Âmago da Meia-noite escrita por Shantalas
Notas iniciais do capítulo
Parte 1 de 2 desse primeiro capítulo
Longe dos campos de plantio e da cidade que cerca o castelo, se achava uma zona de mata quase toda fechada, exceto por um caminho estreito. Ali se reuniam 50 cavaleiros com armaduras e capas vermelhas. Eles se aglomeravam no início da pequena trilha e avançavam um atrás do outro.Pouco mais adiante, observando os intrusos de cima de um ulmeiro, estava uma criança chamada Daniel. Vestido em um manto de pele de jacaré, bem verde, a cor em que a vegetação se achava naquela época do ano. Tinha a pele morena, cabelo curto e enrolado. Embaixo, na base da árvore se encontrava um indivíduo mais velho que Daniel. Esse rapaz usava vestes sujas e costuradas à mão, estava um pouco acima do peso e tinha os membros curtos, além de olhos estreitos e arredondados.
— Melhor descer daí. É perigoso – Diz o rapaz de forma lenta e atrapalhada.
— São homens das terras vermelhas, Glenn – Daniel comenta em voz alta, curioso e tentando esconder a animação – O que será que querem aqui?
— Não temos nada com esses homens – Glenn comenta, protegendo os olhos de um feixe de luz do sol que passa por uma entrada na copa da árvore. Era meio dia e estava quente. De cima da árvore, o garoto parecia não escutar.
Daniel se abraça no galho, escorrega, ficando de ponta-cabeça e se solta lentamente sobre um galho abaixo, que estala como se fosse se partir, mas Daniel era leve, uma criança de 14 anos com a estrutura corporal de 12. Então ele se pendura novamente e desce até o chão caindo habilmente de uma altura de mais de dois metros.
— Cuidado Daniel! Você pode se machucar! – Diz Glenn com sua lentidão.
— É Brasil! – Daniel responde incomodado, se referindo ao seu novo nome, que o ancião prometera.
Os dois seguem pela mata, se embrenhando como de costume pelo mato alto. Daniel era o mais jovem membro de uma pequena sociedade de anciãos que, desde muito antes de sua chegada, já habitavam a floresta próxima às terras vermelhas. Tal sociedade tinha como principal objetivo ajudar os que tinham algum problema, físico ou mental, ao menos foi assim que ele ouviu.
A dupla passava por uma área onde grandes cedros se erguiam e Daniel parou de súbito ao avistar um pássaro pequeno, do tamanho de um punho fechado. Tinha o topo da cabeça preta e o corpo cinza. Estava com um galho na boca.
— Daniel? – Glenn freia com suas pernas curtas e quase tropeça.
O pássaro voa. Daniel observa até ele sumir de vista, depois volta a correr balançando a cabeça negativamente e dizendo:
— Não foi nada.
Os dois continuam a correr pela parte da floresta com cedros até chegarem ao acampamento. Não havia nada de incrível ali, as barracas eram de madeira e folhas velhas, algumas cobertas com peles de animais. Na pequena clareira ao fundo havia uma panela de pedra que esquentava em uma fogueira. Os habitantes eram idosos ou pessoas semelhantes a Glenn, com os olhos estreitos e arredondados. Haviam mais de 30 habitantes, todos demonstravam receio da presença dos homens a cavalo, exceto por Sangue-de-Dragão.
Tal pessoa era um homem alto que, com um corvo em cada ombro, conversava com os cavaleiros. Ele usava pinturas de cor vermelha ao redor dos olhos, traços na bochecha e um no queixo. Tinha a pele da cor de cobre, cabelo crespo inchado e usava um macacão de pele de urso, bem cavado. As partes expostas de seu corpo eram repletas de cicatrizes.
— O ancião não falará com o senhor – Disse Sangue-de-Dragão com voz rouca. Os corvos olhavam curiosos para o homem com a armadura mais pomposa, que mantinha o diálogo.
— Nosso Rei, Claus Donmark, pede com urgência que seu ancião nos receba. Ele viria pessoalmente se sua filha, a princesa, não estivesse adoentada.
O homem mais velho, de armadura pomposa, falava formalmente. Tinha uma expressão dura, olhos cinzentos e firmes. Seu elmo, com o visor levantado, permitia ver suas grossas sobrancelhas negras e seu cabelo liso. Ele não era um homem baixo, mas conversava com Sangue-de-Dragão olhando para cima. Outros dois cavaleiros estavam logo ao seu lado, ambos com a mão na espada embainhada, um deles era visivelmente mais novo, seu porte físico e armadura mais leve o denunciavam.
Daniel se aproxima, cauteloso, e Glenn vem logo atrás, com medo. Os cavaleiros vinham da estrada estreita e se juntavam. Os mais próximos seguravam os cavalos pela rédea, os recém-chegados vinham montados. Portavam uma lança nas costas e espada na bainha, alguns deles com arcos e uma aljava no flanco da montaria.
— Seu Rei, não nosso – Sangue-de-Dragão diz sem cortesia – Agora retire seus homens daqui, pois estão assustando meu acampamento.
— Não se incomode com esses farsantes Cláudio... Duque Cláudio – O rapaz a direita do Duque diz afoito, sua voz testificava sua idade, não tinha mais do que 15 anos.
Duque Cláudio, o homem da enfeitada armadura, faz sinal com a mão para o rapaz indicando para ele esperar e diz paciente:
— Nós estamos com uma emergência, a cada segundo que passa a vida da princesa se esvai. Vou pedir mais uma vez, encarecidamente, que nos leve até o ancião.
