim, apenas suspirou.

— Eu ainda esperava por algo diferente, vindo de você. Mas no final, sabia que acabaria resultando nisso.

— Viu? Eu estava certo - cantarolou o homem tragando de seu cigarro — Mas não se prenda a isso, Maka. O que Chrona fez foi um ato honrável, um ato que a prendeu no seu maior momento de coragem.

Uma batida na porta interrompera a conversa. De fora, Marie apareceu com um sorriso gentil.

— Não querem um pouco de café para animar esse reencontro? E Stein, não deveria fumar tanto, esse lugar fede.

— Não é a toa que foi o único cômodo que me restou - disse indiferente enquanto guiava Maka até a porta — Pelo menos, o café dela é ótimo - comentou num tom que apenas ela pudesse ouvir.

Maka sorriu enquanto um pensamento lhe tomava a mente.

Talvez ela poderia deixar as coisas como estavam.

Talvez e só talvez, ela poderia deixar de pensar nas infinitas possibilidades de um futuro diferente e se concentrar no seu presente, em tudo aquilo que ela tinha ao seu redor. Em todas as pessoas que a cercavam e que contavam com ela.

Os risos de uma criança ressonavam pelo lugar de forma cristalina, iluminando cada cantinho pelo qual tocavam. O que deixou a loira curiosa visto que Marie aparecera sem a bebê nos braços. E mal pode conter o sorriso quando, ao chegar a sala com seu antigo professor maluco ao lado, encontrou sua arma com uma garotinha loira nos braços, a qual não parava de rir das caretas que o albino fazia.

— Acho que a nossa menina gostou dele - disse Marie com um sorriso no rosto — Deixei os dois juntos por três minutos e ela não parou de rir um minuto sequer.

— Curioso - comentou Stein se aproximando do sofá, seu rosto nada dizia e quando a bebê avistou o rosto do pai se calou imediatamente. Ao se afastar, ela voltou a rir olhando para o albino.

A cena se repetiu por um breve momento, enquanto Soul tentava conter seu nervosismo.

— Stein, pare com isso. O garoto não vai aguentar!

A artífice balançou a cabeça para os lados, rindo. Quando Marie pegou a garotinha em seus braços, ela pareceu se acalmar, aninhando-se no colo de sua mãe.

Havia algo incrivelmente convidativo no ar, conversas sobre o passado e presente fluíam de uma forma curiosa, como se as quatro pessoas presentes na sala o fizessem diariamente e não a cada três meses. Maka podia ver claramente nas expressões de sua arma que o receio que sentia antes de entrar naquele laboratório passara, Soul parecia estar em casa conversando com Marie sobre formas de tranquilizar a bebê com música enquanto ela se resumia a assistir com alegria os avanços daquele que enfrentara grandes batalhas consigo.

A pequena mesa de centro estava abarrotada de guloseimas prontas para serem apreciadas, e fora enquanto ela bebia uma xícara de café que Stein resolvera falar.

— Se sente melhor agora?

Era incomum alguém como ele se dar ao trabalho de perguntar e se preocupar com o estado em que a artífice se encontrava, pelo visto algo em seu professor estava mudando.

— Acho que sim, Marie tem talento na cozinha - disse conseguindo um sorriso torto do outro.

— O que pretende fazer agora que conseguiu uma resposta?

Aquilo a pegara desprevenida.

— Não sei, não cheguei a pensar tão longe - brincou — O que sugere, professor?

Os orbes verdes por detrás das lentes redondas a observavam de forma calculista, como se analisasse cada possibilidade de maneira minuciosa, avaliando todos os pontos e por fim, voltou seu olhar para a mulher com o bebê nos braços, do outro lado da sala. A loira sentia a sensação de surpresa com o carinho que viu na expressão do homem.

— Porque não tenta lecionar? Tenho certeza de que Kid precisa de uma nova leva de mestres, e enquanto eu e Marie estamos incapacitados, e Sid junto de Spirit encarregados com mais de uma função. Talvez não seja uma má ideia tentar, Maka.

Por um momento, o cérebro de Maka Albarn parara de funcionar.

E quando suas engrenagens voltaram a ativa, ela tinha a atenção de todos na sala, exceto pela bebê, que parecia dormir serenamente.

— Isso é sério?

— O que disse, Stein? - perguntou Marie.

