Heartbeat escrita por Ana


Capítulo 15
Confused minds, confused hearts


Notas iniciais do capítulo

Voltei, e agora estando de férias, vou buscar fazer com que as atualizações aconteçam de modo mais frequente. O capítulo anterior terminou tenso, bem tenso, e o de hoje vai dar continuidade a ele.
o capítulo de hoje possui uma música, e eu gostaria que vocês ouvissem enquanto leem, que é Dream - Imagine Dragons.
No mais, boa leitura.

P.S.: a revisão não está completa.



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Dream

As pernas de Emma obedeceram ao comando de Regina antes mesmo que ela pudesse raciocinar qualquer coisa, só voltando a perceber a própria camisa aberta ao entrar no elevador e ver o reflexo do seu peito desnudo no espelho. Na volta para casa procurou o caminho mais curto possível, em pistas sem fiscalização eletrônica dirigia mais rápido do que o permitido, seu pé pesava em cima do acelerador, ao ponto de quase não conseguir trocar de pedal e frear no limite de passar em um sinal vermelho.

Alice estava sentada no sofá da sala enquanto tentava reproduzir alguns desenhos das apostilas no caderno de desenho, era uma atividade da disciplina de desenho com crayon, quando a porta se abriu e a sua irmã entrou.

— Por a hora, achei que você fosse dormir fora de casa. — disse sem tirar os olhos do caderno enquanto desenhava.

Emma não respondeu, trancou a porta da sala e foi direto para o quarto, sem acender a luz, jogou a bolsa em cima da cama sem se importar com as câmeras que estavam dentro.

Iluminado pela luz do rádio relógio em cima do criado mudo, o pote com as suas moedas de sobriedade brilhava.

Foi para isso que eu cheguei até aqui? Para tomar tudo que era de alguém?

Emma caminhou até o banheiro, onde jogou uma água no rosto, ao levantar a cabeça, se deparou com a sua imagem no espelho, ela era distorcida pelas lágrimas e água que inundavam os seus olhos e ganhavam o seu rosto, ou talvez só houvesse voltado a se enxergar como sempre se viu, errada, desajustada, não pertencente a lugar algum.

Enquanto encarava a si mesma no espelho, desbotoou a camisa; não importava se fosse um dia de chuva ou de sol, sempre vestia camisas que pudessem ser abotoadas, porque assim poderia esconder qualquer vestígio da cicatriz sob a roupa; e mirava a marca em seu peito, como se o seu olhar e desejo tivessem a precisão de um bisturi, e que pudesse arrancá-la fora.

Suas mãos se moveram ágeis como se tornassem os próprios bisturis, e com as unhas começou a arranhar o seu próprio peito. A pele antes alva, adotava o tom avermelhado a medida em que Emma se enfurecia e começava a abrir finos vergões na pele, a salvo a que estava recoberta pelo sutiã.

O seu coração batia tão rápido e forte, que o ouvia como se estivesse a bater dentro dos seus ouvidos a ensurdecendo. Emma só queria que ele parasse, só queria que aquele barulho acabasse, que a dor passasse.

— Emma, você não sabe — Alice começou a dizer quando entrou no quarto da irmã —, a Robin vem no mês que vem, ela vai... — mas parou assim que chegou a porta do banheiro.

Com o olhar fixo no espelho do banheiro, sua irmã mais velha desferia arranhões e mais arranhões no seu próprio peito, enquanto lágrimas vertiam aos montes pelo rosto dela.

— Mas o que é que você está fazendo?! Emma, para com isso. — Alice disse assustada, mas Emma nem sequer pareceu notar a presença dela ali. — Emma!

Alice segurou nos punhos de Emma fazendo com que ela parasse de se autoflagelar, e precisou usar grande parte da força que tinha, já que sua irmã era mais forte.

— Porque que você está fazendo isso?

Com as mãos presas, Emma tremia, respirava e soltava o ar com muito mais força do que o necessário.

— Emma! — Alice gritou.

— Isso não é meu, não pertence a mim. Eu não mereço... — as palavras saiam embargadas pelo choro.

— O quê que não é seu? Do que você está falando?

— Disso aqui dentro. — Emma tentou mover a mão para apontar para o seu próprio peito, mas com Alice ainda as segurando, não conseguiu. — Dentro do meu peito.

— O seu coração? — Emma acenou tristemente com a cabeça. — É claro que ele é seu.

— Não é, nunca foi e nem vai ser.

— Emma, se acalma, eu vou te soltar, mas você tem que me prometer que não vai voltar a fazer aquilo de novo. Você promete?

— Uhum. — confirmou com a cabeça.

Quando Alice os soltou, os braços de Emma caíram como dois pesos sem vida.

— O que é que está acontecendo? Porque você estava fazendo aquilo?

— Pôr que eu não quero mais isso aqui dentro do meu peito, porque eu não mereço, Alice. Ele devia ter ido para alguém bondoso, eu não passo de uma ex-viciada.

— Eu não conheço ninguém nesse mundo que mereça mais esse coração e que faça jus a ele do que você.

O que Emma dizia, fez com que uma lembrança muito específica viesse a mente de Alice: Emma surtando em uma das crises de abstinência depois do transplante.

Alice lembrava da sua irmã tremer ao ponto de bater os dentes enquanto perguntava irada quem tinha sido o responsável por colocar aquilo dentro dela, porque ela não tinha dado autorização, para logo em seguida cair em um choro copioso, pedindo que o tirassem, porque assim, ela acreditava que poderia voltar a usar as drogas e acabar com a abstinência.

— Emma, você não... você não fez isso, não foi? Por favor...

Sabia que se Emma voltasse aos antigos hábitos, não seria só ela, a própria Emma, que afundaria, mas sua família inteira também iria junto.

— Não. — negou com a cabeça como uma criança.

— E o que te deixou assim?

— Eu recebi o coração dela, Alice. — sussurrou.

— Dela quem?

— Da esposa de Regina.

— Esposa?

— A outra mãe do Henry. — se sentou vaso sanitário que estava com tampa abaixada e escondeu o rosto nas mãos.

— A doação é secreta, como que você sabe disso? — Alice se sentou no chão perto da irmã.

— Era ela quem estava no carro que também se envolveu no acidente, nós fomos para o mesmo hospital, ela morreu um dia depois do acidente, e foi quando eu recebi o coração dela. Tudo bate. — a voz saiu abafada e as palavras trôpegas.

Alice permaneceu em silêncio enquanto absorvia toda a informação que Emma tinha lhe dado.

Isso é mesmo possível?

