Severo Snape - O Princípio escrita por Noctem


Capítulo 2
Capítulo II - Encontros e Desencontros




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   Uma locomotiva vermelha expelia uma cortina de fumaça sobre a crescente aglomeração na Plataforma 9 ¾. Discernindo-se aqui e ali entre a multidão, via-se alunos mais velhos já estampando o brasão de Hogwarts em suas vestes que farfalhavam pelo chão. No alto, o letreiro indicava o horário exato de partida do trem, mas Snape não se preocupou com isso. Havia apressado sua mãe, logo quando os primeiros raios de sol conseguiram trespassar a atmosfera nublada de Cokeworth, por isso estavam adiantados.

   Entre o conglomerado de malas, gaiolas recheadas de corujas piando e malas se arrastando, estava não muito longe dele e da mãe, a família Evans. Os pais pareciam estar fascinados com o cenário que seus olhos discerniam, como convêm as pessoas que descobrem algo que por toda vida acreditaram ser conto de fadas. Um pouco afastado deles, estava Lílian radiante como sempre e Petúnia de nariz empinado e azedo.

   Snape sabia que a irmã de Lílian, Petúnia, apenas desprezava a irmã por não ter nascido com dons mágicos. A ousadia e o insulto foram às válvulas de escape para que ela disfarçasse seu interesse em conhecer Hogwarts e realizar magias. Diante disso, Severo só podia rir, visto que não conseguia imaginar uma trouxa mais autêntica do que Petúnia.

— Não se preocupe comigo, Severo — disse Eileen, soando maternal. — Acho melhor você ir embarcando, ou não encontrará cabines vagas.

   E dizendo isso, comprimiu o ombro do filho afetuosamente, deu-lhe um beijo na testa e deu meia-volta.

— É melhor assim, sabia? — uma voz retumbante ecoou excitavelmente atrás de Severo. — Você trilhar seu caminho sozinho neste mundo sem limites.

   O adolescente era, na concepção de Severo, no mínimo tão estranho quanto ele. Trajando uma calça verde berrante, colete vermelho e uma toga azul em contraste com seus olhos faiscantes o proporcionavam uma aparência doentia e biruta.

— Tarquin McTavish — anunciou-se estendendo a mão esquerda. — Você não é um bruxo comum, não é mesmo?

— Eu não saberia dizer — respondeu Severo, cumprimentando-o com a mão direita. — Para mim todos os bruxos são incomuns.

   O outro fez uma careta tão exagerada que Severo, por um átimo, achou que estivesse passando mal. Refletiu por um momento, acariciando uma barbicha ruiva e irregular sob o queixo e, subitamente, esboçou um sorriso tão largo e tresloucado de gelar os ossos.

— Entendo e quase invejo a gentil e inocente alegria dos comuns, mas amo a angústia de ser incomum.

   Dizendo isso, ele retirou uma chaleira do bolso interno do colete, segredou algo pela tampa e por fim colocou-a na cabeça como um chapéu.

— Vejo você na escola, até lá.

— Até — disse Severo, sem saber se aquela era uma recepção adequada.

   Desviando-se desse pensamento, ele caminhou até o trem esbarrando em alguns transeuntes que replicavam em acenar pela janela, encontrando o banheiro pela metade do trem. Despiu suas vestes mendicantes e tentou encontrar Lílian.

    Vasculhando as cabines apressadamente, encontrou pela metade do trem, uma conhecida cabeleira ruiva encolhida no canto ao lado da janela. Do lado da porta, uma dupla de garotos barulhentos conversava avidamente. Deu dois toques leves na vidraça da porta, indicando sua entrada e enfiou-se para dentro. Acomodou-se à frente da garota que lhe lançou um breve olhar e voltou sua atenção para a janela.

— Não quero falar com você – disse, em tom crispado.

— Por que não?

— Túnia me od... odeia. Porque vimos aquela carta do Dumbledore.

— E daí?

 Ela lhe lançou um olhar de profundo desagrado.

— E daí que ela é minha irmã!

— Ela é só uma... — Ele se refreou depressa; Lílian, ocupada demais em secar os olhos discretamente, não o ouviu. – Mas nós vamos! — exclamou ele, incapaz de conter a exaltação na voz. — Isso é o que conta! Estamos viajando para Hogwarts!

Ela concordou, enxugando os olhos, e, apesar de não querer, deu um meio sorriso.

— É melhor você entrar para a Sonserina — disse Snape, animado ao vê-la menos triste.

 — Sonserina? — queixou-se um desconhecido, com repugnância palpável no timbre de voz.    

   Um dos garotos que dividia com eles o compartimento, e até aquele momento não mostrara o menor interesse em Lílian e Snape, olhou para o lado ao ouvir aquele nome. Era magro, de cabelos negros como os de Snape, mas com aquele ar indefinível de alguém que foi bem cuidado, até adorado, que visivelmente faltava a Snape.

 — Quem quer ir para a Sonserina? Acho que eu desistiria da escola, você não? — zombou o garoto com óculos de armação redonda.

   O outro, de cabelo indomável e esparramado preguiçosamente no assento não retribuiu a sátira.

— Toda a minha família foi da Sonserina.

 — Caramba – replicou o outro —, e eu que pensei que você fosse legal!

    Dessa vez o garoto de cabelos fartos riu de prazer.

 — Talvez eu quebre a tradição. Para qual você iria se pudesse escolher?

