Orquídea Vermelha escrita por Mrs Jones, QueenOfVampires


Capítulo 11
I'm Gonna Find And Kill That Bitch


Notas iniciais do capítulo

Hey, people! Mais um capítulo para vocês, esperamos que gostem e aguardamos comentários! Boa leitura!



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 Poucos dias após começarem a cuidar de Cornélia apropriadamente, ela finalmente apresentou melhoras. A infecção diminuiu e a febre passou a ceder, de forma que ela já conseguia se manter acordada, pelo menos para reclamar de algo ou de alguém.

Barba Negra estava mais calmo, como se tirasse um grande peso das costas, sentia que podia voltar a focar toda sua energia em encontrar Delilah. Ele só precisava que seus informantes retornassem de Tortuga, não esperava que levassem tanto tempo mas não queria acreditar que algum grave imprevisto tivesse acontecido para atrasá-los.

Por sua vez, Killian estava aprendendo a ler e escrever com Lady Elisa, assim como ela estava avançando em suas aulas de luta com espadas. Além do mais, a mudança no comportamento deles era bem visível. Elisa se tornara mais confiante, até seu caminhar emanava poder. Já o jovem cozinheiro se pegara várias vezes escrevendo sílabas e palavras desconexas em pedaços de pergaminho pelos cantos da Torre.

— Vocês estão estranhos… - Cornélia comentou, olhando de um para outro enquanto tomava sua sopa sentada na cama.

Killian e Elisa se entreolharam, eles não queriam falar nada para a ruiva ainda, queriam que fosse uma surpresa. Mas Cornélia odiava surpresas, ou que guardassem segredos dela, ou que agissem como se soubessem de algo que ela não sabia… Todas as variáveis que envolviam ela ser deixada de lado de alguma situação.

— Não faço ideia do que está falando… - Killian deu de ombros - Mas a senhorita passou um bom tempo apagada, é normal que estranhe algumas coisas. Mais de um mês, Cornélia.

— Me poupem. - ela revirou os olhos - Eu quero saber quando poderei sair dessa cama.

— Quando tiver forças para se manter em pé sozinha, claro. - Elisa foi até ela - Passou muito tempo aí.

— Que seja! Espero retornar à ativa dentro de uma semana - ela exibiu sua clássica expressão de superioridade -, isso aqui deve ter virado um ninho de baratas tontas na minha ausência… 

— Cornélia, nós ainda temos um Capitão e um Imediato - Elisa a censurou com o olhar rígido que uma mãe ofereceria à filha - É claro que as decisões de ambos já não são as mesmas sem a sua influência, mas estamos sobrevivendo. 

— Se eu não fosse seu pai, levaria para o lado pessoal - Barba Negra estava parado à porta, os braços cruzados às costas, com uma expressão carrancuda que era só de brincadeira. Ele foi se sentar aos pés de Cornélia, dando tapinhas nas pernas da ruiva - Sossegue, está tudo sob controle! O cozinheiro ainda não explodiu a cozinha, Elisa ainda não perdeu a cabeça e, bem, eu ainda sou eu. 

— A diferença é que o cotidiano ficou menos apimentado sem a sua presença - Killian deixou escapar, até notar a exasperação da moça. Barba Negra arqueou uma sobrancelha e Lady Elisa soltou um risinho - Ei, eu não quis dizer… Vocês me entenderam!

Elisa fez um gesto significativo com a cabeça, comunicando ao rapaz que era hora da lição de leitura.  

— Acho conveniente nos retiramos, antes que a Cornélia se erga para arrancar a sua cabeça. 

Quando os dois se foram, Cornélia exclamou consigo mesma. 

— Eles estão aprontando! E algo me diz que não é coisa boa… 

Talvez, por resistência, ela pensasse que esse algo envolvia o segredo da estufa. Mataria a ambos se revelassem a informação, mas, no fundo, também sabia que a sua desconfiança tinha uma ponta de ciúmes. Até então, Elisa fora sua única amiga. Ela simplesmente não ia permitir que um homem se pusesse entre elas. 

— Não se preocupe - disse o Barba em ar de troça - O Killian não é interessante para a Elisa, ela sonha com um príncipe encantado. 

— Não me importa, eles que se fodam! Só não quero que essa desmiolada ingênua caia no conto do vigário… Enfim, o que o senhor tem para me reportar? Quais foram os lucros do último mês e o que tem sido feito? 

