Glory and Gore escrita por Iulia


Capítulo 2
She is the last true mouthpiece.


Notas iniciais do capítulo

Oooi!!! Voltei com outro capítulo desta historinha, já que o primeiro capítulo eu postei em um dia aleatório e as postagens devem ficar pra domingo mesmo, como eu sempre fiz por aqui. Nesse capítulo aqui, o plot já vai começar a dar aquela caminhada básica e tudo, mas ainda não tem exatamente a vibe que os outros capítulos da história vão ter. Até porque agora que tá começando, né não? Ele tem um tantão de diálogo, pra vocês prestarem atenção no discurso dos meus filhos e ENTENDEREM eles como eu penso que eles são, e um tiquinho de background pra dar aquela situada. Mesmo assim, eu acho ele muito bom, na moral. Eu quero que outra pessoa escreva essa história para que eu apenas possa ler sem me sentir exposta kkkkkkkkkkkkkkkkk. Brincadeira. Leo Season, né? Espero que seja. Enfim. Se liguem aí:
Ah. A música é do Hozier, aquela Take Me To Church (um negócio massa: eu na verdade só gosto de pop fuleiro, mas creio que essa historinha demanda uma playlist mais dark, de modo que tirei Músicas Doidonas de tudo quanto é cantooo. Mas eu gosto dessa aqui de verdade).
*Trigger Warning* O capítulo contém menções a assassinato, consumo de álcool, prostituição e violência. (E tem um negocinho sobre bissexualidade).



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Cato e Clove não se encontraram de novo até a semana seguinte, quando eles tiveram que voltar pra Capital. Como o Primeiro Encontro Oficial com Naevio não tinha acontecido ainda, Clove continuou com sua agenda cheia de antes e o mesmo valeu para Cato. Apesar do que ela havia dito na casa dele e da tentativa que Cato nunca parava de exercer de se afastar dela, Clove apareceu em seu apartamento na Capital duas vezes.

Na primeira vez, ela passou horas o contando sobre sua companhia, à beira de uma crise; a companhia era exótica e não tinha deixado sequer uma parte do seu corpo sem marcas e ela aparentemente não conseguia limpar elas no banho. Ela tinha um problema com marcas.

Na segunda, foi como se nada tivesse acontecido. Ela se serviu de uma bebida e eles conversaram sobre os outros Vitoriosos que estavam na cidade, todos trabalhando em conjunto, odiando e admirando Katniss Everdeen ao mesmo tempo.

Tudo foi como sempre havia sido. Eles não falaram sobre o que estava realmente na mente deles, esperando surpreender – manipular, dominar – o outro no futuro com seus planos brilhantes.

Clove podia imaginar que Cato ia querer tomar parte de uma rebelião, o pobre garoto manipulado a entrar nos Jogos que ele tinha sido, todo preenchido com ideais de honra e orgulho e tudo o mais. Ele era transparente e era cheio de ódio – que infelizmente não havia surgido só depois de sua passagem pela arena – então, bom, por que não participar de uma guerra? Era nisso que ele era bom. 

Ela podia imaginar, se divagasse muito, mas ela não sabia. Eles eram do 2 e ele era o filho rico de um Pacificador, que história de rebelião era essa, pra quê morder a mão que te alimenta?

Por ser o filho rico de um Pacificador, Cato tinha uma perspectiva limitada das coisas. Elas eram o que elas eram e elas eram o que ele via delas. Eles disseram pra ele que sair vivo dos Jogos era glória, vitória, a recompensa perfeita. Ele foi lá e viu que não era assim. Caso encerrado. Ele tinha sido enganado. Ele queria vingança. Mas Clove... Toda vez que ele a via, toda vez que ele lembrava dos anos atrás, dele a dizendo pra não ir para a arena porque era mais do que eles haviam dito, Cato ponderava sobre a possibilidade de que Clove sabia no que estava se metendo. Mais que isso; às vezes ele achava que Clove gostava de tudo aquilo de verdade, não porque alguém a tinha dito para o fazer, mas porque ela tinha nascido assim, a perfeita fabricação da Capital.

Então Cato não podia imaginar Clove considerando nada parecido com uma revolta. Ela tinha tudo que ela queria agora, Snow a apreciava, ela tinha todas as coisas bonitas e caras que sempre tinha querido. Mas ela era uma menina das pedreiras que sempre havia sido muito traiçoeira, muito boa em conspirar por prazer e atacar muito silenciosamente. Se ele divagasse muito, ele poderia chegar a essa conclusão. Mas Cato não era muito chegado em divagar. 

