Heartbeat escrita por Ana


Capítulo 14
The whole truth


Notas iniciais do capítulo

Não, eu não desisti da fanfic, mas o projeto de monografia, relatórios e artigos da faculdade tem me impossibilitado de voltar a atualizar Heartbeat com a frequência que vocês merecem, mas prometo que isso vai mudar assim que as férias chegarem.
Acho que esse é o capítulo que eu estava mais ansiosa para escrever e postar.
Perdoem os erros que passam despercebidos e boa leitura.



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Emma começava a organizar o estúdio para o ensaio que iria fazer durante a tarde para a campanha do dia das mães. Montou os refletores, deixou uma câmera com no tripé à postos, arrastou somente alguns puffs e poltronas para o cenário de fundo branco, pois os outros elementos seriam adicionados depois, durante a edição das fotos através do photoshop, e o mais importante, escolheu a playlist do dia e a colocou para tocar no sistema de som, enquanto esperava que as modelos chegassem.

Estava baixando a cortina de fundo branco quando ouviu um som diferente que estava sendo tocando nas caixas de som. Se dando conta de que era o interfone do andar, pausou a música através do celular e correu para atender.

— Emma? — a voz sempre calma de Belle soou do outro lado.

— Oi Belle.

— O segurança interfonou da portaria e disse que tem uma mulher lá na recepção pedindo para subir para falar com você.

— Quem é? — perguntou realmente sem saber quem poderia estar procurando por ela, não barrariam a entrada Alice ou da sua mãe, logo não tinha nenhuma ideia de quem fosse.

— Ela se identificou como Page e disse que conhece você, que são amigas.

— Lilith Page?

— Isso mesmo, você a conhece?

— Sim, diga que podem mandar ela subir.

— Tem certeza?

— Claro.

— Vai receber ela no estúdio mesmo?

— Vou, pode mandar ela para cá.

— Está certo, vou mandar que liberem a entrada dela para o estúdio.

Emma ficou ansiosa, há muito não via Lily, mais precisamente três anos, a mesma quantidade de tempo que ela tinha de sobriedade. Se perguntava o que ela poderia querer depois de tanto tempo, se ela estava bem ou se continuava na mesma. Quando bateram na porta do estúdio e Emma a abriu, ficou pasma com a pessoa que passou por ela.

Lily estava cadavérica, com as saboneteiras dos ombros profundas e o rosto pálido e angular, tinha os olhos vermelhos e aguados, com bolsas escuras embaixo que davam a aparência dela estar ainda mais magra, e o cabelo com dreads estava amarrado nele mesmo, parecendo ser pesado demais para aquele corpo magro.

— Swan. — Lily disse abrindo os braços para abraçar Emma, e ao corresponde-lo, Emma pôde sentir as costelas de Lily sobre as palmas das suas mãos, e o odor das ruas nela.

— Oi Lily, o que e você faz por aqui?

— Faz muito tempo, não é?! Esses dias eu estava conversando com uns amigos antigos nosso e daí do nada você surgiu como assunto. Um deles disse que viu o seu nome em uma revista e eu quase caí da cadeira achando você tinha virado modelo, mas daí ele explicou que era você quem assinava as fotos. Que doideira, não é? Você trabalhando numa revista e tals, você sempre gostou dessas paradas. — Lily empurrou o ombro de Emma.

— É, e agora eu trabalho somente com isso. — sorriu forçadamente.

— Esse é um prédio bonito, muito maneiro e tem muitos seguranças também...ouvi até vozes de crianças lá na recepção. Não vai me dizer que vocês obrigam elas a trabalharem, obrigam? — fez piada. — Porque eu já posso imaginar elas trabalhando como uns anõezinhos.

— Não, é uma a creche. Os filhos das pessoas que trabalham aqui ficam lá em tempo integral.

— Ah, legal. — olhou ao redor — A sua também fica lá? — jogou uma verde.

— Não — Emma foi enfática —, não tive filhos, pelo menos não ainda. — mas respondeu de bom grado. Como vai a vida, Lily?

— Você sabe, faço alguns bicos aqui e outros ali. Preciso de grama para pagar o meu doce.

— Você ainda está nessa? — a pergunta era retórica, a aparência de Lily era terrível e a resposta era óbvia.

— Você sabe, é só para livrar a cabeça dos problemas, abstrair. Mas só de vez em quando. — enquanto falava, um dos olhos de Lily piscava independente do outro, como um cacoete, o que estava deixando Emma desconfortável.

— Não me parece ser só de vez em quando.

— Ah, qual é Emma. Você nem deve tá limpa a tanto tempo assim para tentar me dar lição de moral, já te vi caída mais vezes do que posso lembrar.

— Eu estou há três anos Lily, e posso conseguir ajuda para você, se quiser claro. — se aproximou dela.

— Ajuda? — zombou — Quer dizer então que ver isso aqui — tirou um saquinho de ziploc transparente com um pó branco de dentro do bolso interno do casaco surrado. —, não tem faz salivar e desejar usar para compensar todos esses anos limpa, Emma?

— Não, é óbvio que não. — Emma deu um passo para traz.

— Eu conheço você, e sei que faria qualquer coisa para conseguir um pouquinho que fosse. Eu já vi você fazer muita coisa por isso Emma...