— Cornélia… não há com o que se preocupar. Smee e eu damos conta. Não há nada de incomum acontecendo… - ele soltou um longo e forçado suspiro - Estou entediado! A minha vida anda mórbida e infeliz sem a sua presença radiante no meu convés.

A ruiva tentou conter uma gargalhada, mas acabou emitindo um ruído estranho. Ainda não se dera conta de que sentia falta das explosões dramáticas do pai. Naquele momento, daria tudo de si para caminhar entre aqueles ratos imundos, berrando ordens e oprimindo marinheiros sem-vergonha. 



Mais alguns dias se passaram e, para a alegria do Capitão, seus informantes haviam retornado. Ele mal deixou que os homens atracassem direito e já foi questionando o motivo da demora.

— Pegamos uma tempestade na ida, atrasamos dois dias. - o jovem marujo que tomou a frente da expedição relatou - E encontramos dificuldades para conseguir as informações que o senhor queria, capitão.

— Mas conseguiram? 

— Sim.Bom, com certa dificuldade… A Delilah é cuidadosa, foi quase impossível reunir informações… Um velho em Tortuga me disse que ela foi para Aruba. Disse que ela andou se gabando de ter intenção de saquear um galeão venezuelano… 

— Um galeão venezuelano? - repetiu o Capitão 

— Sim, Capitão. Delilah tem intenção de saquear esse navio, pois soube que transporta um tesouro de grandes proporções. Ela está na trilha desse galeão… 

— Hum… Bom… 

— Mas, Capitão, eu soube de outras coisas - disse um segundo marujo - Uma prostituta de Tortuga me contou, que soube de um pirata inglês, que ouviu de um comerciante, que um navio pirata foi visto na rota do Golfo do México...

— E o que há de tão especial sobre esse navio? Navios vêm e vão… Eu também estaria no México, se não tivesse negócios por aqui. Ouvi dizer que há muitos haréns por lá… - ele pigarreou, balançando a cabeça - Enfim, acho que temos de nos mover rápido! 

— Mas, Capitão… 

— Ah, você tem que rever o que anda ouvindo das prostitutas… Nós vamos tomar a rota de Aruba. Delilah não me escapa! 

— Sim, senhor. - o marujo assentiu antes de seguir o capitão de volta para a Torre.

Enquanto ordenava que o resto da tripulação se organizasse para seguir pela América do Sul caçando Delilah, Barba adentrou o salão principal a fim de colocar Smee a par da situação, quando viu Cornélia subindo tranquilamente as escadas.

— Mas o que está fazendo fora da cama?! - ele exasperou, indo rapidamente em direção a filha.

— Vivendo? - ela ergueu uma sobrancelha ao se virar para ele.

— Você ainda está se recuperando, trate de voltar para o quarto agora mesmo. - ele a segurou pelo braço, mas ela se desvencilhou.

— Não! Eu estou cansada daquele quarto e estou bem, pronta para voltar ao trabalho, inclusive… - rodopiou no lugar e desceu até onde os marujos recém chegados se encontravam - Podem começar a falar, o que descobriram?

— Cornélia! - Barba desceu atrás dela - Você não deve se esforçar…

— Fale logo, verme inútil! - ela ignorou o pai.

O pobre homem engoliu em seco, recebendo um olhar de advertência do Capitão, de que não deveria dar a ela nenhuma informação. Mas nada era mais assustador do que a expressão da ruiva, como se seu olhar pudesse cortar-lhe o pescoço se esgotasse sua paciência.

— Delilah foi para a América Latina! - o marujo falou de uma vez - Saquear.

— E? 

— É isso…

— Não. Isso é muito vago! - ela fez um gesto de desleixo com a mão - O que mais você tem?

— Bom, uma prostituta de Tortuga me contou, que soube de um pirata inglês, que ouviu de um comerciante, que um navio pirata foi visto na rota do Golfo do México…

— ISSO É IRRELEVANTE! - Barba jogou os braços para cima - PELO AMOR DE DEUS, HOMEM!

— Calado, Capitão! - Cornélia revirou os olhos e se voltou para o homem - O que falaram desse navio no México? Detalhes?

— Uma bandeira vermelha… Atracaram para furtar as rotas comerciais.

