E se... - Ernesto e Ema escrita por Anne Liack


Capítulo 10
Capítulo 10


Notas iniciais do capítulo

Indo em Frente...



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/762536/chapter/10

— Foi até fácil - ela fez pouco caso do próprio esforço, porque ali se dera conta que teria ido muito mais além para conseguir encontrá-lo. 

Ameaçara Luccino pelo endereço, fugirá da Ouro Verde na calada da noite. Pegou o trem na nova ferrovia em direção a São Paulo de lá um navio até a Itália, outro até a região da Campania, de lá, outro trem até a província de Avellino e por fim um carro de aluguel até a comuna de Avella. 

"Avella" - ela sorriu. Como não sorrir de mais uma peça que a vida lhe pregara.

 


— Sabe por que se chama assim?! Avella?! - tinha lhe perguntado Mr. Rossi, o condutor do carro que a levara, em seu perfeito italiano arcaico. Ema precisou apurar bem os ouvidos e puxar bem em sua memória a fluência no idioma.


— Por causa das avelãs?! - arriscou ela. 

— Não, isso foi depois! - o velho respondeu como se ela pudesse ter insultado um filho dele. - Vem do nosso  extinto idioma  indo-europeu. - O homem gargalhou em seguida. – Chamava-se Abella antes, quer dizer maçã - disse ele por fim. - Porque foi aqui que os pomares de maçã se originaram, sabia disso?

Ema não respondeu, instantaneamente, Ernesto lhe veio forte a mente, de todas as vezes que uma simples maçã em cena, seja nas mãos, na boca ou nas palavras tinha virado uma tortura para ela.

“Esqueceu-se das maçãs, por isso não pode colher sua doçura.” Ele era implacável em todos os aspectos quando queria.

— Sabe como eu sei disso? – o velho a tirou de seus pensamentos.

— Porque Mr é um exímio historiador.

Mr. Rossi sorriu um tanto presunçoso, mas negou-lhe com a cabeça. Puxou do bolso uma foto amarelada e já meio amassada, depois de uma mirada entregou a ela.

— Está é a Mrs. Rossi, Mrs. Evelyn Rossi – apresentou orgulhoso. – Demorei anos até descobrir o verdadeiro significado do nome de minha Evelyn. Acredite no insulto que é termos tão poucos livros na biblioteca da província sobre o indo-europeu. – Ema achou que não tinha conseguido acompanhar com toda coerência a última frase. – E por fim quando encontrei, não poderia ter estado mais satisfeito. Evelyn deriva de Avella que significa maçã. - sorriu. - Tão doce quanto ela e ainda é o nome de nossa bela comuna! Essa coincidência sempre me surpreende e me encanta!

​​

A Senhora Rossi era uma bela mulher, mesmo que na foto aparentava ser apenas uma senhorita, os traços precisos não negava que com certeza se tornara uma senhora muito vistosa.

— Gostaria de conhecê-la! – comentou sincera, porém displicente.

— Ela adoraria você e por certo ela faria jus a sua curiosidade. Nunca vi mulher de tanta força! Veja só signorita, ainda sou apaixonado por ela, e já temos cinqüenta anos de casados.  

A veneração na voz dele, não deixava dúvida de sua sinceridade. E era tudo que Ema precisava saber. Não conseguiu aprofundar-se mais no assunto com o Mr. Rossi, pois havia chegado a seu destino. Ela devolveu a sua foto e ele descarregou suas malas, despediu-se cortês e seguiu.

E lá estava Ema parada de frente ao armazém cujas cartas da família Pricelli para filho eram endereçadas, com a sensação de que realmente, por certo, foi fácil chegar até ali, o mais difícil provavelmente viria.

A tarde já caía e o céu estava ameaçado desde que saíra de Avellino, e por algum motivo as nuvens que carregavam o céu, pesavam também seu peito em apreensão. Respirou fundo e adentrou o lugar. O ambiente era um tanto escuro, talvez pela ausência de janelas e pelos móveis em madeira de lei; as sacas de grãos espalhadas pelo local e prateleiras abarrotadas de mantimentos para venda e garrafas de bebidas  também não ajudava a melhorar a brutalidade do lugar. Ela, porém não tinha nada haver com isso, pensou. Aproximou-se do balcão onde uma moça de cabelos claros esfregava quase que freneticamente um dos vários copos de vidro de uma bandeja.