— Eu me apaixonei pela mulher dela, Alice, pela mulher da minha doadora — disse encarando os olhos azuis da irmã, enquanto o seu queixo tremia —, eu quis que o filho dela fosse meu. Tudo isso aconteceu depois do coração dela começar a bater dentro do meu peito. O que é que eu estou fazendo? — passou as mãos trêmulas nos cabelos.

— Emma — Alice tomou o rosto dela em suas mãos —, isso é só uma coincidência, confusa, mas é só uma coincidência, ok? Você não pode se deixar levar de novo, está me ouvindo? Hein? Por mim Emma, por a sua irmã mais nova, por favor...

Em seu apelo, Alice também derramou algumas lágrimas, a versão 2.0 de Emma tinha sido a versão em que as duas também tiveram a melhor versão da relação de fraternidade. Alice não queria perder aquilo.

— Uhum — Emma balançou a cabeça. —, eu só preciso... só preciso da minha cama. Eu vou ficar bem.

Passou a mão no rosto o enxugando, tudo que menos queria era preocupar a sua irmã mais nova, mas que naquele momento parecia ser anos mais velha.

— Tem certeza?

— Acho que agora eu só preciso deitar.

— Tudo bem, vou fazer um chá, acho que camomila por ser bom, você precisa se acalmar.

Olhando para trás, Alice deixou o banheiro e o quarto.

Emma lavou o rosto mais uma vez e limpou o nariz. Se encarando de novo no espelho, o rosto avermelhado entregava a existência do choro e da agonia em seu coração.

No quarto, Emma terminou de tirar a blusa e o sutiã, e os jogou desajeitadamente em cima de um puff, catou um camisetão no armário e o vestiu sem se preocupar em ao menos tirar os cabelos de dentro da blusa, depois tirou os sapatos e os empurrou para debaixo da cama, para então tirar a calça e também jogá-la no puff, e ao fazer isso, Emma ouviu o barulho de algo caindo chão.

Tateou o chão na penumbra, apenas a luz vinda do banheiro iluminava o quarto, mas não encontrou nada. Acendeu a luz do quarto e voltou a procurar, perto do puff encontrou o ziploc com anfetamina de Lily. Emma apanhou o saquinho com o pó branco e o encarou por segundos que pareceram durarem horas. Sabia que se o usasse, tudo aquilo em seu peito sumiria em questões de minutos, mas também sabia que voltariam de uma vez quando o efeito passasse.

— Você quer leite no seu chá? — a voz de Alice se aproximando indicava que ela estava voltando para o quarto.

— Do jeito que você fizer está ótimo.

Emma correu até o lado da cama e jogou a droga na primeira gaveta do seu criado mudo, e sentou na cama respirando fundo olhando para gaveta.

— Aqui, toma. — Alice entregou a xícara de chá com leite para Emma.

— Obrigada. — ao pegar a xícara em com as suas mãos, Emma percebeu elas tremiam.

— Vai ficar tudo bem. — Alice disse passando a mão nos cabelos da irmã enquanto ela sorvia o chá.

— Allie, você pode dormir comigo hoje? Pode ficar aqui, por favor?

Ter Alice no quarto era uma segurança para Emma, sabia que Alice se manteria a noite inteira acordada também, então não conseguiria fazer nenhuma besteira com a irmã por perto.

— Claro Emma.

Foi Emma saindo do seu apartamento e Regina fechando a porta em um estrondo logo atrás. Com os dedos enterrados nos cabelos, se manteve hiperventilando olhando para porta fechada, a imagem da cicatriz no peito da fotógrafa se mantinha na sua cabeça juntamente com o desespero que a acometeu no dia do acidente. A voz quase que indiferente de um dos funcionários do hospital ao ligarem para Regina dizendo que a sua esposa havia se envolvido em um acidente, ecoava em seus ouvidos, o encontro com o seu filho todo arranhado e machucado, o médico tentando lhe explicar que ela não estava mais ali, que aquele corpo não passava de uma carcaça vazia, que nada do que a tornava a sua esposa existia mais...

— O que foi que eu fiz para Você? — Regina gritou no meio da sua sala. — O que eu te fiz hein? — bradou olhando para cima  — Isso tudo é uma piada para você? Você nos jogou aqui e orquestrou para que tudo colidisse e explodisse. Minha vida não está a sua mercê, Você não tinha esse direito de fazer isso comigo, de me tirar a minha esposa da forma que tirou e depois colocar ela na minha frente e fazer como que eu a amasse de novo. Você não tem esse direito! — caminhando às cegas pelo apartamento, Regina tropeçou na quina de uma das paredes machucando o seu dedo mindinho. — Sério isso? Não quer tirar a minha vida também?

Se encaminhou para o seu quarto e passou direto para o banheiro, e fez exatamente o que tinha feito há três anos quando chegou em casa depois de autorizar a doação de órgãos da sua esposa e permitir que desligassem os aparelhos, tirou toda a roupa de uma vez e entrou embaixo do chuveiro desejando poder se afogar naquela água que caía na sua cabeça, molhava todo o seu corpo e escorria pelo ralo.

As lágrimas derramadas pelos seus olhos se misturavam com a água do chuveiro, sua cabeça fervilhava, suas ideias se misturavam e embaralhavam, a noção do que era real ou irreal, possível ou não de acontecer, se perdia diante daquela imensidão de pensamentos.

— Eles dizem que Você é onipresente, meu pai me ensinou isso, contou que você olha e cuida de todos, que nos ampara, mas onde Você estava quando eu precisei?  Você me abandonou, me ignorou, se esqueceu de nós. Amai uns aos outros como a ti mesmo uma ova, Você fechou os seus olhos, não aceitou a minha família e a tirou de mim. Porque? Eu não merecia ser feliz? Todo mundo merece, todo mundo tem a sua chance, e quando eu finalmente estava voltando a ser, Você fez com que tudo, absolutamente tudo se esvaísse pelos meus dedos. O que isso quer dizer? — enterrou os dedos nos cabelos e se permitiu escorregar pela parede até o chão.

Emma agora possuía o coração dela, o coração que tantas vezes bateu acelerado no peito de outra pessoa por ver Regina, o mesmo coração que se juntou ao seu em nervosismo quando foram ao cartório oficializar sua união, um coração que bateu dentro de um peito que acolheu o Henry nas noites de cólica. Um coração que Regina ouviu bater acelerado tantas vezes que jamais poderia contar, pois era ali o seu local de descanso, de repouso, onde recarregava as suas energias, e que agora batia dentro do peito de uma outra pessoa, uma pessoa a qual ela jugava também sentir as mesmas coisas.

