Castle escrita por Romanoff Rogers


Capítulo 4
IV - Nossas Antigas Estátuas




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"Vamos ser lendas
Eu sou um rei e você é uma rainha
Se há uma luz no fim, é só o sol em seus olhos
Você sabe que nós dois somos jovens deuses"
— Young God, Halsey

 

 

 

Wanda


Eu não aguentava mais. As solitárias e cheias de lágrimas noites em que fiquei separada dele foram as piores da minha vida. Um buraco se abria em meu peito, e de lá, sangrava minhas dores para fora do corpo. E naquele momento eu podia explodir de saudade.

Mas ali estavam seus olhos. Seus doces olhos azuis e sorriso travesso estavam exatamente ali na minha frente. Eu podia gritar um palavrão e ter um filho com ele ali mesmo. O cabelo negro estava preso em um coque atrás da cabeça, e seus músculos cobertos por uma blusa de manga comprida verde escura com detalhes pretos de camurça. Ele está magnífico, é tudo que eu conseguia pensar.

Ele sorria arrebatadoramente feliz, e eu não podia esperar para contá-lo que podíamos finalmente ficar juntos. Com um movimento de cabeça ele sinalizou para irmos até o jardim, e eu assenti, vendo-o sumir pela multidão. Fui por outro caminho que eu conhecia melhor, saindo pela porta qual eu entrei, e dei a volta, passando pela lateral. Assim que saí da vista se todos, comecei a correr.

Corri o máximo que pude, eu não aguentava mais um segundo sem tocá-lo. Precisava beijá-lo, abraçá-lo e dizer que podemos ser felizes. E pela última vez - eu sabia - estava eu correndo pela penumbra da noite para encontrar com Bucky escondida, já avançando pelo jardim com meu vestido vermelho e preto me camuflando.

Parei, perto de um chafariz, olhando ao redor para procurá-lo. Nenhum sinal dele.

— Bucky? - perguntei, sem querer chamar a atenção de ninguém indesejado.

Estava tudo silencioso, o único som que se ouvia era meu coração batendo dentro do meu peito. Um arrepio percorreu minha espinha, e comecei a ficar preocupada. Com medo, até. E foi quando braços me agarraram num beijo, e mesmo sem vê-lo, eu sabia que era Bucky.

Passei meus braços tremendo ao redor do seu pescoço, agarrando sua nuca e trazendo-o para perto de mim. Foi tão forte que meu corpo se inclinou para trás, terminando quase caindo. Seus braços apertavam minhas costas e nossos lábios unidos dançavam em sincronia.

Eu senti tanta falta dele. Tive a necessidade de tocar cada centímetro do seu rosto para saber se era realmente real. E não queria desgrudar nosso beijo, eu só o queria para mim.

Mas seu sorriso nos interrompe, e eu sorrio também, nossas testas unidas e os narizes se tocando.

— Wanda. - ele disse, começando a rir e me abraçou.

— James. - e antes que eu possa ver, as lágrimas que tentei segurar começaram a correr, e ele apenas acariciou minhas costas, balançando o corpo de um lado ao outro. O queixo apoiado no topo da minha cabeça e minhas mãos encolhidas entre nossos corpos.

E ficamos assim sem dizer nada por minutos e minutos, ele apenas acariciava minhas costas cheio de amor. As vezes depositava um beijo no topo do meu cabelo e murmurava "tudo bem, bruxinha."

Ainda tenho medo de que me tirem dele.

Levanto meus olhos para encará-lo, e ele sorri. Belisquei sua bochecha, e ele fez uma careta.

— Ai!

— Queria ver se é real. - sorri, e ele apertou meu nariz, me arrancando um riso.

— É real, Romanoff.

Abri um sorriso, já me sentindo emocionada de novo. Segurei suas mãos, fazendo-o ficar de frente para mim.

— O que aconteceu, querida? Você está... Emocionada.

— Estou feliz. A coisa que mais quero na minha vida vai acontecer. - Bucky abriu um sorrisinho, acariciando minhas mãos.

— E o que é?

— Eu vou me casar com você. - seu sorriso sumiu, substituído por um olhar triste. - Podemos ficar juntos, James.

— Wanda... Eu não faria isso com você... Seu pai te expulsaria de casa, você nunca mais veria Natasha e seria rebaixada.... Eu não posso te ver perder tudo por mim. - abri um sorriso, negando com a cabeça.

— Me ouça, James, nada disso vai acontecer. Natasha vai se casar com Steve.