Pigarreou para denunciar sua presença.

— Pois não? – perguntou-lhe a moça assim que desgrudou os olhos do copo e a mirou.

Ema sorriu, em simpatia, buscando novamente em sua mente a fluência do idioma.

— Procuro pelo senhor Pricelli, a senhorita o conhece? – ela viu o semblante da jovem se estreitar instantaneamente.

— O que deseja com ele? – a pergunta foi inquisitiva suficiente para Ema se pôr na defensiva.

— A senhorita o conhece? – ela repetiu a pergunta.

— O que deseja com ele? – assim como a moça.

Ema estreitou os olhos, o coração batendo furioso, enquanto algo frio despencava por seu estômago.

— Ora, mas quanta petulância! – indignou-se. - Quem a senhorita pensa que é para... – só então se deu conta que não usava o idioma da jovem, ela parecia não entendê-la tornando-se ainda mais sisuda.Tornou ao italiano  – Creio que não precise dar essa informação a senhorita, até dizer-me quem é?

— Posso lhe dizer o mesmo. – ela respondeu.

O corpo de Ema se agitou.

— Insolente! Atrevida! – xingou em perfeito português.

Ela aprumou o corpo em altivez, e estreitou os olhos para a jovem.

— Eu sou Ema Cavalcante. E se conhece Ernesto com certeza já ouviu falar de mim! – ela arriscou, arriscou alto, mas viu o efeito desejado no semblante da moça, ela tinha empalidecido e arregalado os olhos. Ema realmente não quis pensar no porquê daquela reação.

— Ema? Ema Cavalcante? – alguém perguntou atrás dela. Virando-se Ema deu de cara com um jovem franzino, em volta de seus quinze anos.

— Sim, sou eu!

— Madre mia! É ainda mais bonita que o...

Ouviu-se o pigarrear da moça no balcão, Ema a ignorou.

— Então o senhor conhece Ernesto? – perguntou ela ao jovem.

— Si, Mr. Pricelli, gosto de pensar que somos amigos. – o jovem se aproximou dela. – Sou Enrico Conti, e aquela é minha irmã Sandra.

— É um prazer conhecê-lo, Enrico. - disse Ema, numa forçada petulância. - Pode dizer-me onde está Ernesto?

— Não vai encontrá-lo aqui. Hoje é sábado o Mr. Pricelli está na plantação. Posso levá-la até lá.

— Enrico! – a moça saiu de trás do balcão e pôs-se entre o irmão e Ema.

— Sandra, você sabe que ele quer vê-la, por mais que negue. – acrescentou a última frase, mais baixo.

— O que sei é que ela faz mal a ele. – disse Sandra e virou-se para Ema. – Que não o merece!

Ema engoliu a seco vendo nos olhos da moça a decepção em vê-la ali, tão próxima de seu objeto de, aparentemente, grande afeto. Doeu o coração de Ema concordar com ela. Mas, se não merecia Ernesto, faria de tudo para passar a ser digna dele, e ninguém mais se poria em seu caminho.

— Isso não é de nossa conta! - interveio Enrico.

— É da minha conta!

— Não. Não é, minha irmã! Pare com isso, papai já lhe avisou... ou você quer que o Mr. Pricelli parta novamente?

— Dannazione! – a moça xingou e marchou a passos duros para dentro.

— Não é nada demais – ele quis explicar, meio constrangido. – É apenas um capricho, o próprio Mr. Pricelli diz isso.

Ema sorriu realmente agradecida. Ele esticou o braço, como um exímio cavalheiro a deixando passar.

— São suas malas? – perguntou quando alcançaram a calçada.

— Sim!

— Um segundo. – Enrico carregou as malas de até dentro do armazém. Voltou em seguida. – Podemos ir.

— Grazie! – Ema pensou na diferença de tratamento e temperamento entre os dois irmãos. Percebeu que a senhorita Sandra tinha seus motivos, mas tão certo não teria tanta delicadeza quanto seu irmão, mesmo se a situação fosse outra. Tentou não pensar mais em Sandra Conti.

Eles seguiram pela calçada do armazém. Ao lado do estabelecimento, Enrico lhe apontou uma escada de madeira que dava para um conjugado no primeiro andar da loja.

