Glory and Gore escrita por Iulia


Capítulo 18
I'm under, sinking to the darkest sea.


Notas iniciais do capítulo

Oi, famíliaaa! O compromisso com a causa CLATO me fez voltar uma hora dessa.... E ai, gente, tanta coisa pra falar sobre esse capitulozinho, porém sem palavras..... Ele é bem tristão. E talvez a linha do tempo dele não bata direitinho com a do livro, mas vamos FINGIR. Outra coisa: TRIGGER WARNING para suicídio. E sobre o título dele, eu juro por Deus que foi difícil demaaaais achar, nada parecia encaixar direitinho, mas esse eu tirei de SCAR de Beyoncé, 070 Shake e Jessie Reyez. Nóis se vê lá embaixooo!!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/765680/chapter/18

Enquanto estava deitada, Clove Kentwell começou a imaginar como seria viver no meio de uma guerra. Uma de verdade, uma que não fosse feita de silêncios calculados e batalhas secretas.

A imagem quase não se formava, mas ela imaginou se Cato finalmente pararia de esgueirar um olhar pra ela a cada minuto, se ele tivesse alguma outra coisa para ocupar sua mente. Ela imaginou se as marcas em sua pele iriam finalmente sumir ou se ela meramente ganharia outras novas. Ela imaginou se havia alguma chance de que Snow realmente fosse cair.

A coisa com Clove é que ela sempre parecia prever o que ia acontecer. Quando ela voltou para casa dos Jogos e encontrou o olhar de Cato, ela soube que as coisas tinham mudado para sempre. Quando o presidente assinou um contrato de três anos com o homem da Capital, ela soube imediatamente que nada daquilo acabaria bem. Quando Cato foi muito cuidadoso com ela na noite antes da Colheita, ela soube que uma condenação tinha sido proclamada.

Contudo, deitada lá, Clove não conseguia mais prever o que iria acontecer.

Porque ela sabia que, lá no fundo, ela não se importava mais. Ela sabia que isso tudo estava errado e que ela devia se importar porque tudo que viria pela frente seria grande, majestoso e era dessas coisas que ela gostava. Clove ouvia a voz na sua cabeça dizer “acorda” o tempo todo.

Mas as marcas eram mais profundas, agora.

Havia um silêncio sufocante dentro de Clove, agora, um silêncio diferente de todos os outros que ela tinha sido forçada a suportar. No começo, quando Iovita disse muito suavemente o que era esperado dela enquanto Vitoriosa, seu silêncio se assemelhou um pouco com aquele de agora, mas ainda assim não tinha a mesma magnitude, o mesmo potencial de destruição. O trabalho estava feito e o vômito tinha queimado sua garganta, mas ela ainda parecia mais composta quando Cato adentrou seu quarto com uma pílula para dormir. Eles sustentaram olhares. Ela começou a falar.

Naqueles dias, quando o trabalho estava feito, o corpo de Clove caía no vazio. Sua cabeça vagava, vazia de tudo e qualquer coisa. Ela não conseguia sustentar o olhar de Cato. Ela não conseguia falar.

Então Clove simplesmente não se importava mais com nada. 

Não fazia mais diferença. Ela teria o sobrenome de Naevio e uma vida de condenação ou a Capital iria cair.

(Contudo, havia tempo que Clove não conseguia achar onde terminava ela e onde começava a Capital).

Ela esperava que ninguém fosse se machucar muito, que Cato não fosse se machucar muito, que Dom e Attico terminassem vivos e que ninguém mexesse com Gaia e Teo. Mas Clove tinha parado de criar os planos extravagantes na sua cabeça porque, a qualquer momento, Naevio iria ligar pra ela e ela se transformaria na mesma criatura fraca de sempre, deixando ele, chorando depois, sentindo aquela coisa queimar suas entranhas por dias e dias. Aqueles jogos antigos agora eram doloridos. Ela não ia mais deixar todas suas ideias improváveis de sempre se infiltrarem porque a cada vez que ela precisava voltar para a realidade sufocante, tudo parecia doer mais.

Então, enquanto adormecia, Clove Kentwell torceu de verdade para que não acordasse mais.

x

No outro dia, contudo, ela acordou. Seu corpo ainda doía, havia um remédio na mesa de cabeceira e passava das quatro da tarde.