— Acho que é o que todo mundo espera, Steve só não sabe ainda. - ele dá de ombros, com um sorriso pequeno.

— E você sabe que a minha irmã não aceita ser... Ofuscada. Então... Se casar com um rei é uma coisa que ela não faria em sã consciência. - James franziu as sobrancelhas.

— E o que fez ela aceitar isso?

— Minha liberdade. Ela trocou a liberdade dela pela minha, James, eu posso me casar com quem eu quiser, sem consequências, ou ela não vai se casar com Steve e meu pai vai perder o poder que tanto quer.

E eu vi esperança em seus olhos. Eles nunca brilharam tanto, e o sorriso mais sincero se abriu em seus lábios.

— Isso é maravilhoso, Wanda! - ele segurou minha cintura, me levantando num abraço e me rodou pelo jardim. Soltei um grito seguido por uma risada, sentindo meus cabelos esvoaçando e a felicidade dele irradiando pra mim.

— Vamos ter sete filhos!

— O que? - ele arregalou os olhos, me coloca no chão, e eu começo a rir.

— Depois a gente conversa sobre isso. - pisquei para ele.

— Vai ficar por quanto tempo? - ele pergunta, sorrindo.

— Não saio sem Natasha.

— E... Se Steve não escolher ela...

— Bem... - respirei fundo. Não queremos que Steve seja forçado como Natasha, mas eu tenho toda a certeza do mundo que ele fará bem pra ela e ela pra ele. Eles já sofreram muito. - Vamos dar um empurrãozinho para eles.

(...)

Steve

— Ele acha que estamos tentando derrubá-lo. - ela diz, abaixando a cabeça. Natasha gosta muito de Tony, mesmo que não admita nunca.

— E não estamos? - zombei, e ela me encarou.

— Meu pai sim. E ele tem dado cada vez mais motivos pra Tony ficar zangado. Ele também me questionou sobre o amuleto da mãe dele. Pelo visto sumiu e ele acha que meu pai pegou.

— Por que seu pai pegaria o amuleto da mãe dele?

— Espera, você sabe de que que ele está falando? - suas sobrancelhas se ergueram, e ela se virou para mim.

— Sei. Um amuleto foi achado penhasco em que a carruagem deles caiu, Tony me contou na época. Disseram que era da mãe dele, mas ele nunca tinha visto ela usando.

— Isso é estranho. - assenti.

— Seu pai não pegou mesmo? - cruzei os braços, e ela se apoiou na sacada.

— Não duvidaria. Mas ele não tem motivos, a gente sabe disso.

— Hm... E quer passar a noite falando disso?

— Eu estou preocupada. - ela cruzou os braços, com uma cara divertida no rosto.

— Tudo bem. Como vai a Wanda? Não tive tempo de vê-la.

— Ótima. Ela só tem ficado péssima sem o Barnes. - ela apoiou a cabeça na mão, desviando os olhos.

— Bucky só fala dela. - sorri. - É engraçado.

— Eles se amam. - Natasha diz, mais séria que o esperado. Ela pensou em alguém, provavelmente. Mas não comentei.

— Merecem ficar juntos.

— Ah, eles vão. - ela me encarou, e eu ergui uma sobrancelha. - Eu... Coloquei meu pai em seu devido lugar. Ele não vai mais atrapalhar os dois.

— O que? Sério? - abri um sorriso, e fiquei extremamente feliz.

— Sim. Ela vai poder se casar com quem ela quiser.

— Mas... Tem um preço, eu sei. Volo não faria isso.

— Não importa. Eu só quero que ela seja feliz. - ela abriu um sorriso triste, e eu entendo o que ela quis dizer.

— Você também merece isso.

Seus olhos curiosos me encararam, analisando-me. Ela sempre me analisava. Desde que o pai dela mandou-a para aquele lugar horrível, quando tinha dez anos. Uma garotinha feliz foi substituída por uma mulher aos onze anos, e essa é a história da rainha mais temida da história.

— Sinto muito pelo seu pai, Steve. - Ela diz, pressionando os lábios. Não era como as outras pessoas. Vazio. Ela realmente se importava com ele e comigo.

— Eu tenho esperanças. - dei um sorriso triste, que ela retribui.

— É a última que morre... Eu estou aqui, se precisar. - assenti, sem parar de olha-la. E ficamos num silêncio confortável, apenas nos encarando por muito tempo.

Ela está linda, e eu só conseguia pensar nisso. Natasha Romanoff brilhava como a lua naquele momento. Eu provavelmente estava encarando-a com cara de idiota, mas não podia evitar.