E se esse for o único motivo para nós termos nos encontrado? E se for o único elo que nos uni? Henry havia se encantado imediatamente por Emma, e ela por ele, e se esse for o motivo?

Perguntas como essas se acumulavam na cabeça de Regina, sabia que em nenhuma delas havia nexo. Mas e se houvesse?

Então eu nunca tive o poder de escolher nada? Sou só um peão nesse tabuleiro?

 Você não podia ter feito isso, não podia.

Com os cabelos molhadas e não penteados, saiu do banheiro vestida no roupão, tudo o que queria era deitar e dormir, esquecer de tudo aquilo, mas sabia que a última coisa que iria fazer era conseguir dormir. No closet, procurou a maleta de primeiros socorros, revirou as suas roupas e o lençóis dobrados, começou apenas os afastando de seus lugares, mas a demora em encontrar o objeto, somado a sua desestabilidade, fez com que em questão de minutos, todas as roupas, lençóis e sapatos que estavam organizados nas prateleiras fossem parar no chão. Agindo em desespero e causando estragos como um furacão, Regina começou a fazer com que tudo voasse pelos ares, virou o cômodo de cabeça para baixo.

Ofegante e soltando um grito de frustação rouco que pareceu ferir a sua garganta, se sentou frustrada sobre tudo que agora estava não, abraçou os joelhos e escondeu o seu rosto ali. Chorava por razões que ela não compreendia, razões absurdamente até então irreais, mas que pareciam se tornarem concretas cada vez a mais que pensava nelas.

Quando decidiu se levantar, que o seu olhar se projetou para cima, avistou a maleta de primeiros socorros na última e mais alta prateleira, havia colocado ela ali para que Henry não a encontrasse e mexesse com os remédios. Da maleta tirou uma cartela de comprimidos relativamente pequenos, e então engoliu dois, um de cada vez. Eram relaxantes, Zelena os havia receitado para momento de crises, ela só não esperava que a irmã mais nova fosse precisar deles mesmo depois de três anos.

Sem olhar para traz, deixando toda aquela bagunça ali, Regina voltou para o quarto, deitou-se em posição fetal no meio da cama e apagou.

O som do seu próprio despertado nunca lhe pareceu tão alto, barulhento e irritante como naquela manhã. Se arrastou pela cama até alcançar o criado mudo, e tateou em cima do despertador até conseguir apertar o botão de desligar. Se manteve ainda por alguns bons minutos sob as cobertas, até lentamente começar a se arrastar para fora e ir para o banheiro.

No espelho do banheiro, seu reflexo não era dos piores, e rosto estava um pouco avermelhado e amassado, e a expressão que trazia era apática e indiferente, mas por dentro, estava em frangalhos. Tomou um banho quente e demorado, abraçada ao próprio corpo deixou apenas que água a molhasse.

Após o banho, quando de fato parou para prestar atenção em que horas eram, percebeu que o alarme deveria estar tocando há muito tempo, pois estava quase uma hora atrasada. Foi de pressa ao closet para pegar suas roupas e calçados para se vestir, mas ao chegar na porta do cômodo foi surpreendida pela sua própria bagunça, e que bagunça. Não lembrava bem de ter deixado tudo tão fora de lugar, mas precisava encontrar rapidamente algo para vestir. Do meio de as roupas espalhadas puxou um vestido de couro sintético preto e as botas pretas de cano alto, pois foram mais fáceis de encontrar do que sandálias.  As roupas em nada combinavam com a expressão que ela trazia no rosto, e para esconder o olhar cansado, colocou um dos seus óculos escuros.

Nos meses em que estava ali, nunca tinha chegado tão atrasada e tão despreparada na revista, tudo que tinha trago eram o celular e as chaves do carro e de casa. Antes de subir para redação, e como uma forma de procrastinar isso, passou na creche para ver o filho, precisava vê-lo, abraça-lo e sentir o cheirinho dele, esperava que aquilo lhe trouxesse a estabilidade que iria precisar no dia.

Quando entrou na creche, foi recebida pela diretora, mas essa lhe disse que ele já estava em aula com as outras crianças, mas como Regina insistiu em ver o filho, e os boatos que corriam eram de que além de editora chefe, ela o era o braço direto de Gold em toda a revista, a diretora achou melhor ir buscar o menino na sala.

— Filho. — se ajoelhou no chão e o esperou de braços abertos.

— Mamãe. — Henry correu assim que a viu e se jogou nos baços dela. — Eu tava com saudade de você mamãe.

— Eu também, você não sabe o quanto. — o apertou em seus braços.

— A Granny me ensinou a fazer bolo de cenora com cobertura de chocolate — disse se afastando para um pouco. —, ele mandou dizer que colocou um pedaço grandão na minha lancheira para você.

— Foi mesmo? Que bondade a dela. Você se comportou? Dormiu e comeu direitinho? E o bolo de cenoura não vale.

— Sim e sim!

— Que bom, meu amor.

— Eu vi a Emma hoje. — ele falou saltitante, havia perguntado a ela quando andariam de bicicleta novamente, e ela simpática, respondeu que em breve. Mal o garoto podia imaginar que por trás do abraço e dos sorrisos afetuosos que recebeu da sua amiga, na cabeça dela estava uma confusão sem precedentes, que inclusive o incluía.

— Onde que você a viu? — se pós de pé com o menino no colo.

— Aqui. — disse como se aquilo fosse óbvio.

— Ah, claro. Bom, acho que você tem que voltar para aula para agora, mas nos vemos mais tarde, está bem?

— Eu vou ficar com a Granny de novo?

— Não. — respondeu enfática — Nós vamos para casa, e agora se comporte. — Regina deu um beijo demorado na bochecha dele e deixou que ele voltasse para sala com a diretora.

Enquanto voltava para a sua sala, Henry olhava para trás e acenava para sua mãe, Regina sorriu acenando de volta, enquanto queria apenas toma-lo de volta em seus braços e correr de volta para casa.

Na redação da revista se instaurava um caos criativo, estavam a finalizar a edição do dia das mães e a dar início a edição da semana seguinte.

Como já esperava, quando saiu do elevador, todos os olhares foram direcionados a ela, e logo Kristin, Ruby, Cruella, Killian e Jekyll estavam em cima de Regina com dezenas de assuntos para tratar, revisão de texto, seleção de entrevistas, layout, cenários, cast de modelos...

— Eu sei que nós temos mil e uma coisas para resolvermos — se adiantou interrompendo todo o falatório. —, mas o que nós podermos tratar através do meu e-mail, trataremos, me enviem, ok? O que não, me mandem mensagem no meu chat, falando qual é o assunto, que eu respondo em que horário vocês podem ir na minha sala.