— É ela! - a ruiva ergueu o dedo - É ela! Não está em Aruba coisa nenhuma…

— O quê? Vai mesmo levar a sério a informação de uma prostituta? - Barba cuspiu ao mencionar a moça.

— Ué, quem garante que a pessoa que deu a informação de Aruba é mais digna que uma prostituta? - Cornélia deu de ombros - Eu vou para o México.

— Eu vou para Aruba. - o capitão cruzou os braços.

— Ótimo, boa viagem! Quando se der conta de que foi enganado, encontrará meu navio atracado em Vera Cruz.

— Que navio?!

— O que eu vou arrumar, pode ir com o seu.

E dizendo isso, ela voltou a subir as escadas e foi se preparar para zarpar. O Capitão a acompanhou com o olhar, ainda descrente de que ela iria realmente sozinha para o México. De fato, a ficha só caiu para Barba Negra quando o sol raiou e ele se deparou com um navio capenga ao lado do seu e parte de sua tripulação consertando as velas.

— MAS O QUE SIGNIFICA ISSO?! - ele foi até o local sacudindo o dedo na direção do navio.

Os tripulantes se olharam, apreensivos, mas antes que o homem os atacasse, a ruiva surgiu no convés, jogando vassouras e esfregões para os outros.

— Eu te disse que ia conseguir um navio. - ela deu de ombros - Tem vários deles na parte de trás da ilha! O senhor está se tornando um velho acumulador, rouba tantas coisas que não precisa que nem lembra mais o que tem! 

— Você não pode ir, Cornélia! - ele subiu a rampa marchando com tanta raiva que quase partiu as pranchas ao meio com a força de seus pés - Está se recuperando! Além do mais, quão longe acha que pode ir com uma dúzia de gatos pingados? Nunca comandou um navio sozinha antes!

Cornélia, que estava ajudando a organizar o navio, encarou seu pai por alguns segundos sem parar o que estava fazendo.

— Sabe que não importa o que diga, não é? - ela perguntou calmamente - Tentar diminuir minha capacidade, tanto física quanto mental, só vai me fazer querer ir mais ainda.

— Por favor, Cornélia… - ele suspirou - Eu quase te perdi uma vez.

— O senhor poderia ter me perdido muitas vezes! Não é como se vivêssemos uma vida pacata! Todo momento lá fora pode ser o último, não importa se estou com o senhor ou não. E se puder me dar licença, eu preciso ir.

Ela passou por ele para ajudar Lady Elisa que estava embarcando com suas coisas e Killian logo atrás carregando o baú da moça.

— Não me digam que estão corroborando com isso! - ele apontou para os dois.

— Capitão… - Lady Elisa foi até ele - Sabe que no fundo não temos escolhas, ela iria conosco ou não. Não é melhor que estejamos lá para cuidar de Cornélia?

E ao ver que não teria a menor chance de convencer alguém, Barba Negra se retirou do pequeno navio, bufando e batendo os pés como uma criança birrenta.



Com a imagem de Nova Providência sumindo no horizonte, uma tripulação minúscula e velas mais frágeis que um lenço de papel, Cornélia seguiu seus instintos para sua primeira aventura comandada apenas por si. 

O mar estava calmo, de fato que ela podia confiar o leme para um dos marujos ao anoitecer, já que Smee nunca iria contra seu Capitão, ele foi o único que ela não conseguira dobrar. 

A jovem foi tomar seu chá antes de se recolher para dormir, quando Killian entrou na pequena cozinha, dando um sorriso de canto de boca ao vê-la.

— Você está me seguindo por acaso? Não é comum alguém passar tanto tempo numa cozinha. - Cornélia questionou enquanto Killian sentava no banco à sua frente.

— Bom, eu sou o cozinheiro, é perfeitamente normal que eu passe muito tempo numa cozinha… - ele ergueu uma sobrancelha e a encarou - O que não é normal é a senhorita passar tanto tempo em uma. É um costume antigo ou algo adquirido nos últimos tempos…

— Não ouse sugerir que estou aqui para vê-lo. - a ruiva praticamente rosnou a fim de interrompê-lo.

Killian ergueu as mãos em rendição devido ao tom agressivo de Cornélia, ele a observou desviar o olhar e tomar mais um gole de seu chá.

— Posso fazer uma pergunta? - ele indagou após alguns segundos em silêncio.