Apesar de não saber exatamente que horas tinha ido dormir, Clove imaginou que era ruim ter deixado seus tributos sem supervisão por tanto tempo, seus tributos que haviam sustentado sua vitória, os tributos com os quais ela afirmou ter compromisso total. Então Clove se sustentou embaixo do chuveiro e se arrumou de acordo com as definições de seu estilista, Prioric, que tinha se empenhado tanto em combinar cada peça de roupa escolhida com o personagem de Clove Kentwell.

O personagem de Clove Kentwell, a garota da Patrus que tinha conseguido exatamente o que tanto queria. Certo?

Do lado de fora, Prioric, Kirana e o Iovita eram os únicos sentados na sala.

— Olha se alguém não está de ressaca! – Prioric guinchou ao vê-la avançando em direção ao elevador.

— Para de gritar. – Ela disparou, num sibilo. Força do hábito, meramente. No segundo seguinte, colocando um sorriso no rosto, ela se virou para encontrar as expressões patéticas de choque no rosto deles todos. Ela rezou para que jamais parecesse assim. – Peguei você, seu escandaloso.

Ela queria que pudesse ser como Cato, cuja equipe de preparação jamais ousaria sequer falar se ele não parecesse estar num bom humor. Eles haviam construído personas diferentes ali na Capital e infelizmente seu charme consistia naquele tipo de joguinho venenoso de menina de escola, os tapas e as mãos escondidas em seguida, os sorrisos falsos e aquele relacionamento complicado, cruel, com qualquer um. Era conveniente, era quase o que ela era – ou havia sido.

Eles todos começaram a rir. Todos menos Kirana, a estilista de Brutus, a que era chegada a Cato porque ele podia cuspir umas palavras charmosas às vezes. Ela estava chateada porque acreditava piamente que ela e Cato não estavam trabalhando em equipe de novo e todos ainda estavam secretamente frustrados com eles por conta do fracasso do ano anterior, já que eles tinham a mais absoluta obrigação de sustentar seus cinco minutos de fama.

Kirana era a única que tinha anos trabalhando com os tributos do 2, a única que se afeiçoava a qualquer um deles que fizesse mais que rosnar e ser rude, a única que tinha coragem de dirigir a palavra a Cato quando ele estava com raiva. E a única que não era muito chegada à Clove desde sua edição, quando ela tinha a visto mandar Cato se foder mais vezes do que um simples tributo deveria.

O atrevimento.

Ela estava chateada porque Cato e ela não estavam andando juntos por qualquer que fosse o problema que eles tinham um com o outro, porque eles não sabiam trabalhar em equipe, porque Clove não o tratava com o respeito que deveria.

Ela continuou observando Clove, que endureceu as feições para ela.

— Cato pediu para te lembrar que houve uma mudança de planos e você vai assumir o turno da noite – Kirana finalmente abriu a boca depois do que pareceram horas a olhando com toda aquela repreensão que não cabia a ela prover.

Clove sustentou seu olhar sem nenhum traço de suas gracinhas perturbadoras.

Mudança de planos. Quando eles tinham acabado de decidir que não haveria revezamento. Kirana então havia entendido que aquilo era Cato dando a Clove mais desconto do que ela merecia, como sempre.

No fundo, Clove queria que Kirana pudesse ter conhecido Cato na Academia, quebrando os ossos de qualquer um que entrasse em seu caminho, suas juntas feridas por conta de todos os narizes que tinha quebrado. Ela queria que Kirana pudesse tê-la conhecido em seus dias de glória, quando eles andavam pelo 2 como os deuses que eram e quando parecia que seus reinados nunca iriam acabar.

Ela sustentou o olhar da mulher até Kirana dar pra trás e abaixar os olhos para seu copo.

— Ah, é. Cato é sempre tão legal comigo – Clove ronronou, decidida a enraivecer Kirana mais um pouco, tom afetado e olhos arregalados e tudo, porque que ela se fodesse, também. – Obrigada, querida.

Clove voltou para o seu quarto, ainda querendo mais daquela satisfação passageira que havia tido com a expressão ultrajada da estilista ou a raiva que a voz aguda de Prioric a transmitira ou o ódio por ter perdido tudo tão de repente.

