História A Falha no Plano - ShikaTema escrita por biapurceno


Capítulo 3
Epílogo


Notas iniciais do capítulo

Finalmente o último capítulo, o epílogo. Foi um prazer imenso escrever essa short e ter o privilégio de alegrar vocês!

Tenham uma boa leitura!



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Temari

Temari jogou-se no sofá, que já estava cheio de almofadas esperando por ela. Suas costas doíam, suas pernas doíam, seus pés doíam. Também pudera, haja corpo para suportar uma barriga tão grande; vira e mexe perguntavam se não eram gêmeos ali dentro. Mas não, era um só. Um bebê preguiçoso que, além de transformá-la numa baleia, estava atrasado para nascer a uma semana. Já tinha conversado com Ino, que tinha treinamento médico, e ela garantiu que o bebê nasceria com quarenta semanas no máximo; mas não o filho de Shikamaru. A criança devia estar confortável lá dentro, então por que sair? Já estava na quadragésima primeira semana, e não aguentava mais esperar a boa vontade daquele pequeno preguiçoso.

Quando anunciou que iria de vez para Konoha, decisão tomada tão de repente, foi um choque para todos. Kankuro ficou louco, dizendo que a proibia de se mudar, que a irmã dele não ia “morar” com um cara solteiro. Temari teve que relembra-lo que o cara solteiro era seu noivo e pai do seu filho, e que iria ele querendo ou não. Já Gaara se preocupou um pouco com o trabalho, mas ela garantiu que mesmo de Konoha faria o que precisasse, então aceitou, desde que concordasse em ser acompanhada por cinco ninjas, entre eles um médico, até chegar na outra vila.

Outra que ficou surpresa com a notícia foi dona Yoshino Nara, mãe de Shikamaru, que variava entre chorar de felicidade por ser avó e bater no filho por não ter esperado o casamento e ainda ter trazido a noiva grávida para morar com eles sem avisar. A princípio Temari não gostou da ideia de morar com a sogra mesmo que por pouco tempo. Teve muito pouca presença feminina na sua vida; perdeu a mãe muito nova e foi criada cercada de homens, pouco se lembrava da sensação de se ter uma mãe por perto. Porém se surpreendeu com sua sogra, e esses meses ao lado dela lhe deu uma amostra de como é gostoso ter essa presença maternal. A mulher se preocupava o tempo inteiro em deixá-la a vontade, cuidava dela quando tinha enjôos e mal estares, e sempre tinha um chá milagroso que ajudava a aliviar os sintomas; ajudava a lembrar das vitaminas e a acompanhava em todos os lugares. Tinham a personalidade muito parecida, e para as duas isso foi uma vantagem. Além disso, dona Yoshino viveu grande parte de sua vida cercada de Naras, e sabia muito bem como conviver com eles. No dia do seu casamento, aliás, ela a encheu de dicas de como lidar com o filho.

— Esses homens são muito inteligentes, mais até do que demonstram, mas são moles demais. Se quer que façam alguma coisa rápido, peça em tom de bronca. Eles odeiam conflitos com mulheres, não vão discutir. — falou enquanto a ajudava a se arrumar.

Por falar em casamento, o seu foi espetacular. Nunca foi do tipo de menina que sonhava com esse tipo de coisa, em encontrar o homem de seus sonhos, ter uma cerimônia chique para todas as vilas, passar o resto de suas vidas juntos, ter filhos. Seu sonho era ser a melhor kunoichi possível, usar sua inteligência para ajudar, na época, seu pai Kazekage, e ser respeitada como autoridade. Porém no momento em que se viu vestida de noiva caminhando ao encontro de Shikamaru, sentiu que o sonho que nunca havia sonhado estava se realizando. A cerimônia foi emocionante, um evento grandioso. A propriedade Nara estava linda, as árvores estavam com sua decoração natural, todas floridas devido a primavera. No chão pétalas cuidadosamente selecionadas por Ino estavam espalhadas, dando uma leveza ainda maior ao ambiente. Ao fundo diversas mesas redondas para jantar estavam dispostas, e decoradas com uma pequena escultura do símbolo do clã Nara. Havia para comer pratos que agradavam tanto aos convidados que vieram de Suna quanto aos de Konoha, já que grande parte de seus amigos haviam viajado até lá para prestigiá-la. Mesmo em sua nova cidade já havia feito grandes amigos. Nunca imaginou que se sentiria tão em casa num lugar tão diferente do seu. Os habitantes da vila da Folha são mais gentis e calorosos, e essa gentileza, que sempre foi vista como fraqueza, provou ser a maior qualidade daquele povo. Todos a acolheram como parte de um time, até mesmo o Hokage era extremamente gentil e atencioso. Chouji e Ino a adotaram de vez, principalmente Ino pois ficaram mais próximas, já que foi ela que planejou e executou seu casamento com maestria. Aliás, de todos os presentes que ganhou, Ino lhe deu o melhor deles.