Uma enxurrada de sensações e lembranças atingiu Emma, seu corpo lembrava de como as substâncias agiam sobre ela, como se sentia capaz de fazer qualquer coisa, de dominar mundo, de queimá-lo se necessário fosse, e ao mesmo tempo se sentir leve, capaz de flutuar, como se os problemas não passassem de algo insignificante. Mas também lembrava perfeitamente de acordar jogada no chão da sala, ou em um beco com desconhecidos do seu lado, do odor pútrido que a própria Lily exalava.

— Eu não sou mais essa pessoa, usar isso não faz mais parte de mim. — ao dizer isso, Emma olhou bem para o ziploc, o encarou por longos segundo e o tomou das mãos de Lily.

— Mas que porra é essa? Não era você que estava limpa?! Vai usar, não vai?  Agente pode dividir. — se desesperou.

— Mas é claro que não, eu sei como é difícil se livrar disso, sei melhor do que ninguém, então se você precisar de alguma ajuda, uma clínica de reabilitação, narcóticos anônimos, qualquer coisa, eu posso te ajudar. Você só precisa querer.

— Você acha mesmos que preciso da sua ajuda? Eu posso parar quando eu quiser, eu tenho controle. Se eu quiser parar hoje eu paro, se eu quiser parar mês que vem também paro, não sou dependente.

— Então pare agora, pare antes que o seu destino seja ser enterrada como indigente por ter uma overdose uma esquina suja.

— Isso só acontece com perdedores, Emma — rosnou. —, eu não sou uma perdedora, mas eu não vou parar, não porque você está mandando. Agora me devolveu.

— Eu não vou te devolver.

Lily partiu para cima de Emma tentando tomar o ziploc a todo custo, que ela mantinha atrás de si.

— Me devolve, eu paguei caro por isso.

— Se você não é dependente, pare agora, faça isso enquanto ainda há tempo.

— E não quero. — gritou.

Lily continuou tentando pegar o saco com a anfetamina em pó, mas os seus reflexos nem se comparavam aos de Emma, que estando saudável e limpa, conseguia ser muito mais rápida do que Lily. Imersas naquela disputa como estavam pela tutela da droga, não perceberam quando Regina entrou na sala com as mães e as crianças que participariam do ensaio.

— Atrapalho? — Regina disse séria após pigarrear.

— É... é... — Emma começou a gaguejar. — Não, de jeito nenhum. Essa é a Lily.

Lily com cara de pouco amigos por ter perdido o ziploc, passou por Regina e por entre as mães e saiu do estúdio praticamente correndo.

Foram alguns segundos, mas pareceram horas, que Emma e Regina ficaram se olhando em um silêncio tenso.

Regina olhava para Emma, a vasculhava com os olhos procurando alguma prova ou pista do que significava aquilo que ela tinha visto. Mas a visão de uma desconhecida se jogando nos braços da loira era autoexplicativa.

Enquanto Emma, pensava no Regina estava penando e em no que ela exatamente tinha visto e ouvido.

As mães e as crianças começaram a entrar e se organizar no estúdio, Cruella também chegou trazendo as araras de roupas para as trocas de figurinos, e Regina se manteve por perto, observando tudo, inclusive a ausência de Jekyll, o lhe tranquilizava mais, já que crianças aparentemente não interessavam a ele.

Com o estúdio apinhado de crianças, Emma se sentia extremamente confortável, elas brincavam e sorriam, só não se sentia mais, pois o olhar inquisidor de Regina a acompanhava a cada passo, até o momento em que ela saiu do estúdio minutos antes do ensaio acabar.

— Vocês gostam de músicas? — perguntou se agachando perto de algumas meninas que brincavam com as araras enlouquecendo Cruella.

— O que você vai colocar?

— Pop. —Emma levou a mão ao bolso para pegar o celular e dar play na playlist e não encontrou.

Tateou por todos os bolsos da calça, só encontrando o ziploc, procurou na mesa, nas bolsas... mas nada dele, então a sua ficha caiu, Lily, ela tinha roubado o seu celular para vender e comprar mais drogas.

O saco com o pó branco de metanfetamina passou a pesar mais do nunca dentro do seu bolso.

Mesmo sem música, o ensaio aconteceu como deveria ser, a energia das crianças o animava. Foram feitas fotos com mães de gêmeos, casais de mães homossexuais, mães e filhos de etnias diferente, mães de produção independente e mães de coração, toda a diversidade que a revista tinha passado a trazer como proposta nos últimos meses.

Após o final do ensaio enquanto os ajudantes organizavam o estúdio, Emma deixou tudo para trás e subiu para redação.

— Eu posso entrar? — perguntou depois de bater na porta com os nós do dedo e abri-la.

— Você já entrou. — Regina respondeu secamente. Estava sentada em sua mesa e castigava o teclado do computador digitando furiosamente. — Precisa de alguma coisa? Algum problema no ensaio?

— Não, ele foi ótimo, ocorreu tudo bem. Foi uma pena você não ter ficado até o final. Sabe o que ficaria lindo como capa da edição?

— O que?

— Uma foto sua e do Henry.

— Aham.

— É... — enfiou as mãos nos bolsos de traz, um erro, o ziploc se fez presente mais uma vez. — O que você viu, Regina?

— Exatamente o que estava acontecendo.

— Você está com ciúmes, ciúmes de mim? — Emma não era capaz de se lembrar da última vez em que alguém havia sentido aquilo em relação a ela.

— Você está mesmo me perguntando isso? — Não seja tão idiota, Emma. — Vi vocês duas quase se beijarem. Achei que você estivesse inteiramente nessa Emma, achei que exclusividade estivesse implícito, mas eu me enganei. Você me prometeu fazer o seu melhor, e se isso é o seu melhor, para mim já deu.

