Quer dar o fora daqui? escrita por Lillac


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

A proposta inicial dessa história era uma one-shot, mas, como sempre, ficou longa demais e eu precisei dividir. Então serão três capítulos não muito longos.
Recentemente eu estou gostando cada vez mais do universo de Magnus Chase, então eu precisava incluir eles aqui também. Mas a fanfic não contém spoilers para quem ainda pretende ler.
Enfim, espero que gostem!



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— Eu não entendo. Se a sua mãe é CEO de uma empresa de livros, por que você precisa ir para esse desfile?

Annabeth conteve um suspiro pelo que pareceu a décima vez naquele dia, enquanto contornava o esboço que havia terminado. Ela olhou por cima do ombro para a própria cama, onde os dois garotos estavam. Magnus, apoiado na cabeceira, com uma revista que havia pegado da prateleira dela, e Jason, deitado de peito para cima equilibrando a cabeça perigosamente fora da cama.

— Para com isso — ela resmungou, franzindo o rosto — você sabe que me dá agonia. E outra: eu já disse que você vai acabar quebrando seus óculos assim.

Jason riu, a mesma risada simples e tímida, e rolou os perfeitos e irritantes olhos azuis, mas ajeitou a postura — e empurrou os óculos de volta para o topo do nariz.

— Primeiramente, minha mãe não é a CEO da empresa de livros, ela é a proprietária. Tem diferença. E segundo, é comum que empresas de ramos completamente diferentes sejam parceiras. Estamos falando de negócios, não de campos criativos.

— E terceiro — Magnus completou sem levantar o olhar — é da empresa de arquitetura que projetou a maioria dos estúdios da Vênus que a tia Atena é CEO.

— É — Annabeth deixou-se recostar na poltrona — tem isso.

Haviam poucas pessoas com as quais Annabeth realmente conseguia falar de seus problemas, e Magnus era uma delas. Não apenas porque eram primos, mas porque suas vidas eram tão assustadoramente parecidas que parecia trabalho de alguma entidade superior com muito tempo livre.

— OK, recapitulando — Jason pronunciou-se. — Vai ter esse... evento de gala, com um desfile e um jantar de luxo, e você precisa ir. E a sua mãe só te avisou ontem?

— Ela estava ocupada — Annabeth resolveu deixar de fora o fato de que Atena estivera, aparentemente, muito ocupada durante as últimas três semanas para entrar em contato com ela — deve ter esquecido.

— É um evento com a Corporação Vênus — o outro garoto arqueou uma sobrancelha, incrédulo — que é, tipo, a maior empresa de moda, cosméticos e agência de modelos desse lado do globo. E ela “esqueceu”. Hm.

Annabeth não tentou convencê-lo, porque Jason não era burro: estava mais do que claro que Atena não lhe dissera antes porque simplesmente não se importava se Annabeth estaria disponível ou não. A “vida pessoal de Annabeth Chase” não existia no vocabulário da maior arquiteta e engenheira dos Estados Unidos.

— Meu vestido vai chegar às sete. Eu preciso estar no salão às sete e meia para não perder a sessão que ela marcou para mim, o que, como vocês sabem, é humanamente impossível considerando o trânsito — explicou —, além disso, ainda preciso entregar esse esquema ainda hoje, depois do almoço, e não posso mais faltar nenhuma aula de História da Arte. Eu...

— Precisa da nossa ajuda, sim — Magnus completou antes que ela pudesse. Ele fechou a revista e pousou-a no colo. — Antes que você fique doida.

Annabeth batucou com a lapiseira na mesa, como fazia quando ficava ansiosa. Não era pelo jantar (ela já estava mais do que acostumada com essas formalidades), mas até para ela o dia parecia estressante demais. Parecia que haviam batido sua rotina em um liquidificador e espremido depois.

— Não posso pedir isso de vocês.

