As Prattis escrita por fdar86


Capítulo 30
[Capítulo 29]




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— Onde vocês estavam? - Perguntara Mônica, ao ver Jéssica e Angelina entrarem rindo e distraídas na sala em direção à mesa para tomar o café da manhã.

Gabriela e Luísa, que estavam comendo de cabeças baixas e em silêncio, levantaram o olhar para encara-las, um pouco receosas, preocupando-se com a razão da pergunta proferida pela mais velha. Jéssica observara as duas e notara que Luísa exibia em seu rosto uma péssima noite de sono, com direito a acesso de raivas e choros incontidos.

Estivera tão feliz com a noite de paz que tivera com Angelina que esquecera-se por completo da confusão no dia anterior. De repente, a proposta de acampar de Angelina, que teriam adiado, lhe parecera mais do que nunca tentadora.

— Como assim? - Perguntara Jéssica, fingindo desentendimento, enquanto planejava o que dizer.

— Eu chamei as duas para tomar café e não obtive resposta.

— Ah! Não estávamos em nossos quartos. Acordamos cedo e decidimos dar uma volta pelo terreno. - Respondera, em disfarce, rindo sem graça enquanto olhava para Angelina em pedido mudo de apoio.

— Estávamos precisando de ar fresco. - Salientara Angelina, encarando Sra. Perez que agora estava de pé no canto da sala na frente do corredor que dava acesso para a cozinha, esperando que todos terminassem a refeição para retirar os pratos. Embora a governanta soubesse do acampamento, e possivelmente já até imaginasse que elas não teriam passado a noite em seus quartos, Angelina sabia que ela jamais as delataria, especialmente em meio à momentos tão conflituosos entre as irmãs Prattis.

Assim que Mônica tranquilizara-se por saber que estavam por perto, e sem perigos, desviara o foco de atenção para Luísa que teria abaixado a cabeça novamente evitando qualquer tipo de interação familiar, transparecendo a chateação. E a mais velha decidira por interromper o silêncio subsistente, acendendo assim um fósforo em uma imaginária refinação de petróleo familiar, que certamente provocaria uma explosão em massa.

— E então Luísa, você aproveitou a noite para pensar bem sobre sua viagem?

— Por Deus, Mônica! - Dissera Gabriela em voz alta, com um tom recriminador, e a mais velha se calara, comedindo-se. Mas já era tarde. O incêndio já teria se alastrado impiedosamente.

Luísa suspirara pesadamente como se fosse ficar sem ar a qualquer momento e a fuzilara com os olhos, transparecendo toda a sua zanga.

Reativa, Angelina segurara as mãos da jovem que ameaçara sair da mesa, enquanto Gabriela ainda encarava Mônica petrificada - e até um pouco decepcionada - pelo seu comportamento.

— Tome seu café. Você está alimentando dois seres agora. - Confortara Angelina, e Luísa considerara a situação e controlara-se, dirigindo-se à Mônica em um tom de voz baixo, mas firme, beirando a rispidez:

— Eu não vou viajar pra lugar nenhum, Mônica, até porque sua mente brilhante está esquecendo que o meu futuro marido, e pai da criança, é o prefeito dessa cidade, e que ele não pode ir a lugar algum nesse momento. E eu não vou deixar que nos afastem novamente. Então me faça um favor, vá controlar os fiéis da paróquia, e o time de beatas que te seguem para todo canto, mas me deixe em paz, Mônica. - Concluíra, retornando à salada de frutas que estaria consumindo antes da confusão começar.

— Dá para tomarmos o café em paz agora, Mônica? - Indagou Gabriela, assim que a mais nova se calou, dirigindo-se diretamente à origem da discussão, coisa que não era do seu feitio, especialmente no que dizia respeito à mais velha, que estranhou o comportamento.  -  É pedir demais ter uma refeição de paz em família?

Gabriela retornara ao suco de laranja natural que estaria tomando, enquanto Angelina a encarava chocada por vê-la comportar-se daquela forma contra uma atitude de Mônica, que a segunda mais velha sempre defendera à ferro e fogo.

— Eu acho engraçado que me tratam nessa casa como um inimigo. - Mônica falara, ainda encarando Gabriela que transparecia sua irritação nos olhos pretos, mas logo retornara o foco para Luísa – Eu só me preocupo com vocês. E o que será de seu futuro com tanto falatório? Mas é você que me fala coisas horríveis, Luísa! E me falta ao respeito sempre.