— Não Regina, você entendeu tudo errado, não foi nada daquilo, está fora de contexto. Me deixa te explicar, por favor. — se aproximou.

— O que eu vi, foi claro o suficiente. — falou pausadamente — Não preciso de explicações, sério Emma, só não quero que isso atrapalhe o nosso trabalho, e só. — se levantou e foi em direção a porta.

— Foi um mal-entendido. — Emma falou cansada.

— Mal-entendido?

— Sim!

— Você a conhece?

— Sim, de muito tempo atrás, tanto tempo que parece ser ter sido em outra vida.

— E já tiveram algo?

— Sim, mas...

— Está claro para mim, Emma, está bem claro que eu me meti onde não me cabia, e você poderia ao menos ter me avisado, ter deixado isso claro.

— Não é nada disso, Regina! Você só precisa me ouvir.

— Eu ouvi, ouvi você praticamente dizer que ela é um caso antigo, e que claramente ainda há algo e que eu estou sobrando. — Emma era capaz de sentir a dor nas palavras de Regina. — Sai da minha sala, tenho muito trabalho a fazer.

Emma saiu em silêncio, não podia deixar que Regina ficasse acreditando naquilo, estava decidida, contaria a ela de onde conhecia Lily, o que implicava contar parte de sua vida que preferia manter em segredo, porque só assim conseguiria resolver aquilo.

Fingindo que trabalhava, Regina se manteve sentada de frente para o computador, mas não conseguia se prender a leitura de um parágrafo sequer, sua mente estava longe.

Então é assim que acaba?

Certamente se soubesse, se ao menos imaginasse, jamais teria baixado a sua guardar, ou permitido se envolver. Perdida nesses devaneios, não ouviu quando bateram na porta da sua sala, então só viu quando a porta se abriu e a pessoa que tinha saído minutos atrás entrou novamente.

— Mas o que é que você ainda quer? — se levantou de uma vez da cadeira e apoiou as mãos na mesa.

— Nós vamos sair depois do trabalho. A Granny vai pegar o Henry depois da creche, ela disse que pode passar a noite com ele e o trazer amanhã de manhã para aula. — disse séria.

— O que? Eu não vou a lugar nenhum com você.

— Você pode ir no seu próprio carro me seguindo, mas se você quer terminar algo que nem demos nome ainda, que seja por um motivo real, por algo que aconteceu de verdade.

As 17h em ponto, o horário em que o turno da revista normalmente terminava, Emma bateu na porta da sala de Regina, e que sem querer admitir, esperava com ansiedade que ela aparecesse.

— Está pronta?

— Para onde você quer me levar?

— Você vai precisar ir para descobrir.

— Eu não vou fazer nada disso...

— Eu posso pegar você nos braços, talvez caiamos por aí, mas garanto que te coloco no carro.

Quando desceram, encontraram com Granny e Henry no saguão com. O garoto quando viu a mãe e sua amiga, correu para abraça-las.

— Vocês vão no parque de diversão sem mim? — Henry perguntou fazendo bico.

— Não querido. — Emma respondeu.

— E quando que nós vamos ao parque de novo? Amanhã?

— Amanhã não, porque é dia de semana, você tem aula e nós temos trabalho. Mas podemos ir no final de semana, se a sua mãe quiser. — Encarou Regina.

— Mamãe... — Henry olho com as suas orbes amendoadas e pidonas para a sua mãe.

— Então filho, nós conversamos com sobre isso depois, ok?

— Ok!

— A Granny já te falou que você vai ficar com ela hoje a noite?

— Aham, ela falou que a tia Ruby também vai  lá.

— Se comporte e seja bom. — Regina deu um beijo no topo da cabeça dele.

— Vamos Henry? — Granny entendeu a mão e o garoto a pegou.

— Tchau mamãe. Tchau Emma.

— Ele vai ficar bem, aproveitem a noite.

Granny piscou o olho para Regina, que olhou para Emma e encontrou a loira desconfiada.

— Não é nada disso do que ela está pensando, eu posso te garantir.

— Sei.

Seguindo Emma de perto em seu carro, Regina começou a observar as ruas em que ela virava, e se surpreendeu quando ela parou o carro em frente a uma enorme e maciça igreja.

— Eu devo te dizer que nós dois não temos uma relação muito boa Emma, se é que você me entende. — Regina disse quando desceu do carro.

— Não é por isso que nós estamos aqui. Vem.

Emma estendeu a mão para que ela a pegasse.

Regina olhou para mão dela, mas em vez de pegá-la, saiu andando na frente.

A editora chefe achou que Emma entraria na igreja pelo portal principal, mas continuaram andando e viraram pela lateral em uma rua um pouco escura. Continuaram andando seguindo a lateral da igreja até que encontraram uma porta estreita guardada por um segurança baixinho e sorridente, e quando ele a abriu dando passagem para que elas passassem, Regina deu de cara com um salão subterrâneo abaixo da nave principal da igreja. Lá havia uma mesa de madeira ao canto, com garrafas térmicas identificas com plaquinhas, chá e café, com bolo fatiado e biscoitos em potes, e ao centro, havia um círculo feito com cadeira bancas de plástico, onde já haviam algumas pessoas sentadas, outros conversavam mais ao canto. Tinham homens, mulheres, alguns adolescentes... Regina jamais poderia imaginar o que uniam todas aquelas pessoas a Emma, e o que ela fazia ali.