A ideia vaga, logo, foi se empalidecendo em sua mente. O tempo passou e ele precisou ver por si mesmo a expressão no rosto de Clove enquanto o começo da Turnê da Vitória do casal do 12 era exibido. Ele precisou ter a surpresa de encontrar fascínio nos olhos dela em vez de desprezo quando algum erro técnico cortou as imagens no meio do discurso da menina no Distrito 11 para devolver cor àquela fantasia.

Clove obviamente era uma grande fã de destruição, o que poderia explicar o modo quase vidrado com o qual ela se curvava no sofá, olhos semicerrados para a multidão do 11. No meio da casa do prefeito, as duas estrelinhas mais recentes do distrito estavam sendo mimadas e observadas, admiradas e invejadas, numa festa sem qualquer razão de ser.

Precisou de um tempinho extra, mas Cato finalmente começou a ver a pontinha de alguma coisa nova, uma associação dos eventos do outro dia com a ausência de quaisquer Vitoriosos do Distrito 11 no palco com os 12. Ele começou a considerar a ideia de que talvez Clove não estivesse exagerando tanto assim quando o avisou para não se associar com nada que viesse do distrito mineiro.

E mesmo assim, lá estava ela, encarando os amantes do 12 quase como se conseguisse sentir o cheiro da inaptidão adorável deles, observando com olhos arregalados a movimentação súbita no 11. Ele sorriu um pouco, sacudindo a cabeça.

Cato ficava bêbado muito mais rápido que ela e não suportava a atenção devotada que os ricos do distrito dispensavam, empenhados demais em se parecerem com a Capital, orgulhosos dele do jeito que apostadores se orgulham de um cavalo corredor que vence uma competição. Ele se afastou da parede à qual se encostava e se juntou a ela no sofá.

— Sai. Não fala comigo na frente dos outros – Clove sibilou, ainda encarando a televisão.

— A gente é colega de vitória, Clove, sossega – ele respondeu, indiferente às possíveis consequências que qualquer proximidade com ela poderia acarretar. Como sempre.

Você é que precisa sossegar.

Como se aquela troca de palavras de segundos houvesse a levado a mais completa exaustão, Clove bateu seu copo vazio de conhaque na mesa de centro e, suspirando, foi se misturar com a realeza, empurrando pro fundo da sua mente o tanto que ela costumava odiá-los e o tanto que eles a subestimavam nos seus dias de Academia. Nada brilhava mais que seu sorriso e seu vestido dourado enquanto ela encantava seu público com sua arrogância brincalhona, toda feita de educação e suavidade. 

Olhando por cima do ombro para Cato, uma perfeita aberração a encarando fixamente, olhos azuis que pareciam queimar sua pele, ela quase riu da pena que sentia dele. Ele podia ficar com ciúmes o tanto que fosse. Ia precisar de muito para superá-la.

Obviamente, a vitória de Cato ainda era muito recente. Tinha sido muito marcante, também. Seus assassinatos brutais ainda estavam muito frescos na mente. Para o resto de Panem, ele era um monstro; implacável, fabricado, semi-humano. Aquele terno e aquela bebida eram meras formalidades que não escondiam bem a besta e o demônio que viviam nele, o tempo todo competindo pela sua atenção.

Para o Distrito 2, Cato era seu problemático Garoto de Ouro. Que, contudo, tinha acabado de ser superado.

Ela agora era a Vitoriosa mais recente. De quebra, Clove ainda era uma presença agradável, diferente da presença intensa e sufocante que era Cato. E os ricos do distrito, aqueles que patrocinavam a Academia e criavam filhos perfeitos para o massacre, precisavam de uma presença como a dela, não de um lembrete intimidante da culpa que deveriam sentir por apoiar qualquer coisa que transformasse um ser humano em alguém como Cato.

Eles até podiam se lembrar dela na arena, mas sua sutileza cobria praticamente tudo e eles precisavam de alguma coisa para cobrir. Certos atributos justificavam como necessidade assassinatos cruéis e ela tinha todos eles; ela era inteligente, ela era uma boa atriz, ela era delicada de um jeito que dificilmente era associado a atos brutais. Alguma coisa em seus modos ainda denotava alguma humanidade. Era tudo explicado; ela tinha matado porque precisava sair viva, torturado porque tinha perdido a cabeça, sido um demônio porque era o que a Capital gostava.  

E ela estava bem com isso. O mesmo não valia para Cato.