Regina deu as costas para eles evitando uma saída dramática, mas o som dos saltos das suas botas contra o piso não a ajudou nisso.

— Viram, ela não teve nem a decência de tirar os óculos escuros para falar com a gente. — Kristin soltou e Jekyll a apoiou.

— E ainda chegou atrasada, isso lá são horas?! Já que cobra pontualidade de todos, deveria ser ela a primeira a seguir e dar exemplo.

Sem querer se envolver, concordar ou discordar, os demais se dispersaram para fazerem as suas devidas tarefas, seguindo as orientações de Regina.

Assim que entrou em sua sala, Regina fechou a porta de pressa, não tinha visto Emma na redação e a porta da sala dela estava também estava fechada, com sorte conseguiria passar o dia sem vê-la. Não sabia o que iria fazer caso aquilo acontecesse, a confusão em sua mente só se alastrava, os questionamentos absurdos feitos na noite anterior pareciam ser tornarem reais toda vez que se atrevia a considera-los.

Tentando afastar como podia aqueles pensamentos da sua mente, começou a trabalhar, recebeu as entrevistas de Killian, no email ele pedia que ela selecionasse o material mais interessante para as vendas, os textos da edição também foram enviados por Ruby. Regina começou a fazer a leitura se focando em encontrar qualquer erro que havia passado pelo programa, ou tonar a linguagem mais humana, como se a revista conversasse com o leitor, mas se pegou lendo a mesma frase várias vezes, estava se esforçando o máximo que podia.

Também recebeu uma mensagem de Jekyll falando a respeito da escolha dos castings de modelos, respondeu apenas com um “Faça o seu trabalho”, e com exatos cincos minutos ouvi baterem em sua porta.

— Fazer o meu trabalho? É esse o tipo de delegação que a editora chefe de uma revista passa para um funcionário? — Jekyll disse assim que entrou na sala de Regina.

— Você não é o funcionário mais antigo daqui? Achei que já estivesse a par do que deveria fazer. — falou cansada, suspirando e se recostando no encosto da cadeira.

— E eu estava, até você chegar e interferir no modo com que eu lidava com os meus afazeres aqui dentro — se aproximou da mesa de Regina como um predador. —, todo funcionava muito bem, até que você me obrigou a fazer as coisas como você bem queria, com os castings que bem te interessavam.

— É, realmente querer que a revista reflita a diversidade que se tem lá fora, além dos padrões estéticos absurdos de impossíveis, é o do meu interesse. — se defendeu. — Mas já que eu piorei tanto assim as coisas aqui dentro, escolha você esse casting ao se bel prazer, escolha modelos magérrimas, loiras e altas, que é o tipo de mulher que te interessa como homem, e depois, não deixe de ficar rondando elas como um abutre durante o ensaio com você sempre faz.

— Você pensa que é quem para falar comigo dessa maneira? Você é chefe da redação, e só. Você não é dona da revista, Mills.

— De fato não sou — ficou de pé e o encarou. —, mas se tem uma pessoa que o Gold confia, essa pessoa sou, e eu estar ocupando essa sala quer dizer alguma coisa. Não são as fotos da sua filha que eu vejo nos porta-retratos daqui, são do meu filho. Essa edição agora está nas suas mãos, escolha fotos e layout, vamos deixar que os leitores decidam quem é o melhor profissional.

— Já que é só isso que eles podem julgar mesmo, uma vez que não podem dizer quem é a melhor pessoa.

— E você por algum acaso está sugerindo que é você?

— E por algum acaso é você, Regina Mills? — a priori, a reposta era estava clara, era óbvio Regina que acha ser a melhor pessoa entre eles dois, mas os acontecimentos recentes e os do passado, talvez não lhe permitissem mais aquela certeza. — Foi isso que eu pensei, que não. — cuspiu as suas última palavras diante do silêncio dela e saiu batendo a porta.

Depois do seu desentendimento com Jekyll, um pouco mais cedo do que o horário do almoço realmente começava, Regina saiu para almoçar, o dia anterior havia terminado errado, o de hoje atrasado, e o decorrer dele descia sem freios ladeira abaixo. Pensou em pegar Henry na creche para poderem almoçarem juntos, mas já havia o tirado de sala de aula mais cedo, com certeza não poderia fazer aquilo novamente, então saiu para almoçar sozinha.

Sem conseguir pregar os olhos, dando apenas pequenos cochilos ao longo da noite, antes que o seu despertador tocasse Emma já estava de pé, manter uma rotina havia sido crucial no se tratamento, então mesmo sem ânimo foi dar início a preparação do café da manhã dela e da irmã, batia a massa do waffle quando tomou um susto com Alice, que apareceu descabelada e coçando os olhos na cozinha.

— Volta para cama, você ainda tem uma hora e meia para dormir. — Emma aconselhou.

— Vai andar de bicicleta? — bocejou.

— Vou sim.

— Tem certeza?

— Sinto que isso vai me ajudar a não perder o controle, eu preciso disso.

— Tudo bem. Já tomou os seus remédios?

— Não, eu ia tomar depois de...

— Agora Emma, você não pode esquecer, você sabe disso!

— Eu sei, e eu já ia tomar, juro.

— Eu vou ficar aqui até você fazer isso.

— Tudo bem.

Emma pegou uma maletinha de remédios, onde estavam os seus imunossupressores, e os tomou com um copo de água da torneira.

— Que olhar embaixo da minha língua?

— Não, agora eu vou dormir de novo.

Se arrastando, Alice dessa vez foi para o seu quarto. Emma apanhou uma maça na fruteira e também foi para o seu quarto para se trocar, vestiu a camiseta e o short que usava para pedalar, calçou a meia e o tênis, e quando foi pegar as luvas no criado mudo, se deparou com o que tinha escondido ali na noite anterior. Pegou as luvas de supetão e fechou a gaveta em um baque. Voltou a ase arrumar, prendeu o cabelo em um rabo de cabalo baixo e desarrumado e apanhou o capacete, estava pronta e prestes a sair quando se pegou encarando o criado mudo.

É só por precaução. Disse a si mesma quando pegou o ziploc e o colou no bolso interno de um casaco que apanhou no armário antes de sair.

Como havia saído mais cedo do que costumava, Emma pedalou mais do que estava habituada, o esforço físico cobrou o seu preço, a deixando cansada e ofegante, ou talvez não fosse o esforço, fosse só a anfetamina pensando em bolso, porque para Emma, em vez de grama, ela parecia pesar quilos, e até sentia que ela pulsar junto do seu coração, mas havia prometido a Alice...