Estavam sentados, finalmente, depois da cerimônia e de cumprimentar todos os convidados e principalmente as autoridades de Suna e Konoha, que estavam ali pela política. Shikamaru acariciava sua barriga distraidamente, era a forma que ele tinha de se conectar com o bebê que morava ali dentro. Ao lado deles, Chouji e Karui estavam comendo como loucos, a barriga dela pouco aparecia, diferente de Temari, que com dois meses a menos o volume redondo não era muito discreto . Ino se aproximou de mãos dadas com Sai, sorrindo largamente, sentando-se ao lado dos casais, ansiosa.

— Eu queria dar um presente a mais a vocês. — Ino começou a falar, sua face estava rubra, e cutucou Chouji que resmungou — Para você também.

— Já não basta ter organizado essa cerimônia digna de celebridades para nós dois? — Temari riu. — não precisamos de mais presentes.

— Mas esse é especial. — ela trocou um olhar carinhoso com Sai — Bem, não planejei uma forma bonita de dar essa notícia mas...  Vamos ter que começar a preparar treinamentos desde já, pois temos mais uma geração de Ino-Chika-Cho completa a caminho.

Chouji parou com o garfo a meio caminho da boca. Shikamaru riu alto, ajeitando-se na cadeira.

— Você está grávida? — perguntou surpreso — Mas Ino... Você falou brincando em Suna que iria...

— Sim eu sei o que disse. Eu estava mesmo brincando quando falei, mas isso não saiu da minha cabeça desde então... Conversei com Sai assim que cheguei e ele achou uma boa ideia. — ela mirou os amigos, e seus olhos encheram-se de lágrimas — Os melhores momentos da minha infância e adolescência foi ao lado de vocês dois, assim como nossos pais também tiveram uns aos outros. Temos laços muito fortes, vocês dois são pessoas que eu sei que sempre poderei contar, que não importa as circunstâncias, sempre estarão prontas para me acolher, assim como eu a vocês. Eu jamais poderia privar seus filhos e meu filho de ter os melhores amigos do mundo por perto.

Temari  não conseguiu segurar as lágrimas, assim como Shikamaru e Chouji. Tinha uma ideia dessa ligação entre eles, mas ver de perto era diferente. Ver os três juntos, lembrava dela mesmo e de Gaara e Kankuro, de como ficaram próximos nos últimos anos. A ligação do trio de Konoha vinha da infância; a tradição em si vinha há várias gerações, e agora mais uma geração estava formada. Seu marido pegou a mão de Ino, e Chouji pegou a outra, ainda emocionados.

— Foi o melhor presente de casamento que ganhei. Vou fazer o impossível para que eles tenham laços tão fortes quanto nós três.

 

Temari se mexeu, desconfortável. Estava sentindo desde cedo uma pressão bem incômoda no pé da barriga, mas não tinha tempo para aquilo. Era aniversário de Shikamaru, e resolveu que daria a ele um jantar de comemoração. A princípio ele negou, sabia que ela estava com dores por conta do final da gestação, mas não era justo que deixasse de comemorar por causa dela. Era forte, podia lidar com um pouquinho de dor, ou pelo menos achou que podia.