Cato era um assassino bruto e Cato era acima de tudo um ingrato projeto de pária, renegando daquele jeito quem se esforçava tanto para apoiá-lo. Clove ainda era humana e Clove simplesmente sabia jogar o jogo.

As impressões que eles provocavam (ou pensavam provocar) eram levemente invertidas.

Ele mantinha os olhos nela como se eles jamais houvessem se conhecido. Clove sabia que era porque ele sempre se empenhava muito em estragar qualquer coisa que ela fizesse, ainda que não soubesse bem o que a coisa era, meramente para manter seus placares altos. Ela coçou sua clavícula vagamente. Percebendo a alteração na disposição do seu público, quase murchando sob o olhar intenso de Cato, Clove decidiu se despedir. Ela estava ficando entediada. Ninguém ali na Curia ia comentar nada sobre o erro técnico no 11 se uma aberração gigante continuasse encarando.

Ela trocou seus sapatos de salto por calçados apropriados para a neve no jardim da casa e esperou por uns segundos que ele a alcançasse porque, obviamente, ele iria o fazer.

E lá ele apareceu, diminuindo o ritmo de suas passadas uma vez que estava ao lado dela, em um silêncio suspeito. Sorrindo. Então, do nada:

— Você está obcecada com os 12 – foi uma declaração que aparentemente não deixava espaço para contestação.  

— Talvez eu tenha uma quedinha por um deles. Quer adivinhar por qual é? – ela provocou vagamente, sorrindo. Cato suspirou um riso debochado.

— Ela começou uma revolta, não foi? – ele realmente não era sutil de nenhuma forma. Clove parou de abotoar o casaco e levantou os olhos pra ele, que a olhava casualmente, como se nem tivesse falado nada especial.

— Conseguiu fazer as contas? – ela respondeu no mesmo tom. Ele deu de ombros, nem se importando em rebater. A garota o olhou bem por um tempo, considerando se ele estava disposto a falar sério. – Eu não sei. Provavelmente. Você acha?

— Pode ser. Seneca Crane já está morto, como você realçou – Cato disse, escárnio exalando por todos seus poros.

Clove o encarou por um tempo, empurrando a bochecha com a língua.  

— Teve um levante no 11 – ela falou bem baixinho, mas com muita casualidade. Cato se virou para ela de sobrancelhas franzidas, rindo do jeito estranho que a mente dela funcionava.

— E você deduziu isso só porque eles cortaram o discurso da menina?

— Cortaram o discurso porque ela talvez tenha atiçado os agricultores lá, sem querer – Clove deu de ombros de novo. – Eu estou falando de outro levante. Um antes da Turnê.

— Como você sabe disso?

— Hora certa, lugar certo.

— Ajeita suas sentenças – Cato mandou, fazendo uso de uma frase que geralmente Clove dizia.

— No dia da minha reunião com o Snow, ele estava ocupado vendo umas gravações. Ele me mostrou o 11, para enfatizar a importância da minha missão de distrair todo mundo do casal lá. A coisa aconteceu na hora que a menininha deles morreu. A Rue. Eles ficaram sentidos e acabaram destruindo a Praça Principal deles.

Ele suspirou um riso, imaginando por quanto tempo Clove tinha guardado aquelas informações só pra si, inventando potenciais, criando planos extravagantes na cabeça. E aí mais uns segundinhos pesando a naturalidade da malícia dela contra a impressão que ele teve por uns segundos de que era um pouquinho forçada.

— Eles iriam apoiar a Everdeen. Se ela tivesse coragem de começar alguma coisa – ela continuou.

— Acho que sim. Mas ela não ia querer mexer com isso. Por causa da tal irmã e daquele menino lá.

Aquele menino lá talvez não fosse ser exatamente o x da questão. Contudo, e de uma forma muito peculiar, Clove respeitava a opinião de Cato. Em certos aspectos, ele era inteligente. Em destruição, guerra, em analisar pessoas e situações como se ele fosse a quem pertencia toda a verdade, ele era imbatível.  

— Mas você acha que iria funcionar?

Cato sorriu daquele jeito estranho dele. Provavelmente reparando na menção perigosa de uma escolha de lado, naquele tom de conspiração de quem quer mais que tudo que alguma coisa seja devastada. A explicação para sua nova obsessão morava ali.

— Talvez. Pode ser burrice. Se desse errado, as coisas iam ficar... feias.

— É.

Você lá, com seu namorado... Pode ser complicado esconder uma coisa assim – Cato apontou cautelosamente, confortável frente às ideias insolentes de Clove.