— Talvez seja porque você não aceita ver ninguém feliz nessa casa sem querer controlar cada segundo dos nossos dias.  -  Luísa respondera imediatamente, em um tom de voz irônico e ofensivo. - Eu respeito pessoas que entendem que a vida é minha e que eu vou controla-la da maneira que eu quiser. Pessoas que me respeitam de volta.

Gabriela suspirou pesadamente cada vez mais contrariada por participar daquele enfrentamento. As duas estavam erradas, mas eram orgulhosas demais para perceber, e Mônica ter iniciado o assunto naquele momento de, embora ilusória, paz familiar, a teria irritado. Jéssica parecera notar a situação desconfortante que atingira Gabriela internamente, e segurara em sua mão para acalma-la. Encararam-se por alguns instantes, até serem interrompidas pelas palavras de Mônica.

— É uma pena que você pense isso de mim. - Admitira a mais velha, derrotada.

— É uma pena que você não entenda que eu sou uma mulher adulta agora, maior de idade, dona da própria vida, e que você não pode mais mandar em mim. - Concluíra, enquanto cortava o pedaço de cuscuz com ovo que trouxera para o seu prato.

Gabriela, evidentemente cansada de participar daquelas discussões que não levavam suas irmãs à lugar nenhum, pegara o guardanapo, e limpara de leve os cantos da boca, e dissera um educado “com licença”, antes de retirar-se da mesa, saindo em direção ao seu quarto.

Com menos uma fonte de preocupação à mesa, Jéssica adiantara-se à jarra de suco e colocou-o medidamente no copo, enquanto analisava os diferentes tipos de pães disponíveis na mesa.

Angelina que observara o movimento da namorada e apreciara o silêncio que fizeram após a saída de Gabriela claramente aborrecida da mesa, a jovem decidira por fazer o mesmo, e as duas começaram a comer finalmente.

—_____________________


Uma semana se passou, e finalmente ocorreria o tão esperado casamento de Luísa e Mário. A relação entre as Prattis melhorara depois daquele dia, a medida que Mônica fora ocupando-se com os afazeres e preparativos do casamento imediato entre os pombinhos que mais do que nunca se fazia necessário.


Era final da tarde de domingo, e a igreja estava movimentada e barulhenta, mas teria sido totalmente organizada pelas Prattis Lopes horas antes para receber os convidados – que receberam convites surpresas durante a semana – daquele dia especial.

O noivo que parecia ansioso, mas muito feliz, começara a entrar vestindo um elegante conjunto slim fit, oxford de corte italiano, com calça, paletó preto de dois botões – o último aberto –, e um pequeno bolso à esquerda com um lenço branco de seda saindo pelo compartimento, além de uma gravata lisa de seda da mesma cor acromática, repousando sobre a camisa social branca.

Ele parecia inquieto, observava os amigos e conhecidos à sua volta, ansiando o minuto em que receberia a futura esposa no altar, que logicamente como uma legítima noiva ainda não teria chegado na igreja. Não era seu primeiro casamento, mas tudo lhe parecia diferente, como se de alguma forma fosse sua primeira vez. Desde que despertara essa manhã, Mário soubera dentro de seu íntimo que aquele seria o dia mais feliz de sua vida, porque finalmente lhe era permitido casar-se com alguém que ele realmente amava. 

À completo contragosto por odiar aquela família e a futura esposa do filho, e moralmente obrigada pelas contingências, Sandra Pontes acompanhara o filho, em nome do finado marido Jânio, até o altar. Usando um elegante vestido longo de veludo azul marinho de mangas, que ajustava-se no corpo, a viúva Pontes entregara o filho ao altar, e sentara-se em seguida. Jamais admitiria à nora, mas estava comovida pela ideia de finalmente ter um sucessor do império Pontes chegando na família. Sua finada mas muito querida nora, Janine Vasconcelos, tinha a saúde fraca e não teria lhe dado um neto.

Outra que parecia estar contrariada no evento era Mônica, que trajara um vestido longo de renda, com manga comprida e todo fechado, na cor preta. Talvez por ser a única da família que realmente se importasse com aquilo, a mais velha atraía olhares curiosos, e a todo momento escutava comentários críticos sussurrados pelos convidados fofoqueiros e curiosos – inclusive algumas beatas –, falando entre si sobre a “estranha” rapidez daquele casamento que teria sido arranjado às pressas e silenciosamente, antes mesmo do corpo da finada primeira dama esfriar no túmulo.

