O moreno e a rosada se olhavam de maneira desconcertante. Mas sabiam que precisavam dizer algo, estavam na mesa do Uchiha após fugirem dos olhares e da fala da morena que acreditava fielmente que eles daquele lugar era a pior das heresias.

— Sinto muito - a fala vinha de Sakura - não queria que passasse por nada, não por minha causa.

— Não é sua culpa, ela mesma me chamou de aberração - a resposta dele a pegou de surpresa.

— Eu tenho síndrome de waardenburg - a jovem falou sem qualquer rodeio - é algo comum na minha família, uma das nossas inúmeras falhas genéticas, pensaram que eu estava a salvo por conta da minha mãe, não existia qualquer histórico na família, mas aqui estou eu - a risada sarcástica dela tentava mascarar tudo - você é legal e novo por aqui, não achei que precisaria explicar ou contar, mas as pessoas já falaram por mim.

Sasuke observava ela, a chamaram de defeituosa, acreditavam fielmente que é o que ela sempre foi. Um erro que não deveria estar ali, mas sim internada em qualquer lugar.

— Sou transgênero - respondeu fazendo ela o olhar - por isso a aberração, sou um homem trans.

— Você não é uma aberração, você é um homem e merece ser visto e tratado como tal - a rosada sorriu para ele.

— Você não merece sofrer por algo que nunca escolheu - falou a abraçando.

— Eu faço acompanhamento, uso aparelhos auditivos desde meus cinco anos de idade - a risada novamente sarcástica saiu e o moreno se perguntou como ela conseguia falar tão fria.

— Então é por isso que não conversa com as pessoas na faculdade? - a pergunta a fez arregalar os olhos.

— Sim, na primeira semana tive uma crise, não conseguia me olhar no espelho, meu aparelho havia quebrado e não conseguia escutar nada, não me sentia eu e então eu gritei com um dos alunos no meio da aula… - abaixou o olhar e apertou mais Sasuke que passou sua mão pelos fios rosados.

— Não precisa falar, mas agora está comigo - sorriu - se quiser lógico - complementou.

— Logico que quero!

Passaram os dez minutos que falavam conversando, Sasuke falou sobre sua situação familiar e a cada lágrima caia Sakura enxugava com o amor que daria ao seu irmão. A dor que sentia mesmo em situações diferentes, o ódio e o desprezo, eles conheciam bem.

…

Naquele momento o relógio bateu três horas, faltava apenas algumas horas para ir para faculdade. Naruto ainda não tinha saído de sua sala desde o início do almoço e para o Uchiha, precisava achá-lo. Não tinha qualquer encontro, reunião, saída daquele momento. Se voltou para a porta da sala e tratou de bater.

— Senhor Uzumaki? - não obteve qualquer resposta e suspirou começando a resmungar consigo mesmo, não poderia entrar na sala de seu chefe de qualquer maneira.

— Senhor Uchiha? - a voz atrás dele o pegou de surpresa, se virando rapidamente e observando o loiro que não tinha o melhor humor, ao menos parecia que não.

— Eu… - não sabia por onde começar, nem ao menos sabia se explicar.

— Quem atacou o senhor e a senhorita Haruno durante o almoço? - a pergunta pegou o moreno de surpresa.

— Não sei, não conheço, eu apenas… - desconcertado procurando um lugar para se esconder.

— Entendo, procure a senhorita Sakura e me dê a resposta, é necessário tomar eu providências até o fim só dia de amanhã - Naruto estava prestes a explodir, porém o moreno que o olhava não conseguia entender o motivo.

— Sim, senhor Uzumaki, obrigado - o loiro que já estava de costas para entrar em sua sala se virou.

— Não aceito nenhum tipo de preconceito aqui, o senhor está se mostrando um bom funcionário, não merece ser tratado dessa maneira.

Por fim, entrou na sala deixando um moreno surpreso e confuso para trás.

…

Para a surpresa da moreno, Sakura estava o esperando assim que desceu. Com os ombros encolhidos e o rosto inchado, sabia muito bem que tinha chorado, mas deixaria em paz quanto aquilo, ignorando sua situação. Era um tempo para ela. Ambos precisavam de um tempo pra si, mesmo com toda a dor e problemas, deveriam seguir em frente, ou ao menos demonstrar que conseguiram.

Sorriu para a amiga que retribuiu, ambos não sabiam o que falar. Exautos daquela situação, exautos se serem atacados, exautos de serem vistos como aberrações, ambos se sentiam inúteis quanto aquilo, mas principalmente exautos, exaustos apenas por serem quem são.

— O senhor Uzumaki pediu para que falássemos quem falou aquilo durante o almoço - Sasuke respondeu quebrando o silêncio e recebeu um suspiro em resposta.

— Hana, Inazuka é o sobrenome dela, todos a conhecem. Ela não é alguém com quem eu queira entrar em combate, não pelo meu emprego - respondeu em direção ao amigo - Eu preciso dele e ela vai tornar minha vida um completo inferno, ela é irmã de um dos melhores amigos de Naruto. Essa briga está perdida - foi franca e sem rodeios.

— Não entendo, então…

— Então vou fingir que nunca aconteceu, eu não luto, esse emprego é importante pra mim e essa batalha já está perdida - observava a amiga, conhecia aquele olhar, estava prestes a ter um crise de ansiedade, com isso apenas a abraçou, sem dizer mais nada.

…

Voltou para sua mesa depois que Sakura pediu para que voltasse dizendo que não deveria estar ali. Apenas concordou. Não queria que se tornasse algo maior, quando saíssem iria acompanha-lá. Não deixaria a amiga sozinha.

Sentiu um olhar sobre si e viu seu chefe o olhando, não entendia o porquê, mas correspondeu. Porém resolveu quebrar o silêncio que para o moreno era estranho e sem qualquer cabimento.

— Sou novo e a senhorita Haruno não viu quem estava falando, não sabemos quem falou - para sua surpresa recebeu um riso curto e sarcástico.

— Ela nunca sabe - sentiu o olhos azuis o analisando por inteiro - você é um péssimo mentiroso.

Com isso observou o entrando na sala, não entendia como, não entendia o porquê daquilo. Mas sabia quem para seu próprio bem, era melhor não saber.

…

Convencer Sakura a passar a noite em sua casa foi perturbador em sua concepção, mas conseguiu. Não conseguia nela sozinha, com tudo aquilo em sua mente. Conhecia bem o que uma mente destroçada, desvios químicos e uma chance conseguia fazer com alguém.

Assim que saíram na universidade conseguiram conversar de maneira tranquila pela primeira vez depois daquilo tudo. A caminhada foi tão calma e receptiva que por um momento esqueceram, apenas um momento conseguiram esquecer a dor passaram.

No momento que entraram no apartamento de Sasuke tiveram uma enorme surpresa, um alto e moreno rapaz saia do banheiro com apenas uma toalha enrolada em sua cintura que abriu o maior dos sorrisos ao ver que o morador do apartamento havia chegado. Correu para abraçá-lo mesmo ainda com o cabelo molhado.

O olhar de Sasuke era de confusão enquanto o de Sakura corria pelo corpo do moreno mais alto, os olhos da rosada se encontravam no abdômen do até então desconhecido para a jovem. Mesmo tentando desviar ainda olhava de maneira disfarçada, ou ao menos tentava.

— Sasuke? - a voz de Sakura chamou atenção de ambos.

— Bem… - a voz demonstrava preocupação, o Uchiha não entendia como por Buda aquilo foi acontecer.

— Prazer, Itachi Uchiha - falou o mais alto com uma breve reverência.