Os filhos do tigre escrita por Anaruaa


Capítulo 16
Sohan 3




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Conversar sobre meus sentimentos com tia Kelsey renovou minhas esperanças. O que eu sentia por Kamala era algo que não se sente por qualquer pessoa. E que não pode ser unilateral. Eu me convenci de que só tinha que esperar e estar lá quando Kamala percebesse que eu era o homem de sua vida. 

Desculpei-me com meu tio e também com Robert. Minha relação com o ultimo passou a ser cordial e profissional. Robert era realmente muito competente, meu tio tinha razão em contratá-lo.

Passei a dedicar-me totalmente ao trabalho. Eu passava até dezesseis horas por dia na empresa e ia em casa apenas para dormir. Nos fins de semana eu ficava em casa, estudando, falava com meus pais, às vezes eu ligava para Anik ou me encontrava com os amigos da época de escola. Em um desses encontros, estava Yumi. 

Yumi e eu namoramos quando estávamos no ensino médio. Depois que nos formamos, ela continuou no Japão, enquanto eu fui estudar nos Estados Unidos. Havia muitos anos que não nos víamos e eu fiquei muito feliz em reencontrá-la. Nós conversamos por horas e marcamos de nos encontrar no dia seguinte. 

Yumi tinha sido importante para mim. Eu gostei muito dela e fui feliz durante o tempo em que ficamos juntos. Reencontrá-la me fez bem. Ela era linda e ainda me olhava com o mesmo carinho de antigamente, e isto mexeu comigo. Eu havia prometido a mim mesmo não tocar em uma mulher que não fosse Kamala, mas reencontrar Yumi quase me fez mudar de ideia. Eu estava carente e ainda me lembrava de como era bom beijá-la. Foi difícil, mas eu consegui manter a minha promessa.

Algumas semanas depois desse encontro, recebi o convite para a formatura de Kamala. Meus tios fariam uma festa após a cerimônia e esperavam que os principais diretores da empresa estivessem presentes. Eu fui, como representante da sede japonesa e como membro da família.

Tudo estava correndo bem durante o evento. Kamala estava linda e radiante, tio Ren estava explodindo de orgulho e Robert era uma presença constante ao lado de Kamala. Eu procurava agir com naturalidade, conversar com as pessoas, me divertir. Mas não conseguia desviar os olhos da minha amada. 

Então, o inesperado aconteceu. Robert subiu ao palco e declarou seu amor por Kamala. Então ele desceu, ajoelhou-se diante dela e a pediu em casamento. Meu mundo caiu.

Mas meu coração ficou aos frangalhos quando ela lhe disse "sim". 

Meus olhos ficaram mareados e meu corpo parecia que estava caindo em um abismo. Doeu. Tanto que eu pensei que não sobreviveria. Eu tinha a certeza de que Kamala era destinada a mim, como eu era destinado a ela. Mas então aquele homem a levou de mim, e eu não tinha mais certeza de nada. Eu precisava sair dali. 

Eu percebia as lágrimas descendo pelo meu rosto enquanto todos sorriam, felizes pelos noivos, mas eu não conseguia mover o meu corpo. Então eu senti alguém agarrar o meu braço. Eu ergui a cabeça e vi meu irmão  Anik diante de mim. Ele me olhava com ternura e firmeza. 

— Vem comigo, irmão.

Eu acompanhei Anik até o escritório da casa de seus pais. Ele fechou a porta enquanto eu me sentava no sofá, sem acreditar no que estava acontecendo. 

— E agora Anik? O que eu faço?

— Não faz nada meu amigo. Viva a sua vida! As coisas vão acontecer como elas precisam acontecer. 

— Mas Anik, eu tinha certeza!

As lágrimas desciam descontroladas pelo meu rosto. Anik me olhava com piedade.

— Eu sei irmão, mas nós não podemos ter certeza pelos outros. Se você a ama, ficará feliz enquanto ela for feliz. Kamala está trilhando o caminho que ela escolheu, e as coisas tem dado certo para ela. Trilhe o seu caminho. Quem sabe um dia os caminhos que vocês escolheram terminem em um mesmo destino? 

Eu esperei alguns minutos até estar mais calmo. Então, pedi licença a Anik e que ele avisasse aos meus pais e tia Kelsey que eu havia me sentido mal e precisei ir embora. 

Eu demorei vários dias até me conformar com o noivado de Kamala. Voltei ao Japão alguns dias depois da festa e foquei-me no trabalho. Eu sabia que Kamala e Robert pretendiam se casar em pouco tempo e que os preparativos já haviam começado. Eu comecei a me perguntar se fazia sentido eu manter a minha promessa de não namorar alguém até ter Kamala comigo. Concluí que não, isto não fazia sentido. Resolvi trilhar o meu caminho, independente do dela. Eu também queria ser feliz. Comecei a namorar Yumi. 

Tudo ia bem no trabalho e no meu relacionamento. Yumi e eu nos dávamos bem, conversávamos sobre todos os assuntos, saíamos juntos, cuidávamos um do outro. Mas o que eu sentia por ela, apesar de ser bom, não era avassalador. Ela não me completava. E acho que eu também não a completava.