Gabriela colocara um vestido verde escuro longo, solto no corpo, também de renda, mas sem mangas, e ligeiramente decotado nas costas – mais uma coisa que a mais velha teria achado um absurdo naquele dia, à propósito.

Sempre que aproximava-se de Mônica, a Lopes escutava suas reclamações e ponderações amargas insistentes sobre tudo e todos à sua volta, ou sobre os vestidos de hereges que elas teriam comprado sem a sua presença, e a mesma permanecia em silêncio, tentando ignora-la para focar naquele momento de muita felicidade na vida de Luísa, que finalmente conseguiria se casar com o grande amor de sua vida.

Angelina chegara usando um vestido de mangas, rodado e tomara que caia, um pouco mais curto que os das demais, que tinha uma estampa floral discreta, de malha bege claro e pequenos desenhos em azul escuro. Estava acompanhada de Jéssica que vestira um preto tubinho básico de tecido, sem mangas, que valorizava o seu corpo.

As duas conversavam animadamente do lado de fora da igreja, quando alguém aproximara-se.

— Henrique, o que você está fazendo aqui? - Perguntara Angelina, surpresa por vê-lo elegante usando uma camisa de botões, com terno microfibra risca de giz, e calça social, tudo em azul marinho. A mesma pessoa que há duas semanas atrás teria encontrado bêbado de manhã. Parecia difícil de acreditar em como aquele rapaz hoje em dia lhe parecia instável.

— Meu primo é o padrinho. - Respondera, enquanto ajustava o relógio no braço, por debaixo da manga esquerda da camisa, soltando um belo sorriso que irritara Jéssica só por observar. O que aquele sujeito estaria fazendo ali? Claramente não seria por causa do primo. - Queria agradecer você por me suportar naquele dia. Estava passando por um período bem ruim, e eu não sabia o que estava fazendo.

À medida que o rapaz agradecia, Jéssica encarava Angelina, que a olhara sem graça por lembrar-se que jamais teria contado a namorada o que passara na manhã durante a viagem de Jéssica com Luísa. Henrique observara a tensa troca de olhares e manteve-se sem entender.

— Eu sei que você não era você mesmo. - Dissera Angelina, ao observar o rapaz ansioso à sua frente esperando por uma resposta.

— Eu jamais faria aquilo se não tivesse... - Continuara o rapaz com suas desculpas.

— Bêbado. Eu sei. - Completara, aflita, e já implorando silenciosamente para que o rapaz fosse embora, pois Jéssica ainda a observava com intensidade, claramente mal interpretando tudo e enciumada, o que estaria deixando a mais nova ainda mais desconfortável, e com dificuldade para disfarçar a crescente tensão entre elas.

Henrique analisara curioso as reações, mas como a “bastarda Prattis” – forma "carinhosa" como considerava Jéssica – jamais aprovara a relação deles, não era tanto de se estranhar que a mesma odiasse aquela aproximação. No entanto, o que viera a seguir o confundira:

— E que dia foi isso? - Perguntara Jéssica para o rapaz, em um tom casual, disfarçando a tensão e o ciúme, mas a estranha curiosidade na pergunta, e o simples pronunciar da palavra à ele, sendo que ela claramente o odiava, transparecera o contrário mesmo sem querer.

— Há duas semanas atrás. - Respondera desconfiado, observando a reação de Jéssica que franzira a sobrancelha levemente, enquanto concluíra olhando para Angelina:

— Ah. Bom, eu vou deixar vocês sozinhos para que conversem. - Dissera, logo afastando-se, e Angelina ainda tentara em vão segura-la, mas não conseguira pegar no braço a tempo.

— Eu interrompi alguma coisa? - Perguntara Henrique sentindo a tensão no ar,Henrique sentindo a tensão no ar, e lembrando-se do dia no parque, meses atrás, em que fora deixado plantado após Jéssica aparecer e sair intempestivamente à cavalo. 

 

Angelina o encarou de repente, parecendo atordoada, após passar segundos acompanhando, pensativa, o distante movimento da namorada que caminhara pelo centro da igreja até sentar-se no primeiro banco do lado esquerdo, bem ao lado de Mônica.

Angelina não teria feito nada de errado, mas compreendia os ciúmes de Jéssica sobre Henrique, e considerando que o período citado erroneamente pelo rapaz – duas semanas atrás –, que batia com o tempo de término, até poderia imaginar tudo o que a jovem estaria pensando naquele momento.