— Annabeth — Jason parecia estar segurando a risada — são cinco e meia da manhã, e você nos acordou porque bateu com o joelho na própria escrivaninha e quebrou sua xícara de café. Eu acho que nós já passamos dessa fase de ter vergonha de pedir por favores, né?

Ela encolheu os ombros involuntariamente. Jason e Magnus eram gentis demais para dizer qualquer coisa em voz alta, mas ela sabia que deveria estar horrível após uma noite em claro regada à estresse e cafeína. Só podia esperar que a maquiadora fosse capaz de fazer milagres.

— Vamos fazer o seguinte: você vai para a faculdade, faz o que tem que fazer, e depois passa na filial para entregar os esboços. Dependendo de quanto tempo demorar, eu posso ir te buscar. Vem para casa, toma um banho...

— Eu te levo para o salão... — Jason intrometeu-se.

— ... A tempo de pegar a sessão marcada. Eu fico aqui, espero pelo vestido, assino a entrega, e levo para você lá.

Annabeth ponderou. Não gostava de ter Jason e Magnus fazendo as coisas por ela, mas gostava menos ainda de decepcionar sua mãe — e isso não era apenas o lado criança e emocional dela falando. Sua carreira, quase literalmente, dependia de agradar a Atena Chase, ou melhor, seus funcionários.

Com o décimo primeiro suspiro, ela abaixou a cabeça e concordou.

 

 

O plano dos garotos parecia bom — o que, é claro, quer dizer que deu completamente errado.

Mas, antes, ela pegou o metrô e chegou na faculdade, sentindo todos os já conhecidos efeitos da falta de sono castigando seu corpo. Jason se oferecera para lhe dar uma carona, mas Annabeth se viu obrigada a reclinar: ele ainda precisa terminar as planilhas do próprio estágio.

Conferindo a hora no relógio, percebeu que ainda tinha alguns minutos antes da aula, e passou na lanchonete. Como esperado, a fila estava enorme: muitos outros alunos que não conseguiam tomar café antes de sair de casa dependendo da comida da faculdade.

Ela não gostava de trapacear, mas sua paciência, bem como o seu tempo, não estava em estoque. Fisgou o celular do bolso traseiro e digitou:

Annabeth.

[6:50 a.m]

Você está trabalhando hoje?

Infelizmente, a resposta não veio no próximo minuto — nem nos dois depois dele. Ela bufou, exasperada, e depois balançou a cabeça, repreendendo-se. Não podia ficar com raiva porque sua amiga não tinha tempo para ajudá-la a furar a fila, não era assim que as coisas funcionavam. Ela começou a arrastar os pés, indo para a direção da multidão, quando uma silhueta alta, musculosa e familiar saiu pela portinhola lateral do balcão.

— Frank?

O garoto sorriu, os olhos tomando o formato de meias-luas, e Annabeth foi mais uma vez lembrada do quanto amava aquele garoto. Ele estava vestido com um moletom vermelho e jeans, mas por cima tinha o habitual avental roxo da faculdade, e nas mãos...

— Esse é para você — disse, estendendo-lhe o copo plástico de café puro, e Annabeth quase abraçou-a ali mesmo. — Reyna viu a notificação na tela do celular, mas está ocupada demais tentando ensinar o estagiário novo. Ela me pediu para trazer para você.

Subitamente, Annabeth perdoou Reyna por qualquer desentendimento que houvessem tido — mesmo aquela vez em que ela a acertara na cara com o seu par de luvas suadas (eca) de boxe. Enquanto sorvia o líquido e sentia-o esquentando todas as células adormecidas do seu cérebro, percebeu que Frank segurava o outro copo com uma expressão de incerteza.

— O que foi?

— Nico me pediu para entregar esse aqui para uma amiga dele também — ele explicou —, só que eu esqueci de perguntar como ela é.

Annabeth estreitou os olhos para o copo. Ao menos, Nico havia se dignificado a escrever “Piper” naquela letra insuportavelmente cursiva, mas o nome por si só também não vinha associado com o rosto na mente de Annabeth.