— Acho que sim. Mas eu podia trabalhar dos dois lados. Quer dizer, nós somos daqui, Snow confia na gente – Clove incitou, sua voz tão suave quanto poderia ser.

Cato continuou a observando com a paixão de quem enxerga genialidade num louco, sorrindo. Ela pintava cenários, traçava rotas, falava sobre estrago como quem canta uma cantiga de ninar. Tudo era feito de um jeito muito atraente. De um jeito que fechava qualquer possibilidade de recusa.

— Mais em você do que em mim – ele observou. – Mas pode funcionar. É a porra da coisa mais louca do mundo, você sabe.

— Mas ia ser divertido.

— Acho que sim.

Eles se olharam por alguns segundos, sorrisos em suas faces.

Se Cato só não gostasse tanto daquele sorriso que ela dava quando se envolvia com esse tipo de pensamento absurdo, ele poderia ter tirado a ideia da cabeça dela, porque era realmente a porra da coisa mais louca do mundo.

Mas ele não era dessas coisas. Ele gostava um pouquinho de loucura. Se Clove estava motivada por raiva de verdade ou por aquele tipo de tédio infantil que ela costumava sentir o tempo todo, Cato não perguntou.

Se ela quisesse, então, que fosse. Quando ele deu por si, já estava hipnotizado, todo perdido na voz dela falando sobre aquele tipo de traição, nos seus olhos brilhando como se estivessem mergulhados em veneno.

A coisa toda era burrice, claro, ele sabia. Gente do 2 não devia se envolver com nada daquele tipo. Ele pensou sobre a reação que seu pai teria se o imaginasse envolvido com esse tipo de pensamento indigno. Ele iria gritar “Seu. Moleque. Ingrato.” e em cada espaço entre palavras, ele ia ganhar um chute nas costelas.  

Quando ele finalmente tinha juntado a coragem para acabar com tudo aquilo, o corpo da mãe dele estava fresco no caixão. Os irmãos dele, Teo e Gaia, estavam agora órfãos de pai e mãe e Gaia, na época, só tinha quatro anos. 

Algumas vezes, Cato precisava pedir para alguém recontar aquela história. Ele não conseguia lembrar e, por isso, sua mente pregava peças nele. Em vez de ver Wade e Brutus cuidando do enterro depois que o corpo foi encontrado em seu quintal, ele os via enterrando sua mãe viva e ela gritava e gritava. Em vez de ver Clove o encontrando um dia depois do assassinato e o puxando para longe do cadáver dela, ele a via conspirando com seu pai pra meter aquela bala no coração de Megara Hadley.

Por causa disso – por causa de uma semana depois da morte da sua esposa o corpo de Gregor Hadley ter sido encontrado no limite da floresta que dividia a vila Patrus de uma das montanhas pedreiras, o Gladiador –, Cato foi mandado pros Jogos dois anos antes do previsto, com dezesseis, independente do quão mal ele achava que sua mente funcionava depois de tudo aquilo. Mas como esperar que eles simplesmente jogassem fora um trabalho de anos? O físico de Cato ainda funcionava e ele ainda era o tributo perfeito, então dane-se, as chances dele eram tão boas quanto antes.

Então o estrago estava feito quando ele atravessou o distrito na noite antes da Colheita dos seus Jogos, na noite que o distrito reservava pro seu campeão comemorar, e bateu na porta de um dormitório na Academia. Quando Clove abriu a porta, todo o álcool consumido se concentrou em torná-lo a pessoa mais desesperada do mundo e Cato se ajoelhou na frente da garota.

— Você odeia crianças, eu sei disso, todo mundo sabe, você odeia todo mundo que não tem poder, mas Clove, porra... Eu não posso deixar minha irmã morrer. E o Teo, ele não ia dar conta, ele é burro e minha mãe sempre fala que ele precisa melhorar, virar homem, mas agora que ela morreu, ele não vai melhorar nunca mais. Então, por favor. Você não precisa gostar dela, só alimenta ela e se certifica que ela tem roupa e que a escola está funcionando e ajuda o Teo a melhorar, eu não... Eu não devia ter mexido com isso agora, eu devia ter esperado, pelo menos alguém ia ficar lá com eles, levar comida, mas agora eu fodi com tudo, então só...

Ele não conseguia perceber seu tom de voz alterado, suas descontroladas expressões faciais nem o jeito frenético que estava correndo a mão pelos cabelos e muito menos o fato de que parecia estar à beira de lágrimas. Clove, no entanto, percebeu tudo muito bem. Seu monólogo afobado de um só fôlego não tinha a dado tempo o suficiente para fechar a porta, então ela o fez porque ninguém podia vê-lo daquele jeito.