Nós namoramos por alguns meses, então Yumi terminou comigo. Ela disse que nós éramos bons amigos, mas que nossa relação não iria além daquilo. E ela tinha razão. Eu continuava pensando em Kamala o tempo todo. 

Tio Ren finalmente aposentou-se. Ele deu a notícia em uma reunião com todos os diretores da empresa, através de vídeo conferência. Ele informou que estava passando a presidência da empresa para Robert por um período de seis meses. Após este período, a diretoria deveria eleger um novo presidente, escolhendo entre Robert e os dois principais acionistas: Kamala e eu. 

Eu imaginava que Robert faria um bom trabalho como presidente e que Kamala, como sua noiva, o apoiaria no cargo. Eu não tinha pretensões à presidência, portanto, se Robert fosse competente, eu poderia votar nele. E de fato, ele era. 

Alguns meses antes da eleição para a presidência das empresas, Kamala afastou-se. Eu imaginei que fosse por causa do casamento. Eu já estava conformado e tentei não me aborrecer, mas era inevitável sentir uma ponta de dor. Eu evitava falar nela e até me afastei de Anik e do resto da família. Mas foi minha mãe quem me falou sobre os motivos de Kamala. 

— Kamala está aqui, na Índia.

— Ela pretende se casar na casa de Kadam?

— Não que eu saiba. Ela não falou nada sobre o casamento. Disse apenas que queria viajar pela Índia para conhecer o país que seus pais não lhe mostraram. 

— Como assim mãe?

— Ela disse que ia até o vilarejo onde Radha nasceu e visitaria a casa dos funcionários das Indústrias Rajaram. Ela queria visitar os bairro mais pobres e a zona rural da Índia. Ela está em Nova Delhi, depois iria para Nepal, Bangladesh, e Sri Lanka.

— Mas porque isso? 

— Parece que ela está seguindo um conselho de Radha.

Fiquei muito preocupado com esta viagem de Kamala. Liguei para Anik na mesma hora.

— Olá Sohan, há quanto tempo você não nos liga? Sentimos sua falta. 

— Me desculpe amigo, é por causa do trabalho. Ainda estamos nos adaptando aos novos tempos aqui na empresa, então há muito o que fazer.

— Imagino que sim. E então, há um motivo específico para você ter ligado hoje?

Anik me conhecia melhor do que ninguém.

— Na verdade há sim. Kamala afastou-se da empresa há algumas semanas. Eu imaginei que fosse por causa do casamento, mas minha mãe me disse que ela está em uma viagem pela Índia e que foi ideia de Radha.

— Sim, é verdade.

— Mas Anik, que tipo de viagem é essa? Pelo que minha mãe falou, Kamala está sozinha em lugares muito não muito seguros para ela. 

— Não se preocupe Sohan, sempre haverá alguém com ela. Kamala vai ficar bem.

— Mas porque ela resolveu fazer isso agora?

— Porque Kamala é assim. Não se preocupe Sohan, Ela logo estará de volta para nós. Preciso desligar agora. Vê se aparece irmão.

— Claro irmão. Em breve. 

Os meses passaram-se rapidamente e a data da eleição do presidente da empresa chegou. Havia três candidatos, Robert, Kamala e eu, mas Robert era claramente o favorito. Kamala ainda não tinha voltado de sua viagem espiritual, ou seja lá o que fosse aquilo e eu não me sentia pronto ainda para assumir o cargo. Apesar de eu ter obtido alguns votos, Robert foi eleito o presidente e me manteve como seu vice. Eu voltei aos Estados Unidos. 

A nova gestão da empresa tinha como proposta a modernização das produções e das relações com os investidores. Os negócios das indústrias Rajaram eram bastante diversificados, mas Robert achava que muitos serviços eram obsoletos. Ele resolveu suspender a produção de uma série de produtos e retomar outros, que estavam parados há anos. Assim, ele anunciou que retomaria a produção de um mini submarino, que a empresa havia abandonado havia quase 30 anos. 

— Este veículo foi desenhado pelo próprio senhor Kadam e projetado pelos engenheiros das Indústrias Rajaram no Japão. Ele foi chamado de Skimmer. O protótipo foi produzido, testado e aprovado. Um veículo chegou a fazer uma viagem curta até as ilhas Barren. Não encontramos diário de bordo, nem conseguimos identificar quem fez a viagem. Sabemos apenas quem assinou a liberação do veículo: a senhora Nilima. Mas ela diz apenas não se recordar deste projeto. De qualquer modo, o projeto é revolucionário e nós temos compradores interessados, por isso, começaremos a produção do Skimmer imediatamente. 

Eu estava muito animado com a nova fase das empresas. Contratamos novos engenheiros e cientistas, vários projetos novos foram surgindo, assim como muitos investidores. Em contrapartida, uma série de produtos deixaram as linhas de produção, a maior parte deles, eram produzidos na sede indiana. Mas eu estava tão animado, que não prestei atenção às implicações disso, até que Kamala voltou.


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