A besta que habita em nós escrita por HadassaDermoh
Notas iniciais do capítulo
Olá, pessoinhas!
Bem, depois que escrevi esse capítulo, passei o dia pensando se deveria postá-lo ou não. Quando li novamente, percebi que ele esclarecia bastante coisas sobre a história e quem gosta de teorizar, certamente terá bons elementos para tentar compreender um pouco os membros da família. Hoje quem narra é a Bethânia e sobre o seu ponto de vista, as coisas podem ficar um ponto mais transparentes.
Boa leitura!
14 de abril de 2019 – Bethânia Alencastro
Como explicar ao homem que eu amo, que não sou uma boa pessoa? Essa pergunta me assombrava desde que conheci Augusto. Ele era tão gentil, carinhoso e inocente. Como ele reagiria se soubesse quem eu era ou quem era a minha família? Iria me abandonar como todos os outros homens que já tive. Não seria assim novamente. Se Jorge queria chegar ao fundo do poço, o problema era dele, eu não iria junto. Não era egoísmo da minha parte, já me sacrifiquei muito por ele e sentia-me frustrada por saber que tinha sido em vão. Jorge jamais superaria o passado e isso afundava sua alma cada vez mais. Mas esse tormento acabaria.
Observei novamente a aliança sobre meu dedo anelar, finalmente noiva! Nossa família era fadada a ser solitária, com exceção de Nei que ainda se casou e ironicamente havia sido morto pela esposa. Amor Traiçoeiro. Nada do que meus irmãos viveram, eu precisaria viver. Fugiria. Era minha única chance de permanecer viva e feliz. Augusto concordaria comigo, não precisava necessariamente explicar os detalhes do que ocorria com os Alencastro, bastava apenas, fazê-lo compreender que eu não era feliz ali. Jorge não permitiria que eu partisse, eu sabia demais sobre ele. Sobre os crimes dele. Peguei o celular em cima da mesa e decidi fazer aquela ligação. Estavam todos ocupados demais, ninguém perceberia o que eu estava tramando.
Após digitar o número que uma conhecida havia indicado, esperei para ser atendida. Não demorou muito e ouvi uma voz masculina do outro lado da linha. Sabia exatamente o que pedir a ele – Por favor, pode marcar um encontro para o próximo horário disponível?
— Temos um horário vago às 15 horas no dia 16, próxima terça-feira. Está bem para a senhora?
Ouvi passos no corredor e imaginei que alguém podia chegar a qualquer instante, apressei-me com a resposta – Sim. Está perfeito, obrigada! – Desliguei o celular e vi Ibelza se aproximar.
— Precisamos conversar – Ibelza mantinha o semblante sério e preocupado, ela queria me convencer que o noivado era um erro.
— Sobre?
— Não pode se casar – Ela sentou-se na cadeira de madeira – Temos problemas, você não percebe?
— Os problemas são do Jorge – Sorri a contragosto – Ele que resolva sozinho!
Estava prestes a sair da cozinha e ignorar totalmente as perguntas da minha irmã, quando ela me lembrou de o porquê eu estava no cômodo – Não vai levar o almoço de Elizabeth? – Direcionei o meu olhar para a bandeja sobre o fogão – Sim, já estava indo.
Peguei a bandeja sem a mínima vontade, meu desejo era que aquela garota jamais tivesse nascido e se eu pudesse matá-la de fome, faria.
— Beth, não se esqueça – Ouvi Ibelza se pronunciar com aquele tom nostálgico que usava sempre que pretendia persuadir alguém – Você encobriu o que houve na clareira – Senti ela se aproximar das minhas costas – Encobriu o que acontecia quando o Nei bebia demais – E então ela sussurrou friamente – Encobriu o verdadeiro assassino de Rodrigo – Estremeci com suas palavras, nunca era bom relembrar – Todos nós cometemos erros e todos nós, encobrimos eles. Nunca se esqueça disso.
Era uma ameaça. Deveria me preocupar ao máximo com isso. Suspirei pesadamente. Parecia que tinha me faltado todo o ar – Não se preocupe Ibelza, papai nos ensinou muito bem a guardar segredos – Saí de sua frente e caminhei em direção ao porão. Comecei a sentir dor na cabeça e imaginei que fosse pelo estresse que estava vivendo.
Descer aquelas escadas era sempre algo assustador. Aquele quarto no porão era recheado de cenas impróprias que éramos obrigados a assistir na infância. Uma casa tão velha e com tantas memórias que pareciam recentes. Toda vez que descia os degraus, lembrava-me de uma vez, quando eu devia ter uns 12 anos e algo perturbador ocorria no local.
— Eu não quero fazer isso! – Jorge implorava entre lágrimas – Não é certo.
— Claro que você quer – Nei sussurrava – Todo homem precisa fazer isso! É uma tradição!
Espiar pela porta sempre havia sido o meu forte e daquela vez não estava sendo diferente. Perguntava-me o que eles estariam aprontando? Meninas não podiam descer lá, mas eu não era como as outras meninas covardes.
— Você nunca vai poder contar para ninguém o que acontece aqui – Nei segurava o braço do mais novo com força, podia notar pela expressão dolorosa de Jorge – Se você contar, vão rir de você e te chamar de mulherzinha.
Acabei desequilibrando sobre a porta, fazendo um barulho alarmante. Só então percebi com os olhos arregalados, que os meninos estavam pelados no quarto.
Talvez na época, aquela cena não fizesse sentido e Nei havia feito eu prometer que não contaria nada á ninguém. Com o tempo, cresci e amadureci, percebi com remorso os abusos que ocorria entre os garotos. Jorge nunca mencionou nada sobre isso e quando ousei perguntar, ele disse não se lembrar de nada. Não insisti. Hoje arrependo-me amargamente de ter seguido as vontades de Nei, se eu tivesse contado, tudo poderia ter sido diferente. Para melhor. Voltei para o meu dever e destranquei a porta, com um pouco de dificuldade por estar com a bandeja em mãos. Entrei no quarto e ouvi o barulho da água vindo de um canto do cômodo. Não havia um banheiro ali, mas tinha um chuveiro e um pequeno box e o sanitário, protegidos por um biombo. Devia ser horrível. Deixei a bandeja sobre a cama e peguei a que havia levado o café da manhã. Prestes a sair do quarto, ouvi Elizabeth.
— Espera Bethânia! – A garota havia desligado o chuveiro, ainda estava ensaboada e enrolada em uma toalha – Se não for abusar muito, poderia me trazer novos livros pela noite?
Acenei positivamente com a cabeça. Não negaria livros a Elizabeth, talvez esses fossem ser os últimos que ela leria.
— Você conheceu alguém? – Fiquei surpresa com a sua pergunta. Elizabeth aproximou-se como um ratinho medroso. Estava preparada para qualquer ataque dela.
— Sim – Respondi não conseguindo esconder a felicidade momentânea em meu rosto, pelo menos algo de bom havia acontecido na minha vida sem graça.
— E ele sabe? Sabe o que acontece entre nós? – Ela desejava que eu ficasse mal com suas perguntas, que eu lembrasse que mentia para Augusto. Elizabeth iria tentar me manipular usando-o ao seu favor, mas eu estava pronta para sua dúvida. Sorridente, respondi sua pergunta – Não te interessa, garotinha.
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E então, alguma ideia de como Bethânia pretende sair de vez da mansão? E Elizabeth? Por que ela ainda não tentou fugir?
Beijos, até o próximo capítulo!