Égon: A Origem escrita por GJ Histórias


Capítulo 9
Capítulo 8 - A Vingança




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 Estrelado está o céu de uma serena noite na Amazônia. Ruídos de animais, como grilos e corujas, ajudam a cortar o silêncio da mata próxima ao acampamento temporário, local que abriga os membros remanescentes da tribo Jirati. Os sons emitidos por passos, os quais comprimem a terra e quebram pequenos galhos espalhados pelo solo, completam o cenário de tensão presente no povoado. Liana, a autora do barulho, caminha em direção à barraca azulada, passando pelos troncos de árvores, usados como bancos,  e as várias tochas que auxiliam na iluminação do terreno.

 Ao a garota adentrar a tenda, ela depara-se com seus irmãos, Turor e Heitor, e Wilson, o capanga de Oliver Lamartine, sentado e amarrado em uma cadeira. O bandido está cabisbaixo e com a boca manchada por um seco sangue. Observando o contexto, Liana questiona:

— Qual é a situação?

— Está difícil extrair informações dele - Respondeu Heitor- Pressionamos ele o quanto pudemos, mas o sujeito não abre a boca. Não sei como o “Cabeça de Leão” consegue manipular a mente dos seus homens, não desse jeito.

— E quanto à vistoria? - Perguntou a garota- Conseguiram encontrar algo, nas vestimentas dele, que possa nos ajudar?

— Nada, apenas uma pistola, Beretta 92F, e algumas embalagens de chiclete. Nenhum rádio, transmissor, ou qualquer outro equipamento que possa ser usado para fazermos contato com o pessoal do Lamartine.

— Droga! - Exclamou Liana- Precisamos nos esforçar, apenas uma única pista, sobre as posições das instalações de Oliver, será de grande ajuda.

 Wilson, estonteado, esforça-se para olhar nos olhos de Liana. Com um fraco sorriso, ele fala:

— Vocês ainda estão brincando, não levam a sério o que eu tento dizer. Quando Lamartine fica furioso, ninguém consegue ficar no seu caminho. Ele vai descobrir que eu estou aqui e irá se vingar.

 Turor cerra os punhos e avança contra o bandido, exclamando:

— Já chega! Vou ensinar bons modos a esse criminoso.

— Pare! - Gritou Liana, enquanto segura o peito de seu irmão- Não deixe a raiva te consumir, caso contrário, você irá o matar. Precisamos dele vivo, ele ainda vai ceder as informações que necessitamos.

 Segurando o rosto de Turor, ela observa fixamente os olhos dele e prossegue com o discurso:

— Se o torturar, estará se rebaixando ao nível deles. Esse não é você, irmão!

— Tudo bem! - Falou Turor, em um tom mais tranquilo.

 Retirando uma folha de papel, do bolso de sua calça, Liana entrega-o ao Turor, falando:

— Nós não podemos permanecer nesse acampamento por mais tempo, é inseguro e não dispõe de tantos recursos para nossa sobrevivência. Tenho alguns contatos que arranjaram um bom local, uma pequena cidade a alguns quilômetros de Manaus, as coordenadas estão nesse papel. Lá existem moradias o suficiente para abrigar o nosso povo. E, por estarmos próximos à capital, poderemos levar Wilson às autoridades. Iremos desmascarar o Oliver, além disso, eles terão seus meios para extrair as informações desse criminoso.

— Obrigado, caçula! - Disse Turor- Vamos trabalhar em nossa retirada.

— Mas precisamos ter cuidado - Manifestou Liana- Há homens do “Cabeça de Leão” por toda parte, eles poderão reconhecer o Wilson.

— Será que o Antônio poderá nos ajudar nesse transporte? - Perguntou Heitor.

— Não! - Respondeu a garota- Ele já nos ajudou muito, não podemos nos aproveitar dele, é errado. Isso é uma tarefa nossa!

— Falando em Antônio, onde ele está? - Questionou Turor.

 Os irmãos, confusos, olham um para o outro, sem terem uma resposta à pergunta feita por Turor.