Com a cabeça em outras coisas, voltou para cassa sem o leite para Alice, mas essa pareceu não se incomodar, imaginava o quão aérea Emma deveria estar. Tomou café da manhã por que Alice praticamente a intimou a fazer aquilo, fez toda a sua higiene, e com a bolsa no ombro e todo o seu material de trabalho dentro, estava tecnicamente pronta para de deixar Alice na faculdade e ir para a revista, mas câmeras, lentes, cartões de memória e notebook, mas aquilo não era tudo o que ela levava consigo.

Sentia ela pesar na bolsa, um peso que sufocava, mas que trazia um certo conforto, um conforto deturpado por assim dizer, o mesmo que sentia ao usá-la. No fundo sabia o quão mal aquilo lhe faria, mas superficialmente se sentia acolhida, abraçada. Aquilo assustava Emma, sentir aquele sentimento novamente era aterrorizante, porque parecia estar à beira de perder o controle, mas mesmo sabendo disso, continuava a carregar aquele peso consigo, que sufocava e que trazia conforto.

Entrando no prédio da revista, a sensação que tinha era de que todos os olhares estavam direcionados para ela, que todos sabiam o que ela trazia, mas enquanto caminhava dizia a si mesmo para ficar calma, que era apenas uma psicose.

— Emma. Emma me espera. — ouviu uma voz infantil a chamar, e então todo o seu sangue gelou e ela estancou no meio da recepção — Emma! — e então bracinhos curtos lhe abraçaram pelas pernas.

— Oi. — se virou e encontrou Henry ali, alegre e sorridente como sempre.

Emma encarou aqueles olhos grandes amendoados que brilhavam como se pudesse emitir luz para todo o mundo. Não tinha dúvidas do carinho que sentia por ela, mas agora se questionava o porquê dele ter sido tão repentino.

— Você que você está? — se curvou e deu deixou um beijo no meio dos cabelos castanhos.

— Eu  bem — disse serelepe. —, e você? E quando que a gente mais andar de bicicleta de novo?

— Eu também estou bem, e, é... em breve. — mentiu — Bom dia Granny. — acenou para senhora que vinha logo atrás.

— Bom dia, dormiu bem, Emma? — perguntou com a voz sugestiva, que Emma logo entendeu o motivo.

— É, a medida do possível. — sorriu fraco — Agora eu acho que alguém precisa ir para creche, não quero que chegue atrasado por minha causa. — afagou os cabelos do menino.

— É, verdade — Granny concordou. — Vamos Henry?

— Vamos. Tchau Emma. — a abraçou novamente.

— Tchau meu bem, tenha uma boa aula.

Quando pegou o elevador, não foi no botão referente ao andar da redação que apertou, mas sim do estúdio, não tinha fotos programadas para aquele dia, ainda iriam decidir o casting, mas achou que seria melhor se manter por lá. A verdade era que estava com medo de encontrar com Regina, havia sido expulsa da casa dela na noite anterior, e agora as palavras ditas por ela doíam mais do que nunca, elas se repetiam em looping temporal infinito. Jamais poderia ficar feliz por o caos que se abateu sobre a vida de Regina, tinha sentido tanta dor nas palavras dela quando lhe contou sobre o acidente e a depressão em seguida, e tão pouco havia requerido em específico o coração da esposa dela, mas havia acontecido, tinham se envolvido no mesmo acidente, e por coincidência do destino ou não, foram levadas para o mesmo hospital. Entre as milhões de possibilidades, entre as centenas de caminhos que poderiam terem tomado, acabaram seguindo pela mesma estrada e se encontrando no meio do dela. O que Emma queria sabe era: Porque?

Sua cabeça e o seu peito estavam em estado de ebulição, as lágrimas teimosas que insistiam em se acumularem em seus olhos embaçavam a sua visam enquanto trabalhava na edição de algumas fotos que seriam mandadas para Kristin adicionar no layout.

No horário de almoço, em vez de fazer o que estava habituada, decidiu descer e comer em algum restaurante próximo, imaginou que seria bom não permanecer tanto tempo assim sozinha. Na volta, tinha acabado de entrar na recepção quando viu as portas do elevador começarem a se fechar, então se apressou para tentar pegá-lo. Faltando pouquíssimo para que as portas se fechassem, Emma colocou as mãos entre elas como se desse um mergulho, as portas automáticas as apertaram um pouco antes que o sensor as fizessem abrir de novo.

— Essa foi por pouco. — expirou o ar com força, mas ao ver quem também estava no elevador, desejou inspirá-lo imediatamente de volta para dentro dos seus pulmões. Pensou em sair e subir pelas escadas ou pelo elevador de serviço, mas era tarde demais, as portas haviam se fechado de fato e o elevador já começava a subir.

Algum dia ela ainda vai perder esses dedos, Regina que voltava do seu horário de almoço, pensou, mas nada disse, se manteve encostada em uma das paredes do elevador, com os braços cruzados e achando incrível interessantes as botas pretas de couro em seus pés.

Emma também permaneceu da mesma maneira, calada e de cabeça baixa olhando para os seus sapatos, as vezes arriscava levantar um pouco o olhar, mas o logo o baixava. Seu coração batia forte nos ouvidos.

Para Regina o elevador pareceu levar anos para chegar até a redação, imaginava que não poderiam ficar sem se falarem para sempre, mas naquele momento preferiu o silêncio quando as suas emoções e sentimentos eram tão contraditórias.

Ainda faltavam alguns minutos para o horário de almoço acabar, e estavam todos na recepção da redação jogando conversa fora, alguns encostados no balcão de Belle, outros espalhas pelas poltronas e sofás, esperando para voltarem ao trabalho.

Como sempre acontece quando pessoas quando estão juntas e não possuem nada melhor para fazer, eles falavam da vida de outras que não estavam presentes, entre eles, colegas da redação, os quebra galhos, Gold e como não podia faltar, Regina. Alguns comentários em nada maldavam, até que Kristin e Jekyll se juntaram a eles.

— Conta aquilo, Jek. — Kristin instigou outro a falar o que tinha descoberto, e imediatamente, curiosos, os outros também começaram a pedir que ele contasse, seja lá o que fosse.

— Isso não pode sair daqui, estão me ouvindo? — advertiu e eles assentiram — Conversando com o Gold e falando com uns colegas antigos de trabalho dela, eu descobri que aquelazinha é viúva.

— Por isso que ela não usa aliança. — um dos redatores comentou.