—Tudo bem? — Ino perguntou. A companheira de time de Shikamaru se propôs a ajudar na preparação do jantar, junto com dona Yoshino. — Quer alguma coisa?

— Quero sim, que essa coisinha preguiçosa saia de dentro de mim! — bradou.

— Já era pra ter saído mesmo... — Ino riu, sentando-se na poltrona ao lado, colocando também os pés para cima. — Ontem conversei com Shizune sobre você, e ela achou melhor induzir o parto se o bebê não nascer até o final da semana. — ela se ajeitou, acariciando a própria barriga. — Vê se não faz isso comigo, viu, Inojin?

Ino estava no seu sétimo mês de gestação. Temari sentia uma pontinha de inveja da garota. A barriga dela era pequena e redondinha, e por isso conseguia se mover livremente por aí. Sua barriga mostrou sinais que ia crescer muito logo de início. Mudaram a data do casamento às pressas para que na cerimônia não tivesse sinais tão claros da gravidez, mas de nada adiantou. Com três meses já era bem visível, e nem mesmo o quimono do casamento conseguiu esconder. Não que se importasse com isso, não se importava, e parecia que ninguém de Konoha também, mas no fundo tinha seu lado vaidoso, e queria estar bem dentro da roupa.

O dia passou devagar, e o desconforto cada vez aumentava mais. Já não tinha posição nem sentada, nem deitada, muito menos de pé. Aos trancos e barrancos, tudo ficou pronto para receber os amigos de Shikamaru, que não tardaram a chegar. Logo a maioria já estava lá, sentados à mesa, desfrutando da deliciosa comida de dona Yoshino, que quis cozinhar tudo, dizendo que Temari só iria atrapalhar na cozinha por causa de sua lentidão.

Era engraçado como as coisas aconteceram, parece que foi dada a largada à temporada de bebês em Konoha. Quase todos os amigos de Shikamaru ou já tinham filhos, ou estavam para nascer. Naruto e Hinata foram os primeiros, o pequeno Boruto tinha oito meses, e apesar do ar angelical que passava com aqueles cabelinhos loirinhos e olhos azuis, era bem agitado e esperto para a pouca idade. Hinata tinha soltado ele no chão para engatinhar, mas desistiu poucos minutos depois, pois nos instantes que ficou solto derrubou os porta retratos de cima de uma estante baixa subiu na mesma. Sakura e Sasuke surpreenderam a todos quando voltaram de sua viagem que durava mais de um ano com sua filhinha, Sarada, nos braços, que havia nascido enquanto voltavam. Aliás, Sasuke, apesar de ter sido perdoado, ainda não se sentia muito a vontade de estar no meio de todos. Ele foi ao jantar que estava oferecendo, mas ficava um pouco isolado, com a desculpa de estar fazendo Sarada dormir. Chouji e Karui chegaram um pouco mais tarde com a primeira do trio Ino-Shika-Cho a nascer; Chouchou tinha pouco mais de um mês e era uma garotinha encantadora, de bochechas redondas e que passava a maior parte do tempo mamando. Ainda teria o filho de Rock Lee, que nasceria em breve, assim como Inojin, filho de Ino e Sai.

Temari preferiu não saber o sexo do bebê antes do nascimento, achava emocionante a ideia de saber só na hora. Ninguém concordou com a sua escolha, nem mesmo Shikamaru, que queria comprar coisas para o gênero certo, e pintar o quarto um pouco mais feminino ou masculino, dependendo do que viesse. Achava uma bobeira, afinal, criança não ligava para nada disso. Um quarto todo branquinho com uns ursinhos na parede já era o suficiente pra ambos os sexos, mas apesar disso, tinha seu palpite. Nunca acreditou nessas coisas que a mãe sente o que está vindo, mas de alguma forma, tinha certeza que seria um menino. E sinceramente, ela preferia mesmo; era bruta demais para lidar com a delicadeza uma menina.

O jantar não se estendeu muito, com bebês pequenos ou as meninas grávidas, os convidados logo começaram a ir para suas casas. Não passou muito tempo e somente Ino e Sai, Chouji e Karui e dona Yoshino permaneceram em sua casa.