Frank olhou ao redor, começando a ficar nervoso — sem dúvida, ele ainda tinha muito trabalho lá dentro —, e foi nesse exato momento que um garoto se aproximou deles. Annabeth o observou com cautela. Ela tinha certeza que já o havia visto antes, mas não conseguia dizer de onde. Ele era alto, com uma expressão relaxada, e estava vestido com uma bermuda marrom horrível (até para Annabeth e sua completa falta de senso de moda), e um moletom azul. O cabelo preto parecia ter sido penteado para o lado de qualquer jeito.

— Ei — ele cumprimentou, com um sorriso — Frank, certo?

— ... sim?

— E você eu não conheço — falou, olhando para ela.

— Annabeth.

— Annabeth, certo. Eu me chamo Percy. Nico mandou uma mensagem para a Piper dizendo que um garoto parecido com você — ele olhou para Frank de novo — ia fazer o favor de trazer o café dela. Mas, conhecendo o Nico como eu conheço, tenho certeza que ele não deve ter, bem...

— Dito mais absolutamente nada? — Frank completou.

— Isso. Foi mal — ao menos o garoto parecia realmente sincero —, o café é para a minha amiga ali.

Ele apontou por cima do ombro para uma mesa a alguns passos, onde um garoto loiro conversava energicamente com uma garota que Annabeth não reconhecia. O garoto a lembrava um pouco de Magnus, com o cabelo loiro bagunçado, mas o rosto da garota era como uma lufada violenta de ar.

Annabeth havia aprendido, do jeito mais difícil, que beleza é subjetivo, e que todas as pessoas são consideradas bonitas, de sua própria forma.

O que, supostamente, deveria tê-la preparado para aquela visão.

É, não.

Ela olhou para a garota, sentada com um cotovelo apoiado na mesa, e rindo de alguma coisa que o garoto tinha falado. A pele perfeita dela, sem nenhum indício de alguma vez na vida ter conhecido o que era uma espinha, e o sorriso de dentes perfeitamente brancos.

A única coisa que Annabeth conseguiu pensar foi: uau.

— Quanto é? — Percy perguntou, trazendo-a de volta à realidade.

— Quatro dólares — Frank respondeu.

— Piper! — Percy chamou, conseguindo a atenção da garota — Você tem trocado?

— Pode ficar com o troco — ela respondeu.

E Annabeth usou aquela oportunidade para olhar nos olhos intensamente verdes dela. Olhando de perto, eles eram parecidos com os de Percy, mas pareciam mais escuros — talvez porque, nas bordas, se misturavam com um tom de azul marinho.

Ok, talvez ela estivesse encarando. Mas Annabeth achava que era perfeitamente aceitável — não era todo dia que se encontrava alguém com olhos multicoloridos!

Ela ficou tão distraída que quase não percebeu Percy entregando uma nota de dez para Frank. Quando o garoto agradeceu e voltou para o balcão, agradecendo pela gorjeta, no entanto, Percy continuou de pé na frente dela.

— ... eu posso te ajudar?

— Ah — ele piscou — não, não. Eu só ia perguntar se você tem algum lugar para ir. Pode sentar com a gente, se quiser.

Annabeth considerou a oferta, mas no mesmo momento as palavras de Percy foram absorvidas pela sua mente. Lugar. Ir. Ela olhou para o relógio, já esperando pela a derrota iminente:

7:05 a.m

— Droga! Desculpa, Percy, eu realmente tenho que ir. A gente se vê...

Ela não conseguiu terminar a frase, porque já havia se afastado demais enquanto corria para tentar não se atrasar, porque o estúpido professor fazia a chamada no começo da aula.

Mal conseguiu ouvir Percy completando com um “até mais”.

Maldita Piper do café misterioso — e malditos olhos multicoloridos distrativos. Annabeth não tinha culpa.