— Se ele não voltou para casa, acho que sei onde poderei encontrá-lo! - Exclamou Liana.

A alguns metros dalí…

 Uma pequena porção de terra, dotada de gramas e pequenas rochas, encontra-se descoberta e rodeada por numerosas árvores, oferecendo uma linda e límpida imagem do céu. Tal espaço está sendo utilizado por Antônio, o qual aproveita-se da calmaria para meditar em seus pensamentos, na esperança de atrair mais pulsos de memória do antigo dono de seu corpo. No entanto, apenas uma coisa preenche sua mente, a cena da felicidade vivida pelos Jirati ao serem resgatados. Essa lembranças trazem reconforto e uma sensação de satisfação para o menino, mais do que um favor, um dever cumprido.

 O reflexos do garoto ajudam-o a perceber a aproximação de alguém. Ele abandona seus pensamentos e vira-se para trás, notando Liana, a qual caminha sorrateiramente em sua direção.

— Como me achou? - Perguntou Antônio.

— Esse estreito lugar não é encoberto pelas grandes vegetações, oferecendo uma incrível vista do céu. Desde o momento em que adotamos esse acampamento temporário, eu visito, frequentemente, esse local, a fim de admirar a paisagem e recolher-me em minhas reflexões. Apenas imaginei que você estaria aqui, e agora percebo que tal espaço não atrai somente a mim.

 Antônio apenas sorri para a garota, a qual pergunta:

— Posso me sentar com você?

— Claro!

 Liana acomoda-se ao lado do menino, questionando:

— Poderia saber o motivo de tanta meditação?

— Estou tentando encontrar rastros da memória do ser que habitou esse corpo.

— Égon?

— Exato! Mas, como eu disse, elas não aparecem sempre. Geralmente em momentos difíceis, de extrema tristeza ou medo.

— Quem sabe, se você tentar resgatar as suas memórias, as do Égon possam fluir, naturalmente, em sua cabeça! Conte-me mais sobre a noite em que você ganhou o corpo.

— Não há muito o que falar, com exceção de tudo o que você já ouviu!

— Talvez, contudo, você havia me dito que, no momento em que trocou o seu corpo, estava afastado do resto da população. Isso já era um hábito seu?

— Não! - Exclamou Antônio, com os olhos lacrimejando- Aquele dia foi diferente de todos pelos quais eu passei.

— O que houve?

— Minha família tem uma agência de turismo, não muito grande, mas é o que nos sustentou por gerações. Nós levávamos vários turistas para conhecerem pontos em Campo Celeste e nas regiões próximas. Tal atividade é muito comum no lugar de onde eu venho, no entanto, minha família executa-a perfeitamente e é extremamente conhecida e requisitada. O problema é que eu não queria fazer parte disso, não visualizava muito futuro nesse ramo. Após assistir documentários, ler trabalhos e estudar um pouco a respeito, desenvolvi o sonho de ser um grande cientista e pesquisador, especialmente nas áreas biológicas. Meus pais notaram isso, mas nunca falaram algo a respeito.

  Naquele domingo, foi quando eles decidiram se manifestar. Minha mãe frisou a importância da manutenção dos negócios da família, no entanto, eu não aceitei esse destino e comecei a discutir. Sempre tive um excelente relacionamento com a mamãe, mas nesse dia tudo desabou, eu gritei com ela! Quando percebi o rumo que a discussão estava tomando, fugi de casa e me escondi, com medo do que havia acontecido. Depois, meu corpo foi trocado e ela nunca mais me viu. E esse é o meu maior arrependimento, a última lembrança que minha mãe tem de mim, dentre todos os bons momentos pelos quais passamos, é de uma briga.

— Sinto muito! - Disse Liana, empática, enquanto segura as mãos de seu amigo.

— Eu só queria poder consertar as coisas, mas esse corpo não permite. As vezes penso em como seria tudo mais fácil, se eu apenas tivesse aceitado o que minha família reservou para mim!

— Creio que esse seja o seu problema, Antônio!

— O que quer dizer com isso?