Mas nem tudo. A aliança que ela tinha com Cato tinha permanecido, tão pungente quanto o sangue, tão forte quanto o ferro.

Então talvez ela devesse descer, afinal, ignorar a tentativa de Cato de livrá-la daquele circo. Quando ela esbarrasse nele, talvez cambaleante e com olhos enevoados, talvez fechando negócios com companhias que não poderiam de verdade o oferecer muito, uma onda de raiva a inundaria. Ela então poderia voltar a se sentir superior a ele. Ela não entenderia as coisas que ele falava, que nem ela fazia antes. Quando ela o visse com outra pessoa, ela quebraria vasos e arranharia seu rostinho bem cuidado e, se tudo desse certo, haveria raiva em seus olhos, também, e as marcas dele cobririam as de Naevio.

Mas nada daquilo era possível, não mais; as cordas eram muito apertadas, as gaiolas eram muito bem vigiadas. As marcas eram muito profundas; elas cobriam todo o espaço em seu ser.

Cato devia saber que todo mundo ia desconfiar quando ela só aparecesse de madrugada, quando os tributos dormiam e os patrocinadores estavam definhados demais no álcool para reparar nela. Naevio ia não só desconfiar, mas saber mais uma vez e mais marcas viriam e ela devia se importar mais porque Cato ia acabar morto de verdade no segundo que Naevio reclamasse dele para Snow e Gaia e Teo estavam sozinhos em casa e tudo era uma teia intrincada demais para ela.

E ela estava deitada lá, deixando tudo acontecer porque não tinha mais da onde tirar vontade de se importar, de explicar pra ele que ela era uma armadilha e que ele devia levar tudo a sério. Havia esperança emanando dele e ela não podia suportar porque alguma coisa em toda aquela história de fugir da Capital daria terrivelmente errado e ele precisava ver isso.

Clove não queria assistir aos Jogos, mas ligou a televisão mesmo assim, tentando aplacar aquelas visões terríveis em sua mente. Ela se sentou na mesma postura rígida e concentrada que costumava exercer na Academia, quando dissecar os Jogos era seu dever.

Mags Cohen havia sido morta por uma neblina tóxica. Ela imaginou se Finnick estava arrependido, se passou pela sua cabeça que o suicídio de Mags poderia ter sido evitado não fosse aquela história de rebelião e o dever deles de manter a menina do 12 viva. Ele trocou um olhar com Johanna Mason, um que parecia com o de Cato quando eles acompanharam Brutus e Enobaria ao aerodeslizador.

Ela viu Cato sendo o corpo sem vida e não haveria ninguém para trocar olhares com ela porque Naevio se certificaria de que ela sequer levantasse os olhos do chão.

Em alguns segundos, Clove disparou para o banheiro, a bile queimando sua garganta.

Clove não estava exatamente pensando quando apertou o botão do elevador, agindo sob a necessidade de encontrar alguma coisa familiar no meio de todo aquele show de horrores que apertava sua garganta com mãos de ferro, se agigantava sobre o que havia de certo em seu mundo.

Ela precisava achar o que permaneceria, como sangue e ferro.

A realização invadiu sua mente; todas aquelas pessoas na televisão iam continuar morrendo e morrendo até Katniss se erguer sobre as monstruosidades da Capital. As memórias das festas e das recepções, todas elas passariam a ser povoadas por fantasmas. Ela veria Johanna Mason usando verde na festa de Rania; ela estaria bonita, mas seu corpo estaria coberto de sangue, se amontoando nas juntas de seus dedos, empapando seu cabelo.

Ela consertou seu batom vermelho no espelho do elevador, imaginou o que Cato falaria quando a visse ali, se ele teria coragem de falar com ela, se ele olharia em sua direção, se ele deixaria eles verem.

Apesar de suas fantasias, Clove não descobriu o que Cato faria. Ele não estava em lugar nenhum que ela pudesse ver, então ela sentiu seu coração tentar atravessar sua caixa torácica e se sentou no bar, porque só uma dose de conhaque poderia ajudá-la em sua busca naquele inferno.

Demorou dez minutos e Clove se perguntou se ainda havia algum rastreador embaixo da sua pele ou se sua tese sobre ele espiar seus pensamentos era verdadeira.

