Eu tinha impressão de que Suichiro estava evitando me encontrar tanto quanto eu (talvez não na proporção de arranjar uma namorada de mentirinha, mas quase isso). Ele tinha sido meu melhor amigo, antes de eu me apaixonar por ele, mas nós nunca mais nos falamos depois e isso me magoou mais do que ter sido rejeitada. Eu sabia que nós devíamos ter muito o que dizer um para o outro, mas eu não conseguia pensar nisso… Mesmo nos breves momentos sozinha.

Combinei de encontrar Takanori no estacionamento, pra irmos embora e me arrependi quando a primeira pessoa que apareceu em meu caminho foi Suichiro. Depois de anos sem nos vermos tão perto, meses fugindo daquele encontro, eu não tinha me preparado direito para encará-lo.

— Acho que vai chover — ele disse e ouvir sua voz foi quase como ver um fantasma. — Achei que ia passar a faculdade inteira sem conseguir falar com você! É meu dia de sorte!

— Falar comigo? Por que quer falar comigo? — perguntei e a mágoa estava tão forte em meu peito que eu não consegui mantê-la escondida.

— Porque você anda pra cima e pra baixo com aquele seu cão de guarda grudado em você — ele zombou e eu fiquei brava. — Eu tenho que dizer que não imaginava você namorando um cara daquele, Carolina — seu tom de voz debochado fez meu sangue ferver e a mágoa foi ofuscada pela raiva.

— Bom, que sorte a minha, então, que quem eu escolho namorar não tem de passar pelo seu “controle de qualidade”, não é mesmo, Suichiro?

— Você não pode estar falando sério — ele tornou a rir. — Pelo que eu me lembre, seu parâmetro de qualidade era o meu! — ele soou tão convencido que eu agradeci por ter autocontrole ou teria partido pra cima dele de tapa.

— Eu decidi usar parâmetros que me dessem resultados reais! — respondi, sem me permitir tocar na parte da informação que me lembraria que o que eu tinha também não era real. Minha frase tinha tido o efeito que eu esperava nele.

— Eu era imaturo! — ele se justificou. — Eu sabia que acabaria magoando você e foi exatamente o que eu fiz, de qualquer forma.

— Não interessa mais — eu decretei. — Não foi tão ruim quanto poderia ter sido…

— Não foi? — ele disse e pareceu surpreso e magoado. — Nós não conversamos há anos e não foi tão ruim? Bom saber.

— Não vem com essa, Suichiro! Você não tem o direito de se fazer de coitado porque não foi ideia minha a gente parar de se falar!

— Eu achei que era melhor te dar espaço, não te forçar minha amizade.

— Você devia ter conversado comigo, antes de decidir qualquer coisa — eu já não sabia mais como eu estava me sentindo, se eu estava triste, se eu estava brava… Eu só queria sair dali.

— Eu sei disso agora! Mas só hoje, depois de meses na mesma faculdade, que eu consegui me aproximar de você! Parecia até que você estava fugindo de mim!

— E eu estava mesmo! Eu não queria ter essa conversa com você, fosse pra você dizer que se arrependeu ou não, que foi culpa sua ou minha, essa era uma conversa que eu teria passado bem minha vida sem!

— Quer dizer que minha amizade nunca significou nada pra você? — ele também parecia magoado e furioso.

— Como se atreve? Você era o meu melhor amigo! — eu lutava com todas as forças pra não chorar. A última coisa que eu precisava era chorar na frente dele!

— Acho que não, tudo o que você queria era que eu fosse seu namorado e, como eu não aceitei, você passaria bem o resto da sua vida sem nunca mais me ver ou falar comigo!

— Não distorce o que eu disse! Eu queria que nós tivéssemos passado por cima disso lá no começo e não agora! Que nunca tivéssemos parado de nós falar. Eu entenderia os seus motivos pra não querer namorar, nós não seríamos mais tão grudados, mas saberíamos da vida um do outro. Agora, só abriu velhas feridas que já tinham cicatrizado! Eu não sei você, mas, quanto mais tempo eu passava longe, menos disposta a entender o seu lado eu ficava!

Ele ficou em silêncio e parecia que tinha mais o que dizer, mas ficou calado.

— Eu tenho que ir. Takanori está me esperando — disse, depois que o silêncio se manteve por mais tempo. Ele continuou quieto, então passei por ele e fui para o estacionamento, sem me despedir ou olhar pra trás.

— Aí está você! — a voz animada de Takanori me alcançou, antes que eu chegasse perto do carro. — Estava tentando te ligar, mas você não atendia… Já ia sair pra te procurar. O que foi? — ele percebeu meu estado e eu me permiti chorar, sendo puxada para seu corpo e abraçada. — O que aconteceu, meu bem? — ele parecia aflito.

— Conversei com Suichiro — consegui lhe responder, soluçando e seus braços me apertaram mais. — Ele me encontrou quando eu vinha pra cá…

Takanori não fez nenhuma pergunta e eu fiquei agradecida.

— Só quero sair daqui, por favor — pedi e ele beijou o topo de minha cabeça, antes de abrir a porta do carro pra mim e me ajudar a entrar.

— Pra onde, milady? — ele perguntou, se sentando ao meu lado, ligando o carro e saindo do estacionamento, mais rápido do que de costume. Eu consegui rir, limpando as lágrimas que marcavam meu rosto.

Só de estar ali com ele, eu já me sentia muito melhor, tudo o que eu queria era ficar com ele, presa em seu abraço, que era onde eu me sentia menos quebrada do que eu era…

Mesmo que fosse a ideia mais burra de toda a minha vida, eu sabia que, se eu queria ficar com ele, no abraço dele, tinha que ser de verdade! E, pra isso, nós tínhamos que acabar com as mentiras… Era uma ideia burra porque eu podia perdê-lo no momento em que eu mais precisava, ele podia não estar sentindo o mesmo que eu e ter conseguido continuar com aquela história sem se apaixonar…

Ainda assim, nós dois tínhamos que conversar.

— Pra sua casa — respondi e ele assentiu, sem perguntar nada.