— Você pode esperar um segundo, Regina?

Regina ficou próxima a mesa com a comida e viu Emma se distanciar até um senhor com um bigode branco e careca.

— Boa noite Emma.

— Boa noite Marco.

— Como você está?

— Bem, um dia por vez, como você sempre diz.

— Vi que você trouxe alguém.

— É — passou a mão na nuca —, espero que não tenha nenhum problema.

— Não vejo nenhum, acho até que seja bom. Se você trouxe alguém, é porque aceitou a ideia de contar a ela.

— É, o meu passado bateu a porta, e por pouco não conseguiu entrar, então acho que ela merece saber.

— É a mulher de quem você tem falado nas outras reuniões.

— É ela mesma.

— Ela é bem-vinda para se juntar a nós, e quando digo isso, falo por todos.

Emma voltou até onde Regina estava e a chamou para que integrassem as cadeiras do círculo, ela não fazia ideia do que se passava na cabeça de Regina, se ela já tinha intendido, o que ela estava pensando... Enquanto Regina se perguntava o que ela fazia ali e o que Emma tinha na cabeça.

— Boa noite — Marco disse a todos, ao tomar posse do seu lugar. —, essa é mais uma das nossas reuniões do NA, e quero que vocês se sintam à vontade para fazerem os seus relatos, para contarem sobre os seus dias, dividir o que te aconteceu de mais difícil, o que te tentou, o que te deu forças para resistir, a reintrodução social... O que vocês quiserem.

Uma mulher sentada do outro lado da roda de frente para Emma e Regina foi a primeira a falar.

— Eu sou Milla, e bom, eu estou sóbria há dois meses e meio, e isso é pouco para alguns, mas muito para mim. E alguns dias são bem difíceis, eu penso que eu poderia estar chapada, de boa, mas também penso que eu poderia estar caída em alguma esquina. Mas daí eu penso, se eu não aceito que outras pessoas me deem ordem, porque que eu vou deixar que elas assumam o controle?

As pessoas que se sentiram à vontade para falar continuaram falando, os que não, apenas ouviram, e Emma foi uma dessas, ouvindo e assentindo em concordância pelo o que os seus companheiros do NA diziam, e esperando que Regina estivesse entendendo.

Regina se manteve calada durante toda a reunião, prestava atenção em tudo, inclusive nos trejeitos de Emma, que balançava a perna impacientemente, e fazia isso ainda mais rápido à medida em que pessoas da roda iam falando e ela ia ficando por último. Não sabia se estava entendendo bem toda aquela situação, se Emma também era um deles ou o que, mas o mais importante era, porque ela estava ali? Porque Emma a tinha levado até aquele lugar?

Quando a reunião acabou, algumas pessoas saíram logo em seguida, enquanto outras permaneceram no subsolo da igreja, conversando próximo a mesa de lanches enquanto tomavam chá ou café e comiam biscoitos e bolo.

Quando se levantaram das cadeiras brancas de plástico, os cantos da boca de Emma se ergueram timidamente em um sorriso de lado, sem mostrar os dentes. Durante toda a conversa e os relatos em roda, não teve coragem de se virar e olhar para Regina, mas sentia necessidade de saber o que ela tinha achado de tudo aquilo, e se depois daquela noite, ela ainda iria querer olhar na sua cara.

De pé, com Emma parada em sua frente, Regina viu uma fragilidade antes nunca percebida, não tinha entendido absolutamente nada até o momento em que o condutor do grupo anunciou sobre do que aquela reunião se tratava, e então lembrou da aparência da mulher que viu no estúdio com Emma, e que a fotógrafa parecia ser perfeita demais para ser alguém real, que a pessoa compromissada com o trabalho, atenciosa com as pessoas e amorosa com as crianças só surgiu depois dela superar seja o que ela usasse no passado.

Com as mãos nos bolsos de trás, Regina retribuiu o sorriso.

— Com licença. — Marco se aproximou—, eu só queria te dar isso, Emma. — ele entregou a ficha já conhecida a Emma.

— Obrigada. — agradeceu pegando ela é a colocando no bolso.

— Não vão querer do nosso chá? É de camomila, eu mesmo que fiz. — ele perguntou sorrindo gentil.

Regina abriu a boca para responder educadamente que tomaria um pouco, mas Emma respondeu primeiro.

— Não me entenda mal, mas o hot-dog lá de fora é mais apetitoso que biscoitos.

— Eu também acho — confessou baixo —, mas não conta para ninguém.

— Ah, Regina esse é o Marco. — Emma o apresentou.

— É um prazer conhecer você, Regina. — estendeu a mão para a acompanhante de Emma.

Emma não era a pessoa mais antiga a frequentar o grupo de apoio, mas sem sombra de dúvidas era a que estava limpa a mais tempo, porém aquela era a primeira vez que Marco a viu trazer alguém para alguma das reuniões, e se ela tinha decidido fazer, certamente aquilo deveria significar muito.

— O prazer é meu. — Regina apertou a mão dele.

— Que hot-dog é esse que tem aqui fora? Confesso que ia aceitar o chá e as bolachas. A essa altura do campeonato o meu estômago aceita qualquer coisa. — Regina disse bem humorada quando saíram do salão de reuniões.

Estava escuro e a temperatura começava a ficar ainda mais baixa, na rua não havia mais ninguém de pé, apenas alguns carros parados no quarteirão seguinte.

