Send escrita por wldorfgilmore


Capítulo 10
Capítulo 10




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Todos os cantos da casa já conheciam o sorriso de Elisabeta Benedito quando o motivo de sua atenção eram as cartas de Darcy. Ela estava na sala, sentada no grande sofá central e com as pernas dobradas no estofado. Sobre seu coração, ela não tinha plena certeza acerca de sua localização, e o principal motivo eram os pulos que ele costumava dar sempre que lia as palavras de Darcy Williamson. Não se surpreenderia se ele se deslocasse a Londres para encontrar seu dono.

Elisabeta já começava a imaginar como seria uma vida ao lado daquele homem. Será que meu inconsciente já te chamava de meu amor? Sorriu. Esperava que falar de amor bastasse em seus diálogos, já que duvidava que algum dia conseguiria desenvolver algum assunto coerente que não fossem frases piegas de uma mulher louca de amor.
Era estranho para Elisabeta se sentir assim. Ela tinha certeza que se uma de suas irmãs tomassem ciência de seus escritos com Darcy certamente começariam a acreditar em algum tipo abdução alienígena.
Feliz 1911, feliz ano do nosso casamento, feliz nós! E, assim como ele, Darcy também foi o primeiro pedido de Elisabeta. Ela se recorda que, ao contrário de seu amado, viu uma estrela cadente no céu, pelo menos era o que ela imaginava que fosse aquele objeto brilhante que passou como um meteoro rasgando a noite escura. Suas palavras foram claras: “Me traga Darcy”, e sabia que em nenhum momento daquele ano se arrependeria do seu pedido mais genuíno dentre todos os anos de sua vida.

Se casaria com Darcy. E seria naquele ano. As palavras dele fizeram ela repetir seu pedido em voz sussurrada na sala de sua casa: “me traga Darcy, me traga Darcy”, quem sabe se com aquela força maior em suas mãos - ela acreditava que aquelas cartas eram como imãs da felicidade - ela atrairia mais fácil o seu desejo.

Elisabeta ainda encontrava-se de olhos fechados quando a voz do pai lhe chamou a atenção.

— Elisabeta, está tudo bem? - o pai a chamou. Sabia que a filha não era tão religiosa, por isso franziu a testa ao imaginar que ela estaria rezando no meio da sala de sua casa.

Ela abriu os olhos.

— Papai! - exclamou, assustada. Estava absorta. - Sim, sim. Está tudo bem!

— Se você diz... - olhou-a desconfiado, mas Felisberto logo adotou uma expressão séria. - Elisabeta… Eu quero tratar de um assunto com você.

Elisabeta franziu o nariz ao constatar que o pai a olhava com preocupação.

— Diga, papai! Porque essa cara? Está me assustando!

— Não é um assunto muito agradável, minha filha. - Felisberto olhava para os lados, fugindo do olhar de Elisabeta. Evitava olhar nos olhos da filha.

— O que é esse assunto? Pare de enrolar! - exclamou, com rusgas se formando em sua testa.

Felisberto sentou em frente a filha no sofá, pegando nas suas mãos logo em seguida. Mantinha a cabeça baixa.

— Elisabeta, eu te peço desculpas, minha filha. Desculpas por ter interferido no seu futuro.

Dessa vez, ele olhou para o rosto da filha. Ela tinha uma expressão confusa e um tanto apavorada.

— Porque diz isso, papai? Não me deixe mais apavorada!

— Eu recebi a carta, Elisabeta. - Felisberto tirou um papel de seu bolso. - Nunca imaginei que meu coração ficaria pesado por te dizer isso, já que sempre fomos honesto com o acordo que tínhamos acerca de seu casamento. Mas agora mal consigo olhar em seus olhos. - o pai encarava a filha com um olhar de súplica. - A data do seu casamento foi marcada.

Elisabeta sentiu o seu mundo dar uma volta de 360 graus em milésimos de segundo. Darcy.

Casamento.

Toque.

Mãos.

Desejo.

Beijo.

Presença.

Amor.

Vida.

Um emaranhado de palavras invadiram o cérebro de Elisabeta em uma avalanche de sensações que ela já havia sentido, mas se surpreendeu ao senti-las todas de uma vez. Seu peito acelerou assim que o pai proferiu a palavra casamento, mas parte dos seus órgãos pareciam ter sumido de seu corpo quando sua mente processou que a data para a concretização do contrato havia sido marcada. A concretização do casamento. a concretização do amor. A concretização de Elisabeta Benedito e Darcy Williamson.