— Hum? - ela apenas murmurou o indicando que prosseguisse.

— Eu já entendi que não quer se casar com nenhum dos homens que seu pai encontra por aí porque não os considera dignos… Mas o que seria um homem digno para a senhorita?

Cornélia surpreendeu-se com aquela pergunta, era certo que Killian sempre a surpreendia com sua capacidade de conseguir iniciar uma conversa sem parecer um palerma. Principalmente nos últimos tempos em que esteve presa em uma cama e ele era um dos poucos seres pensantes que podia ter algum tipo de interação.

— Bom, não pense que eu estou esperando o homem perfeito… - ela levantou-se e foi em direção à chaleira no balcão para pegar mais chá, retornando à mesa com uma xícara extra e a entregando para Killian - Até mesmo porque, se existe uma raça que está o mais longe possível da perfeição, é a raça humana.

— Obrigado. - ele tentou esconder a surpresa diante daquela gentileza.

— Veja bem, cozinheiro… Eu estive com muitos homens durante minha vida… E algumas mulheres.

Nesse momento Killian engasgou-se com o primeiro gole do chá e precisou de um bom tempo para recuperar o fôlego em meio às tosses. Cornélia revirou os olhos e foi até o homem para dá-lhe bons tapas nas costas para que ele se recuperasse mais rápido.

— Desculpe-me, eu apenas me surpreendi… - ele enxugou uma lágrima que escapou - Mulheres?

— Sim, algum problema? - ela perguntou simplesmente, retornando para seu lugar.

— Não mesmo, pode continuar. - ele assentiu, ainda mais curioso.

— Bom, eu notei uma série de coisas. Eu conheci homens que eram realmente interessantes, que conversaram comigo, que se interessavam no que eu tenho aqui - ela apontou para a própria cabeça - e não pelo o que eu tenho aqui! - e apertou os próprios seios sem qualquer cerimônia, fazendo com que Killian ficasse levemente constrangido pela falta de filtro da ruiva, ele ainda não se acostumara com aquilo - O problema é que eles não me despertavam atração alguma. Eram sempre escritores, artistas, sensíveis, deprimidos… Isso não me atrai. Por outro lado, me atraí por homens que não cheguei a trocar sequer uma palavra, porque eles eram o que meu corpo queria… E isso me incomoda um pouco.

— Como assim?

— Meu corpo muitas vezes sente atração por pessoas vazias. Por homens que… Não são nada, não são interessantes e a maioria não conseguiu me satisfazer… São muito egocêntricos e primitivos para lidar com uma mulher, é quase um crime.

Killian estava começando a se sentir ofendido e desconfortável com o rumo da conversa mas ao mesmo tempo estava verdadeiramente interessado no ponto de vista de Cornélia, ele apreciava a ouvir falando, era algo muito raro, era único e ele estava começando a se apegar à ideia de realmente conversar com ela.

— E é aí que entra a parte das mulheres… - ela tomou um gole de seu chá e aproveitou para analisar a expressão de Killian antes de prosseguir, ele estava com o olhar fixo nela e parecia estar prestes a explodir, Cornélia achou divertido - É difícil que eu me sinta atraída por uma mulher, mas acontece… O problema é que elas são muito oprimidas, é difícil conquistá-las… Mas eu gosto da parte de seduzir também. 

— Imagino que seja mais fácil achar mulheres com quem possa conversar e se sentir atraída, certo? - ele sugeriu.

— Errado. Elas são tão oprimidas que muitas sequer abrem a boca, se sentem oprimidas até por outra mulher! E se quer saber, isso me assusta um pouco… - seu tom de voz diminuiu - Elas acham que não são nada se não objetos sexuais. Elas não se importam em receber prazer, elas mal se mexem… É doentio e é por isso que raramente eu me envolvo com mulheres, eu não quero ir para cama com alguém que não me quer… No que isso me diferenciaria dos homens que existem por aí?

Killian sentiu o peso das palavras de Cornélia, pela primeira vez ele aceitou um argumento dela e concordou conscientemente.

— Mas você já encontrou alguma que estivesse disposta a se envolver com você?

— Algumas… - ela deu um meio sorriso - E foi muito bom, se quer saber. É diferente, é generoso… Mas não é real, porque para elas é errado! É só uma aventura. Diferente dos homens que fogem no dia seguinte por medo de compromisso, elas fogem por vergonha do que fizeram.