 — É, ela era casada com uma mulher, para mim ela já não era essas coisas todas, e depois disso... Enfim, elas tinham um filho e tudo mais, aquele pestinha que fica perturbando a minha filha na creche, e há uns anos ela morreu em um acidente aqui em Boston, achei até que ela quem tinha matado a esposa, mas o acidente foi noticiado e todo. — não havia respeito ou consideração alguma na forma com a qual Jekyll falava, e percebendo isso, alguns funcionários pararam de prestar atenção no que ele dizia, mexendo no celular ou conversando com quem estava do lado. — Depois disso ela foi para o interior do interior do Maine levando o menino junto, e agora está aqui, saiu do inferno que ela estava só para vir encher o meu saco, só pode ser isso, porque não tem condições. Vocês deveriam terem visto a arrogância com a qual ela falou comigo mais cedo...

Jekyll estava tão concentrado em falar sobre a vida pessoal de Regina, que nem mesmo ouviu quando elevador chegou na redação, e muito menos viu quem saiu dele.

— É realmente muito interessante a minha vida, você não acha, Jekyll? — ele se virou e encontrou Regina parada com Emma ao seu lado, que havia decidido também descer no andar após ver todos reunidos na recepção. Todos os outros pararam até de respirar ao ouvirem a voz dela — Um pouco mórbida talvez, eu confesso — se aproximou, e com seus rostos ficando a menos de um palmo de distância um do outro continuou: —, mas pelo menos eu posso dizer que a minha esposa me amou até o seu último suspiro de vida, enquanto a sua preferiu fugir, deixando até a própria filha para trás, em vez de passar mais um dia ao seu lado. — Regina cuspiu as palavras como facas amoladas. — Você tem ideia do quão difícil é para uma mãe deixar um filho para trás? E mesmo assim ela preferiu fazer isso do que continuar dormindo ao se lado. Acredite ou não, mas isso fala mais de você do que dela.

Muda como estava no elevador, Emma continuo ao ouvir o que Jekyll dizia, mas dentro de si uma fúria crescia como o fogo quando alimentado com oxigênio puro. Ele falava da esposa de Regina sem consideração alguma por ela ou por a falecida, com tom de deboche e desaforo. Apesar e todos os pesares, reconhecia que só estava ali hoje graças a ela, e era muito grata por isso, e então também se sentia ofendida.

Depois de sustentar o olhar dele até começar a sentir os olhos arderem, Regina caminhou tranquilamente até a sua sala, para depois fechar a porta em um baque seco que ecoou por toda a redação.

— Você... Você!

Emma queria xingá-lo, mas naquele momento estava mais preocupada com Regina do que em agredi-lo verbalmente, e sem se deixar ser impedida por todos os seus receies, saiu correndo até a sala da editora chefe.

— Regina... — disse entrando na sala e encontrando todas as coisas que costumavam ficar em cima da mesa dela, no chão.

Regina estava de costas para a porta, fitando a rua lá em baixo através do vidro da janela.

— Eu... Você está bem? Ele foi um pulha!

— Me deixa sozinha, Emma. — ouviu Regina fungar.

— Mas acontece que eu não quero sair. — fechou a porta da sala.

— Me deixa sozinha, você não entende... — se virou permitindo que Emma visse as lágrimas que banhavam o seu rosto.

— Me deixa ficar com você? — pediu.

— Eu lido há tempos com babacas como ele, — enxugou as lágrimas com a mão — mas agora isso — apontou para Emma e para si mesma —, isso não deveria acontecer, não me parece certo, não mais. Eu não entendo...

— E por acaso você acha que eu entendo? A minha cabeça está tão confusa quanto a sua, eu não sei como e nem porque, mas aconteceu, Regina, e eu não tenho culpa. Eu não tenho culpa alguma nisso. Ninguém tem. Sei que parece ser mais fácil me culpar, mas você não pode fazer isso comigo, eu não mereço.

— Não é a você que eu culpo, mas isso não quer dizer que eu saiba o que fazer. Eu nem sei o que pensar Emma, não sei mais o que é real, ou o que é fruto da minha cabeça perturbada. Parece que eu estou sonhando. Tendo um pesadelo, na verdade. — a encarou.

Emma sentia que forma como Regina lhe olhava agora era diferente, não havia mais afeto ou cordialidade, era como se ela visse uma criatura estranha, como se não fosse mais Emma que estivesse ali.

— Você pode por favor para de olhar para mim desse jeito, como se a visse aqui, pode parar de ver ela no meu lugar? Sou eu, Regina, a Emma. Eu também estou em conflito, também não sei o que pensar ou como agir. — seus ombros cederam cansados.

— Não dá — Regina falou quase em um sussurro. —, eu não consigo. Tudo que eu consigo ver é o que eu descobri, são as minhas incertezas... Uma piada de mau gosto de alguém que só quer ver que tudo pegando fogo.

— Então é o que você acha que tudo isso é, uma piada?

— Só pode ser Emma, no mundo em que eu vivo, isso não é possível, isso não acontece.

Todo o choro controlado por Emma na noite anterior à dura pena veio à tona.

— Então eu sou uma piada? Somos uma piada? — disse com o queixo começando a tremer.

— Acho que é melhor você sair da minha sala. — tentava ao máximo controlar que as lágrimas escorriam, mas elas pareciam brotar incessantemente.

Em seus olhos, o verde fazia contraste com o vermelho, e tempestuosos, encaravam os de Regina.

— Eu não sei o porquê, mas eu não sobrevivi para virar uma piada, Regina.

Dito isso, Emma saiu batendo a porta deixando ela sozinha lá dentro. Mais uma vez era mandada embora, mais uma vez aquilo lhe doía.

Todos já haviam se dissipados e voltado a trabalhar em suas mesas, pelos menos era a impressão que queriam passar, e antes que voltasse para o estúdio, instável como estava, Emma fez um desvio de rota, passou em frente a uma porta com uma placa em que dizia “Produtor Executivo”, e sem bater ou perguntar se podia entrar, entrou e fechou a porta.

Com expressão séria, mas distraído folheando o book de uma modelo, Jekyll não teve tempo de agir quando por cima da sua mesa, Emma o segurou pela lapela e aproximou o seu rosto do dela.

— Qual é o seu problema? — Emma perguntou o sacudindo.

— Me solta, Swan! — se debateu tentando se soltar. Talvez fosse pela raiva que Jekyll via nos olhos avermelhados dela, mas naquele momento Emma parecia ter tanta força quanto ele.

— Não até você deixar de ser um babaca escroto, seu estúpido.

— O que foi que deu em você? Você não é assim, você a pessoa mais tranquila daqui. Isso tudo é culpa dela, até parece que você não ouviu o que ela falou sobre mim e sobre a minha família. — disse com um pouco de dificuldade.

