O Ex-Namorado Perfeito escrita por Mr D


Capítulo 2
O Petit Gâteou


Notas iniciais do capítulo

Sim, os títulos dos capítulos serão nomes de sobremesas (na maioria das vezes).
Espero que goste. Não deixe de comentar o que achou.
Desculpem qualquer erro e boa leitura!



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Depois de ouvir o questionamento confuso de sua amiga ao telefone, Victória apertou o botão do oitavo andar e assistiu o homem caminhando em direção a saída, até que a porta do elevador se fechasse.

— O que disse? – Fernanda a questionou mais uma vez ao telefone.

— Nada não. Que hora vai sair do trabalho?

— Umas seis horas, eu acho.

— Vem direto para o meu apê, preciso da sua ajuda com o jantar.

— Ainda vai rolar o jantar?

— É uma longa história…

Não era tão longa assim. Victória estava tão confusa. Uma parte sua queria continuar com o plano do jantar simplesmente para mostrar como estava bem, mesmo depois de ter acabado de levar um fora do namorado. Mas outra parte dela pensava que se realmente estivesse bem com tudo isso, não precisaria provar para ninguém, nem para ela mesma.

Com sua melhor amiga substituindo seu ex-namorado, Victória ainda teria que preparar um jantar para quatro pessoas e tinha cerca de cinco horas para fazer isso, o que era tempo o suficiente, então a primeira coisa que fez ao entrar em seu apartamento foi se jogar no sofá, onde se questionou pela milésima vez porque não podia ser normal como as outras mulheres, o que não quer dizer que seria mais fácil, mas seria mais normal. E sentindo-se cansada de toda aquela situação repetida, ela adormeceu.

Embora não fosse se lembrar quando acordasse, Victória sonhou com a única exceção, que inclusive era um sonho bastante recorrente. Algo bem no fundo do seu subconsciente, mesmo com todas as suas vitórias na vida profissional, ainda se arrependia de ter o abandonado. Era a primeira vez que tinha um de seus vislumbres, ainda não entendia como funcionava, e de qualquer forma, não teve muito tempo para tentar entender.

A única exceção estava lá, imóvel, apenas observando-a com seu olhar encantador no corredor vazio da escola em que estudavam, ainda com sua jovial aparência de quinze anos. Victória não o vira desde que terminaram, um dois anos depois de começarem a namorar. Melhor dizendo, não se viam desde que Victória terminou com ele. Como dito anteriormente, a primeira vez de Victória lidando com seu dom/maldição foi especial, diferente de todas as outras vezes que vieram a ocorrer. Enquanto sempre via homens terminando com ela em seus vislumbres, foi ela que resolveu terminar com a única exceção.

Depois do que se pareceram vinte minutos de um ótimo cochilo, Victória acordou com o barulho de batidas na porta, e antes que pudesse dizer alguma coisa, as batidas recomeçaram mais fortes e uma voz surgiu.

— Abre aqui. Sou eu.

Era Fernanda.

— Já estou indo.

 

Sem entender porque Fernanda tinha chegado tão cedo em sua casa, Victória vasculhou todo o sofá à procura do seu celular e deu um salto quando viu que já eram quase cinco e meia da tarde. Parece que seu cochilo de vinte minutos na verdade tinha sido uma bela dormida de quatro horas.

— Não estou sentindo cheiro de comida. Por que eu não estou sentindo cheiro de comida?

Quando a porta foi aberta, Fernanda se deparou com a cara do desespero. Victória parecia perdida, mas ela gostaria de acreditar que era tudo por causa do jantar com seus pais e que o recente fora que levou do Carlos não teria nada a ver com seu estado atual, coisa que fazia questão de sempre se lembrar.

— Como é que você está? - Fernanda perguntou, abraçando-a. Pensando em como devia ser horrível ter que passar pelo seu quinto ou sexto término, sim, sua amiga já havia perdido a conta.

A propósito, era o sétimo.

— Estou ferrada. Acabei dormindo e não preparei nada para o jantar.

Victória fechou a porta e correu até a cozinha, quase não se importando com a presença de sua amiga. O que não era nem um pouco verdade. No fundo o que queria mesmo era não ter que se preocupar com o jantar e se lamentar para Fernanda sobre o quanto sentiria falta do Carlos. Mas de novo, não que isso esteja afetando seu estado atual. Ela estava super tranquila quanto ao término. Super tranquila. Super. Mesmo. De verdade.

— Quanto tempo nós temos?

Fernanda indagou ao perceber a agitação de Victória, que abria todos os armários e atirava vários ingredientes espalhados em uma bancada de mármore.