— Senhorita… Já que duvida que existam homens decentes, se por acaso encontrasse uma mulher como você… Ficaria com ela?

Um silêncio se instalou por alguns segundos, Cornélia respirou fundo para pensar na pergunta, nunca havia considerado aquela hipótese antes.

— Não existe… - ela parou por um segundo, como se tivesse um clique na sua mente - Não existe uma mulher como eu, pelo menos não que vá me despertar algum tipo de interesse romântico. São tempos estranhos, eu não sei se no futuro nós vamos ser livres… Eu não sei se um dia fomos! 

— Eu entendo. - ele engoliu em seco, nunca tinha pensado dessa forma - E nunca existiu um homem que fosse capaz de sustentar um diálogo e mesmo assim atraí-la? 

A ruiva o encarou profundamente antes de responder. Porque há pouco tempo atrás, a resposta viria rápida e sonora, um perfeito “não”. Mas naquele momento, ela não tinha certeza.

— Não… - ela desviou o olhar - Mas me deixe perguntar, Jones, você já encontrou alguma mulher que fosse diferente para você? Ou homem, eu não julgo…

— Não! - ele ergueu as mãos, se sentindo completamente ofendido pela sugestão - E eu nunca encontrei uma mulher que me fizesse sentir algo a mais, por assim dizer, pelo menos era como meu pai se referia à minha mãe… Aquela que o fez sentir algo a mais.

— Como é possível que vocês, homens, não fiquem constipados com seus próprios sentimentos? - ela riu - Tão frágeis, vivendo em negação…

Naquele ponto, algumas frases perderam o efeito ofensivo em Killian, aquela era uma delas, a menção à masculinidade frágil, porque ele começou a ver o sentido e concordar. Não disse nada, porém. Se limitou a virar o resto do chá e, enxugando a boca, desviou o assunto. 

— Bem, eu mencionei os meus pais e fiquei curioso: como foi que o famoso Barba Negra conquistou o coração da sua mãe? 

Cornélia notou a estratégia de desviar a atenção de si mesmo, mas se comportou com indiferença. 

— Ora, ele era um pirata! O marido dela era um babaca fardado da Marinha. Imagino que ela fosse reprimida por ele… - ela suspirou, indignada - Meu pai não costuma comentar o assunto, mas eu sei umas poucas coisas que ela me contou quando eu era mais nova. Certa vez, ela saiu ao convés para tomar ar. O navio atracado ao lado era o de meu pai, mas eles estavam disfarçados como burgueses. O marido dela, Robert, estava trancado na cabine há horas, fazendo seja lá o que fosse. Ele não era um marido atencioso… Eu quero dizer, não acho que era… do contrário, ela não o teria abandonado por um pirata, imagine só… 

— Piratas são mais intrigantes - sorriu Jones. 

— Eu também acho. Mas ela era comportada, teve uma educação impecável. Sempre que eu penso na vida passada dela, a vejo como uma versão de Lady Elisa. Enfim, em todo caso, naquela noite ela avistou meu pai. Disse que ele estava lá no navio, como quem não quer nada. Não sei o que foi que o denunciou, apesar de o meu pai não ser nada sucinto. Ela sabia que se tratava de um pirata, mas escolheu não contar a Robert. O resto você já pode imaginar… 

Killian estava rindo, pois Cornélia estava fazendo cara de quem não suportava uma melação romântica. 

— Ah não, você vai ter que contar. Vamos, essa parte é importante! 

— Ai, está bem! - ela bufou - Na manhã seguinte, os dois cruzaram no porto. Ela tinha uma dama de companhia… imagino que foi daí que o meu pai tirou a ideia de contratar Elisa… Bom, ela me disse que os dois trocaram olhares e que se interessou pela barba dele… Ugh! Nunca vi coisa mais cafona! Então, ela dispensou a dama e deixou cair um lenço - Cornélia revirou os olhos com afetação, o que fez o cozinheiro segurar o riso. 

