A garota que eu costumava ser escrita por Elise Caroline Gouveia


Capítulo 1
Desguarnecido


Notas iniciais do capítulo

UFC Fanfics, rodada 1.
Tema: "Queria saber, depois que se é feliz, o que acontece?" - Clarice Lispector



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Desguarnecido

(O mesmo que: ‘desprotegido’, ‘vazio’, ‘indefeso’, ‘nu’.)

...

John podia jurar que cada riso de felicidade que eles compartilharam se juntaram em um coro distante, ecoando em sua mente. Todos os momentos em que um toque dela mudou o que ele sabia sobre o mundo lhe vieram à cabeça. Aqueles segundos de antecipação o sobrecarregavam. Lembranças continuavam a inundar sua cabeça num misto de acalento, incerteza e medo.

Ele pensou que assistir o corpo inerte da mulher que amava era o pior que lhe poderia acontecer. A sensação de impotência era esmagadora, não havia nada a fazer além de esperar por ela abrir os olhos.

Mas não.

Quando ela finalmente fixou o olhar nele. Aquele foi o pior momento. Foi quando ele percebeu o que havia perdido.

O pequeno fio de esperança — onde ele se segurou fortemente durante os três dias em que ela esteve em coma — se partiu.

Parecia que um buraco havia sido aberto dentro dele, sugando tudo de bom que um dia ele teve e deixando apenas o vazio. A parte dele que somente era completa por causa dela, voltou a ser apenas escuridão.

O tom frágil da voz lhe apertou o coração, mas suas suaves palavras, essas o destruíram. Foram a confirmação do que John já sabia apenas pela forma como ela olhou para ele, ouviu-as como se em um túnel.

A dor da perda o atingiu em cheio. Um milhão de pensamentos o assolou. Uma vida inteira de infortúnios o levaram a ela, seria mais uma desgraça que a tiraria dele?  

Sempre lhe foi dito que não havia redenção para pessoas como ele. Sua mãe jamais permitiu que pensasse diferente e ele nunca teve esperanças, até que ela derrubou cada uma das convicções que ele adquiriu durante a vida.

Lutou, desde o momento em que conseguia se lembrar, contra os odiosos ensinamentos de sua mãe. Conquistou fama, dinheiro, sucesso e o amor que ela sempre lhe fez acreditar que não merecia. Pelo tempo em que ela morreu, John acreditava ter sido vitorioso no jogo de interesses que foi a sua vida. Triunfou.

Agora, ele não tinha mais tanta certeza. Conseguia ouvir o riso de escárnio da sua mãe como se ela estivesse do lado dele.

Lágrimas encheram seus olhos, a derrota lhe consumiu e, mais uma vez, ele foi apenas um menino assustado, coagido pelo brutal ensinamento de uma mãe perversa.

Toda felicidade que conheceu estava atrelada a mulher na cama de hospital à sua frente. A garota que verdadeiramente o amou; a única pessoa que lutou suas batalhas, a despeito de tudo que ele tenha feito; que mostrou que ele era mais do que sempre acreditou; a única boca que continuamente lhe proferiu palavras calorosas; os únicos ouvidos que souberam o escutar; as únicas mãos cujo toque o fizeram sentir-se querido; os únicos olhos que sempre lhe olharam com carinho, neste momento lhe observavam sem qualquer reconhecimento.

 — Quem é você? — repetiu Eliza, mudando, mais uma vez, toda a realidade do que John conhecia.  


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