— Steve. - saí de transe, dando atenção ao que ela falava. - Você tem centenas te convidados te esperando lá.

— Ah. Eu tenho. - respirei fundo, arrumando minha túnica. - Vai ficar conosco por quanto tempo?

— O quanto você quiser. - ela diz, jogando a cabeça para o lado, e eu entendo o que quer dizer. Para sempre, se me escolher.

— Então temos muito tempo pra recuperar o perdido. - ela assentiu e eu ajeitei a coroa na cabeça, respirando fundo.

Deus, como eu odeio isso.

— Você consegue. - ela disse, lendo meus pensamentos. Assinto.

— Com licença. - fiz uma reverência rápida e sai andando, e antes de fechar a porta da sala do trono, encarei a rainha ruiva de vestido dourado iluminada pela luz do luar.

Quando um rei escolhe uma rainha, nada no mundo destrói isso.

(...)

Natasha

Eu fiquei ali encarando o luar por muito tempo. A conversa com Steve foi boa, eu realmente senti sua falta. E sei que ele também sentiu a minha, vi sua felicidade ser mútua. Isso é reconfortante, ainda mais quando ele me deu uma garantia que me quer aqui por muito tempo.

Podia ter muitas interpretações disso. Mas esperamos pela melhor.

Mas eu ainda tinha trabalho a fazer naquela noite. Rapidamente, subi e fiquei de pé na murada de pedra, me esforçando para não cair lá embaixo. Minha perna fisga do acidente com a tora no treino, mesmo assim agarrei as trepadeiras na parede ao lado e fiz impulso, subindo apenas o suficiente para alcançar o andar de cima.

O fiz com muita dificuldade, mas sem derrubar a coroa nem estragar os sapatos. Arrumei meu vestido e abri a porta de vidro, verificando se não tinha ninguém no corredor. Quase todos estavam ocupados com a festa, menos alguns guardas que faziam ronda nos corredores. Ninguém. Tenho que lembrar Steve de indicar as falhas nessa segurança, sei que Barton, outros espiões conseguiriam entrar aqui, ainda sem vestido.

Fui andando com meus passos apressados batendo no carpete, mas sempre silenciosa, e foi quando ouvi alguém se aproximando. Me escondi atrás de um sofazinho, e o distraído assoviando foi embora. E fui assim, observando tudo que queria, reconhecendo território e me escondendo sempre que alguém se aproximava.

Subi as escadas em direção ao andar de cima, e depois o próximo e próximo, e isso com certeza era muito mais divertido que uma festa. Fuçar. Eu não sabia qual seria meu quarto, mas teria essa madrugada inteira para achar lugares para esconder minhas coisas e criar rotas de fuga para mim e Wanda.

Ouvi algo interessante enquanto estava escondida.

— O rei Stark falou comigo, Ellen, comigo!

— O que ele disse?!

— Disse que meu sapato estava desamarrado!

— Que tolice. - Ellen comentou, cada vez se distanciando mais. - Onde?

— Aqui em cima!

E era o que eu precisava. Era o suficiente.

E naquela noite decorei cada canto daquele castelo. E com eles, vieram as memórias em forma de pesadelos.

(...)

Steve

Fechei a porta do meu quarto, e comecei a andar pelos corredores. Mesmo depois daquela festa tudo estava bem, pelo que eu via. Respondi as reverências que recebi no caminho e passei o olho pelo salão. Estava limpo, e todos os resquícios da festa foram apagados.

Até que ontem a noite foi divertido, afoguei minhas preocupações no álcool sem perder a noção e eu queria muito ficar com Natasha, mas ela sumiu, só apareceu horas depois para o jantar.

Eu estava morrendo de fome, mal deu tempo para comer ontem de noite. E assim que me aproximei da sala de jantar do segundo andar, ouvi os risos de Bucky e de alguém que julguei ser Wanda. Deus, eu não a via a anos.

Eles não notaram que eu entrei, continuaram rindo absurdamente alto, e eu abri um sorriso com a cena.

— Alteza. - Bucky se levantou, e Wanda olhou para trás, me vendo. Ela abriu um sorriso e pulou pra fora da cadeira, antes de me abraçar com força.

Eu retribuo o abraço, surpreso e feliz. Ela era uma garotinha quando a vi pela última vez.

— Um abraço é muito melhor que uma reverência, perdão. - ainda sorrindo ela se afasta e fez uma reverência.

— Eu concordo. - eu sorri, tocando o braço de Bucky.