— Por que você é teimosa assim, bebê? Cato disse que era pra você estar descansando agora –Clove viu suas mãos pousarem em seus pulsos quase no mesmo instante que a mão de Naevio tocou suas costas. Ela rezou para que não estivesse com a expressão que tinha visto mais cedo nos olhos de sua equipe.

— Quem seria eu se escutasse o Cato? – ela respondeu, como se estivesse lendo um roteiro, recebendo um beijo estalado nos lábios.

— Não a mulher por quem eu me apaixonei, com certeza.

Clove não odiava Naevio pelas coisas que ele fazia na cama. Ela poderia se acostumar com as marcas, ela poderia passar a sentir menos repulsa por ele com o convívio, ela pensava, eventualmente. Clove o odiava pelo jeito que ele agia fora da cama. Ele não devia se atrever a fazer conversa fiada sobre amor e sobre o tanto que ele cuidava e adorava ela. Aquelas ameaças vagas, todas aquelas insinuações sobre Cato não deveriam sair da boca de um homem que fazia o que fazia.

Clove queria que ele pudesse tratá-la com a brutalidade que ele usava no quarto, para que ela sempre soubesse onde pisar. Ela queria que ele a chamasse por um daqueles apelidinhos ridículos, que ele a xingasse, que ele fosse honesto sobre suas putarias.

Aquela dança alucinada era exaustiva.

No silêncio que se estendeu, Naevio perfurou Clove com seus olhos de urso apertados, sorrindo vagamente. Como sempre, uma diversidade de coisas que jamais seriam pronunciadas estavam sendo ditas. As mãos de Clove procuraram a marca mais nova que descia por suas costelas. Ela sorriu de volta, os cantos de seus olhos tremendo de leve, sua face pálida como papel.

— Por que você não aparece lá em casa amanhã?

Houve um sorriso, um aperto em sua bunda e espera nenhuma por uma resposta. Não era um convite nem nada do tipo, então Naevio só se despediu com outro beijo estalado e deixou o prédio.

A bile voltou a queimar a garganta de Clove, que empurrou tudo pra baixo com mais conhaque. Ela desistiu de procurar por Cato. Qual era o ponto daquilo? A aliança deles devia ser renunciada ali, certo?

Clove se esforçou o máximo que podia, mas uma única lágrima escapou de seus olhos mesmo assim. Ela voltou apressada para seu andar, sem querer concedê-los mais aquele entretenimento.

Suas pernas pareciam muito fracas quando ela se sentou na banheira gigante. Ela não suportava mais Cato, toda hora se insinuando em sua cabeça, nem Naevio sufocando sua existência, ou Brutus assassinando Cetrina, do 5, por “piedade” depois que uma onda gigante a atingiu. Nem Snow, obrigando todo mundo a ter que sustentar a porra de uma rebelião.

Era demais.

Tudo agora era embolado e saturado e ela nunca podia resolver mais nada, porque nada mais pertencia só a ela (nem ela mesma), nada ficava em seu poder. A vida era uma coisa complicada daquele jeito, quando se precisava considerar todos os vários aspectos de tudo, quando se parava de ver as coisas em preto e branco.

Clove não costumava conseguir entender os discursos embolados de Cato sobre tudo ser demais, mas agora ela via, em todas as cores. E isso, aquelas intrusões violentas em seu mundo módico, ela não podia tolerar.

— Pelo amor de Deus, levanta.

Do nada, um ato de violência, de crueldade, aconteceu; uma mão puxou seu braço e as coisas voltaram a parecer obscuras, confusas e todas suas linhas pareceram borradas de novo. Seus pulmões pararam de doer, tudo estava de volta e ela não podia mais tomar suas decisões.

— Mas que porra, Clove. Você tem que parar com essa merda – Cato meio que gritou, puxando uma toalha e quase a esfregando em seu rosto. Mas ela ainda não tinha capturado o ar direito, então ele se ajoelhou ao lado da banheira e segurou seus braços. – Respira. Só respira.

— Que porra você está fazendo aqui? – ela finalmente exclamou, para cortar seu olhar gelado, seu aperto forte demais. Cato a soltou, mas não estabilizou sua respiração ou desviou o olhar.