Seu casamento havia pulado de um estágio de pura depressão para um entusiasmo bom demais para ser sentido. Queria gritar, queria chorar. Queria sentir Darcy em seus braços naquele momento. O que antes parecia ser um carma em sua vida, hoje era a realização do maior sonho de sua existência.

Elisabeta sentiu que estava pálida e que suas pernas, mesmo sentada, pareciam bambas demais para se manter reta no sofá, mas só se percebeu nesse estado quando seu pai apoiou uma das mãos nas suas costas.

— Meu Deus, Elisabeta. - o pai a segurava pelas costas. Ela se perguntou quando Jane e Mariana chegaram ao local.

— Minha irmã? - Jane a chamava, com um copo d’água na mão. - Tome isso.

— Eu disse que poderia esperar mais para contar a ela, papai. - Mariana resmungava, ajoelha aos pés de Elisabeta.

Elisabeta segurou o copo de água que Jane oferecia por pura distração, não entendeu o motivo daquilo.

— O que foi? - Elisabeta falou e percebeu que sua voz saíra falha.

— Estamos te chamando há alguns minutos, Elisabeta. Você simplesmente não responde. Está melhor? - Mariana perguntou, colocando as mãos no joelho da irmã.

— Suponho que a emoção da notícia de seu casamento tenha lhe abalado um pouco. - Jane concluiu, trazendo a tona novamente o assunto casamento aos ouvidos de Elisabeta, que quase sorriu.

— E quando é? - perguntou alto, virando-se para o pai, que não entendeu a reação da filha. - Digo… - tentou arrumar o tom de voz. - quando Lorde Archiebald Williamson marcou a data de meu casamento com seu filho?

O pai voltava a apresentar um olhar apreensivo, apesar de tentar passar firmeza em sua voz.

— Março.

— De que ano? - perguntou, sua respiração já se tornava rápida outra vez.

— Esse, Elisabeta. - o pai terminou de falar.

— Eu vou me casar com Darcy daqui há dois meses? - Sua voz falhava entre uma palavra e outra.

— Minha filha, me desculpe. Me desculpe, de verdade. Aparentemente Darcy Williamson está vindo ao Brasil no mês que vem para assinar alguns acordos em relação a ferrovia da cidade. Ele será um dos sócios da construtora, em nome de nossas famílias. Seu pai me informou que ele propôs o adiantamento do casamento já que estará em nossas terras. - Felisberto explicava, olhando com carinho para a mais velha. - Me perdoe, filha. Não tive como dizer não. Já enviei a carta com a confirmação. Ele chegará alguns dias antes do casamento e irá ficar no centro da cidade, o trato de vocês só se verem no dia do casamento continua. Não há como arriscar, ainda mais com a sua reação.

— Mas papai, eu… - ela iria protestar, mas desistiu. Como falaria para os pais que, ao invés de sentir asco do casamento como dizia há alguns meses, agora queria mais do que nunca vê-lo? Independente de acordo, daria um jeito de ver Darcy. - Eu vou ao meu quarto.

Elisabeta pôs-se a correr nas escadas, mas logo foi seguida por as suas irmãs. As duas estavam realmente preocupadas. A moça abriu a porta do quarto, se jogando na cama, Jane e Mariana logo entraram também.

— Eu não acredito! Eu não acredito! Esse é o dia mais feliz da minha vida. - Elisabeta começou a rir enquanto pegava uma almofada. - Ahhhh! 

As irmãs de entreolharam. Elisabeta sentou-se na cama, abraçando a almofada e sorrindo abertamente para as irmãs.

— O que eu perdi? - Jane perguntou, atordoada com a felicidade incomum da irmã, pelo menos naquele momento.

— Eu acho que eu também perdi algo. - Mariana olhou para Jane.

— Ai, minhas irmãs. - Elisabeta levantou, largando a almofada e abraçando as duas em conjunto. - Eu vou me casar com Darcy. Darcy Williamson. - repetiu o nome, dando ênfase no Williamson. - O amor da minha vida.

Elisabeta viu as irmãs arregalarem os olhos, em uma expressão única de incredulidade. Ela riu.

