O vermelho de Copenhague escrita por Letícia Matias


Capítulo 17
Dezessete


Notas iniciais do capítulo

Oi pessoal!!! Bom dia pra vocês!
Finalmente estou aqui pra postar o capítulo dezessete. Esperei muito para postar ele ♡♡♡ Digamos que ele tem um lugarzinho especial no meu coraçãozinho.
Sem mais delongas.... bora ler



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O céu estava de um azul perfeito, com nuvens o forrando. O sol estava quente na medida certa, para nos esquentar, ainda que estivesse uma brisa fria naquela manhã.

Eu estava empurrando a cadeira de rodas do sr. Zarch, que estava vestindo um suéter de lã cinza e calça de sarja. Ele tinha insistido em tomarmos o café da manhã e logo tomarmos um banho de sol. Ele achava que eu estava muito branca.

Paramos no meio do extenso campo e eu me sentei em cima de uma toalha quadriculada de pequenique ao lado de sua cadeira de rodas. Jullian estava conosco e permanecia calado. O sr. Zarch estava me contando um pouco sobre a origem do Budismo. Eu estava fascinada.

– Dá para acreditar que um príncipe abandonaria tudo e iria morar no meio do mato até que atingisse a paz espiritual plena?

Sorri balançando a cabeça em negativa.

– É uma ótima história. Se isso aconteceu mesmo, sr. Zarch, acho mesmo que Sidarta foi muito inspirador.

Seus lábios se repuxaram em um sorriso torto.

– Ele foi, querida. Quem não quer atingir a plena paz espiritual, certo?

Assenti e disse:

– Eu só acredito que conseguimos isso quando morremos.

O sr. Zarch ficou em silêncio por um tempo, pensativo e contemplando as casas amarelas vizinhas no horizonte do extenso gramado.

– Você vê, eu acho Wendy, que viemos para o mundo fadados a sofrer.

Eu estava olhando para o rosto do sr. Zarch e pude ver Jullian, em pé ao seu lado, olhá-lo quase que... ameaçadoramente. Sua expressão era de exasperação e raiva. O sr. Zarch pareceu não notar e continuou:

– Viemos para o mundo, crescemos e, começamos a sofrer. Alguns mais cedo e outros mais tarde. - o sr. Zarch soltou um suspiro. - É só sofrimento e sobre aprender.

– Como assim? - perguntei franzindo o cenho. Coloquei a mão em frente aos olhos por um segundo, livrando-os da luz solar.

– Veja bem, o budismo explica que, com o desejo, vem o sofrimento. Nossa existência é composta de desejos. Desejamos coisas materiais e, se não podemos a possuir por qualquer icógnita que seja, sofremos. Sofremos quando desejamos uma pessoa. Mas não é só sobre o desejo. Olhe quantas pessoas no mundo nascem doentes, ou tem uma condição de vida precária. Olhe quantos estão se refugiando, fugindo de seus próprios países... - ele deu uma pausa e respirou fundo. - É puro sofrimento. Uns sofrem por saúde, outros por dinheiro. Nunca estaremos completos, Wendy, querida.

Aquilo me fez parar para refletir. Ele tinha razão. Eu conseguia concordar completamente com o sr. Zarch. Uma pergunta se formulou em minha cabeça e eu fiz a ele:

– Sr. Zarch, o senhor acha que, podemos ser completamente felizes à certa altura da vida?

Observei seus dedos perto do botão vermelho da cadeira de rodas. Ele apertou o botão, o que fez a cadeira virar e ele ficar de frente para mim. Seus olhos pequenos fitaram os meus.

– Acredito que não. Certamente pelo desejo. Nunca estamos satisfeitos. É um ciclo vicioso. Além do mais, somos burros, querida. Damos valor ao que não importa. Esquecemos de agradecer à saúde que temos, não valorizamos o ar que entra nos nossos pulmões. Não. Isso é algo banal para nós. Não somos gratos por pequenas coisas.

– Acho que, parar para pensar nessas coisas, faz com que fiquemos deprimidos.

O sr. Zarch estava sério, mas ao ouvir eu falar aquilo, riu; a boca retorcendo-se do lado direito para baixo.

– Desculpe, não quero te deprimir.

Ri baixinho.

– Não tem problema. Eu gosto das nossas conversas.

Os olhos do sr. Zarch se fecharam por um instante e logo tornaram-se a abrir.

– Eu também, querida.

Eu estava nocauteada por aqueles pensamentos do sr. Zarch. Era muito para pensar. Eram questões que não estamos acostumados a refletir. E era totalmente necessário para nossa existência.

Olhei para Jullian em pé ao lado da cadeira do pai. Percebi que sua mão estava tremendo um pouco. Não podia ser frio, pois o sol estava quente o suficiente para nos esquentar. Uni as sobrancelhas.

– Jullian, você está bem? Suas mãos estão tremendo.

Ele olhou para mim e revirou os olhos.

– Você é tão intrometida! Por Deus!

Senti meu rosto esquentando. Permaneci encarando seu rosto.

– Foi só uma pergunta, eu...

