Duet escrita por oicarool


Capítulo 11
Capítulo 11




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Quando Darcy acordou, no dia seguinte, desejou não tê-lo feito. Sua cabeça doía. Muito. E nenhum de seus problemas havia sumido. Seu celular tinha dezenas de ligações. A maior parte delas de Ema, algumas de Mariana. Desistiu de ver as notificações das mensagens que havia recebido naquela noite. E havia um desconforto em seu peito ao lembrar da moça que conhecera no dia anterior.

Elisabeta Bennet, e seus olhos que pareciam estar presentes em seus pensamentos há uma eternidade. Lembrava-se claramente daquele impulso incontrolável, do desejo intenso que sentiu por ela. E hoje, com um pouco mais de clareza nos pensamentos, não conseguia reconhecer de onde vinha tudo aquilo. Era verdade que seu casamento com Ema passava por uma crise. Era verdade também que nunca sentira uma paixão desenfreada pela esposa.

Mas Darcy Fitzwilliam não era um homem passional. Era centrado, técnico, objetivo. Não era dado a rompantes, fossem eles negativos ou positivos. Era uma grande contravenção para ele o simples fato de contrariar os desejos de Ema e não retornar à Londres na noite anterior. Por isso, era enorme a possibilidade de que o que sentira na noite anterior fosse culpa do efeito alcoolico.

Sentimentos como aquele não existiam. Não era factível a sensação de já conhecer Elisabeta ou qualquer outra pessoa. Ou você conhecia alguém, ou não conhecia. Elisabeta era familiar, provavelmente parecida com alguém que ele já conhecia, e que simplesmente não conseguia lembrar naquele momento. Não era algo absurdo. Era uma explicação racional, inclusive.

Mas, mesmo depois de um café forte e um banho em uma temperatura completamente inadequada para a manhã fria, Darcy não conseguia deixar de pensar na mulher que conhecera na noite anterior. Mesmo quando terminou de dobrar suas roupas, fechou sua mala. Quando entrou no taxi – irritado com a demora do Uber, e quando fez o check in na fila preferencial, ainda assim, pensava em Elisabeta.

##

Elisabeta caminhava apressada pelo saguão do aeroporto, seus saltos batendo contra o solo, fazendo barulho característico, enquanto ela arrependia-se amargamente de não ter calçado um par de tênis. Jane caminhava a seu lado, com a expressão preocupada, e bastou abrir a boca para Elisabeta desatar a falar.

— Jane, se você me disser mais uma vez que vamos perder o avião, eu juro que paro agora mesmo e estrangulo você. – Elisa bufou.

— Não seria bom para a sua carreira. – Jane sorriu, a contragosto.

— Quando eu chegar à Londres e encontrar Ofélia, depois de ter perdido o primeiro avião, eu não terei sequer uma vida, quem dirá uma carreira. – Elisabeta sorriu, travessa.

— O que custava você ter ido dormir mais cedo?

— Eu já disse a você que Victor ligou, discutimos, eu perdi o sono. – Elisa revirou os olhos. – Victor quer que eu volte para os Estados Unidos.

— No meio da sua turnê? – Jane parou, esquecendo-se de que estavam atrasadas.

— Victor acha que eu poderia dar um tempo entre as datas, para que possamos ficar algum tempo juntos. E tecnicamente ele está correto, mas Ofélia jamais permitiria. – Elisabeta continuou andando, até notar que Jane não a acompanhava.

— Ele poderia tirar folga e fingir que se importa com sua carreira. – Jane deu de ombros, voltando a caminhar.

— Não é assim, você sabe. – Elisabeta riu baixo.

— É claro que é. E como sua melhor amiga eu tenho carta branca pra dizer que Victor não valoriza o que você faz. Eu o adoro por muitos outros motivos, mas o único jeito de vocês pararem de brigar seria você desistir da sua carreira.

— O que eu não vou fazer. – Elisabeta disse, como se fosse óbvio. – Então Victor terá que se acostumar com a realidade.

— Ou vocês dois vão brigar até chegarem a um ódio mútuo. – Jane riu alto.

E, quando o atendente da companhia aérea já estava prestes a chamar o nome das duas, chegaram à porta de embarque. Jane resmungou sobre usar a classe econômica, enquanto Elisabeta voava de executiva, e se despediu com a promessa de se encontrarem em poucos minutos, já em território inglês.