— Eu te vi lá embaixo. Eu não entendi que porra você foi fazer lá, então eu subi pra saber que diabos você queria – ele respondeu secamente, mandíbula travada, sua respiração parecendo exigir muito esforço. – Que bom que eu vim, não é, se não eu nunca ia saber.

Clove costumava amar o jeito que palavras podiam cortar, podiam reabrir feridas feias, podiam desviscerar pessoas.

Naquele dia, Clove sacudiu a cabeça, fechou os olhos e imaginou que devia abaixar a cabeça de novo na água para poder parar de ouvir Cato, de vê-lo com aquela expressão de ódio pelos motivos errados. Ele ficou calado por vários minutos, a encarando.

— Toda vez que uma merda acontece, você pega e afunda sua cabeça na porra de uma banheira, certo? Aí minha parte preferida é quando eu puxo você, toda roxa, e você inventa de dizer que estava só pensando. Eu fico admirado com o seu cinismo, sabia, porque depois você chega pra mim dizendo que eu que tenho o caralho de uma “coisinha” por suicídio.

Ele não estava gritando, sua voz saía em um rosnado difícil de ouvir. Ela preferia que ele estivesse.

— Você se importa?, eu ainda preciso tomar banho – ela cuspiu, fuzilando seu rosto.

— Aham, eu me importo. Toma a porra do seu banho aí, eu espero – Cato latiu, a raiva ainda exalando de seus poros.

— Você quer foder, é isso? Só fala logo.

Essa era a hora que Cato devia se levantar, pensar sobre gritar e decidir sair porque certas sugestões em momentos como aquele o deixavam irado. Dessa vez, ele permaneceu calado e Clove se perguntou se ele estava abrindo e fechando os punhos em cima dos joelhos porque queria demais fechar as mãos ao redor do pescoço dela até aquela merda acabar. Mas Cato não falou nada, não avançou em sua direção, não gritou. Ele se virou de costas para ela, mas lá ficou, as costas apoiadas contra a banheira.

Silêncio.

Talvez ele estivesse sentindo um tipo diferente de ódio.

— Você não decide essas coisas. Se eu quero morrer ou viver ou o caralho a quatro, o problema é meu – suas palavras estavam escapando com uma suavidade estrangeira.

— Eu sei – ele grunhiu, ainda ridiculamente virado para o outro lado. Clove estava prestes a agarrar seu pescoço e forçá-lo a olhar para ela porque ele devia até que umas palavras indefiníveis foram balbuciadas. Murmúrios. E Cato não murmurava.

— O quê?

— Você precisa me falar! Porra! – Cato gritou de repente, batendo com o punho no tapete. Clove se encolheu, surpresa de um jeito que não devia ficar, porque era o Cato. Ela inspirou o ar profundamente e tentou voltar ao normal, mordendo sua bochecha de leve. Então, quando ele finalmente se virou, ela bateu as costas na ponta da banheira com tudo, sentindo seus pés escorregarem pela superfície de mármore. Havia lágrimas marcando o rosto vermelho de Cato. – Você não pode só decidir que quer morrer e enfiar a merda da sua cabeça embaixo da água, você precisa... Você tem que me falar, Clove, porra. Se você quer jogar a toalha, me avisa, fala comigo.

Veias, olhos de vidro e desespero era tudo que Clove conseguia ver. Ela não havia juntado coragem para respirar pelos últimos vinte segundos. Ela sentiu a ponta da banheira começar a furar a pele de suas costas, mas ela mesmo assim não se moveu. 

Ela continuou paralisada, encarando o rosto selvagem de Cato como se jamais houvesse visto nada parecido. (Ela não havia visto).

— Me fala, Clove, você tem que me falar – Cato sussurrou. Um arrepio correu pela pele doentiamente pálida de Clove. Ele suavizou seus olhos e desviou o olhar para o lugar onde o 1 tinha enfiado a faca em sua perna. – Porra, se eu entrar em um banheiro aqui da Capital e encontrar seu cadáver, Clove, isso ia me foder. Isso ia ser a maior merda de todas.

Clove não tinha uma resposta. A aliança deles era de sangue, era feita de ferro. Claro que ela tinha que falar.