— Na verdade eu ouvi bem o que você falou, o que ela disse depois foi só uma consequência. Você não tem respeito nem por alguém que já não está mais entre nós.

— Você não vê que ela está conseguindo? Ela está conseguindo nos separar, fragmentar a revistar, está acabando com as nossas amizades.

— Amizades? Como se você fosse amigo de alguém aqui, seu biltre infame, seu canalha — segurava Jekyll com tanta força pelo terno, que suas mãos começaram a ficar brancas pela falta de circulação sanguínea. — Isso é porque ela é uma mulher e é lésbica, é misoginia e homofobia ou é só inveja por ela ser mais competente do que você e ter sido escolhida para o cargo que você tanto desejava?

— Ela me tirou o que era meu. — sibilou por entre os dentes, para depois se engasgar com a própria saliva e começar a tossir.

— Se engasgou com o próprio veneno? Achei que você fosse imune. — Emma disse empurrando ele para trás com força. — Fica esperto Jekyll, porque não é só com ela que você está comprando briga.

Na redação todos fingiam terem voltado aos seus afazeres, mas a verdade era que estavam atentos e prestavam atenção a toda aquela movimentação, inclusive viram quando Emma bateu a porta da sala da editora chefe, depois a da produtor executivo e em seguida passar como um furacão pela redação e pegar o elevador. Ninguém entendia nada, Cruella e Ruby já haviam notado a proximidade entre a loira e Regina, e entendiam o motivo dela ter ficado tão furiosa com Jekyll, mas o porquê dela também ter saído batendo a porta da sala de Regina tinha ficado no ar.

Emma voltou para o estúdio e se manteve por lá até o final do expediente. Não retomou o trabalho, mais uma vez as palavras de Regina giravam em sua mente feito um redemoinho, trazendo caos e confusão. Se aquilo tudo era mesmo uma piada, quem a estava fazendo, Deus? Mais algum ser que tivesse esse poder? Mas não era ele quem havia providenciado sua recuperação? Pelo menos era isso que a sua mãe dizia. Todas as chances estavam contra Emma, absolutamente todas, e mesmo assim ela não deixou de orar e de pedir.

Apesar do absurdo que tudo aquilo parecia, Regina só havia conseguido deixar tudo mais insano para Emma.

Ela permaneceu no estúdio tempo suficiente para o expediente acabasse, e às cinco horas da tarde em ponto, desceu pelas escadas até o estacionamento, onde pegou o seu carro e foi direto para casa.

Ainda dentro do carro, parado na sua vaga no estacionamento do prédio onde morava, Emma respirou fundo várias vezes, não sabia se Alice já estava em casa, e se ele estivesse, não queria aparentar estar tão mal assim para ela. Pegou a bolsa no banco do carona e abriu para procurar as chaves do apartamento, ao enfiar a mão no fundo da bolsa, ela se fechou em torno do ziploc. Não, aquela não era a solução, não era a saída, mas era o que Emma tinha. A angustia que sentia parecia que a qualquer momento romperia o seu peito de dentro para fora, as incertezas, Regina e Henry, tudo estava tão fora do seu controle...

Suas mãos tremiam enquanto fazia as duas carreiras com parte do pó branco em cima painel do carro, não poderia dizer se era por estar tão próxima de usar novamente, ou por incerteza, mas independente do motivo, se debruçou sobre o painel pronta para aquilo, seu nariz estava tão próximo das carreiras que se inspirasse o ar com um pouco mais de força, inalaria a anfetamina.

Momentos em que as crises de abstinências, junto com a ansiedade e a irritabilidade lhe vieram à mente como lembranças, o momento em que precisou escolher entre a sua vida e mais uma tragada, a sua médica lhe dizendo que se houvesse uma próxima vez ela não teria tanta sorte assim. Lembrava que durante esse momento tudo em que pensava era: Eu não quero morrer.

Duas batidas rápidas na janela do carona a assustaram fazendo com Emma pulasse, e como um reflexo de quem já tinha feito aquilo antes, quase sido pega no flagra, passou a mão no painel derrubando todo o pó no assoalho do carro. Rapidamente baixou o vidro da janela.

— Está tudo bem aqui, srt. Swan? — Walter, o porteiro no turno noturno do prédio perguntou colocando a cabeça na janela. — É que já faz um tempo que você chegou e não saiu do carro, achei que não estivesse passando bem.

— Oh, eu estou bem sim, eu só... só estava procurando as minhas chaves. Bolsa bagunçada. — se explicou

— Claro, entendo. Me desculpe pelo susto, só queria checar se você estava bem mesmo.

— E eu estou, é... estou. Obrigada por se preocupar.

O porteiro acenou e se afastou voltando ao seu posto, a portaria.

Rapidamente Emma apanhou as suas coisas, pegou a bolsa e travou o carro ao sair. Preferiu tocar a campainha do apartamento, ao perceber que a luz da sala estava acesa. Alguns segundos depois de tocada, Alice abriu a porta.

— Esqueceu as suas chaves? — a mais nova perguntou.

— Não achei elas na bolsa.

Alice deu passagem e Emma entrou, e ao passar pela irmã, a visão que teve não podia ter sido mais acolhedora e afetuosa.

— Mamãe.

Estava enganada, tinha muito mais do que qualquer droga podia lhe oferecer.

Mesmo com o fim do expediente, Regina ainda permaneceu alguns minutos em sua sala, esperou que a redação se esvaziassem e que todos deixassem o andar para poder sair. Depois do atrito com Jekyll e a conversa que tivera com Emma, se manteve trancada em sua sala. Não queria sair ou ver ninguém, só queria que todos sumissem, que a deixassem sozinha e esquecessem da sua existência.

Quando a redação finalmente pareceu se esvaziar e as todas as vozes finalmente cessaram, Regina saiu da sua sala, ainda haviam dois os três por ali, mas preferiu fingir que não os viu.

Na recepção, as crianças saiam da creche acompanhadas dos seus pais, saiu do elevador bem a tempo de ver Jekyll passando pelas portas de vidro da entrada, enquanto saía do prédio acompanhado de uma garotinha com cabelos transados. Se não soubesse, jamais imaginaria que a menina era filha dele, uma vez que ele não segurava a mão dela, caminhavam lado a lado como desconhecidos. Queria rir da infelicidade que era os seus filhos serem melhores amigos na creche, que toda vez que perguntava a Henry como havia sido o dia na creche, ele falava do tanto que tinha brincado com a Violet, era sempre Violet isso e Violet aquilo. Riria daquilo, mas havia outros acasos que lhe perturbavam mais.