— Uma hora no máximo. O jantar é às sete, mas minha mãe vai chegar pelo menos quarenta minutos antes, ela vai dizer que é para me ajudar com a preparação, mas é só para irritar meu pai a noite inteira sobre ele ter se atrasado. O que provavelmente vai acontecer, já que ele costuma esquecer do mundo quando está com a nova namorada…

— Calma. Eu sei como resolver isso.

Enquanto guardava de volta tudo o que Victória estava tirando do armário, Fernanda dizia tudo o que sua amiga desejava ouvir, as soluções para amenizar o desastre que seu dia estava sendo. Primeiro lhe foi sugerido que ligasse para o restaurante de um grande amigo e encomendasse a comida, além do mais, não se tratava mais de um jantar para apresentar o namorado aos pais com uma tentativa de melhorar a impressão com comida caseira, e mesmo que o restaurante em questão não fizesse entregas, ficava muito próximo e ter um amigo chefe tinha lá suas vantagens. Segundo, Victória deveria preparar a sobremesa, pois Fernanda sabia o quanto preparar doces era o melhor remédio para o estado atual de sua amiga. E enquanto cozinhava, podiam conversar sobre como ela estava se sentindo em relação ao Carlos.

— Não sei o que faria sem você – disse Victória, agradecida.

 

— Eu sei. Então, o que vai fazer de sobremesa e como está se sentindo em relação ao término?

Fernanda perguntou sem tirar os olhos de seu celular, onde respondia as várias mensagens de seu namorado. Ele queria a atenção dela, mas Victória precisava mais, então simplesmente jogou o celular de volta na sua bolsa, a colocou sobre a mesa de jantar e voltou sua atenção para Victória, que já estava com o balcão ao lado do fogão cheio de ingredientes, cabelo amarrado e pronta para fazer o que fazia de melhor.

— Petit gâteou— respondeu, enquanto picava uma barra de chocolate. – E eu estou bem, não é como se eu não soubesse que aconteceria – terminou de falar forçando uma risada.

— Não acredito que esteja bem. E acho que nem você acredita.

Eu também não.

— É claro que eu não estou bem, aparentemente eu ainda não sofri o suficiente, já que fica doloroso a cada término. – Victória respirou fundo. – Pronto, esse é todo o lamento que irá ouvir por hoje. Não posso colocar esse tipo de negatividade na sobremesa. Não vamos falar sobre isso de novo.

Na verdade, as duas já tinham tido essa conversa. Quando começou a sair com Carlos, Victória já sabia que os dois terminariam – e mais especificamente, como terminariam – mas isso nunca foi algo que lhe afetava a princípio, já estava acostumada. Mas quando completaram o primeiro mês de namoro, Victória começou a desejar profundamente que aquilo não acabasse, então começou a curiosa fase em que sofria com o término meses antes de acontecer. E como Fernanda era a única pessoa no universo que sabia do estranho dom de sua amiga, ela era sempre a pessoa que ouvia o choro de lamentação de Victória.

Então, quando sua visão finalmente se cumpria, Victória evitava passar pelo luto mais uma vez. Mesmo que ainda doesse muito. O que no caso, doía.

Faltavam exatos trinta minutos para o jantar. Victória já tinha tomado banho, os petits gâteaux estavam prontos no forno e o porteiro já havia interfonado para avisar que o entregador havia chegado e estava subindo até seu apartamento com a comida.

Victória e Fernanda estavam no sofá da sala, sentadas de qualquer jeito e com os pés jogados em cima da mesa de centro, tomando vinho e tentando não conversarem sobre Carlos. E qual a melhor solução para evitar falar de um certo homem? Falar de outro.

— Hoje quando cheguei no prédio vi um cara muito gato saindo. Mas antes de imaginar nosso casamento, preciso saber se é novo morador ou só um visitante.

— Como ele é?

Fernanda virou todo o seu corpo na direção de Victória. Ela estava em um relacionamento com o mesmo cara há mais de cinco anos, logo, qualquer assunto que envolvesse novos homens tinha toda a sua atenção.

— Eu fiquei um pouco distraída hipnotizada pelo rosto mais lindo que já vi na vida, então não reparei em muita coisa, mas quando o vi de costas notei que ele é só um pouco mais alto que eu, forte, não um forte exagerado, um forte discreto. Ele me deu boa tarde com sua voz grave. Pela postura como caminhava, parece ser um cara maduro, e estava vestido de forma tão descontraída. Tênis esportivo, um jeans azul, camisa branca...