— Eu não consigo te falar, eu não sei quando vai acontecer – depois de longos segundos, ela finalmente soltou, ainda na mesma posição, como se raízes estivessem a prendendo longe dele. Clove percebeu que poderia falar qualquer coisa para fazer Cato ir embora com aqueles olhos estranhos dele, aquelas lágrimas que não o pertenciam manchando sua camisa. – Eu não planejo essas coisas.

— Mas e a nossa aliança, Clove? A gente é a porra de uma equipe, você fala o tempo todo – e soou como se ele estivesse implorando. Mas Cato não implorava, que Deus proibisse, então Clove quis o empurrar e sair correndo daquele quarto, daquele prédio, daquela cidade. – Não dá pra você morrer assim, desse jeito. Você precisa esperar mais um pouco. Se depois dessa merda toda você ainda quiser, beleza. Mas não faz isso agora. Você não pode. Você não pode fazer isso comigo. Por favor.

Por que você se importa, por que você fala essas coisas, por que você tem esses olhos, por que você quer que eu fique viva se eu assino a porra de sua sentença de morte toda hora (?).

Porque nossa aliança é feita de sangue e é sagrada e é o que mantêm nossos fios vitais. Nós precisamos derrubar a Capital antes de perder a juventude.

Clove poderia dizer “vai embora, porque nada disso vai melhorar quando eles explodirem aquela merda de arena, a gente está condenado desde o começo, acaba logo com essa sua esperança idiota”, mas haviam compromissos maiores, aqueles que haviam sido feito aos nove, quando o prisioneiro da Capital morreu e os atou para sempre.

Cato estava exatamente igual no dia que achou o cadáver de sua mãe.

— Ok – a palavra escapou de seus lábios antes que ela percebesse.

Ele ainda tinha aqueles olhos esquisitos, olhando ela com uma expectativa desesperada. Ela finalmente entendia o que diabos era o problema dele com ela, entendia por que a aliança deles era diferente.

Ela tinha visto o mesmo problema nos olhos de Oto Sagi, largando a Academia por causa de Drusa Plate, ela tinha visto em Bac Sevina observando Iana Kamp cruzar a Patrus.

— Me desculpa – ela disse, sustentando seu olhar. Tinha pena nos seus olhos? Tristeza? O mesmo que tinha nos dele? Clove não saberia dizer. Lealdade como a que havia entre a deles só poderia encontrar fim se eles abandonassem a vida ao mesmo tempo, afinal, e ela não deveria deixá-lo. – Me desculpa.

Como se desviar o olhar fosse matá-lo, Cato simplesmente acenou com a cabeça, sem os traços de raiva em suas feições. Clove sentiu os cantos dos lábios se voltarem para cima, sua pele se livrar dos arrepios. A ponta da banheira parou de torturar sua pele quando ela se aproximou mais dele.

Era sagrado, certo?   

Cato se curvou e ela deixou que ele a beijasse daquele mesmo jeito calmo do outro dia. Ela traçou formas em seu braço no mesmo segundo em que ele percorria a inexistente cicatriz do garoto do 1 em sua perna.

Era a sentença de morte, mas o que mantinha seus fios vitais.

— Eu preciso encontrar o Naevio hoje – ela murmurou, como um aviso.

— Eu sei – Cato respondeu, simplesmente, em um tom muito baixo. – Eu também tenho uma coisa pra resolver. Você pode assumir um pouco antes de sair?

— Eu vou me arrumar e desço.

— Claro – ele disse na mesma hora, se levantando. Mas aquele era um “claro” estranho, um “eu sei” suspeito. Com uma calmaria despropositada, Cato se levantou e deixou o quarto, como alguém que caminha com satisfação para um destino certo.

Clove tinha uma ideia do que aquilo significava. Ela tinha visto a mesma cena inúmeras vezes.

Ela terminou o banho. Ela não encontrou Cato em lugar nenhum.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Ai e aí?? Sem palavras, né. Eu TAMBÉM. Mas, assim, família, já tá chegando uma outra fasezinha da história que nos dará mais oportunidade de ver coisas menos péssimas!!! VEM AÍ. Ai, sentida, de verdade. Toda vez que leio esse cap eu fico ABALADA. Mas enfim. É isto. Obrigada por lerem e beijãooo!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Glory and Gore" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.