 

 

A aula fora horrível, mas aquilo não era surpresa. Depois de quase quatro horas seguida de falatório, Annabeth saiu da sala sentindo-se como se alguém houvesse drenado toda a energia do seu corpo. Enquanto os estudantes se espalhavam pelo corredor, ela apoiou-se na parede do lado de fora e permitiu-se respirar por um momento, resolvendo checar o celular.

Jason

Duas mensagens não lidas.

Magnus

Cinco mensagens não lidas.

E um e-mail. Geralmente, Annabeth daria prioridade ao e-mail, mas ela precisava conversar com alguém para esfriar um pouco a cabeça.

Não surpreendentemente, foi a decisão errada.

Jason

[9:10 a.m]

Ei, acabei de chegar aqui. Me manda mensagem quando sair da aula.

[11.20 a.m]

Minha aula acabou, se ainda estiver por aqui me manda mensagem, eu posso te levar na filial.

 

Magnus

[8:25 a.m]

Ei Annie

[8:25 a.m]

Cara

[8:26 a.m]

Checa o seu e-mail

[8:26 a.m]

É, tipo, importante

[10:40 a.m]

Já???

Annabeth grunhiu — Magnus era tão chato com aquilo de mandar um milhão de mensagens para dizer algo que poderia ser resumido em só uma —, e mandou um rápido:

Annabeth

[11:37]

Se ainda estiver por aqui, estou indo para a cafeteria. Eu poderia aceitar essa carona...

E checou o bendito e-mail.

Ah.

Ah, céus.

De: athena.enterprises.

Para: annabeth.chase.

Cara, Annabeth Chase. Gostaríamos de convidá-la formalmente para o jantar de comemoração dos cinco de anos de parceria entre da nossa empresa e as Corporações Vênus e Dare Enterprises. A data e horário estão fixadas ao final deste documento.

Exigências:

Traje: fino esporte.

2 acompanhantes.

Convite impresso e documento com foto.

Aguardamos com ansiedade!

 Ela ficou olhando para a foto anexada no e-mail: era o convite impresso dela. Que Atena convenientemente esquecera de mencionar ser necessário. E mais do que isso...

Dois acompanhantes.

Para um jantar que ocorreria naquele mesmo dia. Em algumas horas.

Às vezes, Annabeth só queria ser um filhotinho de pássaro: e poder sair voando para longe dos seus problemas.

 

 

 

— Tudo bem por mim — Jason respondeu, colocando uma batata frita na boca — mas você tem certeza que quer levar o Magnus?

A pergunta não foi feita em tom de deboche, apesar do sorrisinho. Era uma questão válida. Annabeth amava Magnus, mas estaria mentindo se dissesse que ele não a lembrava ao menos um pouco demais de Thalia, sua melhor amiga e irmã mais velha de Jason, que se mudara para jogar pelo time feminino de beisebol no ano passado.

Os dois eram... bem, facilmente provocáveis? Para dizer simplesmente. Não tinham paciência para coisas formais e cumprimentos falsos, e ela nem gostava de lembrar da última vez que tentara levar Thalia como acompanhante em um desses eventos. Atena quase a deserdara.

— Eu tenho outra opção? — Annabeth afogou sua própria batata frita no creme cheddar. — Quem mais ia aceitar uma intimação de última hora assim?

Jason pareceu pensar por um momento. Mas, por fim, tudo o que disse foi:

— Justo.

Eles terminaram de almoçar, e Jason salvou meia hora da sua agenda que de outra forma seria perdida no trânsito lhe dando uma carona para a filial da empresa na qual trabalhava.

— Eu te vejo mais tarde, preciso ajudar o Magnus a encontrar um blazer — ele disse, deixando-a na calçada, e Annabeth agradeceu mais uma vez.

Ela agarrou a pasta junto ao peito e respirou fundo. Desde pequena, as pessoas lhe diziam que ela tinha o olhar de uma mulher de negócios: firme, inquisitivo, forte.

O que ela não sabia era que, na maior parte das vezes, as crianças que cresciam sendo elogiadas pela inteligência eram colocadas sob a maior pressão. A expectativa de crescer para se tornar uma arquiteta tão boa quanto Atena pesava um pouco demais.

