Otou-san,   

Embora considere que esta carta seja inútil e que depois eu venha a queimá-la com meu katon, assim como fiz com a anterior, a escrita foi o melhor meio que pensei para tentar organizar meus pensamentos nesse momento. Sakura estava certa em um ponto, afinal, por isso estou escrevendo a segunda carta desse processo terapêutico.  

Eu vou ser pai. Venho repetindo essa sentença por meses na minha cabeça, mas nunca havia, de fato, sentido as perspectivas e responsabilidades da paternidade, não fisicamente. No entanto, eu senti agora, senti tão forte que perdi o sono e mesmo banhando-me no riacho ao nosso redor, não consegui relaxar. Sakura e eu estávamos dormindo serenos, mas hoje eu senti uma ondulação no seu ventre e quando percebi minha mão já estava posicionada naquele local, no qual eu pude sentir os chutes da minha bebê. Sim, é uma menina. Passamos por Kirigakure há uma semana e Sakura aproveitou para fazer uma ultrassonografia, descobrindo que teremos uma filha. 

Ela, no caso, permanece sem nome, porque Sakura tem uma nova ideia a cada novo lugar que visitamos durante a viagem, se inspirando em flores, pessoas e até em comidas, e eu só a observo com um sorriso tolo, porque diferente da minha esposa não tenho grandes inspirações e sei que de qualquer forma sua escolha final será mais do que perfeita.  

Questiono-me agora como foi para você ser pai, Otou-san. Imagino que na época havia muitas responsabilidades intrínsecas a esse evento, principalmente como líder do clã, porém, e no íntimo de nossa casa? Como você agia com a okaa-san? Ajudou-a nos momentos ruins, como achar uma posição confortável para dormir? Sussurrou palavras gentis ao seu ventre como fiz hoje, há poucos minutos? Você desejava que Itachi e eu fossemos homens ou chegou a cogitar e desejar ser pai de uma menina? Tenho muitas perguntas e infelizmente nenhuma resposta, nenhuma oficial quero dizer, porque imagino que o conselho do clã o pressionava por um herdeiro, mas agora não há nenhum clã além de mim, Sakura e nossa filha. Então continuo encabulado com fato de não saber cuidar de uma menina. Eu convivi com Itachi e com os meninos do clã e por isso não sei quais brincadeiras seriam apropriadas para uma menina, embora Sakura tenha o discurso de que ela brincará com tudo, porque nossa filha merece se desenvolver plenamente e não posso, nem quero, discordar dela nisso.  

Às vezes, observo Sakura e a comparo a okaa-san, a forma delicada com que me trata, sorri e fala com as pessoas conhecidas e até desconhecidas. Ela está sempre radiante, me mostrando sua visão do mundo e eu apenas a escuto tagarelar, seja de manhã enquanto come uma fruta, durante o almoço enquanto cozinha animada ou quando vamos dormir e ela me conta seus sonhos e desejos. E essa convivência é que me faz sentir grato por ela nunca ter desistido de mim e por me entender, mais do que eu mesmo.

Por isso decidi escrever esta carta endereçada a você, porque eu sei que me entenderia se estivesse vivo. Você estaria orgulhoso da esposa que escolhi pra mim, não por causa de seus títulos, como ser a melhor kunoichi de sua geração, mas por ela ser àquela que me completa da mesma forma que a okaa-san completava o senhor.  

Certa vez, eu estava magoado por não receber a mesma atenção que Itachi ganhava de você, mas okaa-san me disse que quando estavam sozinhos, você sempre falava sobre mim, e isso me deixou feliz na época, fez com que eu me sentisse querido, e eu sei que ela não estava mentindo com o intuito de me agradar. Okaa-san sempre falava a verdade e também sempre soube entender o que se passava na nossa casa, seja com o nii-san, comigo ou com você; e eu vejo como Sakura desempenha perfeitamente esse mesmo papel.  

Confesso não me lembrar de um contato caloroso entre nós e admito que por causa disso não sei o que devo fazer quando minha filha nascer, mas irei me esforçar para manter uma relação calorosa entre nós enquanto estiver vivo. Farei tudo para que ela cresça saudável, feliz e que seja livre para escolher seu próprio caminho, porque ser uma kunoichi, comandar um clã ou até ser Hokage não são sonhos meus, mas se forem os dela, irei apoiá-la até o fim dos meus dias.  

Hoje eu tive um pouco da sensação física da paternidade e posso admitir, mesmo que envergonhado, que meu coração falhou uma batida e meus olhos lacrimejaram. Eu me senti emocionado pela minha filha estar se desenvolvendo de forma saudável e por ter se revelado a mim, já que Sakura continua dormindo tranquilamente ao meu lado e não notou esse fato extraordinário. 

Otou-san, você também observava a okaa-san dormir? Ou esse mal hábito soturno eu desenvolvi sozinho? Sinceramente, a visão dos cabelos róseos médios acima do símbolo Uchiha nas vestes dela faz com que eu me sinta contemplado e em paz, sendo assim, não é um hábito que pretendo extinguir tão cedo. 

Ela é a minha esposa, sua nora, minha amiga e mãe da minha filha. É nela que a honra dos Uchihas reacende, porque Sakura nunca precisou de um clã para brilhar, mas o nosso clã sempre precisou de mais pessoas como ela, sem egoísmo e ódio, apenas empatia e um amor tão sublime que é capaz de atingir a todos ao seu redor. Eu não quero mais cometer erros com ela, muito menos com nossa filha e, embora eu saiba que não quero seguir os seus passos, Otou-san, também não sei como agir diante da nova fase que me encontro... minha filha está chegando e eu preciso me preparar para tê-la em meus braços.  

Constantemente a imagino durante os sonhos, cabelos negros e olhos verdes, uma combinação perfeita entre mim e Sakura, e posso dizer com sinceridade que ficaria feliz em olhar para minha filha e automaticamente pensar na minha esposa, as duas mulheres que preenchem a minha existência com amor. Essa é, então, a minha definição de felicidade: ser pai de uma menina Haruno e ao mesmo tempo Uchiha. 

Com amor, 

Seu filho.