Não era bem aquela reação Emma esperava de Regina, estava pronta para que ela saísse da reunião assim que compreendesse a verdade, ou para um olhar de julgamento, de indiferença, e até de nojo. Mas não era isso que ela demonstrava.

Será que ela entendeu mesmo? Emma se perguntava.

— Ele fica numa praça ali na frente.

Caminharam lado à lado em silêncio até o quiosque citado por Emma, onde fizeram os seus pedidos, e ao receberem escolheram um banco da praça e se sentaram para comer.

— Emma?

— Hum? — disse enquanto mastigava.

— Há quanto tempo você está... é... — procurou uma palavra menos invasiva para usar.

— Limpa?

—Hurum. — Regina balançou a cabeça em afirmativo.

— Três anos e alguns meses.

— E como que isso aconteceu na sua vida?

Essa foi a mesma pergunta que a sua psicóloga fez, na época em que Emma passou a ter seções depois do acidente, e foi a pergunta que ela mais demorou a conseguir responder.

— Eu era pouco diferente dos Swans, do meu pai e da minha mãe, eles são aquele tipo casal amável e conhecido em toda a vizinhança sabe? Que sempre são chamados para os chás da tarde ou só para tomarem um cafezinho e conversarem sobre trivialidades no jardim, e as pessoas não fazem isso só por educação, fazem porque gostam deles, gostam de estar com eles. Meus pais são incríveis, sempre foram, mas quando entrei na adolescência não consegui me enxergar como parte daquilo, o que é até normal, não é? Todo mundo passa for uma fase rebelde, você deve ter tido a sua.

— Quase fugi com um circo que passou no Maine uma vez. — confessou.

— A diferença entre nós duas é que eu fiz isso, e que a minha fase rebelde não passou. Mesmo aprontando um monte, eu queria muito ser como o meus pais, queria ser convidada para as festas de aniversário dos filhos dos vizinhos porque eles gostavam de mim, e não porque tinham consideração pelos meus pais. Nesse desespero eu fiz algumas, para não dizer muitas, escolhas erradas, me envolvi com o que e quem não devia, e um dia eu acordei e decidi que o tornavam Mary e David tão legais para o mundo era o amor que eles exalavam, e então eu saí em busca disso, mas não achei em ninguém, eu também pensei que o amor estava nas drogas, achei que ali eu fosse encontrar algo como o que os meus pais tinham, que assim eu seria mais como eles e menos como eu, porque quando você está chapado não existe medo, você se sente incrível, invencível, a pessoa mais extrovertida do planeta, e o mundo é seu. Mas quanto mais eu usava, mais me era tirado, mais eu me perdia e me afastava das pessoas que eu amava, e nunca parecia ser o suficiente o que eu usava, eu queria mais, queria ser a descolada, a pessoa que todo mundo queria ter por perto. Eu perdi muito tempo vivendo assim. — disse olhando para as suas mãos, enquanto as limpava com o guardanapo, depois de ter terminado o seu hot-dog. — Eu me afundei muito rápido.

— Mas você agora está sóbria, como consegui sair dessa? — Regina deu uma última mordida no seu lanche.

— Um dia — Emma suspirou —, um dia os meus pais e a minha irmã vieram me fazer uma visita surpresa aqui em Boston, eles moravam em Norwood e eu aqui, tinha vindo para estudar e trabalhar. Eles sabiam meio que por cima sobre as coisas que eu usava, e eu já tinha prometido e jurado muitas e muitas vezes que iria parar, mas todas as palavras eram ditas ao vento, e nisso, eu também ia me enganado, achando que estava no controle de alguma coisa, mas nesse dia em especial, eu errei o meu andar três vezes e ainda tentei abrir à força a porta de um vizinho, eu só sei disso porque o porteiro contou, eu estava terrivelmente fora de mim. Nós brigamos, gritamos um com os outros e eu até medi forças com o meu pai, literalmente, para conseguir sair de casa, depois disso eu peguei a moto na garagem e aconteceu o que as estatísticas sugerem. Me envolvi em um acidente e acho que é só por um milagre que eu ainda estou aqui, e desde então eu tenho estado sóbria, mesmo com crises ferrenhas de abstinência no primeiro ano. Depois do que me aconteceu, eu descobri que viver é maravilhoso, mesmo com algumas pessoas te tirando do sério ou com os boletos para pagar, estar aqui é sublime — riu um pouco.

— Você existe mesmo?

— Porque?

— Como você consegue, depois de tudo que você acabou de me contar...?

— A vida não é fácil, a de ninguém é, e chegar aqui também não foi. Eu poderia viver remoendo que eu fiz, talvez eu até faça as vezes, afinal eu sou humana, mas não dá para viver o tempo inteiro assim, porquê dessa forma você acaba não vivendo, pelo menos é o que eu acho. Ter uma segunda chance como eu tive e não aproveitar como se deve, me parece ser um pouco desonroso com quem gostaria de ainda estar aqui. Aproveito a vida, vivo mesmo os meus dias, eu me perdi, desisti de mim e estive muito perto de sumir, de não voltar, mas eu estou aqui, e tento fazer jus a isso. Apenas existir, fazer por fazer, são coisas que não me cabem mais. As vezes a rotina pesa, o trabalho fica estressante e a vontade de desistir fica batendo na porta, mas isso não está no meu sangue, desistir não faz parte de mim, não mais.