E ela absolutamente não podia deixar que nenhum dos funcionários da mãe a visse fraquejar, nem por um momento sequer.

Entrou no prédio com passos confiantes, tornando-se mais intimidante em seus jeans e tênis surrado do que os demais funcionários em ternos de risca de giz e blazers escuros. Ela parou em frente à secretária e pediu pela audiência com o editor geral.

— Ele está terminando uma reunião — a mulher informou, no tom monótono de sempre. — Você pode aguardar ali.

Annabeth quase não pôde acreditar. Como se o dia dela já não estivesse apertado o suficiente, agora ela precisava esperar para que o homem que deveria estar disponível, tivesse tempo para ela. Com uma última carranca, dirigiu-se para o sofá da sala de espera e...

— Ei — a garota abriu um sorriso — eu conheço você.

Uma sensação familiar — e nada bem-vinda, diga-se de passagem — subiu pelo pescoço de Annabeth, esquentando-a. Piper estava sentada de pernas cruzadas no sofá, com o celular desbloqueado em uma mão.

— Você... trabalha aqui? — Annabeth perguntou.

Piper demorou alguns segundos para responder:

— Mais ou menos. Trabalho para uma da associativas. Mas estou tentando um estágio na área de marketing hoje. Você?

— Trabalho para... — ela quase a minha mãe, mas mordeu a língua.

Primeiro, porque Atena já fora bem clara: o emprego de Annabeth lhe havia sido dado baseado unicamente em sua competência profissional. Ela não queria nenhum boato circulando sobre favoritismo para com a sua família.

E segundo... porque talvez dizer que trabalhava para a mãe não fosse impressionar aquela garota.

Não que Annabeth quisesse impressionar ela.

— Eu faço estágio — ela engoliu em seco — ajudo com alguns projetos novos.

Annabeth sentiu vontade de dar um soco em si própria. Ela fazia muito mais do que ajudar em alguns projetos. Céus! A esse ponto, a única coisa que ela tinha de estagiária era o termo em sua carteira de trabalho, uma vez que já trabalhava bem mais do que metade dos funcionários dali. Por algum motivo, ela sentiu a necessidade de deixar isso claro:

— Mas são projetos grandes. Importantes.

Piper assentiu lentamente.

— Parece legal — disse, com um sorriso que parecia genuíno — e você gosta?

Percebendo que ficar ali, de pé, com uma pasta enorme não parecia muito casual, Annabeth deslizou cautelosamente até o sofá, e em nenhum momento os olhos de Piper deixaram de segui-la. Mais uma vez, parecia que as írises tinham mudado de cor, estando de um castanho profundo agora.

— Bastante — ela resolveu ser sincera —, meu pai queria que eu desse aula, como ele, mas eu sempre quis ser arquiteta.

— Seu pai dá aula? Isso é incrível. Eu já pensei em ser professora. Ele dá aula onde?

Annabeth mordeu a parte de dentro da boca. Ela não queria soar como a garota mimada e rica que tinha os dois pais extremamente bem-sucedidos.

Embora fosse quase exatamente isso.

— Harvard.

Os olhos de Piper se arregalaram quase imperceptivelmente. Ela bloqueou, finalmente, a tela do celular.

— Caramba — disse, com uma risada contida — uau.

É, Annabeth pensou, tentando parar de olhar para o rosto dela, uau.

Infelizmente, o rosto não era a única coisa bonita em Piper. Ela havia trocado de roupa (provavelmente porque fosse qual fosse a vestimenta que um universitário usava para ir para a faculdade, nunca seria propicia para uma vestimenta de emprego). A calça preta fazia suas pernas parecerem mais longas do que realmente eram, e a blusa branca acentuava a cintura fina. O blazer escuro estava cuidadosamente dobrado sobre o colo.

— Qual o seu curso? — Annabeth tentou mudar de assunto.

Piper pareceu perceber, mas não disse nada.

