A dança. Uma das formas mais bonitas de se expressar, capaz de trazer sensações profundas e indescritíveis.

Quando dançava, Odette conseguia sentir o prazer de viver e de sentir-se ela mesma. Alegria, ansiedade, tristeza, raiva… ela colocava tudo na dança. Aquilo a libertava, sabia que era o que queria fazer pro resto de sua longa vida, afinal, só tinha dezoito anos.

Pensava nos palcos, nos aplausos, mas principalmente, em mostrar pro mundo que a dança fazia parte dela, que a movia. Odette, com seus lindos cabelos castanhos escuros e olhos azuis — quase cinzas — brilhantes, amava sair dançando pelo quintal ou pela praça à noite quando não tinha ninguém. Com suas lindas sapatilhas vermelhas, saltava, girava, deixava o vento levá-la.

Uma coincidência que ela adorava, era o fato de se chamar Odette, pois era o nome da personagem principal de sua peça favorita de ballet “O Lago dos Cisnes”. Conhecida pelo mundo inteiro, a peça conta a história da princesa Odette, uma jovem aprisionada no corpo de um cisne branco por um feiticeiro malvado. Durante o dia, Odette se mantém em sua condição animal, se revelando humana somente à noite. Ela é destinada a permanecer como cisne, até ser resgatada por um homem que lhe jure amor eterno.

Odette amava aquele espetáculo e já teve a chance de vê-lo no teatro da Ópera de Paris. Foi uma das noites mais inesquecíveis de sua vida.

A garota dançava em casa como um hobbie desde os dez anos de idade e, já sabia o básico dos passos vendo as bailarinas que adorava. Nunca teve aulas, pois não tinha como pagar até então.

Aos dezoito, Odette conseguiu entrar na Ópera Nacional de Paris, o Palácio Garnier, e consequentemente, teve aulas com o bailarino Louis Mérante, um jovem de cabelos pretos e olhos castanho mel, cinco anos mais velho que ela.

Mérante ficou famoso por realizar o maior número fouettés num único solo, o que lhe causou quase uma crise de vômito depois, afinal, cento e oitenta e sete giros não são qualquer coisa. Desde então, muitos bailarinos tentaram passar desse número de fouettés e não conseguiram.

O jovem estava seguindo a carreira de coreógrafo e com a pouca idade que tinha já era conhecido quase no mundo inteiro. Ele adorava ensinar, e Odette adorava aprender.

Em sua primeira aula, a garota não foi muito bem, afinal, saber os passos não significa fazer direito, o que levou Mérante a dizer que Odette tinha a energia de um guepardo, mas a leveza de um elefante deprimido.

Com o passar dos anos na Ópera, Odette se tornou a melhor bailarina de sua geração e conseguiu todos os papéis principais que queria, enquanto Mérante se tornou o mestre do ballet, admirado e respeitado por milhares de pessoas.

Nesse meio tempo, Odette perdeu sua mãe, a única que vivia consigo, e essa perda lhe causou uma enorme dor emocional impedindo-a de se concentrar no ballet por longos dias. Quem foi animando-a aos poucos foi Mérante, sempre educado e formal, estando disposto a ajudá-la no que pudesse.

Ela não precisou, mas sempre agradeceu.

Mesmo não admitindo para si mesmo, a jovem Odette o encantava com seu talento e graciosidade. Contudo, ele não a deixava saber disso por ser muito sério e fechado.

Na realidade, ambos eram bem fechados e um tanto tímidos no quesito sentimentos. O único tempo que passavam juntos eram as horas das aulas de ballet na Ópera. Apesar de serem focados e levarem a dança muito a sério, ambos se divertiam enquanto o faziam junto com os outros bailarinos que, num geral, admiravam muito os dois mais experientes.

Só havia uma pessoa que detestava a bailarina, e essa pessoa era Régine Le Haut, vizinha de Odette. Régine era extremamente ambiciosa e obsessiva. Era alguns anos mais velha também, sua família era rica — ao contrário da de Odette —, e mesmo assim nunca conseguiu o que ansiava. Sempre quis saber dançar, mas não levava o menor jeito para tal. Isso a deixava com muita raiva e ver Odette dançando tão bem, crescendo tanto na Ópera e no ballet em si, deixou-a amargurada. Nem se dava a chance de conhecer Odette de verdade por conta disso.

A bailarina, por sua vez, havia notado essa implicância da parte de Régine, mas nunca a questionou ou se importou.

A raiva de Régine poderia prejudicar Odette um dia?