— Bom dia. - ele diz, colocando uma ameixa na boca.

— Vocês estão felizes, não é mesmo?

— Sim... - Ela murmura, com um sorriso pra Bucky.

— Eu já sei das novidades. Natasha me contou.

— O que ela te contou? - seus olhos se arregalam.

— Que ela enfrentou deu pai.

— Ah... - ela deu uma risada aliviada, e não identifiquei o motivo. - Sim, sim, Natasha fez isso sim.

— Fiz o que? - Natasha diz, e minha cabeça vira imediatamente para vê-la entrar. Usava um vestido de malhas de ferro até o chão com seda meio transparente e preta por cima. A parte de cima da armadura estava bem colocada, e uma tiara de ferro com diamantes brilhava em sua testa.

Minha boca abriu de surpresa. Tratei de fechá-la rapidamente, mas aquilo era uma mudança e tanto. Não sabia que Natasha tinha... roupas de ferro. Muito menos que ela ficava absolutamente maravilhosa nelas.

— Não a abrace, ela não gosta. - Wanda disse a Bucky, que ri.

— Oi, James. - ela disse, antes de beijar a bochecha de Wanda.

— Oi, Natasha.

A ruiva se sentou de frente para Wanda, do lado da cadeira do rei. - Bom dia, Steve.

— Bom dia. - eu disse, me aproximando da cadeira do meu pai. Encarei-a por alguns segundos. Não tenho coragem de sentar nela até ele morrer. E Bucky percebeu e me lançou um olhar reconfortante. Sento-me na cadeira menor, pegando um pouco da salada de frutas e queijo.

Wanda comia torradas com geleia e suco de laranja, Bucky tomava café puro e Natasha pega a taça inteira de morango pra ela.

— Achei que comia sonhos de criancinhas no café da manhã, Romanoff. - James sorriu e ela revirou os olhos, enfiando um morango na boca.

— É no jantar. - Wanda murmurou, e Natasha apontou a faca de cristal pra ela.

— Olha só. Cuidado com o que você fala, sua tonta.

— Você demorou a voltar para o baile. - disse a Natasha, enquanto o casalzinho volta com fofuras e conversas animadas.

— Sim... - Ela morde os lábios, se apoiando na mesa para ficar mais próxima, e eu aproximo o rosto para ouvi-la sussurrar. - Eu... Descobri que Tony foi pro andar de cima. Durante a festa.

— O que? - arqueei uma sobrancelha. - Por quê?

— Não sei. Ele não teria motivos pra isso. A menos que tenha. - ela disse, enfiando mais um morango na boca.

— E como descobriu isso? - ela sorriu, sem parar de mastigar. Eu sorri também, apontando pra tigela nas mãos dela.

— Algumas coisas nunca mudam.

— Você está igualzinho sempre. - A ruiva sorriu, encostando na cadeira. - Tony também.

— Por falar nisso - olhamos para Wanda, esperando ela terminar. - Eu jurava que vi Tony na varanda do jardim, que susto eu levei.

— Eu disse que você está vendo coisas. - Bucky falou, bebendo seu café.

Natasha me lançou um olhar preocupado, e eu retribuo.

— Eu conto ou você conta? - murmurei, com a mão na nuca.

— Tony estava aqui. - ela diz, e vejo a expressão dos dois cair.

— O-O que? - Wanda arregalou os olhos, nos encarando.

— É. Ele veio. - Comentei, suspirando. Eu sei o que aconteceu entre eles. Todos nós sabemos. Wanda traiu Tony com Bucky. Não julgávamos ela porque ela era bem mais nova, mas Tony nunca mais conseguiu olhar para ela do mesmo jeito.

— Ai Santo Deus. - ela tapou o rosto, e Bucky suspirou.

— Ele está tramando alguma coisa, não está? - James falou, prevendo o que Wanda iria fazer.

Não respondi, tampouco Natasha, e Wanda saiu andando, cabisbaixa e murmurando um "com licença", enquanto Bucky comprimiu os lábios, se inclinando para pegar o café.

— James! - a voz irritada de Wanda o faz levantar e sair também.

— Tudo bem, princesa, tudo bem. - dou um sorriso. Eles têm uma relação tão especial, tentava não ter inveja disso. Mas eu sou tão feliz por eles.

Meu olhar cai sobre Natasha, que ainda devorava morangos como se nada tivesse acontecido. Apoiei minha cabeça na mão e passei a observà-la. Sei que ela notou, mas ignorou para me fazer olhar para outro lugar.