As palavras de Emma envolveram Regina de tal forma, que ela não sabia mais se a fotografa ainda estava falando dela mesma e se fala para ela, para Regina. Havia passado dois anos completamente imersa em se luto, se negando a coisas básicas como sair de casa para aproveitar um dia de sol, e Emma então lhe fala sobre viver, viver de verdade, e se deu conta de que só voltou a fazer isso depois que se mudou de volta para Boston. Depois que assumiu a revista passou a sair à noite para se divertir com os amigos e como a adulta que era, a ir a parques naturais e parques de diversão, e a brincar mais com o seu filho que crescia tão rápido diante dos seus olhos.

Depois que conheceu Emma, voltou a viver de novo.

— É, talvez você esteja certa...

— E sobre o que você viu hoje... A Lilith foi alguém que eu encontrei nesse mundo escuro em que eu vivi antes.

— Vocês namoravam? — perguntou mais tímida do que gosta de parecer.

— Se é assim que você chama alguém com quem você divide as suas drogas, então sim — fez piada uma piada infeliz —, mas faz muito tempo desde a última vez em que eu a vi, ela sumiu depois do acidente e eu também não tinha mais motivos para procurar por ela. Mas hoje ela apareceu, descobriu onde eu trabalhava e foi lá, e parece que nada mudou, na verdade só piorou, ela está ainda mais dependente, me chamou até para cheirar um, e roubou o meu celular — falou um pouco mais baixo.

— O que?

— Pois é, tirou do meu bolso e eu nem senti.

— Nossa Emma...

 — Eu tentei oferecer ajuda a ela, sabe?  Mas ela não aceitou, o que já era de se esperar, disse que podia parar quando quisesse. — Regina percebeu decepção no tom de voz de Emma. — Era a mesma coisa que eu dizia para os meus pais.

— E você ainda sente alguma coisa por ela?

— Não — disse rápido —, nem sei dizer se já senti, ou se tudo era efeito dos entorpecentes, eu só sinto pena, e isso é algo tão ruim de se sentir por alguém.

— Eu sinto muito, Emma.

Emma sorriu fraco e colocou a sua mão dela, e Regina a apertou, como se de algum modo tentasse dizer que estava com ela.

— É... acho que eu também preciso te contar algo.

— Não vai me dizer que você era usuária? — brincou.

— Não. Eu sou casada, Emma. — disse olhando naqueles olhos verdes profundos.

— Você é o que?

— Quer dizer, fui casada ou era casada, eu não sei. É a primeira vez que falo disso no passado.

— Com a outra mãe do Henry?

— Como você sabe? Por que você não sugeriu pai?

— Porque quando nós nos conhecemos, o Henry me contou que não tinha um. Quando eu o encontrei na calçada naquele dia em que ele correu atrás do algodão doce, eu perguntei se era o pai dele que trabalhava na revista, por causa da farda que ele vestia, e daí ele me disse que não tinha um. — explicou melhor ao ver cara de surpresa que Regina fazia.

— Ah. É, a outra mãe dele, Felicity, a minha falecida esposa. — foi a vez de Emma apertar a mão de Regina. — Nós morávamos aqui em Boston, ela era corretora de imóveis e eu trabalhava em uma revista um pouco menor do que a Gold’s Magazine, era redatora lá. Eu tinha vindo Maine para estudar aqui no MIT, lá é cidade pequena, minúscula quando comparado a capital, e ela foi a primeira pessoa que fez com eu me sentisse em casa.

Contado para Emma sobre a sua história com a sua falecida esposa, Regina começou a notar paralelos. Foi Felicity quem fez com que Boston se tornasse um lar na primeira vez em que Regina se mudou, e há pouco havia pensado em como Emma, foi importante na sua volta para lá.

— A adaptação a lugares novos é sempre complicada.

— É... enfim, nós nos casamos e quando nós decidimos que iriamos aumentar nossa aumentar a família, foi ela quem foi inseminada, a empresa que ela trabalhava oferecia todos os direitos de acordo com o que instituído, e você sabe, revista pequena não oferece muita segurança para a gente, e ela teria licença maternidade de seis meses e todas as outras coisas certinhas. Mas em um dia de semana comum depois de sair do trabalho e pegar o Henry na creche, eles sofreram um acidente de carro. — Emma percebeu a respiração de Regina mudar. — O Henry só se arranhou um pouco e teve alguns cortes, ele estava atrás na cadeirinha e o impacto nele não foi tão violento, mas ela que estava na frente não... Ela não resistiu ao acidente.

— Eu sinto muito mesmo Regina. — Emma colocou a mão no rosto dela e o afagou. Regina recebeu o carinho de bom grado, sentindo o toque afável de Emma com os olhos fechados.

— Está tudo bem, pelo menos agora está. Depois do que aconteceu eu voltei para o Maine com o Henry, voltei para casa do meu pai, deixei tudo para trás e fui embora. Eu não consegui continuar aqui, não depois do que aconteceu.

— Muitas lembranças?

— Uma vida delas. E eu também não tive condições para ficar sozinha com Henry, ele só tinha dois anos na época e precisava de cuidados e atenção redobrada, e eu não conseguia dar isso a ele. Entrei em depressão, tive sucessivas crises de pânico e de ansiedade, eu não aceitava o que tinha acontecido, perdi a conta de quantas foram as vezes que e implorei para que eu fosse levada no lugar dela, ou que fosse eu quem estivesse no carro naquele dia. — disse de cabeça baixa — Fiquei soterrada por tanta angústia, tanta dor... Eu só queria ficar deitava ou abraçada ao Henry, um clássico quadro depressivo, e por ironia do destino, ou não, a minha irmã mais velha é psicoterapeuta, tentou me tratar sem que parecesse estivesse fazendo isso. Na verdade todos me ajudaram, meu pai, meus sobrinhos, a minha família. Eu progredia de vagar, até que há um ano o Gold apareceu na minha casa para fazer uma visita e me propôs faz as edições dos textos da revista, disse que eu não precisava voltar para cá, que podia fazer o trabalho de casa mesmo, e depois mandar as matérias para o e-mail dele.