— Você vê apenas os pontos negativos desse seu corpo alienígena, apenas as dores que ele provocou em sua vida, como o afastamento da sua família. Nunca passou, pela sua cabeça, o fato de que tudo isso pode ter ocorrido em prol de um bem maior? Veja a maravilha que você realizou ontem, quantas vidas você salvou. Muitas atrocidades ocorrem, diariamente, nessa floresta. Pessoas são injustiçadas e não dispõem de alguém para protegê-las. Quem sabe você seja a pessoa designada a desempenhar essa função?

 Antônio sorri, talvez Liana esteja certa, talvez a perda de seu corpo humano não tenha sido em vão. Salvar a tribo Jirati trouxe felicidade ao garoto, ele quer vivenciar isso de novo.

— A Amazônia ganhou um protetor. - Falou Liana- E ele não é desse planeta! O que achou?

— Mas e quanto ao caçador? Ele ainda pode estar por aqui.

— Esqueça o passado, isso está impedindo-o de progredir! Se ele aparecer novamente, lute! Você é forte!

 Antônio volta-se para Liana. Com um sorriso estampado, ele diz:

— Tem razão, obrigado!

 Durante o tempo em que Liana e Antônio conversam, Turor, juntamente com Heitor e alguns membros mais jovens da tribo, auxiliam na mudança dos Jirati, guardando comidas e outros suprimentos em bolsas improvisadas, feitas a partir dos panos das tendas. Enquanto eles carregam algumas dessas bagagens, a fim de empilhá-las próximas à fogueira central, Elyn, irmã de Sutor, questiona:

— O que está havendo aqui?

— Mudança, tia! - Respondeu Turor- Conseguimos um local melhor para vivermos, até restabelecermos um novo povoado. Pretendemos sair amanhã.

— Vocês já avisaram o restante do pessoal?

— Não, deixe-os dormir! Amanhã daremos a notícia a todos.

— Ah sim, tudo bem então. E quanto à Liana e o garoto azul? Onde eles estão?

— Não sabemos, Antônio desapareceu e Liana foi procurá-lo.

 Nesse instante, Turor percebe certos ruídos vindos da mata. Fracos barulhos surgem por todos os lados, os quais soam como plantas mexendo e galhos partindo. Pessoas se aproximam, discretamente, mas a floresta as impede de serem sorrateiras. Turor, notando que algo se aproxima, diz:

— E para nosso bem, espero que eles cheguem logo! Tia, entre agora!

— Por quê?

— Entre!

 Em seguida, inúmeros homens armados, os quais utilizam trajes e máscaras pretas furtivas, surgem e cercam os nativos. As miras laser são apontadas na direção de Turor, Elyn e os demais indivíduos, paralisando-os.

— Fiquem parados!- Disse um homem, com a voz abafada em função da máscara.

 Através de gestos, o mesmo sujeito orienta que quatro homens, posicionados logo atrás dele, vasculhem as várias barracas. Ao adentrar a tenda azul, um dos rapazes localiza Wilson e o desamarra. Wilson, enfraquecido, diz em voz baixa:

— Sabia que vocês viriam!

— Eu não abandonaria você! - Exclamou o mascarado, com um sotaque diferenciado.

 O criminoso sai da tenda, com Wilson apoiado em suas costas, e defronta-se com os demais nativos, todos ajoelhados e com as mãos amarradas.

— Achei nosso alvo! - Gritou o homem.

 Os demais bandidos comemoram.

— Foi mais fácil do que imaginei - Disse um deles- Terminamos por aqui!

— Ainda não! - Retrucou o sujeito que carrega o Wilson. - Onde está o gigante azul?

 O Jirati ficam silenciosos. Observando a resistência dos nativos, ele vira-se para os outros homens, os quais sacodem as cabeças, simbolizando o fato de que Antônio não foi avistado. Tal sujeito acomoda Wilson no solo e retira sua máscara, revelando o rosto do “Cabeça de Leão”.

— Até que enfim eu retirei essa porcaria! - Exclamou Oliver, enquanto entrega-a a um de seus comparsas- Como vocês respiram com essa coisa?