Enquanto narrava com uma precisão assustadora todos os poucos detalhes que havia reparado no homem, batidas ininterruptas começaram a soar na porta.

— ESTÁ ABERTA! - Gritou Fernanda, que estava encantada ao imaginar todas as características que Victória dissera sobre o homem e desejava profundamente que ela continuasse.

— A comida chegou.

Não era só a comida. Quando abriu a porta, Victória se deparou com a sua mãe com uma bolsa no ombro e duas sacolas nas mãos.

— Não se deu nem ao trabalho de cozinhar? - Ela entregou as sacolas a filha e caminhou até o sofá, sentando-se ao lado de Fernanda e servindo-se da taça de vinho de Victória. - Parece que o curso em Paris não foi tão eficiente assim, afinal.

— É ótimo ver você também, mãe.

Ivone Carvalho era uma jovem mulher de quarenta e sete anos que adorava se intrometer em cada aspecto da vida da sua filha, era como demonstrava seu amor. Tudo isso começou depois que Victória voltou da França, onde morou por seis anos com seu pai após o divórcio nada amigável dos seus pais. Por muito tempo, Ivone se sentiu traída e abandonada por sua filha quando escolheu ir morar com o pai, mas ela diz não pensar mais assim. Só não sei se alguém realmente acredita nisso.

— Onde pegou a comida?

— Encontrei o rapaz da entrega no corredor. Bife à parmegiana… Carbonara… Vinho francês… Você não cansa de esfregar a Europa na minha cara, não é?

Fernanda se esforçava para não rir da estranha tensão que rolava quando mãe e filha permaneciam no mesmo ambiente por mais de um minuto. E como a boa amiga que era, sempre fazia o que qualquer um faria em seu lugar. Colocava mais lenha na fogueira.

— Impressão minha ou você está mais magra? - Comentou com um misto de desdém e seriedade. Era um talento que tinha.

— Eu estou, não é?

Victória revirou os olhos enquanto levava a comida para cozinha e arrumava a mesa para o jantar.

— E que bom que está com esse corpão. – Fernanda começou a falar com um tom de voz mais alto para que Victória pudesse ouvir da cozinha – Assim vai poder comer a maravilhosa sobremesa que a sua filha fez. Estou curiosa para saber o que vai ser dessa vez.

— Só falta ser petit gâteou, se o plano dela realmente for me fazer lembrar a noite toda dos tempos maravilhosos que tivera com seu adorável papai na frança.

— Ela não se atreveria.

Fernanda falou apenas com pura seriedade e deu um gole no vinho, esvaziando a taça. Enquanto se debatia por dentro de diversão. Quando voltaria a instaurar o caos naquela noite já catastrófica, mudou de ideia ao ouvir o telefone de Victória tocar, era o seu pai.

 

— Vi, é o seu pai.

Fernanda pegou o celular que ainda estava no sofá e o levou até a cozinha.

— Deve estar ligando para dar alguma desculpa esfarrapada sobre o seu atraso. - Ivone nunca perderia essa oportunidade. Então comentou mesmo sabendo que ainda faltava dez minutos para a hora marcada para o jantar. - Por falar em atraso… Onde está o tal namorado?

Victória ignorou a pergunta da sua mãe e permaneceu na cozinha, onde atendeu ao telefone.

— Pai?

— Oi filha. Já chegamos, só liguei porque não lembro exatamente o número do apartamento. É o oitenta…

— Espera. - Victória o interrompeu. - Chegamos? No plural? - Perguntou falando cada vez mais baixo, esticando o pescoço para espiar sua mãe na sala se divertindo com o vinho.

— Sim. Eu trouxe a Amanda. Se está preocupada com sua mãe, isso não é problema, ela precisa aceitar o fato de que estou namorando.

— Eu vou descer. Não sai daí.

Victória não esperou sequer que seu pai respondesse e desligou o telefone de imediato. E depois de explicar a situação brevemente para Fernanda, pediu que sua amiga distraísse sua mãe, enquanto iria conversar com seu pai cara a cara.

Se eu pudesse arriscar, diria que esse estava sendo o pior dia na vida de Victória, mas não sei se ela concordaria. Quer dizer, pelo menos ela não está entrando na área de embarque de um aeroporto enquanto a única exceção esmagava uma rosa com o punho, a atirava no chão e ia embora. Partindo seu coração em mais pedaços do que qualquer pessoa na terra poderia contar.