A conversa estava animada, mas Temari não conseguia acompanhar. Tentava não demonstrar, mas o desconforto que sentia mais cedo tinha aumentado consideravelmente, e mesmo sentada em cima de todas as almofadas da casa não conseguia se sentir bem. Além da pressão na barriga, agora sentia cólicas e suas costas também incomodavam. Precisava deitar, mas sem fazer com que notassem o que estava sentindo. Deveria falar, sabia, mas odiava parecer fraca. Ela nunca esteve tão frágil quanto nesses meses, então tentava segurar seus desconfortos até onde podia para não demonstrar tal fraqueza.

— Você está bem? — Dona Yoshino, sempre observadora, perguntou.

— Estou, eu só... — Ela fez uma careta no momento que sentiu uma pontada mais forte — Estou cansada, acho que vou me deitar.

— Vem, te ajudo a levantar. — Shikamaru se levantou prontamente.

Ele a apoiou pelas costas, segurando a maior parte de seu peso. Levantar nunca foi tão difícil, e hoje estava pior. Com dificuldade, ela se equilibrou e sorriu para o marido.

— Obrigada, pode ficar aqui com seus amigos, eu vou descan...

Ela parou de falar no momento que sentiu o líquido escorrer por suas pernas, sem que conseguisse controlar, molhando toda sua roupa e o chão. Todas as pessoas ali presentes soltaram exclamações que Temari nem ouviu, seu olhar estava preso em Shikamaru e seu olhar amedrontado, porque ela sabia que devia estar da mesma forma.

— T-Tema... Isso é... Isso é...

— A bolsa estourou, Shikamaru, tá ficando burro? — Dona Yoshino bradou, tirando Temari das mãos do marido e apoiando-a pelo ombro. — Vai para o quarto pegar as coisas, eu vou ajuda-la a trocar de roupa. Ino querida, pode avisar no Hospital que já estão indo?

A loira assentiu, e dona Yoshino a conduziu em direção ao quarto. Era a hora, seu bebê preguiçoso estava chegando, e embora estivesse com as mãos tremendo e o coração acelerado de nervoso, só de saber que em pouco tempo estaria com seu filho nos braços, seus olhos já enchiam de lágrimas. Estava pronta, mais do que pronta, para receber o seu bem mais precioso.

 

Shikamaru

 

Estava no jardim há quinze minutos, já tragando seu segundo cigarro. Sorte que havia comprado um maço novo, porque do jeito que estava tenso acabaria com ele todo de uma só vez. Tinha adquirido o hábito de fumar há alguns anos, após a morte de seu sensei, mas mesmo naquela época o máximo que consumia eram cinco cigarros durante um dia inteiro; se fosse um dia calmo, uns dois. Sua mãe não gostava nem um pouco desse hábito e durante muito tempo encheu seu saco por conta disso, então não fumava em casa, nem mesmo no jardim. Aproveitava o caminho até o prédio Hokage, e os momentos que dava uma pausa no trabalho. Após se casar, com a esposa grávida, manteve a rotina de fumar do portão para fora. Temari não era a favor dele manter o cigarro em sua vida, mas também nunca se mostrou realmente incomodada por ele fumar, porém ainda assim preferia manter longe da sua casa para não prejudicá-la e muito menos ao bebê.

Entretanto hoje abriu uma exceção. Estava tão nervoso que nem mesmo o cigarro mais forte seria capaz de acalmá-lo. Sabia que seu filho nasceria a qualquer momento, aliás, já era para estar ali há pelo menos uma semana; achou que estava pronto para quando ele decidisse vir, mas não estava. Durante a gravidez, Temari o obrigou a participar de palestras e treinamentos para pais iniciantes. Aprendeu a trocar fraldas, pôr para arrotar, fazer dormir, até a desengasgar um bebê caso ele se afogasse com leite. Nesse curso, inclusive, fez treinamento para o dia do parto, para que quando chegasse a hora não se desesperasse e soubesse conduzir a esposa que estaria com dores para o hospital. Em tudo, segundo a enfermeira, tinha se saído muito bem, até Temari o parabenizou dizendo que no dia que acontecesse seria um ótimo líder para esta “missão”.

