Bem Vindo a Castelo Bruxo escrita por Leo Fi


Capítulo 21
Felipe




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Felipe estava se divertindo bastante ali com seus novos amigos, brincando comendo doces e dividindo experiências de vida. Ficou feliz que seus novos colegas não o julgaram e nem o trataram diferente por ser um garoto vindo do morro. Mesmo que sentisse um certo desconforto vindo do Bernardo que sempre teve tudo que queria e um olhar condescendente de Letícia que apesar de não ter pais ricos nunca sofreu privação de nada na vida. Ficou surpreso mesmo pela genuína curiosidade de Flor. A menina o bombardeou com perguntas sobre sua vida na comunidade e como era conviver perto de “malfeitores” trouxas. Ela explicou que no mundo bruxo também existiam problemas sociais, mas que geralmente as pessoas se viravam com magia e que não conseguia imaginar como os trouxas resolviam seus problemas sem isso. Lipe tentou explicar da melhor forma que podia sobre seu lado, já que para muitas perguntas ele não tinha resposta, mas achou interessante aquele choque cultural. Tinha tantas coisas que não sabia de ambos os mundos que se sentia meio perdido e espremido e ficou aliviado que não conversaram sobre os parentes bruxos, não queria entrar no assunto de seu avô, mesmo por que não sabia muita coisa a respeito.

O importante era que estava indo para um lugar onde parte de suas dúvidas seriam tiradas ou assim pensava ele. Felipe tinha uma vida inteiramente nova pela frente e isso o assustava mais do que ser um filho, ou melhor um neto de dois mundos, mas pelo menos conseguira fazer magia e mudar a cor do papel.

Uma sensação de felicidade tomou conta dele quando conseguiu usar magia pela primeira vez e nem tinha chegado na escola ainda. Realmente era difícil, ele tentou bem umas cinco vezes até que pegou o jeito da coisa. Mentalizar o papel vermelho, pronunciar de forma correta o encantamento e fazer o movimento da varinha. Quando sentiu o poder passar pela varinha sabia que tinha conseguido e assim foi, o papel mudou do tom natural amarelado para um vermelho vivo.

Todos estavam bem contentes com aquele pequeno feito, bom talvez não Bernardo que conseguiu deixar o tom amarelado natural do papel mais desbotado, mas já era um progresso.

Lipe estava sugerindo tentar outro feitiço quando ouviu o anúncio ecoar e sentir o barco adernar para frente. Correu para a janela circular até ver a linha da água subir e conseguir ver o fundo do rio, qualquer em que estivessem.

— Não se preocupem como já expliquei é assim que atravessamos o país.

— Não é isso, dá pra ver alguns peixes! Disse Lipe animado.

— Cadê? Deixa eu ver! Bernardo levantou e parou do lado de Lipe olhando encantado.

— Também quero ver! Disse Letícia se espremendo entre os dois.

— Nossa é tão poluído!

— Hahaha! Acho que vi um pneu! O que é aquilo flutuando.

— Eca!

— Ai gente vocês são tão engraçados. Disse Flor se sentando na rede de Lipe e se balançando.

— Ah! A cor da água está mudando!

Realmente, Lipe percebeu que a medida que o barco avançava pelo fundo do rio, a água turva e poluída foi sendo substituída por uma água de coloração diferente. Ainda um tanto escura mas de forma natural.

Depois de um tempo o barco pareceu diminuir a velocidade até parar. Tinham chegado na segunda parada do dia. Como na cabine dos garotos não dava para ver o cais, os quatro foram para a cabine das meninas e ficaram olhando as movimentações de alunos embarcarem com seus malões e bagagens assim como eles fizeram. Logo depois ouviram o barulho nos corredores dos alunos do primeiro ano passarem pelos corredores e para encontrarem suas cabines. Foi nítido a diferença de sotaques dos futuros colegas. Assim que todos já tinham embarcado, a caravela voltou a zarpar e repetir o processo quando atracaram na terceira parada. A essa altura já estava escurecendo pelo que podia se ver na janela. Depois da terceira parada Lipe e Bernardo tinha voltado para suas cabines e descansado nas redes onde cochilaram sendo acordados pelo auto-falante mágico.