– É invasiva. Deixe eu te contar uma coisa, americana: dinamarqueses não são intrometidos, não querem saber da vida dos outros. Então, por favor, cuide da sua vida ou vá discutir suas crises existenciais com o meu querido pai.

Eu estava mais do que pasma e envergonhada. Observei ele se afastar de nós andando rápido e furiosamente. Encarei suas costas e pisquei algumas vezes. Estava boquiaberta. Olhei para o sr. Zarch. Este me olhava neutro e calmo. Não estava sorrindo e nem parecia bravo.

– Sr. Zarch, me desculpe! Eu disse algo errado?

Ele soltou uma espécie de suspiro.

– Não, querida, não. Mas há algo que precisa saber sobre meu filho.

Esperei pacientemente que ele continuasse a falar.

– Jullian tem problemas com álcool. Ele está sem beber desde ontem e está mais explosivo do que o normal. Fiz questão de pedir para Betty esconder todas as bebidas.

Permaneci quieta, absorvendo aquelas informações.

– Não deixe que ele te trate de qualquer jeito. Peço que exija respeito.

Assenti.

– Você vê, ele não é uma má pessoa. Meu filho só guarda muitas mágoas. Ele sofre muito, pois deseja coisas que não pode ter. Deseja o pai que tinha, quando eu era mais jovem e saudável. - o sr. Zarch teve uma crise de tosse. Limpei a baba que começou a sair de sua boca. - Deseja que sua mãe não tivesse conhecido outra pessoa e que tudo fosse diferente. Ele sofre.

Eu sentia minha cabeça girando e processando todas aquelas informações. Senti meu coração pesado e ao mesmo tempo batendo rapidamente. Lembrei da acusação de Jullian sobre a mãe; dizendo que ela era uma má pessoa, lembrei-me dele tocando piano e da noite no clube, qual ele parecia exausto.

– Vamos entrar, querida. Acho que preciso dormir um pouco antes do almoço. Além do mais, preciso do Nigel.

– Claro!

Coloquei-me de pé e levei o sr. Zarch de volta para dentro da casa plana e quadrada. Nigel estava na sala de estar e esperava por nós. Eu forcei um sorriso para os dois enquanto se afastavam para o quarto do sr. Zarch.

***

Um pouco antes do almoço estar pronto, eu estava na sala lendo algumas informações e documentos que teria de levar comigo em consultas médicas, quando o senhor Zarch precisasse. Estava tudo silencioso quando ouvi as teclas do piano serem tocadas. A sequência de notas criava uma bela melodia, de uma música que eu conhecia.

A porta quadriculada estava entreaberta. Me encaminhei silenciosamente até ela e a abri cuidadosamente. Observei Jullian tocando concentrado. Ou ele não havia me visto ou estava ignorando minha presença. Desconfiava mais do último.

– É rude espiar as pessoas. - disse depois de um tempo. Ainda tocava.

Não resisti ao impulso de revirar os olhos. Ele estava olhando para meu rosto. Adentrei completamente no cômodo e fechei a porta atrás de mim. Estávamos a sós.

– Eu não estava te espiando. Eu só... gosto dessa música. É linda.

Cruzei meus braços. Seus olhos azuis voltaram-se para as teclas. Seus dedos compridos tocavam com habilidade.

– Você sabe tocar?

Deixei uma risada de deboche escapar. Ele voltou a olhar para mim e arqueou uma das sobrancelhas loiras.

– Não, eu... nunca pude pagar aulas particulares de música e na minha escola, só os talentosos conseguiam uma vaga.

Jullian não fez comentários sobre aquilo.

– Olhe, me desculpe. Eu... não quis ser invasiva. - encarei a parede ao lado dele. - Entendo que... vocês sejam mais reservados. Você principalmente. Não fiz por mal. Desculpe. Não perguntarei mais nada.

Jullian continuava tocando. Por um momento, perguntei-me se ele tinha ouvido o que eu havia dito. Não fez comentário algum sobre nada. Quando falou novamente, disse:

– Nós começamos com o Dó, depois com o Lá e o Mi.

Permaneci em silêncio. Ele tinha recomeçado a tocar a música.

– Se ficar aí não vai aprender nada. É preciso ver.

Aquilo era um convite para eu me aproximar e ver quais teclas estava apertando. Engoli em seco e caminhei um pouco hesitante até o lado do banco estofado em frente ao piano.

– Este é o Dó.

Ele me mostrou as teclas que faziam o som de Dó, mas eu estava atônita demais com a situação para realmente aprender


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Notas finais do capítulo

Como sempre, eu quero muitoooooo saber o que vocês acharam desse capítulo. Muito mesmo. Me contem aí. Espero que tenham gostado e que estejam gostando da história.
Aaaaah e para os curiosos, a música que o Jullian estava tocando é Bruises do Lewis Capaldi (eu acho que é assim que se escreve).
Aaaaaaah como tô ansiosa pra saber o que vocês acharam sobre essa revelação sobre o Jullian e sobre a aulinha de piano.
Beijos,
Lê ♡



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