Bem, na prática as coisas eram bastante diferentes. Ninguém falou que ele estaria com as pernas bambas e com as mãos suando. Também não disseram que sua mente genial iria traí-lo e começar a pensar em tudo de errado que poderia acontecer no nascimento, e com isso, que seria tomado por um medo quase irracional. Ninguém falou que ele se sentiria tão inútil, como se tivesse com as mãos e pernas amarradas. Mesmo em suas missões mais difíceis nunca sentiu-se tão incapaz.

Nem tinha percebido que seu cigarro estava no final, jogou fora a bituca que tinha na mão e logo acendeu outro. “Hoje estou pior que o Asuma.” — riu.

— Shikamaru! — Chouji vinha correndo até ele — Estamos indo embora agora. Já está tudo sob controle e segundo Karui elas já estão descendo.

O moreno apenas assentiu. O Akimichi o puxou para um abraço de esmagar os ossos.

— Muda essa cara, vai ficar tudo bem. — Falou, soltando um Shikamaru quase sem ar pela força que pôs nos braços. — Ino vai acompanhar vocês, ela assistiu o parto da Karui e fez um ótimo trabalho. Agora fica tirando sarro de mim dizendo que segurou minha filha antes do próprio pai.

Chouji riu, mas o Nara não conseguiu acompanhar. Ele pôs a mão em seu ombro, compadecido.

— É assustador, eu sei disso. Mas quando acabar e você ouvir o choro do seu filho, vai ver que esse nervosismo não é nada comparado à felicidade de vê-los aqui fora.

Ele agradeceu e seu melhor amigo se despediu. Shikamaru acompanhou-o com o olhar saindo portão afora. Apesar da gentileza de querer consolá-lo, ainda estava muito tenso. Como desejava ter seu pai ali ao seu lado. Ele sempre tinha a coisa certa a dizer quando o encontrava em aflição, seja dando-lhe uma bronca, ou convencendo-o a seguir em frente, ou até dando um abraço se precisasse. Seu pai era seu maior incentivador, uma das poucas pessoas que tinham o poder de fazê-lo mudar a atitude quase de imediato, por isso encontrar-se vulnerável fazia com que sentisse ainda mais falta de tê-lo por perto.

— Ah, papai. O que você falaria? — Perguntou às estrelas.

— Ele certamente mandaria você apagar essa coisa.

Shikamaru tomou um susto, engolindo a fumaça de mal jeito, tossindo descontrolado. Não tinha percebido sua mãe chegar.

— Tá vendo? Eu falo para você largar essa porcaria, mas não me ouve!

— Não é hora pra isso, mãe! — Shikamaru brigou, se recompondo — Você me assustou!

— Deixa de ser molenga! — ela bradou — Vamos, Temari está esperando. Apaga isso, suba e troca de roupa. Não vai receber meu neto ao mundo fedendo a cigarro.

— Não estou fedendo. — Ele afirmou, e ela cruzou os braços, duvidando. — É sério, não fico com cheiro.

Shikamaru não achou que sua mãe fosse mesmo fazer aquilo, mas fez. Agarrou ele pelo colarinho, e cheirou sua roupa como um cão farejador.

— Como você consegue não ficar com cheiro na roupa depois de soltar fumaça feito uma chaminé? — Questionou, soltando-o.

— Experiência, acho.

Ela revirou os olhos resmungando baixinho. Em outro momento, falaria mais alguma coisa que a deixaria irritada. Tinha um certo medo da ira da sua mãe, mas no fundo gostava de provoca-la. Mas hoje não, se limitou a apagar o cigarro como ela pediu. Dona Yoshino notou a falta de resposta, e sorriu, compreensiva.