Durante o tempo em que estava dentro do elevador, esperando chegar ao térreo. Victória não conseguiu evitar pensar no homem que vira mais cedo. A pobre coitada já era tão prejudicada emocionalmente, que nem se preocupou em pensar como era estranho que estivesse pensando em um homem que vira só uma vez há algumas horas, quando seu jantar para apresentar o namorado que já era ex-namorado beirava uma tragédia familiar de proporções épicas.

Antes que pudesse lhe surgir um remoto arrependimento por não ter cancelado o jantar, Victória saiu do elevador e andou apressada até a entrada do prédio, onde seu pai a aguardava impaciente acompanhado por sua jovem namorada – ênfase no uso da palavra “jovem”.

— Pai, o que faz aqui? - Victória o abraçou. - Amanda… - Deu um sorriso seco por cima do ombro para a mulher encostada no carro.

— Como assim? Estamos aqui para o jantar. Não é hoje que vamos finalmente conhecer o famoso Carlos?

— Ah pai… Que cabeça a minha. Achei que tinha te avisado. - Victória olhou para o chão, dando pequenos chutes com a ponta do pé, como sempre fazia quando mentia. - Não tem mais jantar. Eu e o Carlos terminamos.

Corrigindo, ele terminou com ela.

— Filha… - Ele a puxou para um segundo abraço. - Vai ficar tudo bem. E sinto muito ter falado sobre a Ivone, achei que era porque ela não queria me ver com a Amanda. Mas é que parece que ela ainda não superou como terminamos…

Corrigindo, ela terminou com ele.

— Então, vamos para algum restaurante. Quer nos acompanhar?

Victória quase não precisou responder, depois de ser fuzilada com o olhar de Amanda quando seu pai lhe fizera o gentil convite. As duas não suportavam a presença uma da outra. É bom evidenciar o fato de que as duas só estiveram no mesmo ambiente duas vezes e por menos de dez minutos.

— Não, obrigado. A Fernanda está me fazendo companhia. Mas divirtam-se – Terminou de falar olhando para Amanda.

Pronto. A chance de Victória ter um ótimo jantar em família para tentar amenizar o sofrimento de ter levado um fora do seu namorado foi totalmente eliminada – Não sei quantas vezes vou dizer isso, mas não que ela achasse que estava sofrendo – depois de ver seu pai entrando de volta no carro e partindo.

Após tudo o que aconteceu, Victória se deu por vencida. Ligou para Fernanda e avisou que ela e sua mãe já poderiam comer, que seu pai não viria mais e que iria para casa em alguns minutos. Precisava de um tempo sozinha, então foi até uma praça na área de lazer do prédio, onde raramente alguém era visto por lá, principalmente em uma noite fria. Ela precisava de um tempo para finalmente sofrer pela perda do Carlos, dessa vez sem nenhuma tentativa de mascarar o sentimento. Estava triste. Seu coração estava partido, de novo.

Saber que aconteceria não diminuía a dor, como gostava de pensar, só aumentava. Machucava ainda mais tentar lutar contra um destino que parecia imutável. Sentada em um banco, cercada por plantas e com uma iluminação fraca, as lágrimas retidas há tempo demais tiveram a liberdade de escorrer pelo seu rosto.

— Noite difícil?

Victória estava tão centrada em suas dores que nem percebeu o homem que estava sentado no banco atrás dela. Ela não sabia há quanto tempo ele estava ali, mas enxugou as lágrimas depressa, pois não precisava olhar para ele, reconhecera aquela voz grave de algumas horas antes. Era quase como se o universo quisesse deixar o seu dia muito interessante, de um jeito bom ou não.

— Não faz ideia – falou olhando discretamente para aquele rosto que quase a faria derreter pelo banco.

— Tá a fim de desabafar com um estranho?

Ele sorriu. Victória pensou seriamente ter derretido naquele momento.

— Morador novo?

— Há quatro dias.

— Bem-vindo ao prédio. E obrigada pela oferta, mas minha mãe está no meu apartamento nesse momento e ela não ia gostar de saber que estou conversando com um estranho.

Tentou ser engraçada. Ele sorriu de novo. Missão cumprida.

— Não seja por isso – o homem estendeu a mão – Pedro Vieira.

Instintivamente, Victória quase levou a sua mão ao encontro da dele, mas parou na metade do caminho. Tocá-lo trazia uma grande possibilidade de mostrá-la mais um término. E depois do dia que estava tendo, ela não sabia se suportaria isso. E ao ver a expressão de confusão dele, não perdeu tempo.

— Desculpa, não posso fazer isso – murmurou e saiu correndo.

— Era só um aperto de mão – Pedro sussurrou, confuso.


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Notas finais do capítulo

Até o próximo capítulo! (Espero)



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