Quando entrou para pegar o seu filho, ele estava sentado em uma cadeira que não permitia que alcançasse os pés no chão, e ele os balançava enquanto conversava alguma coisa com a professora que estava sentada ao lado dele.

— Olha quem veio buscar você, Henry.

— Mamãe. — Henry pulou da cadeira e correu em direção a mãe.

— Ei, cuidado. Você não quer cair, quer? — Regina disse o pegando nos braços.

— Não. — falou balançando a cabeça em negativo.

Com Henry preso na cadeirinha e todas as bolsas e lancheira no banco de trás, partiram para casa.

— Filho, vai tomar um banho, acho que você já consegue fazer isso sozinho, e depois pega dois ou três brinquedos que você gosta muito e coloca na sua mochila, está bem? — falou cansada quando entraram no apartamento.

— Porque mamãe?

— Você está com fome? — perguntou ignorando a pergunta do filho. — Ainda tem do tem de cenoura com chocolate da Granny na sua lancheira, não é?

— Tem sim, eu posso comer? — seus olhos brilharam.

— Só depois que você fizer o que eu pedi, ok?

—  bem.

Henry saiu correndo e saltitando pela casa até o banheiro. Regina tirou o bolo da lancheira e o colocou em prato junto com um copo de suco de laranja. Não era a melhor refeição que poderia preparar, mas simplesmente não dava, não tinha cabeça para nada, e tinha medo de acabar ateando fogo ao apartamento.

Sentada na cozinha sozinha, tinha apenas tirado os sapatos ao entrar em casa, continuava vestida como quando tinha ido para a revista, não sentia vontade de se trocar, de tomar um banho o até mesmo de comer. Esperava que Henry terminasse o seu banho e que ele tivesse ao menos ter lembrado de passar sabonete atrás da orelha.

— Terminei mamãe. — Henry surgiu correndo pelado pela casa com uma cueca box na mão.

— O que é que você está fazendo?

— Veste aqui. — sorriu amarelo.

— É... claro, vem aqui.

Regina o vestiu e ele sentou para comer.

— Você não pode aparecer assim no meio da casa, está bem. E se tivesse mais alguém aqui?

Henry corou com a possibilidade de que mais alguém, além da sua mãe, lhe visse pelado.

— Desculpa mamãe. — falou de boca cheia de bolo.

— Tudo bem. Você já pegou os brinquedos, filho?

— Porque? Pra onde vamos? — perguntou tomando o suco no seu copo do Hulk.

— Você não está com saudades do vovô, da tia Zel e do tio Robin, e de brincar com o Roland?

— Eu . — disse prontamente.

— E então.

— Nós vamos para casa do vovô?

— Vamos sim. — afagou os cabelos molhados dele.

— E nós vamos poder levar a Emma junto?

— O que? N-não Henry, ela não vai com a gente.

— Mas eu posso dar tchau para ela, ?

— Acho que não, Henry.

— Porque não? — cruzou os braços.

— Porque não! E se você já terminou de comer o seu bolo, é melhor ir fazer o que eu pedi.

— Então eu não quero. — desceu da cadeira enraivado.

— Não importa, porque se eu quiser, você vai do mesmo jeito.

— Eu não vou. — gritou batendo o pé.

— Você vai sim. — Regina se debruçou olhando ele de cima, falando alto e séria.

— Eu quero ficar com a minha amiga, não quero ir com você. — correu para sala.

— Volta aqui, Henry Mills. — se levantou e foi atrás dele.

— Eu não gosto mais de você, eu quero a minha amiga. — berrou com a sua voz aguda e infantil.

— Ela não é a sua amiga, você está me ouvindo? — disse se ajoelhando e ficando na mesma altura que ele — Ela não vai com a gente e você não vai se despedir. Você tem que esquecer ela, tem que esquecer a Emma. — sua voz não saía mais séria, e sim embargada, estava à beira do choro.

— Mas ela é a minha amiga, mamãe. — Henry começou a chorar, o que foi a gota que faltava para que Regina transbordasse.

Ela se sentou no chão, dobrou os joelhos e escondeu a cabeça ali. O pranto veio de forma copiosa, fazendo com que todo o seu corpo tremesse.

— Mãe?

Henry se aproximou.

— Mamãe? — a cutucou e Regina levantou a cabeça. — Não chora mamãe, eu vou ser bonzinho, eu pometo.

Ainda fungando, Regina abriu os braços e Henry se aninhou dentro deles, ficaram os dois ali, sentados no chão, até que em seu colo, Henry acabou dormindo. Regina se levantou com ele nos braços e o colocou no sofá, enquanto Henry dormia, arrumou em uma mala de mão algumas roupas dela e do filho, pegou alguns poucos brinquedos e arrumou superficialmente o closet destruído na noite anterior. Terminou de vestir o Henry, que ainda dormia, e caíram na estrada.

Regina olhava a todo momento pelo retrovisor se o seu filho que estava na cadeirinha no banco de trás ainda dormia, tinha medo de que se ele acordasse voltaria a chamar por Emma, e tudo o que não precisava era perder o controle dentro de um carro e com o seu filho dentro, já bastava ter caído em prantos na sala de estar em casa.

Havia saído de Boston no início da noite, tinha quase três horas de viajem pela frente, com Henry dormindo e a sua cabeça em um caos permeado por Emma, Jekyll, a revista, Emma, Henry, Emma... Era difícil manter a atenção na estrada, os carros que vinham na mão oposta com os seus faróis altos lhe cegavam, mas conhecia aquela avenida tão bem quanto a palma da sua mão.

Estar de volta sob aquela situação era angustiante, era como reviver tudo de novo.

Estava frio e ventava um pouco quando Regina saiu de dentro do carro com o filho nos braços e tocou a campainha.

— Oh, Regina? — Henry abriu a porta surpreso.

— Oi papai.

Em casa, ela estava novamente em casa.

 


Estamos todos vivendo em um sonho, mas a vida não é o que parece
Está tudo uma bagunça e todas essas tristezas que eu tenho visto
Elas me levam a acreditar que isso é tudo uma bagunça

Imagine Dragons


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Notas finais do capítulo

Agora elas terão o amparo e o apoio das suas famílias para começarem a tentar entender o que tudo isso que dizer, o que tudo significa.
Muito obrigada pelos comentários no capítulo anterior, fiquei muito feliz com o que li, e peço que me deem mais uma vez esse feedback, me contem tudo que acharam.
Beijo grande e até o próximo
xnxruth

P.S.: Qualquer dúvida, qualquer coisa que não tenha ficado clara, podem deixar nos comentários que terei prazer e esclarecer. E vou responder os do anterior agora.



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