— Sei que está nervoso. Ainda lembro como seu pai ficou no seu nascimento... — comentou sonhadora, e Shikamaru se arrepiou à menção de seu velho — Ele estava louco! Derrubava tudo no chão, não falava coisa com coisa e tropeçava nas próprias pernas. Sempre foi um homem tão sério e centrado, meio preguiçoso, mas sempre muito controlado, até mesmo nas missões mais complicadas. Porém no seu nascimento não, ele estava tão nervoso que mesmo estando em trabalho de parto tive que gritar algumas vezes para que parasse de agir feito idiota. No hospital parecia que quem ia parir era ele. Cada vez que eu tinha uma contração ele se contorcia no sofá. Eu já estava ficando irritada a um ponto que se ele fizesse mais qualquer som lançaria ele janela à fora. Para piorar a noite, Inoichi apareceu, tão nervoso quanto ele, dizendo que Yuko também estava tendo o bebê. Achei que a presença do amigo se tornando pai ao mesmo tempo que ele ia ajudar, mas no fim só ficaram dois homens nervosos juntos.

Ela gargalhou, perdida na lembrança.

— Entretanto seu pai me surpreendeu. Apesar de nervoso não saiu do meu lado; e quando você nasceu, a médica te entregou a ele primeiro, e assim que ajeitou aquele garotinho bonitinho que chorava desesperado nos braços, ele chorou. Foi a única vez na vida que o vi chorar. E hoje, se ele visse seu garotinho chorão adulto com o seu próprio garotinho ou garotinha nos braços, tenho certeza que o veria chorar pela segunda vez.

Shikamaru não conseguiu conter as lágrimas, e sua mãe o abraçou.

— Eu também queria que ele estivesse aqui... Mas esteja onde estiver, ele está orgulhoso do que você se tornou. — ela falou, enxugando as lágrimas do rosto do filho. — Agora vai, Temari está aguardando. Vai receber seu presente de aniversário.

Com tanta coisa na cabeça não tinha lembrado disso, seu filho nasceria no dia de seu aniversário, o que tornava tudo ainda mais especial.

O hospital já estava preparado para recebê-los. Ino ajudou a acomoda-los no quarto, e logo Shizune veio examinar Temari. Segundo ela, ainda demoraria mais um pouco para que a dilatação fosse completa, e não restava fazer outra coisa senão esperar.

Conforme o tempo foi passando, as coisas foram piorando. Temari saiu de casa reclamando apenas de um desconforto e leves cólicas. Passado pouco mais de duas horas no hospital, a dor aumentou numa proporção assustadora; ela se contorcia na cama, sem conseguir nenhuma posição que aliviasse. As contrações, que antes ele estava ajudando a contar, agora não tinham mais intervalos, era uma dor intensa e constante. Era desesperador ver aquela mulher sempre tão forte, tão frágil, chorando encolhida, e ele, impotente diante de tudo isso; só conseguia desejar poder dividir aquela dor.

Ino disse que a levaria para tomar um banho quente, pois ajudaria aliviar um pouco a dor. Shikamaru aproveitou para sair por uns momentos, respirar, fumar um cigarro para tentar ficar menos tenso, porém assim que chegou na porta de entrada do hospital, desistiu. Temari não podia descansar, relaxar ou ficar menos tensa e pensou no quanto aquela situação era injusta. Não ia sair do lado dela por nem um minuto, assim como seu pai um dia fez com sua mãe. Voltou e entrou no banheiro. Ela estava sentada em um banquinho, com os olhos fechados e o cenho franzido, a água que caía do chuveiro era tão quente que seu rosto estava avermelhado, e o cômodo estava tomado pelo vapor. Se aproximou, abaixando-se ao seu lado, por fora do box, sem se importar com os respingos que molhavam sua roupa. Permaneceram assim por longos minutos, ele nada falava, só se mostrava presente. Ela olhou para ele e sorriu, um sorriso meio torto pela dor, mas um sorriso que o aliviou: estava fazendo a coisa certa.

Por fim ela desistiu da água e quis sair. Ino a ajudou a vestir a roupa e ela voltou a deitar em posição fetal, respirando pesado.

— Shika... — ela gemeu. Ele abaixou seu rosto na altura do dela, apoiando sobre seus braços cruzados na cama — Não teremos mais filhos, certo?