— É ali que o Mr. Pricelli dorme!

Ema estranhou, Ernesto dormir num quartinho em cima de uma armazém quando sua boa aventurança nos negócios era óbvia. Mas, nada comentou, seguiu com Enrico que não parava de tagarelar um segundo sobre qualquer coisa relacionada a plantações e Comuna, Ema se atinha apenas em balançar a cabeça, seu interior estava apreencivo e ela não queria se esforçar a tentar traduzir tudo que o jovem falava. Por fim pegaram uma estrada de barro. Andaram uns quinze minutos até alcançarem um considerável campo de plantação, Enrico afastou a cerca e ajudou-a a passar por ela.

— É um atalho. - disse, como se estivesse se desculpando pelo transtorno a ela. -  Andaríamos muito mais até a entrada.

— Não acredito! É mesmo verdade que aqui se cultivam maçãs? - ela expressou-se reconhecendo as fileiras de macieira. 

— Sim. Principalmente maçãs e avelãs. A familia Ferrari é dona da maior produção de maçãs mais suculentas da Comuna. – explicou-lhe. - O Mr. Pricelli já é dono de um quarto disso! - Ema arregalou os olhos. Enrico deu de ombros diante da surpresa dela. – Bem, se seguir essa fileira até o final, encontrará o Mr. Pricelli. Tinha acabado de voltar de lá quando a encontrei no armazém! Creio que não devo acompanhá-la a partir de agora. Mas, se não o encontrá-lo volte até aqui que me encontrará.

— Molto Grazie, Enrico!

Ele apenas assentiu sorrindo. E Ema seguiu apreensiva. Só queria encontrá-lo. Apenas isso. Uma trovoada rasgando o céu a deixou ainda mais nevosa. Resolveu contar os passos para se distrair e não pensar, enquanto o vento frio, mesmo na direção de seu favor queria lhe arrepiar a pele. Ema se concentrou, passo ante passo... duzentos e cinquenta e dois, ela contara, quando enfim avistou o corpo familiar ao longe. Ernesto estava de costa, um dos pés apoiado numa escada de madeira recostada numa das árvores do pomar. Um balde cheio da fruta ao seu lado e uma delas ele examinava minunciosamente com as mãos. 

Ela sorriu. Ernesto jurou que esqueceria dela, e naquele momento Ema se perguntou como ele faria aquilo ali, exatamente naquele local, não quis envaidecer-se, mas sabia que era impossível não pensar nos dois estando num campo de cheio de maçãs.

Sentiu o primeiro pingo de chuva em sua face, e outra rajada intensa de vento que com certeza lhe tinha assanhado os cabelos, tremeu. Viu Ernesto despreocupadamente continuar a examinar a fruta enquanto se aproximava, ele a cheirou por um momento, e quando ia levando a boca parou de repente. Ema já estava perto suficiente dele para perceber, através do movimento dos ombros, que sua respiração tinha quedado suspensa. Era possível ele já ter se apercebido de sua presença? Ela não soube dizer. Ernesto não se virou, continuou de costas, ela só percebia que ele agora voltara a respirar, profundamente. Venceu os últimos passos de distância entre eles e quando já bem próxima, novamente não veio reação, estendeu o braço e tocou-lhe o ombro.

Ela sentiu o músculo que tocara retesar. Assustou-se por um momento e suspirou pesado pelo contato com a pele dele, pois a camiseta regata não lhe cobria os ombros. Pele, que incrivelmente não era fria, era quente e lisa sob sua mão e era mais que um convite, ela pressionou com um pouco mais de força os dedos e o virou para si. Ernesto tinha os olhos fechado e quando finalmente os abriu estes brilhavam, ele instantaneamente lhe sorriu. Ela o acompanhou. Sinceramente, não esperava tal recepção. Os pingos da chuva caindo cada vez mais fortes sobre eles de nada incomodava. E não resistindo a ele nem por um segundo ela jogou-se em seus braços. Ernesto a agarrou com força a suspendendo e o beijo que se seguiu fora delicioso, calmo e molhado, mas não menos intenso, o coração batia loucamente no peito de ambos.

