Pequenos Contos escrita por Tah Madeira


Capítulo 6
Memória (parte 3)


Notas iniciais do capítulo

Mais um capítulo desse conto.



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—Bom aparente foi só a falta de memória, penso que devemos levar ele para São Paulo o quanto antes, amanhã pode ser bom.— Diz Rômulo assim que saí do quarto.— Ele está bastante confuso, fazendo perguntas que não sei como responder.— olha para as duas que parecem buscar a mesma informação.
— Era exatamente isso que queremos saber, o que dizer a ele?— Ema pergunta.
—Penso que coisas primordiais devem ser ditas, mas não devemos encher ele de informação, ainda mais hoje e vamos evitar o contato com muitas pessoas, isso pode gerar mais perguntas. Por ora ele está bem, aqui está a medicação e a dosagem que ele deve tomar— eu me apresso em pegar e ler o que ele deixou prescrito.— Vou me retirar volto amanhã pela manhã, mas se precisarem não hesitem em me chamar.


Rômulo saiu nos deixando ali, sem saber muito bem como agir, por fim trocamos olhares e entramos no quarto, Aurélio olha para o nada e dirigiu seu olhar assim que entramos.
—Ema? — ele a chama, ela se senta na cama — Cadê sua mãe? — Ema olha para mim, no fundo eu sabia que aquela seria uma das primeiras perguntas dele, me afasto um pouco, parece ser um momento só dos dois, vou em direção a porta, mas ouço a voz suave da minha enteada.

— Por favor, fica — olho para ela que tem os olhos marejados, e suplicantes, vai ser doloroso, não queria ter de assistir aquilo, mas tenho de ficar, mas permaneço mais afastada, as costas de Ema.

— Papai, o senhor lembra que mamãe estava sentindo algumas dores, que a minha festa quase não iria sair porque ela estava se queixando de muito — Aurélio só confirma com um aceno de cabeça. Ele não tinha ideia que Ema sabia disso, mas bobagem ele pensa, tinha perdido a memória.


Então ouço o relato de Ema sobre a progressiva doença da mãe, a ida dos dois a médicos que nunca formavam um diagnóstico preciso do que ela tinha, por fim ela fala do desfecho da mulher que morreu entre os seus, sendo amada até seu último suspiro, há um choro sentido por parte de Aurélio, não só por saber o que houve com a esposa, mas por ter perdido quem amava, não queria sentir ciúmes, nem nada, era natural o choro dele, Ema o abraça e diz palavras carinhosas, quando os soluços dele saem mais alto eu não consigo suportar e como uma covarde fujo dali, evito olhar para trás e vou ao meu quarto, não consegui ser tão forte como ele ao saber do meu passado que não só ficou ao meu lado, como cuidou de mim, ainda lembro que na manhã seguinte ao acordar ele estava sentado comigo em seu colo, olheiras funda e olhos vermelhos, confessou que não conseguiu dormir ficou velando meu sono, apenas toquei com carinho aquele rosto e agradeci, em nenhum momento ao longo do dia ele dormiu ou reclamou de cansaço, não posso deixar de sorrir ao lembrar ainda que mais tarde ao nos despedirmos e ir cada um para o seu quarto, sentiu um desconforto naquela cama vazia e fui ao quarto dele, Aurélio dormia sentado na poltrona, ainda de roupas, se assustando quando eu o chamei perguntado se tinha acontecido algo comigo, novamente dormi em seus braços, mas só fiz quando percebi que ele dormia serenamente.


E agora ele estava no quarto ao lado sem saber disso, e ela não sabia como ajudá-lo, se sentia impotente, abraço o meu próprio corpo chorei, ouvi leves batidas na porta, tentei me recompor o melhor que pude e permito a entrada.
— Dona Julieta, vim ver como a senhora está— era Ema com os olhos vermelhos e a voz rouca pelo choro quem entra.

—Ema , senta aqui— assim ela faz, seguro nas mãos dela — Me desculpe por sair daquela forma.
— Tudo bem, sei que deve ter sido difícil ouvir sobre a minha mãe.
—Não minha querida não foi pela sua mãe, foi penoso ver seu pai daquela forma e não poder fazer nada, vê-lo sentir novamente uma dor e não poder ajudar.
—Foi triste reviver e contar.— os olhos dela encheram de lágrimas e aperto mais forte em sua mão,tentando assim passar mais um pouco de conforto.
— Sinto muito que tenha que passar por isso.

— De certo modo ele assimilou bem, pois lembrou o quando ela vinha sofrendo — ela limpa a lágrima solitária que cai.
— Como ele está agora?