Ele não conteve a risada, e negou com a cabeça. Ela tentou rir, porém pareceu mais uma careta e fechou os olhos em seguida, tentando suprimir a dor, e uma lágrima involuntária escorreu por seu rosto. Ele enxugou, aproveitando para acariciar sua bochecha, e desejou com todas as suas forças que o bebê nascesse logo.

Mas o tempo parecia não colaborar, se arrastava preguiçosamente, como se o provocasse. Já tinha cerca de quatro horas que estavam no hospital, mas parecia que eram dias. Estava mentalmente exausto, tanto que acabou cochilando. Acordou no susto, procurando por Temari. Notou que sua esposa não gemia mais, nem se contorcia de dor; estava quietinha, virada para a parede. Shikamaru se aproximou, e percebeu que ela estava mole, pálida e gelada. O pânico tomou conta dele. Saiu correndo pelos corredores, desesperado, atrás de alguém. Shizune logo apareceu, a examinou por alguns segundos, concentrou chakra nas mãos e as levou ao peito da loira.

— Ela está cansada, gastou energia demais tentando suportar  a dor. O trabalho de parto está longo e intenso... — a cor de Temari começou a voltar, assim como a expressão de dor. — Ino, pode checar a dilatação?

Quando Ino se posicionou para realizar o procedimento, Temari resmungou, fazendo bico.

— Já me tocou tantas vezes hoje que tô seriamente pensando em me casar com você.

Todos riram. Mesmo com dor sua mulher não perdia sua ironia. Ela prosseguiu à examinar sua esposa, e de repente deu um gritinho, surpresa, com um grande sorriso no rosto.

— Shizune! — Chamou, ansiosa — está pronta!

Seu coração descompassou, seu bebê chegaria agora. Na sua cabeça passou um filme: a surpresa em saber que seria pai, a quantidade de vezes que segurou  os cabelos de Temari para que vomitasse, o casamento apressado, a alegria de sentir aquele serzinho se mexendo dentro da barriga, de mobilhar a casa para a chegada dele... depois de tanto sofrimento naquela noite, finalmente teria seu bebê nos braços. A ansiedade aumentou tanto que suas mãos começaram a tremer, e seus olhos já queriam lacrimejar. Mas não era hora de chorar. Respirou fundo e foi para o lado de sua loira, que estava claramente exausta, e segurou sua mão. Temari olhou amedrontada para ele, depois para Shizune.

A ninja médica assumiu uma expressão mais séria, aumentando o chacra das suas mãos.

— Ino, eu não vou poder sair daqui, vou continuar cuidando da energia dela, você cuida do bebê. — ela assentiu, então Shizune virou-se para Temari. — Tá na hora. Sei que sua dor está constante, mas assim que sentir uma pressão um pouco maior, empurra.

—Eu não vou conseguir... — ela falou entre gemidos — não tenho forças...

Shikamaru segurou o rosto da esposa, virando para si.

— Você é a mulher mais durona e determinada que eu conheço, não vai desistir. — ele se inclinou, beijando-a na testa — Nosso bebê está chegando, Tema. E eu vou ficar aqui do seu lado.

Então ela começou: um empurrão, dois, três. Shizune, a cada um deles aumentava ainda mais o chakra. Temari se esforçava, e em cada empurrão apertava a mão de Shikamaru com força. Não se importava, nem um pouco, poderia quebrar todos os seus ossos de quisesse, ele continuaria ali.

— Vamos lá! — Ino exclamou — um último empurrão!

Temari apertou sua mão com ainda mais força e gritou o mais alto que já ouviu, um grito longo e sofrido, que quando finalmente terminou, ela desabou sobre a cama. E nesse mesmo instante, um choro estridente preencheu o quarto.

— Um menino! — sua amiga anunciou, empolgada — vocês têm um menininho com a cara do Shikamaru!

Aquele choro foi o som mais bonito que já ouviu na vida. Viu de longe, enquanto Ino o arrumava para trazê-lo, o amontoado de cabelos negros naquela cabecinha tão pequena. Ela logo trouxe aquele pequeno pacote nos braços, ia entregá-lo a Temari, mas Shizune ainda não tinha terminado, então virou-se para Shikamaru, emocionada, estendendo os braços, passando o bebê para seu colo.