— Que Maka deveria ser professora.

Soul engasgara com um pedaço de bolo — Sério? Sabe, de verdade?

O cientista assentira com a cabeça.

— É uma opção. Maka tem grandes habilidades, não duvido que possa se dar bem lecionando.

O albino rira.

— Fazendo os alunos devorarem todos os livros da biblioteca.

— Soul!

— Eu não pensaria dessa forma se fosse você, Evans. Minha sugestão era a de que vocês dois trabalhassem juntos - o albino tossia freneticamente enquanto as duas loiras riam — Vocês dois funcionam melhor dessa forma. Imagine como seria, Marie.

A arma se pôs a pensar com um sorriso maroto nos lábios.

— Uma aposta interessante, mas acho que eles vão precisar pensar no assunto. Soul não para de tossir e Maka ainda não disse uma palavra sequer sobre a sua ideia. Você os pegou de supetão, Stein!

Enquanto isso, mente da Albarn viajava por vários cenários. Mesmo ouvindo as vozes que estavam ao seu redor, as palavras de Stein se repetiam em transe. Ela não conseguia enxergar sentido no que ele dissera. Poderia ela conseguir lidar com uma sala cheia de alunos, assim como ela fora no passado?

De alguma forma, aquelas palavras fizeram nascer uma inquietação no peito da artífice.

— Eu posso mesmo?

Marie e sua aura gentil tomaram a dianteira.

— Basta você querer, querida.

— Mas eu vou precisar de auxílio para isso. Não sei se conseguiria dar aulas, e sobre o que eu falaria? Mesmo com o Soul, não penso num resultado positivo.

A pilha de nervos em que Maka se encontrava fora apaziguada pelo afago que Stein dera em suas madeixas.

— Foi uma sugestão, você tem potencial, mas não precisa levar isso tão a sério.

Em busca de uma distração, ela pegou um punhado de biscoitos pequenos e coloridos.

— Obrigada, eu acho.

— Bom, é melhor irmos Maka. Parece que a chuva já passou.

A artífice sentira seus olhos aumentarem de tamanho se lembrando de como o tempo estava quando saíram da praia, o céu nublado e o vento forte. Nem se passara pela sua cabeça a ideia de chuva quando decidira ir ao laboratório. Balançando a cabeça para os lados, se censurando por se esquecer de algo tão bobo, Maka agradeceu ao casal por terem os recebido, pelos conselhos que recebera. De alguma forma ela se sentia melhor, a tristeza na qual havia mergulhado já não era um problema e poder enxergar isso claramente era seu melhor remédio. Certos eventos não poderiam ser mudados sem que algo fosse afetado, ela imaginara brevemente como seria dar aulas a Chrona sem se dar conta do sorriso que lhe tomava os lábios.

A ideia de ter total responsabilidade por uma sala cheia de alunos a assustava um pouco, mas ela não seria tão diferente da sua realidade. E se talvez e só talvez, ela desse o braço a torcer?

— Agradeço pela visita - disse Marie — Apareçam mais vezes, por favor. Sinto falta de ter meus alunos por perto.

— Diga por você.

— Stein, deixe de ser assim!

Arma e artífice sorriam ao ver a interação do casal, no início era difícil de imaginá-los juntos, mas agora tudo parecia ganhar uma cor diferente. Enquanto se arrumavam para encarar o tempo fechado, o então cientista se aproximara da porta de saída, com uma pequena sacola na mão, que parecia guardar dois potes por dentro.

— Marie pediu para levarem, são pedaços do bolo e alguns doces que ela fez - suspirou ajeitando a armação do óculos — Espero vê-los de novo.

É, a ideia de lecionar poderia ser deixada como uma opção futura.

O ar do lado de fora era frio, e o dia deixara de ser claro quando Soul guiava sua moto para fora da residência de seu antigo professor. Ao menos a chuva cessara.

— Nunca pensei que veria você com um bebê no colo. Foi engraçado.

— Eu não achei engraçado - o albino fizera uma careta — Acho que aquela garota não vai se assustar tão facilmente no futuro, com um pai daquele.

Maka rira do comentário, enquanto se posicionava sobre a garupa da moto. Já não era surpresa a sincronia que suas almas tinham e nada acusara que sua arma não gostara da sugestão que Stein dera, a realidade estava tão clara quanto a segurança que a alma dele irradiava.