Ema sentiu-se flutuar, e realmente era assim que estava, girando nos braços dele, enquanto sentia a doçura de sua língua tão saudosa invadi-la. A chuva se intensificando gradativamente e ela gradativamente mergulhando em satisfação e prazer. Porém, num dado momento, de súbito, ela sentiu todo corpo de Ernesto tremer e os músculos retesaram, ele sessou o beijo e a colocou no chão. Depois a encarou, por tanto tempo que ela se pôs nervosa e sentiu frio, ele levou uma das mãos a face dela, acarinhando sua bochecha, seu olhar era perdido.

— O que? – Ema sentiu a necessidade de perguntar, e Ernesto parecia ter levado um choque, afastou a mão ligeiramente, e seu olhar passou a ser confuso. – O que houve?

— Ema? – ele estreitou os olhos para ela, a chuva já grossa atrapalhavam suas visões.

— Sim!

— Ema?! – ele pareceu inquieto.

— O que está havendo, Ernesto?

— Ema! – ele avançou sobre ela, exasperado, segurando-a firme, muito firme pelos braços.

— Sim, sou eu! O que há? – por algum motivo ela sentiu os olhos marejarem.

Ernesto fechou os olhos e balançou a cabeça freneticamente, como se estivesse espantando os pensamentos. E Ema entendera, quase sorriu - sabia que ela teria reagido da mesma forma no em seu lugar - Ele pensara que ela era uma miragem.

— Ernesto! – o chamou, e o sentiu afrouxar um pouco o aperto em seus braços, ela libertou apenas um, deixando que ele sentisse sua presença sob a pressão que ele ainda fazia no outro. Levou a mão livre até o rosto dele, seus olhos ainda fechado bem apertados, e quando ela tocou sua face, Ernesto parecia está sendo torturado. – Olha para mim! Eu estou aqui!

— Não pode ser! – disse, porém, pareceu por fim se convencer. A chuva já os encharcara quando ele finalmente abriu os olhos. - O que faz aqui?

Apesar de ser difícil, aquela sim era atitude que ela esperava. Ema deu de ombros, perdera completamente as palavras. Ele a segurou firme novamente.

— Ema o que faz aqui?

— O que acha que estou fazendo aqui? Me diga, o que acha? – ela teve que altear alguns décimos o tom da voz, o barulho da chuva não permitia um diálogo civilizado. Embora sabia que a ausencia da chuva em nada garantiria que o tivessem. – O que acha que eu estou fazendo aqui?

— Não tenho a menor ideia!

Ele a soltou e sem aviso prévio, virou-se e começou a andar.

Ema estarreceu por um momento, mas lembrou que não esperava facilidade. Marchou a passos decididos seguindo-o pela linha, ainda aparentemente extensa de macieiras.

— Ernesto! – ela berrou, depois de mais ou menos vinte passos; ele tinha as pernas mais longas e estava se afastando consideravelmente dela. – Ernesto, pare... ai! – ela tropeçou, e agradeceu, pois o susto em sua voz foi suficiente para ele virar-se para ela, preocupado. Um prazer interno tomou conta de seu corpo. – Só me escute, por favor! – ela gritou, ele tencionou virar-se novamente, mas ela foi rápida, correu até ele mesmo com a dificuldade por causa do peso da roupa encharcada, o segurou. – Tem todo direito de está magoado comigo, eu só peço que por favor, me escute.

Ele a encarou. 

— Certo! Você está certa! – mais uma vez ele fechou os olhos e balançou a cabeça. – Me desculpe! Foi apenas o susto. Vamos... Vamos para um lugar mais... seco!

Ela percebeu naquele momento que a revolta dele foi por ter demonstrando tão singelamente que ainda pensava nela de maneira tão intensa. E aquilo ela podia perdoar com louvor. Assentiu para ele, e sentiu o coração acelerar quando ele segurou a sua mão a guiando apressadamente para onde quer que fosse.

(...)

 

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Mais um reencontro!! Sim, porque a vida sempre dará um jeito de levar um para o outro, não importa o quanto lutem!!

Gente!!!Demorou mais aí está!
Eu peço realmente desculpas pela demora, eu odeio fazer isso, juro!Eu também sou leitora sem bem como é!! Mas, realmente as coisas foram corridas esses dias... Então, desculpas mesmo!!

Opiniões? Sempre bem vindas!
Um grande beijo, e até o próximo!!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "E se... - Ernesto e Ema" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.