##

Elisabeta finalmente soltou a respiração quando sentou-se em sua poltrona. Apertou o cinto – o que sempre era a primeira coisa que fazia, e respirou fundo novamente. Odiava voar. Suas mãos tremiam, o coração ficava acelerado. Não importava que viajasse dezenas de vezes por mês. Ainda assim era desconfortável. Respirou fundo mais uma vez, e dessa vez olhou para o lado. E os olhos que a observavam fizeram seu coração acelerar ainda mais.

Darcy Fitzwilliam. O homem que tirara seu sono – muito mais do que a discussão com o namorado. Pesquisara quem ele era no Google. Empresário de sucesso, herdeiro, casado. E agora ele estava ali, olhando para ela com um azul curioso, e Elisabeta viu-se sem saber o que dizer, novamente embasbacada pela sensação de que o conhecia, de que já fizera parte de sua vida.

— Oi. – ele disse, em um português quase perfeito.

— Oi. – Elisabeta tentou sorrir, mas fez uma careta.

— Não esperava vê-la aqui. – Darcy comentou, educado, fazendo-a olhar para os lados, como se reconhecesse o lugar em que estava. – Digo, não esperava encontrá-la.

— Estou indo para Londres. – ela respondeu, com a obviedade da situação.

— Sim, é para onde este avião vai. – Darcy sorriu abertamente, fazendo-a relaxar um pouco. – O que vai fazer em minha cidade?

— Trabalhar. Tenho uma série de concertos nas próximas duas semanas. – Elisabeta sorriu.

— Concertos? – ele arqueou a sobrancelha.

— Eu sou pianista. – Elisabeta informou.

— Pianista? – Darcy arregalou os olhos, se aproximando sutilmente. – Eu não imaginaria isso.

— Não? Devo me sentir ofendida? – ela sorriu e ele sentiu um arrepio.

— Ofendida? Não, é claro que não. Eu só não conseguiria adivinhar. – Darcy piscou.

Elisabeta assentiu, e quase imediatamente o avião começou a se mover. Ela lembrou-se de onde estava, e uma onda de ansiedade a atingiu. Elisabeta respirou fundo, fechando os olhos.

— Eu não gosto de voar. – disse, de repente, como se precisasse explicar.

— Eu percebi. Mas não há com o que se preocupar, vamos ficar no ar por um pouco mais de uma hora e...

— Eu sei. – Elisabeta abriu os olhos, apenas para revirá-los. – Eu só não gosto.

Darcy assentiu, sem tirar os olhos dela. Percebeu, de repente, que estava quase inclinado em sua direção, como se Elisabeta fosse uma força que o atraísse. Ela tinha os olhos fechados novamente, seus lábios formavam uma linha, havia uma pequena ruga entre os olhos. As rodas do avião passaram por um desnível, fazendo com que Elisabeta sobressaltasse. E sem coordenar seus movimentos, Darcy a tocou.

Foi um toque sutil em seu antebraço, mas Elisabeta abriu os olhos no mesmo momento. Ele estava próximo, e ela não entendia o porque. Sua pele queimava onde os dedos dele estavam, mesmo por cima do fino casaco. Darcy deslizou os dedos em um movimento que não deveria ser tão sensual. Não tinha objetivo de ser. Mas sua mão abriu espaço entre as mãos dela, e Darcy entrelaçou os dedos nos de Elisabeta.

Ela deveria afastá-lo, e ele sabia que deveria se afastar, mas os dois engoliram em seco vendo suas mãos entrelaçadas. E quando perceberam, seus olhos estavam em contato, a mesma apreensão, ansiedade, e um desejo intenso, ardente. Os tons se misturavam, e havia aquela sensação forte, familiar, de que não era a primeira vez que se tocavam, que estavam tão próximos. Como se aquele momento fosse certo, mesmo diante do absurdo que representava.

Elisabeta estava prestes a se afastar, mas então o avião acelerou e ela apertou a mão de Darcy, fechando os olhos novamente. Encostou-se no assento e, que o mundo a perdoasse, deixou que a presença de Darcy a acalmasse.

##

Ignoraram a presença um do outro durante o voô. Exceto pelas mãos entrelaçadas, por Elisabeta brincar com os dedos dele, sem perceber, ou por Darcy acariciar a pele dela com o polegar. Darcy observava as nuvens, e Elisabeta mantinha os olhos fechados, até que adormeceu. Acordou já no solo, sobressaltada. Soltou-se de Darcy, como se ele pudesse queimá-la.