— ATENÇÃO ALUNOS DE CASTELO BRUXO SAREMOS DO QUARTO SALTO PARA O DESTINO FINAL, POR FAVOR VISTAM SEUS UNIFORMES E SE PREPAREM PARA O DESEMBARQUE.

Lipe acordou no susto assim como Bernardo e os dois prontamente começaram a arrumar a pequena bagunça que estava a cabine. Depois de guardados os doces e brinquedos e jogados fora os papéis na pequena lata de lixo da cabine, os garotos revezaram para usar o banheiro e se arrumarem.

As vestes verdes couberam muito bem em Felipe que nunca tinha se sentido tão elegante antes. Bernardo também não estava mal apesar da roupa dele ser pelo menos dois números maiores que a de Lipe. A costureira do Mercado Circular da Uruguaiana era realmente boa e isso o fez se lembrar da sua avó e do que ela falaria ao ver vestido daquele jeito. Lipe suspeitava que a velha senhora sentiria o maior orgulho do neto e por isso ele engoliu o nervosismo e esperou o momento de ingressar na escola de seu avô.

A caravela já tinha emergido e flutuava a uma velocidade moderada pela água escura. Olhando pela janela não dava para distinguir muita coisa, apenas a silhueta de uma floresta densa e selvagem. Lipe se deu conta de que estava mais longe de casa do que nunca tinha estado até então.

— Cara, é a floresta amazônica? Perguntou, Bernardo impressionado.

— Só pode. Respondeu Lipe baixinho com o rosto colado ao vidro.

— Realmente estamos aqui não é? Quer dizer…

— Cara nem em meus sonhos mais nerds… Disse Bernardo.

Bateram na porta da cabine Letícia e Flor entraram.

— Gente vamos, podemos ver a chegada lá de cima. Disse Flor.

— E podem deixar as bagagens, eles levam, pelo que falou um dos tripulantes.

Realmente um dos tripulantes com roupas de marinheiro verde, instruía os estudantes do primeiro ano a fazerem fila e ir com calma para cima. Seguiram o fluxo e chegaram até o déque onde um vento fresco do ar noturno os engolfou. Marinheiros de ambos os lados impediam qualquer estudante de chegar perto das bordas, mas mesmo assim dava para ver o cenário que se descortinava ante seus olhos. Pra onde a vista alcançava se via o verde escuro da floresta em torno. Olhando para o céu uma infinidade de estrelas decorava o firmamento. E o silêncio só era interrompido pelo murmúrio dos alunos e os sons ocasionais dos animais noturnos.

A caravela entrou num afluente e uma luz tomou conta do barco vindo do que parecia ser uma pequena vila a alguns metros do leito do rio. Pelo que Lipe pôde ver a vila era formada de casas de pedra bruta com teto de palha e as ruas de paralelepípedos, talvez do mesmo material das casas. Uma fonte era vista ao longe no que parecia ser uma praça.

— Ah eu já estive nessa vila de férias com meus pais. A propósito essa é Verônica minha prima de Santa Catarina.

Lipe se virou para olhar a garota que era bem parecida com Flor a não ser pelo cabelo escorrido e também não usava maquiagem, sendo o único adorno óculos de gatinho de aro vermelho. Eles se apresentaram.

— É uma vila só de bruxos? Eu li que existem algumas espalhadas pelo país quando estava folheando o livro de história. Disse Letícia.

— A existem várias espalhadas pelo país. Você pode encontrar muitos bruxos vivendo nas cidades grandes, claro, mas a maioria prefere se entocar no interior em comunidades fechadas. Verônica aqui de uma vila na serra catarinense. Explicou Flor.

— Verdade? E como é lá? Perguntou Letícia para Verônica.

— Hum, frio. Respondeu a menina um tanto fria.

— Eu detesto frio. Disse Lipe.

— Bate aqui parceiro. Disse Bernardo fazendo hi five pro Lipe sorrindo.