— Por que está me olhando desse jeito, Rogers? - ela cruzou os braços, me encarando com um bico aparentemente irritado.

— Tenho que te mostrar uma coisa. - uma sobrancelha dela se ergue. Ninguém fazia essas coisas pra ela, eu sei. Fazia. Agora eu faço.

(...)

Natasha

Eu o encarava confusa, com uma sobrancelha em pé. Me mostrar algo?

— É. - Steve se levantou, com uma cara divertida, e eu o segui, pegando mais um morango. Ele me ofereceu o braço e eu aceitei e saímos da sala assim.

Encontramos Catrinna, a meia irmã mimada de Bucky. E eu sei que ela está aqui pelo mesmo motivo que eu. Steve a cumprimentou, e nós dois fazemos uma reverência retribuída por ela. Sorri, lançando lhe um olhar a sua cara pegando fogo de inveja.

— Você sabe que eu odeio surpresas. - falei, e Steve negou, sem largar o sorriso.

— Essa você vai gostar. - bufei, revirando os olhos. Ele sabe como lidar com meu gênio, isso ele não esqueceu.

Fiz mais perguntas, cada vez mais curiosa, e não fiz questão de esconder isso. Percorremos o castelo inteiro até as portas mais ao fundo e descemos a escadaria até o jardim.

Vamos andando e andando, e descubro onde ele me levava. Abro um sorriso, vendo nosso banco. Um banco de pedra cinza na frente de vários pés de morango e a estátua grega de uma mulher sem cabeça na frente.

Aqueles morangos não estavam aqui da última vez que vim.

— Meu pai mandou plantar morangos no jardim, tempos atrás, e eu sabia o melhor lugar para eles. Seus preferidos.

— Adorei. - disse, sem largar um sorriso e toquei as folhas verdes dos morangos aumentando de tamanho aos poucos.

Íamos aquele banco toda vez que nos encontrávamos e conversávamos a madrugada inteira, fugindo dos bailes chatos. Mas agora tudo mudou.

Fui até a estátua da mulher, onde em suas costas estava escrito "Steve e Nat, amigos para sempre" com uma letra bem feia. Eu ri, tocando as letras, novamente atingida por uma nostalgia familiar.

— Tudo era mais fácil naquela época. - comentei, e Steve cruzou os braços.

— Não sabíamos o que tínhamos até perdermos. - ele concordou antes de se sentar no banco. Não demorei para seguir o mesmo caminho e encarar a mulher.

— O que aconteceu com sua mão? - ele perguntou, e olhei pra ela, revelando os cortes de quando soquei a murada de pedra. Eles doíam e me lembravam de Clint.

— Socando coisas. - seria mais fácil mentir, mas eu não queria. Não para ele.

— Como eu disse, algumas coisas nunca mudam. - eu dei um sorriso triste, analisando minhas unhas.

— Eu não sei quem eu sou a muito tempo. - antes que eu possa raciocinar as palavras saem, e eu abraço meu próprio corpo. Agora que eu disse não tem como engolir as palavras.

Olhei para ele, esperando que mude de assunto. Mas ele faz algo melhor.

— Somos vazios demais pra isso? - perguntou, e eu não sei a resposta. Já me perguntei isso tantas vezes... E nunca tive uma resposta.

— Amor é coisa de criança. - eu falei, e ele deu um sorriso, sem parar de encarar meus olhos.

— Não lembro de você sem ser uma garotinha ruiva e feliz. - é minha vez de sorrir, sentindo o nó em minha garganta se desfazer. Eu só queria ser essa menina de novo.

Minhas mãos tremendo alcançam as fivelas que amarrava as tiras de couro da armadura em minhas costas e as desamarram com facilidade, deixando apenas as malhas de ferro e a seda preta cobrindo meu corpo. A armadura cai no chão com um baque, e joguei a coroa no chão também.

Steve me encarava com os cotovelos nos joelhos, sabendo o que eu iria fazer. E tudo bem. Ele tira a própria coroa também.

Seus braços me envolvem com uma familiaridade impressionante. Minhas mãos em seus ombros, minha cabeça deitada em seu peito e seu queixo descansando em meus cabelos. Aquela sensação estoica volta, eu me sentia uma criança. Derramando todo o peso que carrego em seus ombros. E o dele nos meus.

E ficamos assim pelo que pareceram horas e horas, seus dedos acariciando minhas costas e eu inalando seu cheiro estonteante. Conseguia sentir cada batida do seu coração, e finalmente reconheci meu amigo.

 


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