— Hadley, se recomponha. – Disso ele se lembrava muito bem, da dureza nas suas palavras. – Levanta agora, seu filho da puta.

Ele o fez e ela o empurrou até o canto do corredor que dividia os dormitórios das salas abandonadas. Se Cato estivesse sóbrio, ele se lembraria do esforço que Clove devia ter feito pra não dar um tapa na sua cara.

— Cala a porra da sua boca. Você não fez nada, nada aconteceu, você não sabe onde seu pai está. Ele sumiu desde ontem, e, por causa disso, Wade e eu vamos ajudar você e seus irmãos até tudo se resolver.

— A Colheita é amanhã, Clove, não vai...

— Eu sei. E daí? Ninguém sabe o que vai acontecer – a intensidade na sua fala e olhar finalmente foi compreendida e Cato tropeçou um pouco para trás, como se tudo aquilo fisicamente houvesse sido jogado contra ele.

Naquele momento, ainda que inconscientemente, talvez, ele havia se dado conta que uma pedra importante em seu castelo tinha cedido.

Cato voltou pro presente quando notou Clove o encarando quase com a mesma intensidade daquela noite.

— O Brutus me contou que você mandou a Gaia pra Academia.

— É, Clove, eu te falei que ia fazer isso mês passado.

— As pessoas mudam de ideia de um mês para o outro.

Isso era a tentativa de Clove de recomeçar uma conversa. Ele queria que a atenção deles parasse de gravitar ao redor dos Jogos e da Capital e de tudo isso, mas. Não tinha mais nada para se prestar atenção. Na verdade, Cato tinha pensado que depois que eles dois houvessem finalmente atingido seus objetivos de vencer os Jogos, não iriam nem se falar mais. Não era esse o propósito da aliança deles o tempo todo?

O problema era que os Jogos se resumiam a mais do que só ir lá e matar as outras vinte e três pessoas. Por causa disso, para Cato, ele estava basicamente preso com sua designada parceira de treino para sempre, a menina muito pequena e muito cruel que ele nem devia ter conhecido pra começo de conversa.

— E aí ela simplesmente não iria pra Academia? Como que isso ia parecer pra todo mundo? Ela já está um ano atrasada. É capaz de eles escolherem ela para ir.

— A Zenobia faria isso – Clove concordou, dando de ombros. – Para conseguir patrocinadores e criar aquelas historinhas loucas dela que eles adoram lá na Capital.

— É, seria perfeito. Então é melhor ela treinar, ficar boa em alguma coisa. Teo é até bonzinho com as espadas. Talvez sejam os genes – essa era uma variação da sua atitude constante de se gabar, mas Clove sorriu de volta pra ele, como se estivesse conformada com seus desagradáveis traços de personalidade.

— E o Teo? Por que você acha que eles não vão chamar ele?  

Cato ficou em silêncio por uns segundos, procurando a chave da casa nos bolsos.

— Eles não vão chamar ele. – Era o veredito final. Ele não ia explicar nada pra Clove, ela que era a inteligente. Explicar o quê, afinal? A esperança cega dele?

Teo era o tributo perfeito, exatamente como ele tinha sido. As chances diziam que ele iria ser escolhido e em três anos ou menos estaria na arena assim como ele. Ele odiava o garoto um pouco por causa disso, porque ele não ouvia ele, que nem Clove não tinha ouvido e que nem Gaia não ia ouvir. 

E mesmo assim, porque ele era incapaz de fazer melhor, ele os deixava morar na antiga casa da família, na Vila dos Pacificadores. Sozinhos, para que enchessem a cabeça com promessas falsas e ideias distorcidas sobre o que orgulho significava.

Claro que eles iam preferir morrer do que morar com ele ali na Aldeia dos Vitoriosos, com os gritos à noite e Clove entrando e saindo nas horas mais estranhas, mas mesmo assim ele se odiava por não conseguir segurar tudo junto que nem sua mãe fazia. Tudo devia estar perfeito como sempre tinha sido, ele devia conseguir fazer isso, ele era perfeito antes de tudo.

Agora, tudo estava sempre errado. Gaia não era tão boazinha quanto devia ser e odiava Clove na mesma proporção que tentava ser ela, toda cheia de arrogância e teimosia. Teo era um lembrete constante do que devia estar certo e não estava, do que antes era perfeito e coerente e agora nem sequer podia ser entendido.   