— Vocês já se conheciam?

— Ele era um velho amigo da minha mãe, ela também era jornalista.

— Era? Se aposentou?

— Não, a minha mãe faleceu quando a minha adolescência estava no fim. Enfim, relutantemente eu aceitei fazer o trabalho, até que há uns quatro meses Gold me ligou dizendo que estava pretendendo se aposentar, que tinha outros planos para a vida dele e que iria se dedicar a eles, e que precisava de alguém para assumir a edição chefe.

— Esses planos eram a Belle.

— Hoje eu sei que eram.

— E então você aceitou o cargo.

— Não, eu disse não na mesma hora, porque eu teria que mudar de novo para cá, e eu definitivamente não queria isso e nem sentia estar pronta para voltar.

— Mas você está aqui agora.

— Ele encheu muito a minha bola. — riu envergonhada. — E a Zelena, o meu pai e o meu cunhado disseram que seria bom voltar e encarar os meus fantasmas, mostrar que eu era maior do que tudo que aconteceu, e eu acabei voltando, mesmo não sentindo nada disso.

— Você ainda acha isso?

Regina ficou em silêncio por alguns segundos.

— Eu não acho que eu seja maior do que tudo isso, até porque eu passei muito tempo submersa, mas eu aprendi a subir para tomar ar, mesmo não sabendo como fiz isso, eu só vivi a minha vida aqui...

— Talvez esse tenha sido o segredo.

— Acho que sim. Emma, você disse que a Granny passaria a noite com o Henry, não foi?

— Foi, para eu que eu pudesse te levar a reunião.

— E o que você acha de irmos para o meu apartamento?

Depois de Emma ter aceitado prontamente, Regina saiu com o carro na frente e Emma a seguindo de perto logo atrás, naquele momento as duas sentiam como se pesos tivessem sido retirados de suas costas, como se respirar tivesse se tornado ainda mais fácil, e de fato tinha. A sua história com a sua esposa nunca fora um segredo que Regina guardava, mas era um assunto no qual ela preferia não tocar, era uma ferida que ela sabia que se cutucasse podia voltar a doer tanto quanto quando ela foi aberta da primeira vez, achava que a sua perda seria algo irreparável enquanto ela vivesse, mas que em meses foi suavizada de uma forma que três anos não foram capazes. Emma jamais soube contar sobre o seu caminho percorrido até onde ela estava atualmente, à salvo por os seus pais, irmã e psicóloga, as pessoas não entenderiam, a olhariam torto e jugariam, e guardando tudo pelo que se submeteu dentro do peito, passou a viver sendo grata por todos os seus dias, porém, sempre mantendo em segredo grande parte da sua vida, pelo menos até o momento em que achou que perderia Regina, em que perderia algo sem nome, mas que preenchia cada cavidade e poro do seu corpo.

— Você quer um vinho, um martini...? — Regina disse depois de entrarem no apartamento e ela avistar um dos brinquedos de Henry em cima do sofá e praticamente se jogar sobre ele para esconder o brinquedo atrás das almofadas.

— Eu não bebo, Regina. — Emma disse tentando aparentar tranquilidade.

— Ah, verdade, eu es... que cabeça a minha. — bateu na própria testa. Como poderia ter esquecido daquilo, em todas as vezes que foram no The Haven Emma bebeu apenas água com gás. — Aceita uma água?

— Eu estou bem. — Emma se aproximou dela e pegou na mão em que Regina tinha usado para bater na própria testa. Via que Regina estava ansiosa, Emma também estava, afinal, ainda não tinham se deixado levar pelo calor do momento e feito aquilo por sua causa e receios. — Mas está tudo bem para você também?

— Porque não estaria? —  levou a mão livre até o rosto de Emma e fez um carinho. — Porque você foi viciada em alguma coisa há muito tempo? Eu também fui, mas em uma coisa diferente, eu fui viciada em tristeza, sei que não é a mesma coisa, mas eu senti como se fosse.

— Onde você estava esse tempo todo?

A pergunta sussurrada por Emma era retórica, e antes que Regina pudesse pensar em alguma resposta, teve os seus lábios tomados por um beijo que se iniciou cândido, quase puro, mas que quando a língua de Emma fez contato com os lábios dela, a abriu permitindo que a sua boca fosse explorada, e uma mão forte apertou a de Regina cintura, que arfou durante o beijo.

Próximas do sofá como estavam, Regina fez com que Emma fosse de encontro a ele e se sentasse, enquanto a morena se manteve de pé, beijava a mandíbula e o pescoço dando pequeno chupões, enquanto sentia as mãos de Emma tatearem pelas as suas cochas. Regina mordia o lobo da orelha de Emma quando teve a sua bunda apertada, fazendo que soltasse um pequeno gruindo, o que claramente pareceu excitar Emma, já que loira acabou por desferir uma tapa e apertar a bunda dela ade novo.