— Dormiu, fez mais algumas perguntas, mas deve ter casando me acabou dormindo entre uma frase e outra, querida dar algo para ele comer, mas o deixarei dormir.— tentei sorrir pensando que dormindo ele sofre menos, ela me olha profundamente e completa — A senhora deve descansar também.
— Não, eu nem vi as acomodações para você e Ernesto, não providenciei nada nem o jantar, preciso arrumar as coisas para irmos para São Paulo amanhã...
— Não se preocupe, já cuidei de tudo, já arrumei um quarto, Ernesto falou com o senhor Brandão que vai hospedar o vovô, já que ele disse não querer voltar para São Paulo, o jantar já foi servido— ela fala sem parar, não se de entusiasmo ou para esconder o quanto também sofre, então lembro que ela sempre cuidou do pai e do avô, mas não deixaria de novo esse fardo sobre os ombros dela, ela estava começando a pouco uma vida de casada— A senhora quer comer algo?

— Não minha querida, obrigada você precisa descansar também .

—Ficarei com papai essa noite.

—Não Ema, deixe que eu fique, eu cuidarei dele.— já vou levantado da cama, mas fico tonta e volto a sentar, lembro que tem horas que não como nada.
— Dona Julieta, por essa noite deixe eu cuidar de vocês— se aproxima de mim e toca em meu rosto, um gesto tão típico do pai dela — Amanhã eu deixo a senhora ser a Rainha do Café eu prometo— sorri para mim o que me contagia e acabei permitindo.

—Está bem, mas promete que qualquer coisa vai me chamar.— eu não tenho argumentos para protestar.

—Sim eu prometo, vou pedir para trazerem algo para a senhora comer.


Ela sai do quarto me deixando um pouco mais leve, talvez tenha sido o sorriso que deu ou o beijo que depositou em minha face. Como prometido logo apareceu a comida em minha frente, mas pouco a degustei, não sentia fome. A noite foi mais longa que achei que seria, o sono não veio fácil, eu cochilei algumas vezes e sempre acordava assustada, nem bem o dia amanheceu e cansada de rolar de um lado a outro na cama levanto e caminho incerta pelo corredor, vejo Ema sair do quarto de Aurélio, parecia o destino a nosso favor.
— Bom dia, senhora deveria estar descansando.

— Eu não tive muito sucesso com isso — meu olhos vão da porta para o rosto dela —Só vim ver como ela está.

—Está bem, consegui fazer com que ele comesse algo e dormiu praticamente a noite toda, ainda agora dorme— Ema sentia o quanto Julieta estava angustiada, queria poder ajudar e fazer mais, seu pai chamou por ela no meio da noite, mas não sabe se deve dizer e se ao acordar a memória ainda não tivesse voltado, seria ainda mais triste alimentar a esperança dela logo cedo, mas resolve ajudar de outra forma— Vou acordar Ernesto e buscar água na cozinha e volto logo mais.


Entendo o recado e entro no quarto dele, de longe assim o vendo, nem parece que há confusão em seu olhar, ele dorme tão tranquilamente, o peito sobe e desce e lembra a sensação de estar ali, repousando a cabeça sobre ele e tendo os braços dele em volta do seu corpo. Sento na beira da cama e segurei uma de suas mãos, entrelaço os nossos dedos, então ouço o meu nome.
— Julieta — foi tão baixo que penso estar ouvindo coisas, ergo a cabeça ele ainda está dormindo, mas seus lábios se mexem e chamam por mim novamente — Julieta. — aproximo meu corpo mais do dele ficando perto de seu ouvido.
— Estou aqui, meu amor— falei tocando em seu rosto, meu peito inflama de esperança. Aurélio se move na cama e vai despertando aos pouco, com pesar desprendo a minha mão da dele e me afasto um pouco.— Bom dia — tento sorrir para disfarçar minha aflição em saber se ele recordou ou não.
— A senhora aqui, Julieta o seu nome, não é?
— Sim isso mesmo — eu tento disfarçar a decepção em minha voz.
— Eu sonhei com a senhora — sou pega de surpresa, mas não consigo indagá-lo pois a porta é aberta e Rômulo entra acompanhado de Ema.

— Bom dia, como vai o meu paciente? — ele perguntou.


Não houve momentos para perguntar que sonho era, como foi, pois não ficamos mais sozinhos, mas senti ele olhar algumas vezes para mim, a ida para São Paulo foi corrida, as perguntas eram respondidas conforme elas apareciam, ficou dito que eu me tornara amiga da família por isso o empenho em ajudá-los. No caminho para São Paulo com Aurélio foi ao meu lado, eu tive uma certeza, ela ainda estava viva na memória dele, sonhou com ela, chamou por ela duas vezes, ela iria fazer de tudo para que ele lembrasse dos dois.


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Notas finais do capítulo

Bom... Esse conto terá mais um capítulo(não sei quantos vão ser)
Espero que estejam gostando.



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