    O outro ergueu uma espada invisível enquanto estufava o peito. — “Grifinória, a morada dos destemidos!” Como o meu pai.

    Snape deu um muxoxo de descaso. O garoto de óculos se virou para ele.

— Algum problema?

— Não — retrucou Snape, embora seu sorrisinho de deboche dissesse o contrário. — Se você prefere ter mais músculo do que cérebro...

— E para onde está esperando ir, uma vez que não tem nenhum dos dois? – interpôs, com ar arrebatado, o amigo cabeludo. O garoto de óculos deu gostosas gargalhadas. Lílian se empertigou, ruborizada, e olhou de um para outro com semblante desagrado.

— Vamos, Severo, vamos procurar outro compartimento.

 — Oooooo... Os dois garotos imitaram o seu tom de superioridade; o de óculos tentou fazer Snape tropeçar quando ele passou.

 — A gente se vê, Ranhoso! — uma voz gritou quando a porta do compartimento bateu.

— Isso foi terrível, pensei que bruxos fossem iguais a você.

   Severo não escutou, estava com uma expressão esquisita como se filtrasse o que ocorreu lá dentro. Lílian o sacudiu pelo ombro.

— Vamos, deve ter algum espaço sobrando por aí.

Ela tomou-lhe a mão, guiando à frente até o fundo do vagão. Não demorou muito, e acharam um compartimento ocupado, mas com dois lugares vagos. Ela abriu a porta.

— Tem alguém ocupando estes lugares? — perguntou, apontando para os assentos ao lado da porta.

Ela não notara, mas os dois ocupantes originais da cabine estavam enlaçados em um beijo de desentupir privadas. Envergonhada, espantosamente seu rosto assumiu uma tonalidade mais vibrante que seus cabelos.

— Ah, claro, sentem-se — disse uma voz masculina, conseguindo falar depois do ruído de sucção quando separaram os lábios.

   Lílian puxou Severo, que aparentemente, se recupera do primeiro conflito em Hogwarts; mas não falara nada, por gostar do toque da garota em sua mão.

— Sou Franco Longbottom — declarou sorrindo, mais para seu par feminino do que para os garotos —, e essa é Alice, minha futura esposa.

   A garota, de cabelos curtos mal-disciplinados, rosto redondo e simpático cumprimentou-os com um respeitável meneio de cabeça.

— Alunos novos, certo? — perguntou Alice, sugerindo com o dedo indicador as vestes trouxas de Lílian.

— Sim, será o meu primeiro ano — respondeu Lílian, com um sorriso contagiante. — Estou muito ansiosa para conhecer a escola.

— Não é muito cedo para trocar suas vestes? — interferiu Franco, lançando as vestes de Snape um olhar intrigado. — Isso tudo é o nervosismo por conhecer Hogwarts?

   Severo olhou para baixo, como se não soubesse que havia se trocado. Na verdade, já havia se acostumado às vestes escolares e achava que sempre fizeram parte de seu vestuário. Concluiu que o ódio irrefreável fruto dos comentários incômodos de seus trajes anteriores tivesse facilitado esse gosto por novas vestimentas.

— Isso mesmo — disse finalmente, sorrindo amarelo para Franco.

   A mudança de paisagem atraiu a atenção de todos, em um instante os prédios cinzentos de Londres dominavam as janelas e então o contorno verde relampejou sobre as janelas. Estavam em região rural, e os únicos residentes do campo eram as vacas e carneiros. Em silêncio, contemplaram a paisagem imutável trespassar os trilhos do trem e se estender até onde suas vistas alcançavam.

   Depois, insatisfeitos, começaram uma discussão amistosa sobre Hogwarts, seus professores, disciplinas e diversões. Lílian completamente anestesiada pela surpresa em cada frase revelava seus desejos cada vez mais; enquanto, Severo, imparcial e autoritário, remendava as explicações de Franco quando ele esquecia ou deixava passar alguma informação que ele julgasse importante ressaltar. 

  Depois da conversa enérgica, uma mulher toda sorrisos abriu a porta, mergulhou a cara para dentro e perguntou:

— Alguém quer uma guloseima?

   Franco se levantou de um salto, Alice o cutucou pela cintura indicando os dois, algo que foi apenas discernível para Severo que examinava o cenário por um olhar de viés. Franco retirou algumas moedas de um saquinho e foi colocando entre Alice e Severo a maior e mais excêntrica variedade de doces que Lílian já vira.

  Snape pensou exatamente a mesma coisa, só não admitiu.

  Juntos deliciaram-se com feijõezinhos de todos os sabores, balas de goma, chicles de bola, sapos de chocolate, tortinhas de abóbora, bolos de caldeirão, varinhas de alcaçuz e uma infinidade de sabores desconhecidos e exóticos. Sem notarem, as planícies tornaram-se mais silvestres, dando lugar a matas, rios caudalosos e colinas tortuosas.

— Vai demorar muito? — retorquiu Lílian, após os doces acabarem, as conversas chatearem e o tédio predominar.

   Franco que no momento tentava um novo beijo hesitou. Retirou um relógio de bolso prateado das vestes, e com uma expressão otimista virou-se para ela.

— Não, senhorita. Neste momento estamos exatamente nos terrenos pertencentes à Hogwarts. — comentou, imprimindo à sua voz um tom muito profissional.

   E enquanto dizia, a imagem de um castelo descomunal empoleirado sobre um promontório rochoso conquistou o horizonte retirando da garota ruiva um sobressalto.


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