Sangue-de-Dragão fecha sua expressão, ele se move, parecendo incomodado, como se os corvos estivessem perturbando-o, um deles voa para a árvore, fazendo um "Cráaaa". Glenn puxava discretamente o manto de Daniel para traz, em uma tentativa inútil de afastar o garoto da conversa, mas ele já estava ao lado de Sangue-de-Dragão, encarando os dois companheiros do Duque, especialmente o mais novo.
— Veremos qual de nós é mais teimoso – Sangue-de-Dragão fala agressivamente – Se é você com sua insistência ou eu com minha negação. – Ao terminar a frase encarando o Duque, ele olha de esguelha para Daniel e diz – Saia daqui Daniel. Glenn, leve esse intrometido para longe.
— Eu falei pra-pra ele! – Glenn gagueja, nervoso e mais atrapalhado.
— Um mongoloide – O rapaz de armadura comenta curioso e com um pouco de malicia ao observar Glenn. Daniel não gostou do comentário.
— O mongol aqui é você, que deixa a cabeça a cozinhar nessa lataria ao sol de meio dia!
— O que você disse? – O rapaz levanta o visor ofendido, tentando lançar um olhar assustador com seus belos olhos cinza e segurando firme o cabo da espada.
— Clauzor – Duque Claudio diz com voz calma e, mais uma vez, levanta a mão para o rapaz, indicando para parar.
— Vá embora Daniel – Sangue-de-Dragão fala, irritado.
Uma discussão infantil e troca de xingamentos estava prestes a acontecer quando, sem ninguém se dar conta de como exatamente, uma mulher já idosa, porém com cabelos bem ruivos, trajando um simples vestido branco, intervém transmitindo serenidade.
— Com certeza me sinto lisonjeada de estar na presença de senhores de respeito, certo Brasil? – Ela lança um olhar cativante a Daniel que fica desconcertado – Não é mesmo meu jovem Sir? – Clauzor fica rubro embaixo do elmo.
— Sou escudeiro, senhora.
— Não precisamos de você, Bromelia – Sangue-de-Dragão diz, áspero – Estamos nos entendendo bem.
— A senhora, ao meu ver, transborda sabedoria – Fala o Duque gentil, apesar do semblante carregado – Talvez pudesse conceder meu pedido e me levar ao ancião.
— Certamente que pensarei com calma, já que sua frota de bravos guerreiros veio de bom coração complementar seu pedido – A idosa Bromelia diz em um simpático sorriso.
— O ancião foi bem claro para mim – Sangue-de-Dragão comenta – Não iremos nos envolver com pessoas da laia de vocês.
— O rei deve estar louco! – Clauzor explode – Nos fazer perder tempo com meia dúzia de velhos e mongóis! Vamos mostrar a esse insolente – Ele aponta para Sangue-de-Dragão – a força da Gleba-Rubra e dar o fora daqui!
Sangue-de-Dragão não gostou do que ouviu. O último corvo voou de seu ombro e ele mira o garoto com um olhar bestial. Pela primeira vez, Clauzor percebe o quão alto era o homem que ele insultara e isso lhe causou medo, fazendo-o segurar ainda mais forte a espada a ponto de mostrar dois dedos da lâmina.
— Sabe usar isso aí Garoto? – Sangue-de-Dragão pergunta com voz grave.
Novamente o Duque move sua mão e faz o mesmo sinal de parada, mas dessa vez ele bate no cabo da espada do escudeiro Clauzor escondendo a lâmina de volta. A Senhora Bromelia diz com um tom de forçada ofensa:
— Velhos nós somos, mas mongóis é rude demais meu escudeiro – Ela faz um carinho na nuca de Glenn e continua a falar encarando Clauzor– Essas pessoas são especiais, e apesar de terem nascido assim, elas possuem muito mais sorte na vida que você.
— Duvido muito – Clauzor diz confiante – Não sou retardado e em breve serei dono de terras.
— Acho interessante a capacidade que certas pessoas têm de se vangloriar do acaso – Bromelia responde com um sorriso. Clauzor pareceu não entender. O Duque fala por fim.
— Não estou aqui para usar a força. Esses homens vieram em paz. São apenas meus guarda-costas. A família real foi atacada recentemente, Goblins foram achados por todos os lados, sem contar o vira bicho nas florestas.
— Vou repetir quantas vezes for necessário... – Sangue-de-Dragão ia dizendo.
— O rei disse que, caso o ancião se negasse a me receber, deveria entregar essa carta a ele. Imagino que esse pequeno recado ele não se incomodará em ler.
Dizendo isso o Duque retira um pergaminho de sua algibeira, cilíndrico e pequeno. Estava lacrado com cera e o símbolo estilizado DM impresso. Ele estende o pergaminho na direção deles, Sangue-de-Dragão faz menção de pegar, no entanto, Bromelia se adianta e toma.
— Me certificarei de que o ancião receba o recado.
— Vocês podem ir embora agora – Sangue-de-Dragão diz no tom ríspido de sempre.
— Se não incomodar, vou esperar a resposta dele aqui mesmo – diz o Duque, educadamente.
Bromelia e Sangue-de-Dragão se olham, havia curiosidade no olhar dele. Ela oferece o pergaminho a Daniel e diz:
— Entregue a ele para mim, por favor, Brasil.
— Com certeza, senhora.
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