— Você tem de compreender que é assim que as damas respeitáveis flertam… 

— Cale a boca e me deixe continuar! Por fim, meu pai pegou o lenço. Eu imagino que Robert devia estar mesmo muito ocupado, porque o que aconteceu em seguida foi que os meus pais fugiram para um bordel qualquer… Eu sei o que está pensando, não ouse me interromper, cozinheiro! - ela afastou os cabelos do rosto suado - Ah sim, eu pensei nessa possibilidade… Não acho que foi nessa noite que eles me fizeram. Enfim! Eles se apaixonaram, blábláblá, ela largou o Robert e fugiu com os piratas! 

— Hum. Eu entendo que o seu pai tem uma presença e tanto, mas Robert devia ser um completo boçal para ser trocado dessa maneira. 

— Ah sim, ela era infeliz! Ela teve uma criação conservadora e voltada para o marido. Era o que eu estava dizendo antes, uma enorme gama de opressão… Mas, bem, o Robert não deixou barato. Tão logo descobriu o que ela fizera, perseguiu meu pai até o inferno! Ele jurou que mataria os dois, mas não foi o que aconteceu, como você bem sabe. 

— E o que aconteceu com ele?

— Foi humilhado umas duas vezes pelo Barba Negra, perdeu muito em seus conflitos, ele não tinha o que era necessário para manter uma mulher, quem dirá para comandar um navio e uma tripulação contra piratas. Faz anos que ninguém escuta falar de Robert Maynard, deve ter se aposentado e vive escondido, com vergonha do próprio fracasso, ou… Seguiu em frente.

— É uma história adorável! - o cozinheiro se ergueu levando as xícaras - Estou com um pouco de inveja. 

— Por que, cozinheiro? Quer se apaixonar por uma dama também? Lady Elisa parece ter uma quedinha por você… 

Jones sorriu para a parede: achava que Cornélia tivesse deixado transparecer ciúmes. Não se fez de rogado e fingiu surpresa. 

— Lady Elisa? Não sei do que está falando! Em todo caso, achei que estivesse preocupada com Delilah, a minha vida amorosa não lhe importa, não é? 

— Nem um pouco - respondeu ela, frígida - Bem, não estou com tempo para contar histórias, tenho mais o que fazer! 

De volta ao convés, Cornélia verificou se os marujos faziam suas respectivas tarefas. Apesar de estar com uma tripulação reduzida num navio que parecia uma banheira velha, ela percebeu que estavam dando conta. Talvez não estivessem preparados para enfrentar Delilah, no entanto. Havia uma série de consertos a serem feitos e ela certamente exigiria mais deles. Talvez precisasse exercer sua tirania, mas era necessário. 

 Lady Elisa se aproximou querendo saber o que fariam em seguida. Cornélia parecia irritada sem motivo, mas era de se imaginar que seus ferimentos ainda doessem e a azucrinação de terem que lidar com Delilah era razão suficiente. 

— Eu preciso de um Imediato - a ruiva estava balançando a cabeça. Elisa arregalou os olhos: não imaginava que ainda fosse ver Cornélia pedindo ajuda - Não me olhe assim! É óbvio que eu não posso capitanear um navio sozinha. Tem de ser você ou o cozinheiro… Não estou certa de que posso controlar meu gênio diante do urubu, então… 

— Cornélia, eu só sei fazer coisas que fui ensinada a fazer. Killian, quero dizer, Jones devia ser o Imediato. Eu assumo a cozinha! 

A moça fez meio caminho em direção ao andar de baixo, mas Cornélia a agarrou pelo braço magro. 

— Não, senhora! Eu estou disposta a ensinar. Mas que merda, elas não conseguem se afastar do papel imposto a elas! 

Elisa ia dizer que Jones, sendo mais experiente, teria melhores meios de ajudar. Mas achou que, como parte de sua evolução, devia aceitar o desafio. Imaginava que Cornélia fosse gritar com ela sempre que fizesse algo errado, mas era tão melhor vê-la berrando aos quatro ventos a estirada numa cama. Além do mais, Elisa devia isso a ela. 

— Bem, está bem! - ela assentiu, livrando o braço do aperto firme de Cornélia - Vou me afastar do papel imposto a mim! Seja lá o que eu tiver que fazer, espero que não seja arriscado. Você sabe, eu quase a matei… 

— Elisa… 

— De qualquer modo, já vi como você faz. E eu não vou berrar com ninguém. 

— Desde que saiba se impor, não me importa como faça. Chegou a hora de as mulheres retomarem o poder. Durante o tempo em que fiquei dormindo, esses palermas devem ter se achado os donos do mundo! Como vê, não posso contar com nenhum dos desmiolados para um cargo de tanta importância. 