— Não me olhem assim. - Elisa mordeu o lábio. - Sentem-se aqui.

Jane e Mariana obedeceram de pronto, olhando Elisabeta com o rosto franzido.

— Você precisa explicar mesmo. - Jane começou.

— Vamos, desembucha. - Mariana tentava acelerar.

— Continuei trocando cartas com Darcy. - passou a língua nos lábios, enquanto observou Jane colocando a mão na boca. - Estamos nos falando há quase um ano. Bom, mais de seis meses, pelo menos. - deu de ombros.

— Elisabeta! - Mariana exclamou, com a voz um tanto mais alta. - Como não nos contou isso? E, como assim? O que vocês conversaram? - A irmã do meio começava a rir, pasma com a situação.

— Bom, nós brigamos em alguns cartas, mas logo nos entendemos. - mordeu a própria boca. - E muito. - O olhar era sugestivo.

— E muito? - Mariana repetiu o olhar de Elisabeta.

— Falamos sobre tudo. - fez uma cara travessa, rindo alto.

— Que absurdo, Elisabeta! O que quer dizer com isso?

— Nós somos um casal, por cartas. - disse naturalmente, enquanto sorria.

— Que inusitado! - Mariana jogou a almofada em Elisabeta.

— Eu estou apaixonada, minhas irmãs. Darcy é maravilhoso e lindo…

— Ele lhe mandou alguma foto? - Jane contestou, atenta a irmã.

— Não.

— E como sabe sobre sua beleza?

— Jane, a alma dele é linda. Ele é romântico, ele parece gostar de mim sem ao menos me ver. Eu não sei explicar, mas aconteceu, sabe? Eu penso nele todos os dias, em todos os momentos. Eu estou ansiosa por abraçá-lo, por beijá-lo.

Mariana se levantou, levando a mão à testa de Elisabeta.

— Não é possível que Elisabeta Benedito não esteja doente. Ou completamente louca. Essa não é você, minha irmã. - Mariana dramatizava a situação, mas parecia entender a irmã. Sentia a mesma coisa por o seu noivo, Coronel Brandão.

— Eu estou louca sim. Louca por aquele homem.

— Eu nunca achei que veria Elisabeta apaixonada. - Jane exclamou. - E muito menos por cartas! É estranho… - riu, pegando na mão de Elisa. - Mas você parece feliz. Então eu… estou? - Sua frase não era firme, mas verdadeira.

— Eu estou. - sorria para as irmãs. - Eu estou muito. Nem acredito que Darcy cumpriu mesmo o que prometeu.

— O que ele prometeu? - Mariana quis saber, curiosa. Elisabeta riu do jeito da irmã, sabia que ela estava adorando aquela pseudo aventura.

— Que nos casaríamos este ano. Só não imaginava que seria neste momento. Eu estou surtando! Ahhhhhhh! - gritou um pouco mais alto, arrancando gargalhadas da irmã. - Não vejo a hora de tê-lo. Em todos os sentidos. - piscou, trocando um olhar cúmplice com Mariana e imitando a expressão assustada de Jane.

— Você não existe, Elisabeta! - Jane indignou-se.

— Eu existo. E vou me casar com Darcy Williamson.

Vale do Café, Janeiro de 1911.

EU VOU TE MATAR,

DE BEIJOS, DE ABRAÇOS, DE TUDO QUE TEMOS DIREITO.

Me perdoe pela minha letra grande que indicam gritos e mais gritos, mas é exatamente isso que eu estou fazendo. Darcy, como pôde marcar a data do nosso casamento para daqui há dois meses? Eu mal consigo processar que isso está acontecendo de verdade e desconfio que em Março ainda não conseguirei discernir que você será a primeira imagem que verei em todas as minhas manhãs. As manhãs mais bonitas que o sistema solar será capaz de me presentear.

Eu estou voando, voando tão alto que tenho medo que aquele ditado seja verdade. Mas não quero cair na realidade se isso for apenas um sonho.

Nós vamos nos casar.

Nós vamos nos casar.

Nós vamos nos casar.

Eu não consigo parar de repetir que nós finalmente vamos juntar as nossas mãos, nossas bocas, nossas peles, nossas almas.