Soul dificilmente duvidava da capacidade de Maka.

— Será que eu consigo?

O motor ronronava, se preparando para o caminho de volta, mas não fora difícil ouvir a voz da loira.

— Você consegue tudo o que quiser, Maka, e eu sempre vou estar do seu lado, caso precise de ajuda.

— Agora deu para dizer frases de efeito Evans?

— Depende, eu consegui causar algum impacto?

Os braços de Maka se agarraram a cintura do albino como se precisasse daquele contato para respirar.

— Só não se esqueça de cumprir com o que disse.

Naquela noite não haviam estrelas e a negritude da lua se misturava ao céu chuvoso. Maka fizera questão de abrir a janela da sala para observar o cenário a sua frente, tomando o cuidado de perceber como suas emoções reagiam a isso mas, diferente do começo daquele dia, tudo que a garota conseguia pensar era em como seu professor a imaginara no lugar dele. A frustração que sentira mais cedo, se dissipara uma outra vez e ela torcia para que agora fosse definitivo. Quem sabe estudando mais ela conseguisse uma solução para a insanidade? Do ponto de vista que tinha, tudo parecia ser possível.

Por um momento, seus pensamentos pausaram devido ao abraço que recebera e antes de conseguir articular uma frase, aquele que a abraçara tinha o rosto repousado sobre seu ombro. Aquilo trazia uma sensação de conforto tão agradável a loira, que as vezes ela se perguntava se estava sonhando.

— Você se preocupa demais, porque não vai dormir?

Ver sua arma claramente preocupada consigo deixava o peito de Maka quente por dentro, tamanha a afeição que tinha por Soul.

— Você está certo, me desculpe Soul - murmurou correndo os dedos pelos braços alvos do outro, como se tocasse as teclas de um piano — Eu já estou indo para a cama.

Nenhum dos dois esperava pelo beijo que viera em seguida, Maka sentia pequenas fagulhas sempre que se beijavam e dessa vez não fora diferente, mesmo depois de fechados, seus olhos eram capazes de enxergar uma bela queima de fogos de artifício. O abraço de Soul se tornara mais forte, como se ele não quisesse que ela escapasse dali, enquanto os braços da loira mantinham-se sobre os ombros dele, buscando timidamente um caminho entre os fios pálidos. Fora tão mais proveitoso quando o ato de se beijarem deixou de ser estranho, agora ambos se sentiam a vontade para fazê-lo sem receios. Aquilo que antes causava estranhamento, passara a ser uma grande demonstração de carinho.

O olhar semicerrado do albino parecia contemplar uma grande obra de arte, enquanto Maka procurava sofregamente pelo ar que lhe faltava.

— Boa noite Soul - sussurrou com um sorriso tímido, tendo como resposta um polegar deslizando sobre sua bochecha.

Enquanto ambos submergiam na presença um do outro, aproveitando aquele elo especial que cultivavam entre eles, algo era assimilado ao cerne da loira. Como uma certeza ainda maior sobre suas ações.

Já era tempo desde que ela teve de encarar uma situação séria de frente. Mergulhada em serenidade ela deixara de cultivar seus valores primordiais, esquecera da sua persistência na luta contra seus medos, dos problemas que enfrentara. Agora tudo parecia tão distante que uma singela frustração conseguira consumir seus pensamentos. Se havia algo de valioso a se retirar daquele dia era aprender a dar ouvidos as dores que volta e meia a incomodavam, elas sempre diziam tanto sobre ela mesma.

E não havia nada de ruim em se dar ao trabalho de escutá-las.


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Notas finais do capítulo

Maka deveria usar capacete para andar de moto, Stein deveria parar de fumar- e como assim ele conseguiu ter um bebê com a Marie!?

Acreditem, isso aconteceu de verdade (só não seio sexo da criança mas tendi para uma menina, grlpwr) e realmente, Chrona conseguiu "vencer" o Kishin, se é que aquilo pode ser considerado como vitoria, depois desse embate a lua ficou negra. Não dou mais spoilers ((a Maka lecionando é um headcannon meu, lol)), vão ler o mangá!!

E bem, estou meio incerta com essa oneshot, mesmo depois de quatro anos ainda fico meio nervosa mas quando termino de lê-la bate uma sensação de orgulho - ainda mais pelo beijo adicionado ao fim.



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