Elisa riu, seus cabelos um tanto alvoroçados pelo vento forte que açoitava as velas acima. 

— Eu não sou boba, sabe. Você só está dizendo isso para que eu não tenha outra opção. Em todo caso, fica por sua conta e risco. Se confia em mim para a função, estou feliz em aceitar o cargo. 

— Ótimo! - Cornélia assentiu com um sorriso contido. Por dentro, queria pular de alegria, mas não deixaria à vista sua pretensão em mudar Elisa. 

Como primeira ordem, exigiu que ela cobrasse dos marujos o relatório completo da embarcação. Já conseguia prever que espécie de investimentos teria de fazer no navio, mas quis manter Elisa ocupada. Dali a pouco, Killian subiu para o convés. Ficou surpreso ao descobrir que a jovem lady ganhara um cargo. 

— E quanto a mim, capitã? O que vai ser? - indagou polidamente. 

Cornélia retomara o leme, que manejava com maestria enquanto mantinha o olhar rígido e atento no horizonte. 

— Você é o cozinheiro! Quando muito, artilheiro, mas eu duvido que tenhamos de entrar em combate - ela lançou um breve olhar ao homem antes de continuar - Eu vou encontrar e matar aquela vadia, mas ela não vai nos arruinar nem um fio de cabelo. Isso eu garanto! 

— Confio em você, Cornélia - ele piscou para ela, mas a ruiva sequer percebeu - Qual é o plano?  

— Ela é boa demais para uma armadilha… Vou precisar de um pacto com o diabo para encontrá-la. - a ruiva começou a andar de um lado para o outro, encarando o chão enquanto sua mente trabalhava, até que lhe veio uma luz e ela parou de frente para Killian.

— O que foi? - ele questionou e, quase como um estalo, pareceu acompanhar a linha de raciocínio de sua nova Capitã - Quer que eu seja o diabo, não é?

— Quero. - ela sorriu - Ela gostou de você. Pode se infiltrar facilmente, os palermas que a seguem não são muito espertos, não irão desconfiar se inventarmos uma boa história…

— E o que seria uma boa história? - ele cruzou os braços - Abandonei a tripulação do Barba Negra, me joguei no primeiro navio xexelento que encontrei e fui parar numa rota comercial à procura de abrigo?

— Garoto esperto. - ela deu dois tapinhas leves no queixo dele - É exatamente isso aí. Desenvolva e vai conseguir dobrar a minha irmã.

— É, pelo menos uma eu consigo conquistar. - ele falou em tom de brincadeira, mas a ruiva simplesmente ignorou.

— Não fique se achando… - ela o empurrou levemente com o ombro - Não precisa de muito para conquistá-la, ela não tem critério algum.

— No entanto, você parece preocupada que talvez minha conversa não a convença. - ele retribuiu o gesto.

— Ela não é burra. Mas se você falar as coisas certas, ela vai cair aos seus pés. - Cornélia sussurrara no ouvido dele, tão próxima que ele escutava seu coração bater. Quando a ruiva apoiou uma mão em seu peito, Jones achou que fosse morrer - Seja criativo… 

Antes que tivesse alguma noção do que estava fazendo, Killian soltou um grunhido baixo. Cornélia se afastou, sem esboçar reação. 

— Isso não funciona comigo, mas valeu à tentativa. Agora suma da minha frente! Não estou vendo as panelas cozinhando sozinhas. 

— Cornélia, o que foi isso que eu presenciei? - Elisa testemunhara a ação à distância e agora estava com os olhos arregalados - Você finalmente deu brecha para o Jones?

— Não seja tonta! Eu quis dar uma motivação a ele, para que saiba o que fazer com a Delilah.  

— Delilah?! Cornélia, ela o mataria se soubesse que se trata de uma armadilha! 

— Eu não o mandaria fazer isso se não confiasse na maldita lábia desse cozinheiro. Jones vai transformá-la num cachorrinho adestrado. Ele queria um cargo, pois então, vai ser um infiltrado. 

Elisa apenas assentiu antes de continuar suas tarefas. Naquele momento, eles eram tudo com o que Cornélia podia contar, e na luta contra Delilah, venceriam os mais astutos. 

 


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Notas finais do capítulo

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