Eu só consigo te agradecer por ter me mandado aquela carta, por ter brincado de sentimentos comigo e por ter transformado essa brincadeira em amor de verdade. Hoje eu sei que o destino foi bom com a gente. Nós nos juntamos há um oceano de distância. Nossa história merece ser contato em livros, Darcy Williamson. E, se ninguém espalhar a nossa história, eu faço questão de escrever sobre nós.

Sobre o nosso contrato, sobre o nosso desejo, sobre o nosso coração, sobre a forma com que a gente não se importa com o que vai encontrar, contanto que seja só a gente. Eu não sei se serei bela aos seus olhos, mas te oferecerei tudo de mais bonito que eu puder oferecer. Não sei se irá se encantar por o meu olhar esverdeado, mas eles vão representar a esperança que tenho em nós. Também não sei se a minha estatura vai ser suficiente para você, tenho apenas 1.68, mas meu coração é grande demais e ele é todo seu. Eu me darei em completude para você, desde meus cabelos castanhos até o outro extremo de meu corpo. E eu só quero você de volta, independente de sua imagem. Você é lindo demais com sua figura borrada, e só consigo imaginar o quão bonito será aos meus olhos no momento em que meu amor criar forma.

Elisabeta era dona de seus sorrisos mais abertos e não fazia mais questão de esconder a felicidade com a ida ao Vale do Café. Darcy já distribuía sorrisos aos empregados, aos fornecedores e ao seu pai, que por um momento desconfiou da euforia de Darcy ao propor o adiantamento do casamento. Darcy não esperou nem um dia a mais depois da carta natalina de Elisabeta para procurar o seu pai. Precisava, mais do que nunca, da concretização da realidade do seu matrimônio. Lorde Williamson contestou a vontade de Darcy, que nunca dera total atenção àquele acordo como parecia estar dando naquela tarde. Mas munido de uma determinação especial, conseguiu argumentar com a desculpa da assinatura dos contratos da ferrovia.

Seu casamento seria daqui há dois meses. E ele já começava a pensar nos preparativos. Não sabia a cor preferida de Elisabeta, mas vermelho parecia combinar muito com a sua personalidade. Esperava o acerto em seu palpite, pois boa parte da decoração da festa de casamento era vermelha. O homem fazia tudo às escondidas, já que ninguém além de Camilo sabia da seu entusiasmo com o casamento - outros homens até diriam que esse papel era da noiva. Mas Darcy estava tão feliz com a sua data que não conseguiria esperar a ida ao Vale para começar a comprar o que precisava. Mandaria tudo para o Vale, assim que conseguisse um navio disponível para o transporte.

Seu pai havia assinalado para que não procurasse Elisabeta, nem por curiosidade. Julgava incoerente a ideia de não poder vê-la nos dias em que antecedem o casamento para não pôr em risco a conjugação de matrimônio, porém procurou não ir contra seu pai e muito menos contra o contrato. Ele deveria muito aquele papel. E, de qualquer forma, nada impediria que seus pés fossem guiados até o seu amor.

Londres, Fevereiro de 1911.

Meu amor,

Eu estou assim como você, meu coração já não bate dentro do meu peito. Ele está do meu lado e hoje é meu melhor amigo. Nós conversamos bastante, mas você é o nosso único assunto. Imagino que ele vá ao meu lado por todo o caminho de Londres até o Vale do Café segurando um copo de água devido a ansiedade latente que me consome.

Como me deixou dessa forma, Elisabeta? Quase não consegui encontrar frases para argumentar com meu pai acerca da minha pressa com o nosso casamento, mas acho que minhas palavras, repletas de você, conseguiram convencê-lo que já era a hora de juntarmos os nossos sonhos. Ele não sabe da poesia deste casamento, mas não imagina que deu o melhor presente para o seu único filho.

Espero que você não tenha se assustado com a data tão próxima, mas não vejo motivo para esperarmos mais. Nós já somos um há quilômetros de distância e é covardia demais a nossa incompletude.

O mundo não merece dois corações partidos. O mundo não merece que meus dois metros de altura não te protejam, tampouco merecem que nossos olhares não se combinem. A separação não merece a gente. A gente merece a gente, meu amor.

E é por isso que no momento em que essa carta chegar em suas mãos, nenhum oceano será obstáculos para os nossos beijos. Toda essa água terá desaparecido e a espera será menor do que um dia já foi.

Não envie mais cartas para este endereço. Agora, o meu endereço será o seu endereço. E para todo sempre, minha Elisabeta.


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