— Majoritariamente, publicidade.

— Majoritariamente?

— Boa parte da minha grade é de disciplinas de história — explicou. — Quero ganhar experiência com marketing para continuar um projeto antigo do meu avô.

Os olhos de Annabeth brilharam, e ela inclinou-se um pouco, quase instintivamente. Ela conseguia entender como era sentir-se parte de algo maior, como era fazer parte de um projeto que parecia ter raízes muito mais antigas do que ela. Algo que, até então, ela só fora capaz de compartilhar com Magnus.

— Meu avô queria conscientizar as pessoas sobre a importância da história Cherokee. A maioria dos descendentes de nativos hoje em dia não fazem ideia de onde vem as suas origens. Ele queria difundir a nossa cultura de novo, de uma forma que as pessoas conseguissem compreender ao invés de só aceitar — Piper contou, e Annabeth conseguiu perceber que a animação na voz dela era verdadeira —, meu pai tentou fazer isso também, mas... — ela comprimiu os lábios, como se houvesse pensado duas vezes — não deu muito certo. Minha mãe é europeia, e não entende muito disso, mas ela disse que seu conseguir o estágio, vai me apoiar de qualquer modo.

Annabeth ficou meio sem fala por um momento. Até então, ela estivera quase hipnotizada pela beleza da outra garota, mas depois de ouvi-la, sentiu um pouco mal por reduzir Piper à apenas um rosto bonito.

— Meu avô queria que a minha mãe fosse médica — Annabeth encontrou-se dizendo antes que pudesse pensar melhor — mas ela... bem, ela nunca foi de obedecer muito. Acho que está na família. Aí um primo meu virou médico, e ele decidiu que eu precisava ser também — a memória quase a fez rolar os olhos —, não me entenda mal, eu sempre quis ser arquiteta, mas... preciso dizer que ver a cara ofendida do meu tio Zeus foi o empurrãozinho que eu precisava para decidir.

Piper abriu um sorriso que não era, de forma alguma, gentil. Parecia o tipo de sorriso que alguém dava antes de fazer algo muito insano, ou muito errado.

— Você conseguiu ser contratada pela melhor empresa de arquitetura do país só para irritar o seu avô? — Piper repetiu, com um brilho estranho nos olhos, e Annabeth os viu mudar de castanhos para avelã, meio avermelhados — Por que é que a gente não se conheceu antes, hein?

As palavras de Annabeth se embolaram na garganta, mas ela jamais deixaria que ninguém a visse sem uma resposta na ponta da língua:

— Eu não sei — disse. — Eu acho que nós duas perdemos um bom tempo, não?

Piper ergueu as sobrancelhas, e uma mexa do cabelo castanho picotado caiu na esta dela, cobrindo parcialmente um de seus olhos. O coração de Annabeth estava martelando em seu peito, mas ela se forçou a manter o olhar firme.

— Eu acho que a demora deixa algumas coisas mais interessantes — Piper respondeu.

Era quase demais. Annabeth conseguia sentir o rosto ficando vermelho. Como que ela deveria ser capaz de lidar com Piper, tão perto, sorrindo com o canto dos lábios levantado e o olhar fixado no rosto dela, o cabelo cobrindo apenas a quantidade certa do rosto...

Mas, novamente, ela preparou-se para responder... —

— Srta. Chase, o editor está esperando.

Annabeth quase chutou a secretária na canela.

O sorriso provocativo de Piper foi substituído por um doce e gentil, direcionado à secretária. Assim que ela virou as costas e Annabeth se levantou, no entanto, Piper fixou-a com aquele mesmo olhar e acenou com uma das mãos:

— Até mais tarde, Annabeth.


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Notas finais do capítulo

Só para esclarecer: Annabeth e Magnus dividem um apartamento, e o Jason é um amigo muito próximos deles. Os dois ainda vão aparecer bastante nos próximos capítulos.
Espero que tenham gostado, e comentários são sempre apreciados!



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