E Cato não conseguia fazer o trabalho emocional. O tempo todo ele sabia que havia alguma coisa errada, alguma coisa faltando. No entanto, ele não conseguia nomear essa coisa. Ele sabia que, quando ele tinha a idade de Gaia, sua mãe cantava bem baixinho algumas músicas pra ele. E ele imaginava se Teo cantava pra ela. Se era apropriado que alguém cantasse. Se Gaia ia acabar diferente por isso.

Ele não conseguia fechar uma ideia sobre o quão pior ou melhor eles estavam sem ele.

— Você vai pra aquela festa que a Rania vai dar? – Clove voltou a dizer enquanto ele tirava o casaco, já se deitando na sua cama.

— Rania...?

— Você até sabe imitar ela, olha, fingindo que esqueceu o nome das pessoas que fodeu. Rania, daquela loja de sapatos. Aquela do marido que engravidou a filha de um cara que trabalha pro Snow.

— Ah. Depende de quem eu vou pegar. Às vezes a pessoa não foi convidada.

— Acha um jeito de ir.

— Pra quê?

— Eu vou estar lá, com o Naevio— a leve torção de nojo na boca dela ao proferir o nome do homem o agradou. Mas o agrado parava aí.

— É pra eu ir lá ficar te vendo com ele ou...?

— Você sempre pode fechar os olhos se não quiser ver – ela rebateu, por puro reflexo. Então ela voltou atrás: – Não. Quer dizer. Eu vou estar lá na Capital e você também e nós somos uma equipe, então...

Clove estava correndo a mão nele agora, tocando seu braço e brincando com os botões da sua roupa. Ele a encarou até que ela levantasse os olhos e retribuísse o olhar. Ela subiu as sobrancelhas e sorriu e Cato soube que Clove tinha outros planos e expectativas pra aquela festa.

Ela era muito estranha, então era óbvio para Cato que ela ia querer se trancar com ele em algum quarto da casa da tal Rania pra que ele pudesse foder ela embaixo do nariz do seu namorado novo. Ela gostava muito dessas coisas.

Mas tinha outro tipo de sugestão nas palavras dela. Uma sugestão que era movida pela mesma espécie de prazer esquisito que ela sentia em elevar a traição deles a outro nível.

Clove queria ir naquela festa na Capital pra descobrir o que quer que houvesse sobre uma rebelião. Aquele tipo de coisa não era feito assim, mas, naquele momento, ele não estava em condições de explicar nada pra ela, muito menos a contrariar em alguma coisa que ela nem havia dito ainda.

Ele se curvou até que seus braços a prendessem na mesma posição e a beijou.

Aquela coisa de revolta ia estragar tudo. Ele devia ficar longe da Clove porque a loucura dela era perigosa, ele ainda estava com raiva da sua ida pros Jogos (que só podia ser entendida como uma traição) e ele nem era muito chegado nela pra começo de conversa. Ele queria odiar ela. No fundo da sua cabeça, Cato estava pensando que ela iria voltar pra Capital em dois dias, de novo. Que ela passava mais tempo lá do que no distrito deles e que aquela coisa de meio que encostar nela enquanto eles dormiam era errada. Ele ponderou sobre o namorado dela, o homem rico e esquisito que estava sempre esmagando seus dedos, prendendo a mão dela com muita força sempre que ele os via na televisão e sobre Clove falando mal dele toda vez que chegava em casa.

Mas Clove tomou a iniciativa de desabotoar suas roupas e ele pensou que, você sabe, ela provavelmente não fazia isso com o namorado dela. Além do mais, tinha aquela chance de que, como sempre, Cato ia simplesmente fazer o que quer que Clove quisesse.  


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Notas finais do capítulo

PRONTOOOO (só rapidão aqui: eu ia descrever essa festa aí, mas acabou que não rolou e é melhor não criar expectativas pra coisa que flopou né kkkkkkkkk). Algumas coisinhas aí eu tirei de outras coisas que eu já escrevi sobre Clato e que ainda me parecem coerentes, então.... Eu gosto demais do Cato ser simplesmente doido e surtado e a Clove ser doida de um jeito..... diferente. Clato é importante e ainda deveria ser relevante, o que me deixa triste diariamente kkkkkk É Isto. Eu acho que seria muito legal se a gente começasse bem e vocês comentassem só pra, né. Dar aquele incentivo básico. Enfim. Espero que vocês tenham gostado, que tenham uma semana incrível e beijão ♥



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