A vila já tinha passado fazia cinco minutos e nada no mundo prepararia Lipe para o que veria ali. Depois de virar num terceiro afluente os alunos se depararam com um enorme cais do porto. Para Lipe enorme não era nem se quer uma descrição correta, pois atracados estavam mais de 20 caravelas. Algumas de velas verdes com aque estavam outras de diversas cores, vermelho, amarelo, azul, violeta, mas todas com o brasão de Castelobruxo flamulando ao vento no topo do mastro mais alto. A caravela começou a diminuir a velocidade até finalmente atracar e os marinheiros sacarem suas varinhas e fazer as cordas flutuarem para se prender no cais. Era incrível para Lipe ver os movimentos sincronizados e a magia que os marinheiros faziam. A prancha de desembarque foi abaixada e os alunos começaram a descer. Primeiro os do primeiro ano onde uma pessoa vestida com uma capa amarela e ar formal veio lhes receber e os guiaram para fora do porto até uma grande área circular ampla e pavimentada onde tinha Uma imensas torre piramidal quadrada como se alguém tivesse esticado um cubo até uns 20 metros de altura. Entalhes podiam ser vistos na parede da torre até onde a vista alcançava. Felipe percebeu que outras comitivas guiadas por pessoas vestidas como a que guiavam seu grupo iam na mesma direção a partir dos barcos. Depois de um tempo todos os grupos estavam enfileirados um do lado do outro em frente à grande torre. Três grupos à direita Felipe reconheceu uma das guias.

— Vanessa! Gritou, Lipe.

A professora retribuiu com um aceno discreto e voltou sua atenção para seu grupo. Alguém pigarreou alto e Lipe olhou para a frente vendo que seu guia e provavelmente seu professor, não havia gostado nem um pouco daquilo. O professor era magro e seu cabelo loiro estava começando a ficar grisalho, não dando pra distinguir onde era loiro e onde era branco. Quando o professor começou a falar Lipe teve uma surpresa. O homem falava espanhol, mas estranhamente Lipe conseguia entender tranquilamente como se um intérprete com a mesma voz do interlocutor estivesse traduzindo ao pé do ouvido.

— Como vocês podem perceber minha língua materna é o espanhol e eu sei que muitos aqui falam apenas o português, contudo, vocês estão entendendo perfeitamente o que estou dizendo. Isso por que nos terrenos da escola a começar por essa torre existe um encantamento muito poderoso que traduz tudo o que falamos na mente de vocês. Alguns podem sentir um certo desconforto no começo, porém garanto que se acostumarão a isso com o tempo. Como meus colegas devem estar explicando aos outros alunos falantes de espanhol, a Escola de Magia Castelobruxo espera o melhor de vocês alunos, por tanto, peço que não dependam apenas de encantamentos para se comunicarem com seus outros colegas dos mais variados lugares da América do Sul e aprendam realmente a segunda língua, pelo bem do convívio escolar e da integração entre os povos.

O professor se virou para a torre, assim como todos os outros ali presentes que sacaram suas marinhas e enunciaram um encantamento numa língua que o feitiço tradutor não captou. “Parece indígena”. Momentos depois o que parecia ser pedra sólida se abriu como uma grande porta dupla de pedra.

— Me sigam! Ordenou cada professor para seu grupo.

Ao atravessar os alunos, mesmo os de família bruxa como Flor e sua prima, não poderiam deixar de ficar impressionados. Lipe imaginou que se depararíam com uma escada e iriam pelo subterrâneo até a escola, mas não que o espaço no interior do monolito seguisse em linha reta por um corredor, até onde não se poderia ver. Caminharam pelo largo corredor cujas paredes eram decoradas por gravuras e desenhos de diversos motivos, como hieróglifos egípcios mas claramente eram de outra cultura. Tochas de pedra iluminavam o local, como vasos cheios de fogo saindo da parede. Lipe perdeu a noção do tempo ali até que mais a frente uma passagem se abriu. Quando saiu para a noite fresca e quente seu queixo caiu.

Um templo. “Um templo?” Um edifício imenso, feito de pedra amarela brilhante, tão largo quanto o Maracanã e mais alto que a estátua do Cristo Redentor despontava em uma enorme clareira cercada pela mais densa floresta tropical do mundo. Uma pirâmide quadrática, como se imensos blocos menores fossem colocados sobre imensos blocos maiores até terminar num bloco do tamanho de uma casa. Era incrível como uma coisa daquela estava no meio da floresta amazônica e ninguém sabia da existência dela.


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