— Bom, então eu acho que é isso. Muito obrigada por me acalmar. – ela disse, rapidamente, juntando as palavras.

— Eu... me desculpe qualquer inconveniente. – Darcy suspirou. – Eu não sei o que acontece comigo quando estou perto de você.

— Ora, como o que acontece? Nada acontece. – Elisabeta respondeu rápido demais, tentando convencer a si mesma. – Nada acontece.

— Eu sou casado. – ele disse, de repente, e não era uma surpresa pra ela, mas percebeu a angústia na voz dele.

— É mesmo? Eu tenho um namorado. Sou praticamente noiva. – Elisabeta levantou-se. – Foi legal conhecer você, Darcy. Mande um beijo para a sua esposa.

Elisabeta pegou sua bolsa, sem deixar que ele falasse mais nada. Inseriu-se entre um casal de idosos que aguardava a abertura das portas do avião, e trocou apenas um último olhar com Darcy, antes de desembarcar. Quando Jane finalmente a alcançou, Elisabeta alegou estar exausta, e ficou o resto do caminho em silêncio.

##

Quando Darcy entrou em casa, estranhou o silêncio. Ema costumava estar acordada naquele horário. A casa estava bagunçada, reflexo do jantar da noite anterior. Ernesto era um primo distante de Ema, cuja família passava por dificuldades. Darcy o ajudara nos últimos dois anos, oferecera um emprego, e a relação dos primos se estreitou. Era comum recebe-lo para jantar.

Havia duas taças de vinho pela metade em cima da mesa. O resto do jantar ainda estava posto. Darcy soltou sua pequena mala de viagem na sala e subiu as escadas. Talvez Ema estivesse muito cansada na noite anterior, e por isso deixara para arrumar tudo hoje. Não que Darcy se importasse com esses detalhes, apenas não era característico de sua esposa.

Abriu a porta com cuidado, sem querer acordar Ema. E nada o prepararia para a cena que viu. Nada o prepararia, mas ao mesmo tempo era como se tudo se encaixasse, de repente. Novamente aquela sensação de que as coisas mais absurdas soavam familiares. E poucas coisas seriam tão absurdas quando ver sua esposa, nua, nos braços de Ernesto. Ema abriu os olhos, encarando Darcy, e foi a forma como ela apenas suspirou, cansada, sem sequer tentar explicar ou defender, que fez com que Darcy virasse as costas, sem uma palavra.

Naquela noite, ele dormiu em um hotel. Uma garrafa de vinho vazia ficou na cabeceira – ironicamente, o mesmo vinho que Ema bebera com Ernesto. Sua vida havia desmoronado rapidamente. Os negócios iam de mal a pior, seu casamento agora era claramente um fracasso, e não poderia sequer culpar Ema ou Ernesto por isso. Não quando, diante de todas as mudanças que o aguardavam, diante de toda a decepção de uma traição, havia nele um sentimento estranho de alívio, de liberdade.

E, a julgar pelos tickets comprados para todos os cinco concertos de Elisabeta Bennet, ele já planejava por onde recomeçar. E a mera expectativa de rever Elisabeta era como voltar para casa depois de uma longa viagem. Darcy era incapaz de explicar aquele sentimento, e antes de adormecer, viu-se desistindo de entender a força que o puxava para ela.

Não imaginava, é claro, que dois andares abaixo, os olhos com que sonhava encaravam o céu sem estrelas de Londres, com uma taça de vinho na mão. Havia discutido novamente com Victor sobre a incompatibilidade completa de agendas que tinham. Havia discutido com Ofélia sobre não conseguir ver o namorado, o pai, a irmã. Estava cansada daquela rotina, onde a única pessoa que podia contar era Jane.

Mas, ao fechar os olhos, era como se o toque de Darcy ainda estivesse ali. Como uma presença que a acalmava. Elisabeta sacudiu a cabeça, tentando afastar aquele pensamento. Não o veria mais, provavelmente nunca mais, e o que quer que tivesse acontecido, já era passado.


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Notas finais do capítulo

Fanfics são engraçadas. As vezes temos uma ideia toda para uma história, e cinco minutos depois um bloqueio acontece. E é o que tem acontecido com Duet. Quem acompanha minhas histórias sabe que gosto de dar um final à elas. E tenho planos de finalizar Duet um dia. Mas não será nesse momento. Agradeço todo mundo que acompanha essa história, espero que nos encontremos em breve.



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