— Parabéns... e obrigada pelo presente. — ele franziu o cenho e ela riu, emocionada. — Seu filho nasceu à meia noite e dez do dia vinte e três de setembro. Já é o meu aniversário.

 Ele nem tinha percebido, seu aniversário já tinha passado há dez minutos; e tudo bem, no aniversário dele ou de Ino, o que importava mesmo é que seu filho estava ali, nos seus braços. Ele era leve, tinha a pele clara e as bochechas grandes. Seu nariz era exatamente no formato do seu, assim como seus pequenos lábios rosados. Poderia dizer que era seu clone, mas então ele abriu os olhinhos. Eram grandes e expressivos, de cor azulada, que certamente se tornariam verdes um dia. Os olhos dela, aqueles olhos que tanto amava.

Seu menino, perfeito, a coisa mais perfeita que já tinha feito na vida. Se tentasse descrever aquele momento em palavras não conseguiria. Sentia-se preenchido por uma felicidade inexprimível.

Não se sabe em que momento começou, mas quando se deu conta estava tomado por uma emoção que nunca havia sentido antes, e as lágrimas rolavam incessantes pelo seu rosto. Ele se aproximou de Temari assim que Shizune terminou, entregando o bebê à mãe, ajeitando-o no seu peito. Ela o abraçou, aninhando-o, admirando cada detalhe de seu pequeno rostinho, completamente emocionada.

— Você está aqui... — ela falou entre soluços — finalmente está aqui.

Shikamaru abaixou-se, beijou a testa de sua esposa, e juntou seu rosto ao dela, apoiando a mão sobre a que ela apoiava seu filho. Não conseguia parar de chorar, ter os dois nos seus braços era libertador, aconchegante e fazia com que se sentisse mais completo do que nunca. Aquele garotinho apareceu na sua vida fora de seus planos, mas com certeza foi a melhor falha no plano que poderia ter acontecido.

Todo aquele misto de sensações que experimentou essa noite, e ver finalmente seu garotinho ronronando aconchegado nos braços de Temari lhe deu uma certeza: Seu filho chegou na hora certa.

— Seja bem vindo, Shikadai.


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Notas finais do capítulo

Tenho algumas considerações finais:


Primeiro: Quero agradecer à minha GRANDE amiga @pkn1208 por ter feito seu relato de parto sofrido para eu poder me basear. Passei por uma cesárea e perdi toda essa emoção (ou não. rs) do trabalho de parto, e só queria uma ideia. Mas sua experiência se encaixou tanto que usei quase tudo! rsrs. Foi difícil, mas o final foi o nosso gordinho gostoso, e tudo valeu a pena! Obrigada por estar me ajudando, amiga, e por embarcar nas minhas loucuras desde 1930! Você é a melhor. Te amo!

Segundo: Para quem não sabe, as datas de aniversário são verdadeiras. Shikamaru faz aniversário dia 22/09, E Ino e Shikadai, como pus na história, 23/09.

Terceiro: Sobre o cheiro do cigarro não ficar na roupa, eu odeeeeeio cigarro. Há uns anos eu tinha uma colega de trabalho que fumava, mas só descobri que era fumante muito tempo depois, quando fomos embora juntas. E quando eu questionei o porquê de nunca ter sentido cheiro de cigarro nela ela falou: "Eu nunca fico com cheiro de cigarro, e olha que fumo há anos. Deve ser a experiência". rsrs.

Quarto: Eu geralmente me baseio em experiências pessoais para escrever (deu pra perceber, né? rsrs), e essa história remete muito ao que aconteceu comigo. Minha filha veio no momento mais conturbado da minha vida, sem o menor planejamento, mas com certeza ela foi a melhor falha no plano que me aconteceu.


Obrigada a todos que acompanharam e aos que ainda irão acompanhar. Essa fic é muito especial para mim, pois eles são meus personagens favoritos, e se não existisse Rony e Hermione em Harry Potter, seriam meu casal favorito de todas as sagas existentes. rsrs

Um beijo e até a próxima! ;)