— Não, mas eu preciso entrar. - Admitira, categórica. - Você sabe, não posso me atrasar no casamento de minha irmã. E já vão fechar o portão - Explicara-se de maneira gentil, para que o rapaz nada desconfiasse e pareceu funcionar. - Fico feliz por te ver bem de novo. - Dissera, sincera, recebendo mais um sorriso do rapaz, que nem mesmo fora devolvido, já que a mesma afastara-se em seguida.

A mais nova caminhara pela igreja apressada, observando que Jéssica já teria se levantado para a posição de madrinha ao lado do abençoado rapaz de cabelos pretos encaracolados e olhos azuis que vira com Luísa no parque meses atrás – que hoje já sabia tratar-se de um amigo que a jovem fizera na faculdade.

Enfim observara que Gabriela não estava mais sentada ao lado de Mônica, e possivelmente já teria ido buscar a Luísa na caminhonete, e dar os últimos retoques na noiva.

 

Aproximara-se do altar olhando para Jéssica que desviara o olhar, como se rejeitasse sua companhia naquele momento, e então a jovem decidira respeitar, e ignorar temporariamente a tensão entre elas, indo sentar silenciosamente ao lado da mais velha. Angelina não poderia arriscar fazer uma cena, ou alguém pegar uma discussão e desconfiar do tipo de relação, nem atrair atenções erradas em pleno casamento da irmã. Luísa jamais a perdoaria se as duas estragassem aquele dia feliz.

 

Vários minutos se passaram, e Mário já teria criado raízes de tanto esperar sua prometida no altar. Conversava casualmente com os amigos Pedro - primo de Henrique - e Regina, respectivamente padrinho e madrinha do rapaz, até que as portas se abriram novamente e a tradicional música nupcial começara a tocar.

Luísa aparecera parecendo uma princesa com um luxuoso vestido branco longo que arrastava no chão às suas costas, de tecido com apliques de renda que desenhavam a parte de cima, e formavam folhas descendo pela vestimenta, não muito justo no corpo, de modo a evitar mostrar a recém descoberta gravidez da moça.

Gabriela acompanhara a jovem em direção ao altar, o que normalmente teria sido ofensivo à Mônica por ser a mais velha da turma, porém considerando a razão daquele casamento e o fato dela estar usando o tradicional vestido branco estando grávida, realmente teria sido um alívio que Gabriela tenha sido a responsável no seu lugar. Ansioso, Mário fora até a jovem pouco antes dela chegar ao altar, e estendera sua mão, ajudando-a na subida. Gabriela aproveitara então para desviar do caminho, e sentara ao lado de Angelina.

Instantes depois, o casal se entreolhava extravasando as emoções em pequenas lágrimas, e seguravam as mãos do outro, enquanto ouviam do padre local um lindo discurso sobre o poder divino de unir novamente duas almas de luz que hoje se completariam em santo matrimônio. Dois seres que já estiveram juntos um dia, no passado, mas que por vontade de Deus, teriam se perdido e seguido suas vidas individualmente, até que ambos estivessem prontos para encarar uma nova caminhada juntos, mais maduros e muito mais determinados. Mas, acima de tudo, com um inegável amor que novamente os uniam.

Claramente o roteiro teria sido escrito por Mônica, e Luísa assim que notara as semelhanças e informações que o padre da paróquia jamais se atentaria a descrever, encarara a irmã mais velha em um silencioso, mas emocionado agradecimento, e uma lágrima tímida saíra dos olhos de Mônica, pela primeira vez no dia. Ficara muito feliz em ver a reação de Luísa, e por mais que o casamento ocorresse por razões precipitadas, e que ela não concordasse com algumas decisões tomadas, era bom vê-la tão feliz e apaixonada, entregando-se perante à Deus ao homem que amava.

No entanto, o padre não estaria exatamente feliz em realizar aquela cerimônia, primeiro pelo espaço curto de tempo em que teria realizado a missa de sétimo dia de Janine Vasconcelos Pontes, e segundo por causa das recentes circunstâncias – afinal, Mônica jamais mentiria para ele –, contudo a prefeitura, e as tradicionais e poderosas famílias Prattis e Pontes eram as maiores fontes de dízimos da Igreja de Catedral do Norte, e responsáveis por constantes obras necessárias para manutenção e funcionamento do local; portanto, jamais poderia dizer não, especialmente com o pedido vindo da devota à Deus, Mônica.


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