Ofegante as duas devido aos beijos quase que ininterruptos, afastaram-se um pouco os seus rostos enquanto recobravam o ar, com os cabelos bagunçados por Regina, Emma tinha um sorriso de adoração misturado com tesão nos lábios que afastou qualquer outro receio que Regina pudesse ter por aquela ser a primeira vez em que estaria com uma outra mulher nos últimos três anos.

Foi a vez de Emma cariciar o rosto de Regina, e quando o polegar se aproximou da boca carnuda dela, se surpreendeu quando o chupou com vontade, enquanto assistia hipnotizada a cena e sentia o seu sexo latejar. Desejava Regina em todos os sentidos possíveis, e para sua felicidade, também sentia reciprocidade.

— Você me desestrutura. — Regina disse debilmente ao alcançar o primeiro botão da camisa de Emma, e ao fazer isso, viu o peito dela subir ainda mais rápido.

Com um sorriso e um aceno de cabeça de Emma, que fez questão de encara-la, Regina continuou.

Segundo, terceiro, quarto, quinto e sexto, a camisa estava totalmente aberta expondo o sutiã de cor creme rendado, mas não foi isso que chamou a atenção de Regina, e muito menos os seios que ele cobria, mas sim uma cicatriz em alto relevo devido a uma delgada camada de queloide que corria o peito de Emma.

Emma se manteve observando cada traço do rosto de Regina, enquanto ela seguia lentamente a linha do transplante com o dedo indicador.

— A médica responsável pelo meu caso disse que tive sorte depois do acidente que sofri — falava baixo sem saber o porquê, talvez tivesse medo de fazer com a atmosfera que tinham criando até então se dissipasse. —, o meu coração entrou em colapso por causa das drogas que eu tinha usado e do estresse do acidente, e então eu precisei de um novo, e ele estava lá, no hospital mesmo, parece que estava só esperando por mim.

Nesse mesmo instante Regina parou abruptamente de seguir o traçado no peito de Emma e a encarou.

— Foi a esse acidente que você se referiu mais cedo?

— Foi.

— E quando que ele aconteceu?

— Foi em 2015.

— Quando exatamente.

Emma estranhou a pergunta, mas mesmo assim se propôs a responder.

— Foi no dia três de... — mas Emma não pôde terminar, porque foi Regina quem completou a frase.

— Janeiro, na 15th Avenue.

— Como você sabe disso? — Emma se empertigou no sofá.

Pulmões, rins, córneas, fígado, pâncreas, coração...

Voltando no tempo, Regina se viu lendo o termo de autorização da doação de órgãos.

Pulmões, rins, córneas, fígado, pâncreas, coração...

Onde citava tudo o que seria tirado da sua esposa para ser doado para alguém.

Pulmões, rins, córneas, fígado, pâncreas, coração...

Coração...

— Então quer dizer que você teve sorte por alguém ter morrido? Quer dizer que você teve sorte por uma mãe ter sofrido um acidente estando com o seu filho no carro? — deu dois passos rápidos para trás.

— Regina, eu não estou entendendo... — Emma se levantou.

— Você teve sorte por uma mãe ter morrido e ter deixado uma criança de dois anos achando que ela virou a lua? Foi sorte por ela ter deixado a jovem esposa viúva? Ela estava voltando para casa com o nosso filho, ela estava voltando para mim, mas tudo isso foi só sorte para você. — a essa altura a voz de Regina já soava alta e descontrolada.

— Espera aí...

— Você era a pessoa da moto.

— E ela a do carro. — Emma ainda falava baixo, começando a se dar conta do que significava tudo aquilo que Regina bradava.

— Você teve realmente muita sorte, Emma Swan, porque ela não teve nenhuma, a minha família não teve chance nenhuma! Ela morreu para que você pudesse viver, e você me diz que teve sorte?

Tudo girava em um redemoinho dentro da cabeça de Emma, para ela nada daquilo fazia sentido, Regina estava a dizer sandices, Boston tinha 685.094 milhões de habitantes, não podia ter recebido o coração da outra pessoa que também se envolveu no mesmo acidente, e muito menos podia ter se encantado pelo filho dela, ter passado a trabalhar com a esposa dela, ter se apaixonado...

— Não é possível Regina, tinham outras pessoas acidentadas, tinham outras... — deu alguns passos trôpegos em direção a Regina, mal podia sentir o restante do seu corpo.

— O seu transplante foi feito no dia seguinte ao acidente, por que foi quando desligaram os aparelhos, porque ela tinha virado um vegetal, foi nesse momento em que a sua sorte aconteceu e a minha vida acabou. — Regina cuspia as palavras em Emma como se fossem facas, a ferida estava aberta novamente, e as lágrimas salgadas que escorriam pelo seu rosto a inflamava ainda mais.

— Tudo ficou destruído, o carro, a moto, tudo... O Henry, ele também estava no carro. — Emma levou a mão a boca descrente de tudo aquilo. Lágrimas solitárias escorriam de seus olhos, enquanto aos poucos a compreensão ia a acertando com a mesma suavidade de um trem descarrilhando dos trilhos — Regina, eu não... — estendeu a mão na tentativa de tocá-la, mas Regina pulo fora da sua zona de contato.

— Sai daqui, sai da minha casa agora.


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Notas finais do capítulo

Please, não deixem de me dar o feedback de vocês, é muito importante, para que mesmo diante da falta de tempo, eu possa continuar tendo ideias para Heartbeat.
Me contem tudo que acharam.
Beijo grande e até o próximo



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