 Voltando-se para os reféns, ele prossegue:

— Isso é sério? Vocês não irão dizer onde ele está?

— Nós não sabemos! - Respondeu Turor.

— Então foram abandonados?

 Percebendo que o silêncio impera, Lamartine enfurece. Cerrando os punhos e passando a pele de seu rosto para um tom mais avermelhado, ele pisa, fortemente, no chão, enquanto grita:

— Chega de joguinhos! Fui atacado ontem e as coisas não se encerram por aí!

 Abandonando sua posição, o contrabandista agarra um jovem, presente no meio dos nativos, coloca-o de frente em relação ao demais e aponta a arma na direção de seu crânio, dizendo:

— Então, meu jovem… Soube que o azulzinho não agiu sozinho, houve pessoas dessa tribo que o ajudou. Por acaso, essa pessoa seria você?

 Voltando-se para os outros reféns, ele continua a fala:

— Eu quero nomes!

 Transcorridos alguns segundos, preenchidos pela mudez dos Jirati, Lamartine não hesita em disparar, matando o garoto. Turor, ao visualizar a cena, desespera-se e urra em um tom de lamentação. Os demais membros choram ante a situação. Oliver, constatando a angústia dos nativos, exclama:

— Eu perdi a paciência, chega de teatros! Se não me apontarem nomes, um novo indiozinho vai pagar com a vida, a cada três segundos, começando a partir de agora!

— Calma! - Gritou Turor.

— O que está fazendo? - Questionou Elyn. - Não ceda!

— Não dá, tia! - Falou Turor- Nossa tribo já está em um número reduzido, não podemos tolerar mais mortes.

 Prestando atenção no diálogo, Oliver interrompe a fala, dizendo:

— Então, meu rapaz, você será o salvador do seu povo? Diga os nomes!

— Fui eu quem ataquei, me chamo Turor!

— Está incompleto! - Exclamou Lamartine, enquanto mira a arma na cabeça do nativo- Meus homens disseram que também havia uma garota!

— Minha irmã, Liana! Mas ela está além do seu alcance! Fugiu, juntamente com o gigante! Eles ficarão cientes do que houve aqui e não irão tolerar!

— Estou contando com isso!

 Com a corona de sua arma, o Cabeça de Leão acerta o rosto de Turor, o qual desmaia.

— Isso é por ter arruinado meus negócios! - Falou o contrabandista.

— E quanto aos demais reféns? - Questionou um dos criminosos- Vamos matá-los?

— Não! - Respondeu Oliver - Aqueles dois, o monstro e a tal Liana, sofrerão minha vingança! Ainda farei eles se curvarem. Contudo, para isso, eu precisarei desse projeto de tribo vivo! Eles serão uma peça fundamental no meu tabuleiro.

 Caminhando na direção de Elyn, Lamartine agacha-se a acaricia o rosto da mulher. Com um assombroso sorriso, ele diz:

— Especialmente você, “tia”!

 Passados alguns minutos, Liana e Antônio abandonam a local de meditação e andam de volta ao acampamento. A conversa que tiveram foi boa para o garoto, ele sente-se mais confiante. Quando os dois atingem o local desejado, notam a ausência dos membros da tribo.

— O que houve aqui? - Questionou Antônio.

 A angústia começa a dominar o corpo de Liana, seu corpo fica trêmulo.

— Não pode ser! - Disse a garota.

 Imediatamente, os dois dirigem-se à cabana onde estava localizado Wilson. Ao adentrarem a tenda, nada havia, exceto uma folha de papel, fixada na cadeira onde o bandido estava sentado, com o desenho de uma Cabeça de Leão. Ambos entenderam o que havia acontecido.


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Notas finais do capítulo

Olá possível leitor, tudo bem? Aqui quem fala é o G. Fico feliz que esteja acompanhando essa história, espero que esteja gostando. Caso sinta-se satisfeito, ou até mesmo chateado com certos assuntos, por favor, comente! Deixe sua opinião, mesmo que seja negativa, para me motivar a continuar liberando os capítulos e readequando a narrativa!



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